A violência como ferramenta para silenciar mulheres

Por Amani Said (*)

Como mulher, advogada, de raízes palestinas e com o coração na luta, sinto a urgência de denunciar o que meus olhos, infelizmente, testemunham com frequência: a tentativa de silenciar mulheres que ousam ocupar espaços de poder. O que vimos recentemente no Paraná não são casos isolados, são sintomas de uma doença social chamada patriarcado, que utiliza a violência política de gênero como sua arma mais covarde para nos intimidar e nos afastar do poder.

Em Arapongas, a vereadora Meyri Faria (PDT), ao usar a tribuna para explicar sobre um projeto proposto por um vereador ‘homem’, porém barrado, na qual o tema proposto cabia apenas à mesa diretora – que ela faz parte e sentiu atacada pelo nobre edil – foi desrespeitosamente interrompida durante sua fala. Sendo que se entende que não foi um ato impensado, e sim um recado: “cale-se, mulher, este espaço não te pertence”. A birra do vereador mimado, “magoado” por não ter sido “apreciado”, é a face patética do machismo que não suporta a nossa presença e a nossa voz.

Essa mesma violência, em uma escala ainda mais abjeta, explodiu na Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP). A deputada Luciana Rafagnin (PT), uma parlamentar com histórico de luta, foi ofendida de forma vil e rasteira por um deputado da extrema-direita. A solidariedade que se seguiu, no entanto, mostra que não estamos mais sozinhas.

A voz corajosa do deputado Arilson Chiorato (PT), líder da oposição na ALEP, nomeou o crime: abuso de prerrogativa parlamentar e violência política de gênero. Mas ele não estava só. A deputada Mabel Canto (PSDB) expressou sua indignação: “Está insuportável… temos que ficar aqui ouvindo essa barbaridade”. O deputado Luiz Cláudio Romanelli (PSD) foi taxativo ao pedir que o microfone do agressor fosse cortado “até que ele aprenda a respeitar os parlamentares e especialmente as mulheres”. E a própria deputada Cristina Silvestri (PSDB) resumiu o sentimento de muitas de nós: “Não tenho mais a mínima vontade de estar aqui nessa casa, porque você fica ouvindo uma discussão tão banal”.

O agressor em questão é um reincidente contumaz na prática de violência política de gênero. Seus ataques misóginos já miraram a deputada Ana Júlia (PT), com ofensas à sua sanidade mental, e a ministra Gleisi Hoffmann, alvo de ataques baixos e mentirosos. O padrão é claro: quando os argumentos acabam, a misoginia transborda. Eles não atacam nossas ideias, atacam nossa condição de mulher. É uma tentativa desesperada de nos desumanizar, de nos transformar em caricaturas para que o debate político seja esvaziado e a violência, normalizada.

É crucial que se diga: isso não é apenas “debate acalorado”. É crime. A Lei nº 14.192, de 2021, foi uma conquista importante para tipificar a violência política de gênero. Ela define como crime qualquer ato de assédio, constrangimento, humilhação ou ameaça contra uma mulher eleita ou candidata, com a finalidade de impedir ou dificultar seu mandato ou sua campanha, com penas que podem chegar a quatro anos de reclusão. A lei existe para proteger o exercício da democracia, que só é plena com a participação efetiva das mulheres.

O machismo estrutural que sustenta esses homens no poder teme a nossa força, a nossa competência e a nossa coragem. Eles sabem que cada mulher que avança na política é uma rachadura nesse sistema podre que eles tanto lutam para manter. A cada interrupção, a cada ofensa, a cada tentativa de nos calar, eles apenas nos dão mais combustível. Nossa indignação se torna mais afiada, nossa solidariedade se torna inquebrantável e nossa luta se torna mais urgente.

Mas eles se enganam. A cada interrupção, a cada ofensa, nossa voz ecoa mais forte. Nossa indignação se transforma em mais luta, e nossa solidariedade se torna nosso escudo. Não recuaremos. Por Meyri, por Luciana, por Ana Júlia, por Gleisi, por Marielle e por todas as mulheres que ousam desafiar o poder, seguiremos em marcha. A ocupação dos espaços de poder por mulheres é um caminho sem volta. O silêncio não é uma opção. A nossa voz é a nossa arma. E nós não seremos caladas.

(*) Amani Said é Coordenadora de Solidariedade Internacionalista da Articulação de Esquerda no Paraná; integrante da FEPAL – lotada na secretária de Direitos Humanos e Solidariedade; Vice-Presidente da Federação de Pais, Mães ou Responsáveis Legais de Alunos e Alunas das Escolas Públicas do Estado do Paraná (Fepamef); Conselheira Estadual de Alimentação do Estado do Paraná.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *