Por Valter Pomar (*)
A imprensa tem especial predileção por uma categoria de petistas: aqueles que ela chama de “conselheiros do presidente Lula”.
Não faço ideia se estas pessoas transitam no Planalto com a desenvoltura que lhes é atribuída pela mídia.
Mas, por via das dúvidas, leio com atenção o que dizem.
É o caso de João Paulo Cunha, que em entrevista concedida recentemente ao Estadão defendeu entregar um ministério para Arthur Lira.
Segundo Cunha, “deixamos muito a desejar nesse processo eleitoral.” O PT precisaria “atualizar a leitura do capitalismo no Brasil (…) ter a compreensão de como os trabalhadores hoje estão se organizando (…) A direita conseguiu captar com mais facilidade uma nova forma de se comunicar com a população, juntando três aspectos: concepção liberal da economia, visão conservadora dos costumes e religiosidade. O PT e o governo ainda não conseguiram enfrentar isso.”
Até aí, no que diz respeito a problemática, temos algum acordo.
Os problemas mesmo começam quando Cunha se dirige para a “solucionática“.
Segundo Cunha, “a direita está hoje com mais problemas do que a esquerda, está dividida, tem brigas em público. E entrou um fenômeno na pauta sobre o qual o governo precisa se atentar, que é o Centrão. (…) Uma parte grande do Centrão está no governo. O PP, o União Brasil, o Republicanos, o PSD têm ministérios, mas não têm um compromisso para 2026 mais sólido. Precisamos consolidar essa banda do Centrão que dialoga com a gente para 2026. (…) ideal é Lira assumir um ministério em 2025 porque temos de trazer o para mais perto”.
A direita está dividida, tem brigas? Sim. Mas, se a questão for 2026, as direitas têm mais margem de manobra do que nós. Por exemplo: se tirarmos Lula da equação, o PT e a esquerda terão grandes problemas. Já se tirarmos o cavernícola da equação, a direita seguirá tendo alternativas, algumas inclusive mais “palatáveis”.
O Centrão é um fenômeno “na pauta”? Sim. Mas o Centrão, com este ou com outros nomes, está na pauta faz muito tempo. O impeachment de 2016, é bom lembrar, foi aprovado com o apoio de parte importante da base do governo (do governo Dilma 2 e, também, do governo Lula 3). A experiência já nos ensinou alguma coisa sobre quão “sólido” é o compromisso com esta gente.
Trazer Lira para o governo, entregar um ministério para Lira, vai mesmo “consolidar essa banda do Centrão que dialoga com a gente para 2026”? Deixemos de lado, por enquanto, os aspectos morais desta proposta e nos concentremos na dimensão pragmática.
Primeiro, uma pergunta: que ministério seria do tamanho adequado aos apetites de Lira, que hoje se comporta as vezes como se primeiro-ministro fosse? Aliás, como fica a norma de não se nomear alguém que não possa ser demitido?
Outra pergunta: na vida real, que tipo de efeito Lira ministro teria sobre a ação prática do governo? O que mudaria, para melhor, no atendimento de nossa base social? Que efeito isto teria sobre as políticas públicas de interesse da esquerda em geral e do PT em particular?
Mais uma pergunta: alguém acha mesmo que esta turma marchará conosco, em 2026, aconteça o que acontecer daqui até lá?
Lendo e relendo a proposta de Cunha, a única certeza a que chego é a seguinte: diante dos efeitos negativos da política adotada até agora, tem gente que está propondo como única alternativa dobrar a aposta.
Ou seja: o pior dos pragmatismos, aquele que não oferece resultados à altura das promessas e expectativas.
O que me recorda uma frase dita por alguém famoso: entre a desonra e a guerra, escolhestes a desonra. Mas o que tereis ao final será a desonra e a guerra.
Acho bem mais pragmático se preparar para a “guerra”.
(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT