Por Valter Pomar (*)
Já estão disponíveis as teses apresentadas pelas oito chapas que disputam o Diretório Nacional do PT. Uma destas oito teses foi apresentada pela tendência intitulada “Construindo um Novo Brasil” (CNB).
A CNB surgiu em 2005, para substituir o “Campo majoritário”, que por sua vez surgira de uma aliança entre a Articulação Unidade na Luta e outros setores da chamada “direita” do Partido. Já a Articulação Unidade na Luta nasceu, em 1993, da cisão da velha Articulação dos 113.
Faço este histórico para sugerir aos interessados que comparem a tese inscrita pela CNB para o PED 2025, com as teses apresentadas no passado por este mesmo setor do Partido. Pode ser chocante, mas é didático. Isto posto, vamos ao grão.
O título da tese da CNB é “DERROTAR A EXTREMA DIREITA E AVANÇAR NA CONSTRUÇÃO DE UM NOVO BRASIL”.
A ênfase em derrotar a extrema–direita é compreensível mas curiosa, tendo em vista que o texto da CNB começa fazendo uma descrição da “conjuntura internacional”, tomando como ponto de partida o “Consenso de Washington e o predomínio global do neoliberalismo nos últimos 40 anos”. Logo, era de se esperar que houvesse uma conclamação para derrotar o neoliberalismo em todas suas expressões, não apenas na versão cavernícola.
Afinal, o neofascismo surge no ambiente criado pela direita neoliberal tradicional. E surge para impor as políticas neoliberais. Políticas que são por sua vez favorecidas pelo fato de parte da esquerda, em nome de combater a extrema-direita, fazer alianças com a direita neoliberal tradicional. Assim sendo, assim como não dá para falar de fascismo sem falar de capitalismo, não dá para falar de extrema-direita sem falar de neoliberalismo. E não dá para falar de neoliberalismo sem perceber que ele é defendido por duas direitas, não apenas pela extrema.
A ênfase que a tese da CNB dá para a extrema tem vários motivos, alguns corretos, outros não. Um dos motivos incorretos é a subestimação da força do neoliberalismo.
Por exemplo: quando fala da América Latina o texto da CNB afirma que “vivemos um tempo de resistência dos governos progressistas e das forças populares que tentam consolidar seus projetos de reformas econômicas e sociais libertando-se do neoliberalismo (ainda que as oligarquias e as minorias privilegiadas continuem tentando impor a ortodoxia fracassada)”. Nesta passagem, o texto da CNB passa a impressão de que nós estaríamos vencendo a batalha –seriam os neoliberais que continuam tentando impor a ortodoxia fracassada. A realidade fática em todo o continente, a começar pelo Brasil, é outra: na melhor das hipóteses conseguimos, em alguns países e em algumas questões, um empate. Mas no geral o neoliberalismo segue hegemônico.
O texto da CNB confunde o fracasso histórico com o fracasso político. Uma coisa é nós dizermos ser “evidente o fracasso histórico do neoliberalismo como modelo de desenvolvimento”. Outra coisa é este fracasso histórico se traduzir em fracasso político. Em muitas partes do mundo, Brasil inclusive, os neoliberais continuam causando estrago. Vale lembrar que a afirmação de que o neoliberalismo fracassou foi feita por muita gente da esquerda também em 2008; sabemos o que ocorreu depois.
O texto da CNB apresenta como contraponto a China, contra a qual “a reação trumpista” parece “tardia e improvisada”. Como alerta o próprio texto da CNB, há muitas incógnitas a respeito do que vai resultar dessa “guerra comercial promovida pelos EUA”. Entretanto, o mais importante é que não se trata apenas de uma guerra “comercial”: o que está em jogo é uma guerra pela hegemonia mundial. Tema que não é devidamente tratado pela tese da CNB.
Curiosamente, a tese da CNB chega a dizer que “a economia mundial, por diversos fatores, encontra-se no limiar de uma crise financeira e comercial”. Acontece que a questão central não é a dimensão “financeira e comercial”, nem a tendência à “desaceleração” e “inflação”. A questão central é a conjunção entre hegemonia, crise e guerra. Ou seja: “crescem as ameaças à democracia e à paz”. Mas não se tira conclusão alguma a altura disso. A impressão que fica, da leitura da tese da CNB, é que eles temem tirar as conclusões de seu próprio raciocínio, parando no meio do caminho.
Normal: se admitirem que vivemos tempos de guerra, alguns podem acabar achando que o jeito é apelar para a esperança vermelha. Assim sendo, preferem fazer raciocínios e conclusões parciais.
Um exemplo disto está na questão palestina. Depois de descrever a situação, afirmam que “o PT defende o fim do genocídio em Gaza, a total desocupação do território pelo exército israelense e o imediato reconhecimento do Estado Palestino pela comunidade internacional”. Ou seja, se depender deles o PT defenderá uma série de ações que devem ser feitas pelos outros. Mas não defenderá uma ação que está ao alcance de nosso governo, a saber, a ruptura das relações com o Estado terrorista de Israel.
Outro exemplo: a tese da CNB afirma que os BRICS são “um espaço privilegiado para a construção de alianças comerciais e de investimentos, criando novos caminhos para o multilateralismo”. E acrescenta que “um dos princípios básicos que o PT sempre defendeu para a política externa brasileira é o multilateralismo em todos os níveis – político, econômico, cultural, social, tecnológico – com base na soberania de cada país e de cada povo. Nosso multilateralismo é fruto de uma visão de mundo, de uma concepção civilizatória, não apenas da defesa dos nossos interesses nacionais. Para um partido como o nosso, as motivações da política externa não se resumem à geopolítica, ao comércio e aos investimentos, por necessários que eles sejam”.
Bonito. Tão bonito como os motivos pelos quais defendemos a paz. A questão é que vivemos tempos de guerra, onde o “multilateralismo” tal como existia é uma das primeiras vítimas. Neste contexto, não podemos continuar operando com base numa realidade que não existe mais. E, portanto, os BRICS deveriam ser vistos noutra perspectiva.
A segunda parte da tese da CNB aborda o “Governo Lula e a Conjuntura Nacional”.
O ponto de partida é a “gravíssima situação em que Lula encontrou o país ao voltar à Presidência da República em 2023”. A tese destaca a vitória de Lula em 2022, sem ter uma “uma composição favorável no Congresso Nacional”. Diz que a situação foi agravada pela “violenta tentativa de Golpe de Estado em 08 de janeiro de 2023”. Registra o esforço que foi feito desde então pelo governo Lula, “diante de uma economia estagnada, à beira da recessão, e de um orçamento federal fictício, impossível de cumprir”. Tudo isto para concluir que “a desastrosa herança econômica e social de Bolsonaro, contudo, não ficou tão evidente quanto deveria para o conjunto da população”.
Isto é verdade? Certamente é. Falhamos em destacar a herança maldita dos cavernícolas, assim como falhamos em destacar a herança maldita dos tucanos.
Mas em nossa opinião o erro central que cometemos foi outro e ele decorre da lógica implícita no texto da CNB: a de que, diante de situação tão difícil, era necessário deixar de lado a “transformação” e priorizar a “reconstrução”, para a qual se fazia necessária a “união”.
Acontece que esta opção – baseada na hipótese de que a “correlação de forças” seria por definição negativa – teve como efeito colateral uma postura politicamente defensiva em todos os terrenos. Por isso, aliás, não falamos tudo o que devíamos ter falado acerca da “terra arrasada” que recebemos: parte daquela terra foi arrasada pelas políticas neoliberais que nossos aliados de direita apoiaram e seguem apoiando. Denunciar a terra arrasada significaria enfrentar os aliados.
Por isso, nos parece um “me engana que eu gosto” a afirmação feita pela tese da CNB, segundo a qual “uma das maiores e mais estratégicas conquistas do atual Governo Lula — a reconstrução do Estado democrático, de suas principais políticas e de sua capacidade operacional — acabou não tendo o destaque que merecia e merece”.
Acontece que o Estado brasileiro está hoje ainda mais capturado pelo capital financeiro, pelo agronegócio, pela maioria de direita do congresso nacional. E nosso governo federal, que é parte do Estado, está brutalmente manietado. Portanto, o que conseguimos fazer é uma conquista, mas chamar de “conquista estratégica” é puro autoengano. E se não demos destaque para o tema é por uma razão óbvia: todos sabem, tanto nós quanto nossos inimigos, que o governo Lula está mais fraco hoje do que no início de 2023. O destaque soaria falsete, portanto.
Acontece que a esse respeito a tese da CNB acredita demais na propaganda e duvida demasiado dos fatos. Por exemplo: “Sem essa reconstrução (…) o país não teria conseguido retomar o caminho do desenvolvimento e voltar a crescer de modo sustentado como está acontecendo”.
Chamar o que ocorreu desde 2023 de “desenvolvimento” só vale se lembrarmos do famoso “desenvolvimento do subdesenvolvimento”. Afinal, seguimos prisioneiros da dependência, da primário-exportação e do capital financeiro. Quanto ao crescimento, ele é em grande percentual “sustentado” pela expansão do agro.
A impressão que fica de trechos como os acima citados é a seguinte: como a CNB acredita que os obstáculos estariam “fora da governabilidade direta do Executivo”, portanto seriam muito difíceis de mudar, a opção seria dourar a pílula. Ou seja, dizer que as coisas estão melhores do que efetivamente estão.
Vejamos um dos obstáculos citados pela tese da CNB: “a difícil correlação de forças no Congresso Nacional”.
Segundo a tese da CNB, trata-se “na atual legislatura” de “um dado incontornável que tem exigido – e seguramente continuará a exigir — ao mesmo tempo muita firmeza de propósitos e grande capacidade de negociação de nossas lideranças e bancadas”. Como se pode ler, a tese da CNB abre mão de pelo menos citar a necessidade de fazer pressão popular, combinada com a ação do governo.
Sem pressão popular, não haverá grande capacidade de negociação que dê conta de vencer. Logo, como já dissemos, a opção é dourar a pílula.
Um exemplo deste dourar a pílula: colocamos “em prática, desde o primeiro dia, medidas fundamentais do programa democrático-popular com o qual ganhamos as eleições. Além de resgatar a credibilidade e o protagonismo internacional do Brasil”, o governo “implementou imediatamente uma nova política econômica e social, com vistas a promover o crescimento com geração de empregos, distribuição de rendas e inclusão social”. Como resultado disso, “o país cresceu”, “contrariando o prognóstico dos chamados especialistas do mercado”. Além disso, “atingimos a menor taxa de desemprego da história”; “o rendimento real do trabalho” e a massa salarial cresceram, “alcançamos o menor nível de pobreza e de extrema pobreza da série histórica e também o menor número de jovens entre 15 e 21 anos que não estudam nem trabalham”. Tudo isso conquistado com “inflação controlada”. Ressalvada a “dificuldade específica” da inflação, “a situação geral da economia brasileira é sólida e sustentável”, tendo sido obtido “com uma virtuosa combinação de responsabilidade social e responsabilidade fiscal. Com as providencias necessárias, o Governo recuperou o equilíbrio das contas públicas e tem cumprido as metas estabelecidas para o resultado primário, descontados apenas os gastos verdadeiramente emergenciais, como os R$ 111 bilhões destinados a combater as calamidades do Rio Grande do Sul. Pela primeira vez, o reequilíbrio das contas públicas não foi obtido às custas da classe trabalhadora e do povo pobre. A arrecadação foi recomposta, entre outas medidas, com a tributação de fundos Off-Shores e dos fundos exclusivos (…)”.
O Ministério da Fazenda, imagino, agradece o copia-e-cola. E, sem dúvida, dadas as circunstâncias, há mesmo o que comemorar. Mas a tese da CNB exagera nas velas e, por isso, corremos o risco da igreja pegar fogo.
Há pelo menos quatro questões de fundo omitidas no resumo acima: 1/o país segue primário-exportador e nenhuma das medidas aponta no sentido de alterar isto; 2/continua vigente a ditadura do capital financeiro e nenhuma das medidas adotadas aponta no sentido de alterar isto (aliás, se depender de Galipolo, o BC vai ficar ainda mais submisso à banca); 3/as melhorias e avanços não fizeram crescer a popularidade do governo; 4/a classe dominante segue protegendo os seus interesses e empurrando as contas para o povo pagar.
O caso do IOF, citado de maneira prematuramente propagandística na tese da CNB, é um exemplo disso. Outro exemplo é a questão do imposto sobre os ricos, que a tese da CNB comemora quando ainda está no fiofó da galinha.
Parte da verdade aparece, na tese da CNB, quando no meio do texto aparece a seguinte frase, certamente emendada por alguém com mais consciência crítica: “É preciso reconhecer, no entanto, que a promoção do desenvolvimento de fato sustentável requer a tomada de decisões soberanas que garantam a proteção das nossas riquezas naturais e dos nossos povos tradicionais, e busquem avançar na superação do modo dependente de inserção do país no mercado global de commodities, enfrentando um falso “desenvolvimentismo” extrativista que ainda tem muito poder no Brasil”.
Paradoxalmente, logo depois desta frase, vem outra que diz assim: “o Brasil tem condições de manter sua liderança graças às vantagens comparativas de que dispõe, sobretudo a sua matriz energética limpa. Pode atrair investimentos verdes em vários setores estratégicos. Apenas como exemplo, nosso tipo de energia pode ser um diferencial de grande valor para atrair investimentos em data center que são elementos chave na atual corrida tecnológica da inteligência artificial”.
As vezes acho que só a dissonância cognitiva impede de perceber que este diferencial de atração dos data centers é uma variante do “extrativismo” antes condenado.
Também só consigo pensar em dissonância cognitiva quando leio que “o principal desafio para o crescimento sustentável da economia brasileira continua sendo a garantia de um ciclo expansivo de investimentos”. Afinal, se isto é para ser levado a sério, então precisamos ter uma política fiscal e monetária que permita ao Estado capitanear este ciclo, pois nunca o setor privado o fará. E para que o Estado possa capitanear este ciclo expansivo de investimentos, precisamos romper com o objetivo do déficit zero e também com a “injustificável SELIC”, que neste momento está sendo implementada por uma diretoria do Banco Central que foi indicada por nós.
Igualmente penso em dissonância ao ler uma lista de exitosas políticas sociais, no exato momento em que o governo promove mais uma rodada de cortes e contingenciamentos e onde se ameaça rasgar os pisos constitucionais de saúde e educação.
Para além de erros, exageros, incorreções e ilusões – como a de que “as novas medidas tarifarias de Trump (…) podem abrir inesperadas oportunidades para o Brasil, já que não temos conflitos com outras nações e possuímos um ambiente seguro e confiável para investimentos” – o principal problema da tese da CNB ao falar da situação nacional está no seguinte: não se explica adequadamente, nem se diz o que fazer, diante do inquestionável fato de que nossas ações positivas estão sendo acompanhadas de uma queda na popularidade.
Atenção: a tese da CNB tenta fazer ambas coisas. Vejamos a transcrição abaixo.
Segundo a tese da CNB, nosso “formidável conjunto de realizações, que está melhorando rapidamente a situação do país, e criando inúmeras oportunidades de trabalho, renda e estudo, não está sendo devidamente percebido por uma parcela da população, inclusive por alguns setores populares que votaram em Lula. Hoje, esse é com certeza um dos maiores desafios do Governo Lula e dos partidos políticos e movimentos sociais que o apoiam — o de transformar os importantes resultados econômicos e sociais já obtidos, frutos da retomada do desenvolvimento, em um apoio mais amplo e efetivo ao nosso governo e ao nosso projeto de país. É claro que a campanha permanente de desinformação e sabotagem da direita e sobretudo da extrema direita—que possui uma vasta rede de manipulação da opinião pública — interfere nessa percepção, e devemos continuar denunciando as falsidades dos nossos adversários, que muitas vezem agem como inimigos do país, apoiando até mesmo medidas de potências estrangeiras contra o Brasil. Mas não podemos nos limitar a essa denúncia, precisamos travar e vencer a batalha político-cultural para que a percepção das maiorias sociais se torne cada vez mais favorável ao nosso Governo e ao nosso modelo de desenvolvimento”.
Cabe destacar, no texto acima, o seguinte: a CNB tem a certeza de que estamos fazendo a coisa certa. E essa é nossa principal divergência: não concordamos que o Novo Marco Fiscal seja a coisa certa, assim como não concordamos com a tática frente ao capital financeiro que se materializou na indicação de Galipolo, assim como não concordamos que estejamos fazendo a coisa certa em diversas outras áreas. Em resumo, defendemos o programa de “reconstrução e transformação” que apresentamos na campanha eleitoral, programa que é diferente do programa de “união e reconstrução” que está sendo implementado. E nisto tudo anteriormente citado reside o problema número um: em diversas áreas, com destaque para a economia, nosso governo está implementando um programa que não corresponde ao projeto de país que o PT defende.
Voltemos à tese da CNB.
A tese reconhece que não se trata apenas de uma batalha de comunicação, sendo necessário “disputar o sentido do que estamos fazendo, o rumo que está sendo impresso ao país”, sendo necessária “uma nova postura no diálogo com a sociedade, muito mais proativa e direta, mais sintonizada com as preocupações e dúvidas das pessoas comuns. Isso supõe potencializar o carisma e a palavra do próprio Presidente Lula, assim como sua presença nas várias regiões do país, que é sempre esclarecedora e entusiasmante. Supõe também aproveitar melhor o prestígio e a capacidade de interlocução social dos principais ministros e dirigentes do Governo. Da mesma forma, supõe dar uma dimensão mais participativa, de verdadeiro envolvimento popular, às chamadas entregas do Governo, que hoje são cada vez mais numerosas e concretas. O PT e os partidos aliados, junto com as organizações populares progressistas, têm igualmente um papel fundamental a cumprir nesse embate”.
Notem que as ações listadas acima – todas corretas e com as quais estamos de acordo – são parte da “batalha de comunicação”. Mas para que a batalha da comunicação tenha êxito, é preciso vencer a batalha da orientação política. Por exemplo: não há comunicação que dê conta de resolver os erros políticos cometidos no tratamento do INSS, não apenas na questão dos descontos indevidos, mas também na questão das filas e, de maneira mais geral, na questão da contrarreforma da previdência que deveríamos ter revogado. O ponto é: se não mudamos a orientação política, a comunicação poderá no máximo ser “compensatória”, ou seja, “reduzir danos”. O que será bom, mas insuficiente.
Acontece que para mudar a política, é necessário antes de mais nada que o PT tenha autonomia frente ao governo. Ou seja, possa além de defender, também criticar e disputar. Mas a tese da CNB tem dificuldade com esta formulação. A dificuldade fica explícita na seguinte formulação: “”nosso partido dá total sustentação ao Governo, em todos os níveis, e isso tem sido importante para o seu êxito – mas precisamos fazer ainda mais, mobilizando de forma articulada e planejada, e com os instrumentos necessários, a base petista em todo o país para disputar os valores, o sentido e os rumos do projeto de mudança social que está sendo implementando no Brasil”.
O que precisamos fazer é disputar e mudar os rumos do governo. Sem isso, nada será suficiente.
Ao invés de falar disso – das mudanças políticas necessárias no governo – a tese da CNB prefere falar das mudanças no partido, que “precisa também revigorar sua construção e organização. Devemos ser cada vez mais um partido capaz de disputar projetos, sonhos, ideias em cada canto do território. Não apenas nos momentos eleitorais, mas no dia a dia da vida do povo. Com mutirões de debates, de organização, de filiação, de presença física, para além das redes sociais”. “Ao mesmo tempo, se queremos consolidar o apoio majoritário da sociedade, é necessário avançar com firmeza na agenda transformadora do Governo, com novas iniciativas de mudança econômica e social”.
A tese da CNB não fala sobre como pretende fazer, nos próximos 4 anos, aquilo que não desfez nos últimos trinta anos. Afinal, o processo de desconstrução do Partido coincide com a hegemonia da CNB no diretório nacional do Partido. Infelizmente, a tese não fala a respeito.
Mas fala de questões importantíssimas, como a redução da jornada, o fim da escala 6×1, a cobrança de impostos sobre os ricos. E também dedica muito espaço para falar do empreendedorismo: “está na hora, por exemplo, de criarmos no partido os setoriais nacionais e estaduais da micro e pequena empresa”.
O que fazer quanto ao Banco Central? Não sabemos.
Como enfrentar o agronegócio? Não sabemos.
Em compensação há muitas ideias sobre como organizar os trabalhadores por conta própria.
Logo em seguida a este furacão de empreendorismo, a tese da CNB trata da “Centralidade da Emancipação”. Aqui aparece uma novidade alvissareira: é a primeira e última vez que o texto fala de socialismo. Transcrevemos: “A construção do novo Brasil que almejamos, na perspectiva histórica do socialismo democrático, exige a combinação – e, mais que isso, a integração – de dois tipos de políticas transformadoras: aquelas que buscam a igualdade social por meio da universalização dos direitos (saúde, educação, trabalho, moradia, cultura, lazer) e aquelas que visam à emancipação das maiorias e minorias discriminadas: as mulheres, a população negra, os povos indígenas, a comunidade LGBTQI+, a juventude. Para o PT não há nenhuma contradição entre essas duas dimensões, ao contrário: elas são complementares”.
Estamos totalmente de acordo. E achamos muito relevante – sem prejuízo de enfoques as vezes diferentes – que a tese da CNB tenha dado destaque para cada uma destas maiorias e minorias discriminadas.
Mas registramos que também seria importante que o texto desenvolvesse o que entende por “perspectiva história do socialismo democrático”. Afinal, a palavra socialismo está ausente do manifesto da candidatura presidencial apoiada pela CNB. E, por razões óbvias, se o tema é verdadeiramente nossa “perspectiva histórica”, caberia desenvolver mais, sob pena de parecer que a citação é apenas para que não se diga que a CNB não se falou de flores.
Cabe lembrar que a reafirmação do socialismo é parte essencial do esforço que o Partido precisa fazer para atrair a juventude. Como diz a própria tese da CNB: “a disputa entre projetos antagônicos de país se acirrou tanto que as juventudes vivem um dilema: ou se alienam inteiramente da política ou assumem um protagonismo efetivo na vida nacional”. Acontece que este “protagonismo efetivo” será maior e mais entusiasmado, se for em favor de uma sociedade alternativa a tudo isso que está aí.
Se “a realidade nos obriga a revisitar o nosso programa e oferecer à sociedade, particularmente aos jovens, novas perspectivas educacionais, culturais e profissionais que dialoguem com as suas angústias, expectativas e desejos”, porque não fazer o raciocínio completo e dizer que precisamos superar o capitalismo. Cá entre nós, neste momento de crise do capitalismo, grande parte da juventude não tem nem mesmo a perspectiva de construir uma vida melhor do que a vida dos seus respectivos pais e avós. Ou falamos de socialismo ou nada terá crebilidade.
Pelos mesmos motivos, não dá para falar de “Mudança Climática e Transição Energética” sem falar em superação do capitalismo. A tese da CNB chega a dizer que “com uma matriz energética majoritariamente renovável, nosso país tem o potencial de se tornar um modelo exemplar. Ao contrário de grande parte do mundo, onde a eletricidade é gerada em usinas a carvão e veículos, aeronaves e navios consomem combustíveis fósseis que são as principais causas do aquecimento global, as emissões do Brasil provêm do desmatamento e da gestão insustentável da terra”. A questão é: como superar isso, sem derrotar o agronegócio, que é um dos pilares do capitalismo brasileiro?
De maneira geral, a tese da CNB – apesar de tudo o que diz acerca da difícil correlação de forças – em alguns momentos comete bárbaras ingenuidades. Por exemplo: “Embora os preços do mercado internacional ofereçam orientação, não podemos ser seus escravos” (…) Temos petróleo suficiente para garantir nossa autossuficiência e ainda exportar por um tempo”. Falar isso e não falar nada sobre a necessidade de recuperar o controle totalmente público da Petrobras é vender ilusões.
Não basta dizer que “é hora de agir, de sonhar e de transformar. O futuro do nosso planeta e das próximas gerações depende das decisões que tomarmos agora. O Brasil precisa ser um dos líderes do movimento de transição energética, combinando o crescimento de fontes renováveis com a substituição progressiva das fontes fósseis”. É preciso dizer como fazer isso. E o como exige enfrentar e derrotar o capitalismo realmente existente no Brasil. Derrotar a tríplice aliança entre agronegócio, especulação e imperialismo. Recuperar o protagonismo estatal. Nada disso rima com arcabouço fiscal. Tampouco com coexistência pacífica com o inconstitucional parlamentarismo de fato.
Por alguma opção editorial ou politica inacreditável, o penúltimo capítulo da tese da CNB fala de “Segurança Pública”. Sobre isso, embora haja muito a ser dito, nos limitaremos a um comentário, acerca do seguinte trecho: “a valorização do papel das polícias não pode, de modo algum, ser confundido com o estímulo à violência como tem ocorrido em vários estados”. Como escrever isso e ao mesmo tempo não falar nada, por exemplo, do que está ocorrendo na Bahia, que governamos há tempos e cuja polícia exibe um comportamento vergonhoso?
A tese da CNB termina com um capítulo intitulado “Rumo às eleições de 2026”. Neste capítulo se propõe a “reedição — se possível, com uma qualidade mais avançada – da ampla frente democrática que foi tão importante na vitória de 2022”. Não sabemos o que seria a “qualidade mais avançada”, mas o que sabemos é que parte de nossos supostos aliados não tem nenhum, absolutamente nenhum compromisso conosco, nem agora, nem em 2026.
Mas o que mais nos chamou a atenção foi a afirmação segundo a qual a “vitória de 2022 reacendeu a chama da esperança na maioria do povo brasileiro. As conquistas do Governo Lula comprovam que valeu a pena. Essa chama precisa estar ainda mais forte e viva na campanha de 2026”. Isso é uma frase de propaganda. Mas como todos sabemos, está muito longe de refletir a realidade.
Ademais, embora vencer em 2026 seja fundamental, também é fundamental vencer em condições de fazermos um segundo mandato superior ao primeiro. Já vivemos esse situação em 2006-2007 e isso fez muito bem para o país, para a classe trabalhadora e para o PT. Mas também já vivemos a situação contrária, em 2014-2015: vencemos, mas com uma estratégia equivocada, que nos levou a fazer um segundo mandato inferior ao primeiro. Este risco é hoje maior do que nunca, devido ao inconstitucional parlamentarismo de fato, além de outras mudanças e chantagens, sem falar do Novo Marco Fiscal.
Se queremos que a chama da esperança brilhe de verdade, precisamos mudar de verdade a linha do governo e do Partido. A tese da CNB não aponta nesse rumo.
(*) Valter Pomar é professor e candidato a presidência do PT
Segue abaixo o texto comentado
DERROTAR A EXTREMA DIREITA E AVANÇAR NA CONSTRUÇÃO DE UM NOVO BRASIL (TESE NACIONAL DO CNB)
Conjuntura Internacional O Chamado Consenso de Washington e o predomínio global do neoliberalismo nos últimos 40 anos desencadearam um processo de financeirização, de abertura comercial indiscriminada, de desindustrialização, de privatizações, com consequente perda de dinamismo nas economias em desenvolvimento. A atrofia do Estado democrático e o poder absoluto do capital financeiro, completamente desregulado e isento de fiscalização, levaram em 2008 à quebra do Lehman Brothers e de outros grandes bancos dos EUA e da Europa, com efeitos desastrosos na economia global, comprometendo o crescimento dos próprios países avançados. A crise mundial da pandemia, que eclodiu em 2020 e só foi superada três anos depois, graças ao protagonismo dos Estados, deixou ainda mais evidente o fracasso histórico do neoliberalismo como modelo de desenvolvimento. Nesse período, a grande exceção ao baixo nível de crescimento econômico foi a emergência histórica do modelo de desenvolvimento chinês, que estabeleceu um novo padrão de relação entre Estado e mercado. Isso levou a um maior crescimento relativo chinês frente às demais economias avançadas e, em especial, aos EUA, sendo acompanhado de um notável avanço tecnológico.
Atualmente, como reconhecem até os principais economistas dos EUA, a China caminha para ser a mais forte potência industrial e tecnológica do mundo. Nesse contexto, a reação trumpista de promover um enfrentamento comercial, impondo seu tarifaço a 180 países, sem distinção entre países ricos e pobres, parece tardia e improvisada, sem falar nos prejuízos que pode acarretar para a economia e a população dos próprios Estados Unidos. Trump é o primeiro presidente na história dos EUA a provocar deliberadamente uma crise econômica e financeira dessas proporções e em escala global. Vale notar que essa verdadeira guerra comercial ocorre num momento em que a China tem uma grande solidez econômica e as cadeias produtivas são muito mais integradas do que no passado. Não contente em 1 cortar recursos da cooperação internacional, Trump tenta transferir o ônus dos problemas internos dos EUA para o resto do mundo. Tudo indica que os efeitos danosos da política de Trump começam a afetar o seu apoio interno, inclusive em setores do establishment. Além disso, alguns países têm retirado parte dos seus investimentos dos EUA em busca de sistemas de comércio que não dependam exclusivamente do dólar, devido ao sentimento de insegurança geral.
Essa guerra comercial promovida pelos EUA ainda está em evolução e com muitas incógnitas sobre o que vai efetivamente prevalecer. Tem-se a impressão de que há muito jogo de cena, mas não devemos subestimar o estrago que ela pode causar devido ao grande peso que os EUA continuam a ter na geopolítica e na economia global. A América do Sul foi relativamente poupada, num primeiro momento, inclusive pela firmeza de seus principais mandatários. Mas a economia mundial, por diversos fatores, encontra-se no limiar de uma crise financeira e comercial. Esse quadro de instabilidade vai afetar decisões de investimentos e tende a causar desaceleração no mundo, podendo igualmente provocar inflação. No plano político mundial, crescem as ameaças à democracia e à paz. A extrema direita avança em várias partes do mundo, aproveitando-se das dificuldades econômicas e das ambiguidades dos governos tradicionais em relação ao Estado do Bem Estar Social e aos próprios valores da democracia. Ganha força junto às classes populares, viabilizando-se eleitoralmente em inúmeros países com pautas xenófobas, misóginas e homofóbicas.
Alimenta o discurso do ódio de um modo diretamente inspirado na ascensão histórica do nazismo e do fascismo. Por outro lado, prossegue o genocídio do povo palestino com o apoio e/ou a complacência dos EUA e das principais democracias ocidentais. Importantes ministros do governo Israelense pregam abertamente a “extinção definitiva” da Palestina e a “anexação permanente” do seu território por Israel. Os palestinos estão proibidos de receber até mesmo remédios e alimentos e todos os dias idosos e crianças morrem de fome. A ONU, que desde 1947 recomenda a criação de dois Estados na região, vê se completamente manietada e já teve até funcionários assassinados por Israel. O PT defende o fim do genocídio em Gaza, a total desocupação do território pelo exército israelense e o imediato reconhecimento do Estado Palestino pela comunidade internacional.
Quanto à guerra na Ucrânia, que envolve, como se sabe, múltiplos atores e toda a geopolítica global, além de interesses específicos dos EUA nas riquezas minerais ucranianas, parece evidente que o conflito só 2 terminará mediante uma negociação efetiva que barre o expansionismo da OTAN. O PT sempre apoiou e continua apoiando o caminho da negociação, o único que pode restabelecer a paz na região. Na América Latina e no Caribe vivemos um tempo de resistência dos governos progressistas e das forças populares que tentam consolidar seus projetos de reformas econômicas e sociais libertando-se do neoliberalismo (ainda que as oligarquias e as minorias privilegiadas continuem tentando impor a ortodoxia fracassada). São muitas as dificuldades enfrentadas pelos governos populares, em meio a crises econômicas e pressões externas, além da convivência com vizinhos de extrema direita aliados ao imperialismo, a exemplo de Milei na Argentina, Noboa no Equador e Bukele em El Salvador. A ordem neoliberal tenta manter-se por meio da pressão dos países do Norte sobre as nações do Sul, impondo acordos neocoloniais e profundamente extorsivos.
Os países do Norte querem preservar a sua hegemonia econômica e política controlando o acesso aos recursos e suprimentos dos países do Sul para atender suas próprias necessidades. Querem continuar determinando para onde vai (ou não vai) o desenvolvimento econômico e tecnológico, submetendo ao seu poder as estratégicas reservas naturais e energéticas, os bens comuns e até as populações do Sul global. Nesse quadro, nossos países precisam, mais do que nunca, intensificar a integração regional que, mesmo sendo um processo complexo e cheio de obstáculos, é essencial para fortalecer a região em sua luta pelo desenvolvimento e pela justiça social, e também para potencializar a defesa de uma nova ordem internacional mais justa e equilibrada. Juntos, somos inegavelmente mais fortes. Como disse o Presidente Lula na última cúpula da CELAC com a China, realizada em maio de 2025: “O Futuro da América Latina depende do nosso comportamento, da análise justa do que nos aconteceu no século XX. (…) Para que a gente compreenda de uma vez por todas que não há saída para nenhum de nossos países individualmente. Temos 500 anos de história que provam isso. Ou nos juntamos entre nós e procuramos parceiros que queiram construir um mundo compartilhado, ou a América Latina continuará representando a pobreza no mundo”.
O PT e os nossos governos sempre condenaram o perverso bloqueio dos EUA a Cuba, que vigora há mais de 60 anos, prejudicando a economia e todos os setores da vida cubana, além de manter Cuba em uma lista espúria de países patrocinadores do terrorismo, o que não passa de um pretexto para recrudescer as restrições econômicas. A Assembleia Geral da ONU já aprovou diversas vezes o fim do bloqueio e está mais do que na hora de tornar efetivas as suas resoluções. 3 Por outro lado, a América Latina e o Brasil precisam acompanhar atentamente a crise comercial provocada por Trump, pois um volume significativo de mercadorias poderá buscar novos mercados, pressionando os produtores locais e exigindo medidas de defesa comercial. A diplomacia presidencial de Lula tem aberto novas oportunidades, como ocorreu no G-20 e mais recentemente com as visitas ao Japão, à China, e ao Vietnã. Os BRICS constituem um espaço privilegiado para a construção de alianças comerciais e de investimentos, criando novos caminhos para o multilateralismo. Neste ano, teremos também a COP30 no Brasil, em Belém do Pará. A temperatura média global aumentou 1,5ºC nos últimos 18 meses.
Nenhuma das previsões climáticas indicava uma elevação tão acelerada. Até agora pesquisadores e cientistas do clima não explicaram o que aconteceu, e se esse processo é reversível. Se o aquecimento continuar nesse ritmo, a temperatura média global chegará a 2,5ºC ou mais até 2050, com impactos catastróficos sobre a vida no planeta. Os desastres climáticos são cada vez mais intensos e frequentes no mundo inteiro. Pelo seu tamanho continental, o Brasil vem sendo duramente impactado: enchentes no Sul, secas no Norte e incêndios em diversas regiões. O mais grave é que a extrema direita, além do negacionismo sanitário, que já foi trágico na pandemia, agora assume o negacionismo climático como uma de suas bandeiras centrais. Os EUA já abandonaram as metas do acordo de Paris, estão retirando o estimulo às energias renováveis e priorizando fortemente a energia de base fóssil (inclusive o carvão), o que vai agravar a deterioração do clima. Na COP 30 será importante construirmos pactos e alianças que garantam um salto de qualidade no compromisso com essa causa e contribuam para concretizar cada vez mais a agenda climática. O restauro florestal e a preservação dos biomas brasileiros são uma exigência fundamental do nosso modelo de desenvolvimento. Da mesma forma que estruturamos o CEMADEM para alertas em defesa civil, precisamos nos preparar para enfrentar as calamidades climáticas e reconstruir as áreas atingidas com novos padrões de resiliência e segurança. O cenário previsível vai exigir planejamento, articulação e pronta resposta. Um dos princípios básicos que o PT sempre defendeu para a política externa brasileira é o multilateralismo em todos os níveis – político, econômico, cultural, social, tecnológico – com base na soberania de cada país e de cada povo. Nosso multilateralismo é fruto de uma visão de mundo, de uma concepção civilizatória, não apenas da defesa dos nossos interesses 4 nacionais. Para um partido como o nosso, as motivações da política externa não se resumem à geopolítica, ao comércio e aos investimentos, por necessários que eles sejam. Nesse sentido, reafirmamos a importância que o PT atribui à relação Brasil-África, o caráter estratégico da nossa cooperação com o continente africano.
O Governo Lula e a Conjuntura Nacional Para uma avaliação adequada da atual conjuntura brasileira, dos avanços e desafios do nosso projeto de desenvolvimento nacional, é preciso partir da gravíssima situação em que Lula encontrou o país ao voltar à Presidência da República em 2023. A verdade é que o Brasil estava mergulhado em uma perigosa soma de crises: crise econômica, crise social e crise institucional. O desgoverno Bolsonaro deixou uma herança terrível, um acúmulo enorme de problemas imediatos e de bombas de efeito retardado. Um país completamente fora dos trilhos e com diversos setores da administração pública ameaçados de colapso. A vitória da chapa Lula-Alckmin, com base em uma ampla aliança democrática proposta e liderada pelo campo progressista, foi fundamental para livrar o povo brasileiro do pesadelo que seria mais um mandato de Bolsonaro com sua fobia antipopular, sua barbárie ético-cultural e sua marcha acelerada para o fascismo. Não podemos esquecer que a eleição ocorreu sob influência de uma gigantesca indústria de mentiras, com o uso escandaloso da máquina, em um verdadeiro diluvio de dinheiro público, com a coação de eleitores por patrões bolsonaristas e a mais extrema e impune brutalidade política, inclusive com assassinatos de companheiros nossos.
Nesse contexto, o triunfo de Lula e Alckmin foi extraordinário, um feito histórico. Mas foi também uma conquista árdua, difícil, com margem bastante apertada, para a qual o PT e as esquerdas deram uma contribuição decisiva, mas que contou com o apoio de outros setores de opinião e de segmentos políticos que não fazem parte do nosso campo. E certamente não teria acontecido se o candidato não fosse Lula, na sua condição de maior liderança política e popular do país. Por outro lado, o êxito da eleição presidencial não se traduziu em uma composição favorável no Congresso Nacional, onde predominam o conservadorismo e o fisiologismo, com uma correlação de forças extremamente complexa e desafiadora. 5 As agudas tensões institucionais, que já vinham de antes, provocadas pelo próprio Bolsonaro e seu aliados, foram agravadas pela radicalização antidemocrática da extrema direita que incitou grupos políticos, sociais, empresariais e militares a negar e subverter o legitimo resultado das urnas, processo que culminaria com a violenta tentativa de Golpe de Estado em 08 de janeiro de 2023. A punição exemplar dos golpistas, sejam mandantes ou executores, além de legal e justa, é absolutamente necessária para que tais atentados à democracia nunca mais se repitam. Na esfera econômica e social, Lula defrontou-se com uma verdadeira terra arrasada. Viu-se diante de uma economia estagnada, à beira da recessão, e de um orçamento federal fictício, impossível de cumprir. Antes mesmo de tomar posse, teve que negociar e aprovar no Parlamento a PEC da Transição, indispensável para cobrir o rombo das contas públicas e evitar a paralisação da máquina administrativa.
O Orçamento de Bolsonaro para 2023 já previa um Déficit de R$63 bilhões, sem nenhum espaço, por exemplo, para a Bolsa Família de R$600,00 que ele próprio garantiu mentirosamente na campanha, nem para a Farmácia Popular e o Mais Médicos, programas tão necessários à sobrevivência de milhões de brasileiras e brasileiros. E menos ainda para investimentos em infraestrutura produtiva e social, como os do PAC e do Minha Casa Minha Vida. Políticas públicas essenciais, que havíamos levado anos para construir e que melhoraram fortemente as condições socioeconômicas do país, dando ao Brasil um inédito reconhecimento internacional, estavam destroçadas e em muitos casos tiveram que ser reiniciadas do zero. Órgãos estratégicos para a prestação de serviços à população e para a promoção do desenvolvimento tinham sido extintos, esvaziados ou completamente deturpados em suas finalidades. Tudo isso obrigou o novo governo, para tornar possível a execução de seu programa, a fazer um enorme esforço de saneamento da máquina e de recuperação de instrumentos cruciais de ação governamental. Em muitos casos, esse esforço dependeu de prolongadas negociações na Câmara e no Senado. Da mesma forma, foi necessário resgatar o caráter democrático e republicano do Poder Executivo. Bolsonaro havia militarizado arbitrariamente a Presidência e diversos órgãos federais (o caso do Ministério da Saúde, em plena pandemia, chocou profundamente o país), comprometendo o seu caráter civil e a eficiência técnico administrativa. Com Lula, as forças armadas voltaram a exercer as suas estritas funções constitucionais e o poder civil foi desmilitarizado. 6 A desastrosa herança econômica e social de Bolsonaro, contudo, não ficou tão evidente quanto deveria para o conjunto da população. Em parte porque a tentativa de Golpe de Estado ocupou, como era de se esperar, o centro do noticiário e do debate nacional; em parte porque a PEC da Transição, imprescindível para que o novo governo pudesse funcionar, exigiu prioridade e atenção redobrada de Lula e sua equipe; e também porque amplos setores da mídia não queriam de modo algum admitir o fracasso da política ultraneoliberal de Paulo Guedes, com suas privatizações absurdas, suas desonerações pouco menos que criminosas e seu permanente ataque à indústria brasileira, aos programas sociais, às universidades públicas. Mas é preciso reconhecer que faltou uma divulgação sistemática e abrangente da trágica situação encontrada, que era pior ainda do que se imaginava e do que os dados manipulados de Bolsonaro e Guedes faziam crer.
O fato é que uma das maiores e mais estratégicas conquistas do atual Governo Lula — a reconstrução do Estado democrático, de suas principais políticas e de sua capacidade operacional — acabou não tendo o destaque que merecia e merece. Sem essa reconstrução, que absorveu grande parte das energias do Governo, inclusive para normalizar e ampliar as relações diplomáticas e comerciais do Brasil com o mundo, o país não teria conseguido retomar o caminho do desenvolvimento e voltar a crescer de modo sustentado como está acontecendo. Persistem, obviamente, desafios que estão fora da governabilidade direta do Executivo. Por exemplo: a difícil correlação de forças no Congresso Nacional, na atual legislatura, é um dado incontornável que tem exigido – e seguramente continuará a exigir — ao mesmo tempo muita firmeza de propósitos e grande capacidade de negociação de nossas lideranças e bancadas. O mais importante, no entanto, é que Lula não se deixou intimidar pela herança bolsonarista nem pela complexidade do quadro político e institucional e pôs em prática, desde o primeiro dia, medidas fundamentais do programa democrático-popular com o qual ganhamos as eleições. Além de resgatar a credibilidade e o protagonismo internacional do Brasil, implementou imediatamente uma nova política econômica e social, com vistas a promover o crescimento com geração de empregos, distribuição de rendas e inclusão social. Reativando o circuito de consumo popular, através de políticas de transferência de renda, valorização do salário mínimo e ampliação do 7 crédito para pessoa física, combinados com um forte estimulo às pequenas, médias e grandes empresas, o Governo superou todas as expectativas para a economia brasileira. O país cresceu 3% em 2023 quando a previsão do mercado no início do ano era inferior a 1%. Em 2024, cresceu 3,2%, contrariando o prognóstico dos chamados especialistas do mercado, de que não passaria de 2%. Atingimos a menor taxa de desemprego da história do Brasil, que foi reduzida de 9,3% em 2022 para 7,8% em 2023 e 6,6% em 2024, batendo recorde na criação de empregos formais, gerando 1,45 milhões de postos de trabalho em 2023 e 1,69 milhões em 2024.
Nesse novo cenário, o rendimento real do trabalho cresceu 3,7% em 2024 e a massa salarial, 6,5%. Alcançamos o menor nível de pobreza e de extrema pobreza da série histórica e também o menor número de jovens entre 15 e 21 anos que não estudam nem trabalham. E esses importantes resultados foram conquistados com inflação controlada, terminando 2023 dentro da meta, em 4,6%, e 2024 ligeiramente acima da meta, em 4,8%. Em 2024, a inflação foi afetada sobretudo por fatores cambiais e climáticos e também pelo aumento do preço internacional de commodities, incidindo principalmente no preço dos alimentos, que havia tido uma desaceleração de 0,5% em 2023 e teve um crescimento de 8,2% em 2024. Considerando que o preço dos alimentos pesa especialmente para as famílias mais pobres, essa situação preocupa. Até porque o acréscimo recente se dá sobre um patamar de preços já bastante elevado, uma vez que a inflação de alimentos entre 2019 e 2022 foi de mais de 50%. O Ministério da Fazenda avalia que o alívio dos fatores climáticos e a safra recorde de grãos neste ano devem reduzir a pressão sobre os preços de alimentos. Se necessário, dada a sua relevância social, o PT considera que devem ser estudadas outras medidas para enfrentar o problema. Ressalvada essa dificuldade específica, que o Governo monitora com atenção, a situação geral da economia brasileira é sólida e sustentável. O significativo crescimento de 2023 e 2024 pode e deve continuar. Até porque ele foi obtido com uma virtuosa combinação de responsabilidade social e responsabilidade fiscal. Com as providencias necessárias, o Governo recuperou o equilíbrio das contas públicas e tem cumprido as metas estabelecidas para o resultado primário, descontados apenas os gastos verdadeiramente emergenciais, como os R$ 111 bilhões destinados a combater as calamidades do Rio Grande do Sul.
Pela primeira vez, o reequilíbrio das contas públicas não foi obtido às custas da classe trabalhadora e do povo pobre. A arrecadação foi recomposta, entre outas medidas, com a tributação de fundos Off-Shores e dos fundos exclusivos, e 8 também melhorando a eficiência dos gastos e combatendo privilégios, como é o caso da limitação de supersalários e do projeto de reforma da previdência dos militares. Trata-se agora de avançar na agenda de Justiça Tributária, cumprindo o compromisso de colocar os pobres no orçamento e os ricos no Imposto de Renda, isentando do imposto de renda quem ganha até R$ 5 mil mensais, reduzindo a alíquota de quem ganha até R$ 7 mil, promovendo a tributação justa de quem ganha mais de R$ 50 mil por mês e também de quem ganha mais de R$ 100 mil (R$1,2 milhão ao ano). Com isso, serão beneficiados 90% dos contribuintes aumentando a alíquota de menos de 1%. A proposta de reforma do imposto de renda tem amplo apoio popular, tanto para isentar quem ganha menos quanto para tributar quem ganha mais. Com essa proposta, uma professora que ganha hoje R$ 4.867 por mês poderá economizar até R$ 3.970 no ano. A justiça tributária, além de seu sentido ético, ajuda a alavancar o crescimento econômico, aumentando a renda e o consumo de quem mais precisa. Na mesma linha, cabe ressaltar a aprovação da chamada reforma tributária do consumo, com vistas a tornar mais simples e eficiente o sistema tributário.
Ela vai com certeza diminuir os conflitos entre os estados, favorecendo a equidade fiscal. Pela mesma razão, deve-se destacar também a criação do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) e do Imposto Seletivo, que contribuirá para desestimular a compra de produtos com impacto ambientalmente negativo, sem falar nos componentes distributivos que foram introduzidos na arrecadação indireta, através da isenção da cesta básica e da adoção do mecanismo de cashback, devolvendo à população de baixa renda a parcela paga em impostos. Além disso, o Governo cumpriu importante promessa de campanha ao lançar o Desenrola Brasil, beneficiando mais de 15 milhões de pessoas, que puderam renegociar R$ 50 bilhões em dívidas, limpando o seu nome e readquirindo o acesso ao mercado de crédito e de consumo. Na sequência, lançou o Desenrola Pequenos Negócios para que os micros e pequenos empresários pudessem fazer o mesmo. 120 mil empresas de pequeno porte já foram socorridas, recebendo um montante de R$7,5 bilhões. Esses e outros programas de credito social disponibilizaram em 2024 mais de R$ 50 bilhões. O crédito bancário como um todo teve uma expansão de 15,4%. O Governo criou igualmente o Plano de Transformação Ecológica (PTE). Trata-se de um ambicioso projeto de transformação da estrutura produtiva do país, ancorado nos pilares da sustentabilidade e da justiça social, que tem potencial de impulsionar o PIB per capita em pelo menos 9 10% até 2026. Títulos soberanos e sustentáveis do Tesouro passaram a ser emitidos para fomentar o PTE, ao mesmo tempo que foi instituído o programa EcoInvest, de atração de capital externo. É preciso reconhecer, no entanto, que a promoção do desenvolvimento de fato sustentável requer a tomada de decisões soberanas que garantam a proteção das nossas riquezas naturais e dos nossos povos tradicionais, e busquem avançar na superação do modo dependente de inserção do país no mercado global de commodities, enfrentando um falso “desenvolvimentismo” extrativista que ainda tem muito poder no Brasil. Ao lado do PTE o Governo está implementando dois outros programas estratégicos para o desenvolvimento nacional: o Novo Programa de Aceleração do Crescimento (NOVO PAC) e o Nova Industria Brasil (NIB). Uma das principais medidas do NIB é a retomada do crédito para a indústria via Plano Mais Produção, que já disponibilizou R$ 507 bilhões para o setor industrial, articulando os bancos BNDES, BB, CEF, BNB, BASA e também a FINEP. Aqui destacam-se a linha de crédito Mais Inovação (R$ 80 bilhões a TR) e o Fundo Clima com taxa de juros de 6,5% ao ano. Em todo esse processo, o BNDES tem tido uma notável participação batendo recorde de liberação de recursos em 2023 e 2024, com R$ 196 bilhões de crédito disponibilizados para o NIB. Assim, mesmo num cenário de elevação da Taxa Selic em 2024, a indústria de transformação cresceu 3,8%; e a indústria geral, 3,1%, o maior crescimento dos últimos 14 anos. Do ponto de vista tecnológico houve predomínio dos setores de alta intensidade, com 6,6% de crescimento em 2024, e de média-alta intensidade, com 6,9%. O faturamento da indústria cresceu 5,6%, o maior nos últimos 10 anos. No ranking mundial da indústria manufatureira, o Brasil subiu de 70º lugar, em 2022, para 25º em 2024 entre 82 países. Quanto aos empregos formais, a indústria foi em 2024 o setor de maior crescimento percentual, passando de 125.002 para 306.506 vagas. Esse crescimento é liderado pelo setor automotivo, que elevou a produção em 10% e as vendas em 14%, e pela linha branca e marrom — geladeiras, fogões, tvs, máquinas de lavar etc — com um crescimento de 29%, o maior dos últimos 10 anos. Todos sabemos que ainda existe uma enorme disparidade de salários em nosso mercado de trabalho, sobretudo com os impactos das big techs e a baixa remuneração dos trabalhadores de aplicativos. Nesse contexto, a reindustrialização e a geração de empregos de qualidade são uma estratégia central para incrementar o bem-estar da população. 10 Apesar do bom desempenho da indústria, a situação geopolítica exige atenção e clareza estratégica. Sem dúvida devemos nos preocupar com as novas medidas tarifarias de Trump que prejudicam todo o comercio internacional e também nossas exportações para os EUA. Mas elas, por outro lado, podem abrir inesperadas oportunidades para o Brasil, já que não temos conflitos com outras nações e possuímos um ambiente seguro e confiável para investimentos. Não obstante o recuo de países como os EUA na agenda verde, o Brasil tem condições de manter sua liderança graças às vantagens comparativas de que dispõe, sobretudo a sua matriz energética limpa. Pode atrair investimentos verdes em vários setores estratégicos. Apenas como exemplo, nosso tipo de energia pode ser um diferencial de grande valor para atrair investimentos em data center que são elementos chave na atual corrida tecnológica da inteligência artificial. O principal desafio para o crescimento sustentável da economia brasileira continua sendo a garantia de um ciclo expansivo de investimentos. Apesar do avanço de 7,3% da formação bruta de capital fixo em 2024, a taxa de investimentos medida pelo IBGE ainda está em 17% do PIB (em 2023, a taxa encerrou em 16,4%). A título de comparação, essa taxa chegou a 20,9% do PIB em governos anteriores nossos. No campo da infraestrutura, o Governo Lula retomou os investimentos públicos, que avançaram cerca de 0,5% do PIB. Com isso, o investimento total em infraestrutura saltou de 1,7% para 2,2% do PIB. Foi essa retomada que viabilizou o crescimento da construção civil no país. Por meio do NOVO PAC, o Governo vem se esforçando para coordenar os investimentos públicos e privados, num montante total de R$ 1,3 trilhões. Os bancos públicos mais uma vez cumprem um papel central, com a previsão de financiar R$ 440 bilhões desse montante. O Minha Casa Minha Vida, que foi reativado em 2003 pelo Presidente Lula, já apresenta resultados muito expressivos: foram contratadas em 2003 e 2004 1,26 milhões de habitações. Isso representa 60% da meta estipulada até 2026.
A despeito desse avanço, ainda temos uma carência de investimento em infraestrutura estimada em 2% do PIB. Recursos necessários para a modernização da mobilidade urbana, expansão e melhoria de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, sem falar da ampliação do acesso ao saneamento básico. E com certeza precisamos também investir em infraestrutura de saúde e educação. O financiamento de projetos de infraestrutura é um grande desafio mesmo em países ricos e com mercados de capitais desenvolvidos, pois os recursos necessários são vultosos e os prazos de maturação longos, além 11 de riscos de atrasos e sobrecustos. Em contrapartida, uma vez implantados, tem receitas mais estáveis e prazos maiores de garantia contratual. Com soluções inovadoras, o Governo tem avançado, no âmbito do NOVO PAC, que abrange mais de 20 mil intervenções, em diversas obras estruturantes de grande relevância para o país. Entre elas, estão quatro rodovias federais que, juntas, atravessam e conectam mais da metade dos estados brasileiros, nas cinco macrorregiões. A Via Dutra do Futuro, que está sendo completamente remodelada e modernizada, e vai ser a rodovia mais digital do Brasil; a BR101, que terá 80kms duplicados e 600kms de pistas adicionais, sobretudo em trechos de maiores gargalos; a BR163, principal corredor logístico da agricultura brasileira, na qual serão duplicados 444 Km; e a BR381, que já foi conhecida como “Rodovia da Morte”, pela sua precariedade, que terá 310Km duplicados e obras de segurança reivindicadas há décadas. Dadas as limitações ficais que ainda temos, agravadas pela injustificável Taxa Selic, precisamos de mecanismos criativos para alavancar o investimento. Boas parcerias público-privadas, como já foi demonstrado em nossos governos anteriores, podem ajudar muito nesse processo, contribuindo inclusive para modernizar a gestão. Elas devem ser intensificadas, com uma regulamentação sólida e transparente que evite abusos tarifários e altos valores de outorga. As concessões e a participação privada devem ser feitas preservando o patrimônio estratégico do Estado e os direitos da população. A área social, que Bolsonaro havia deixado em frangalhos, dominada pelo negacionismo e o fisiologismo, exigiu um tremendo esforço de reestruturação. Programas tiveram que ser redesenhados, equipes técnicas reconstituídas, cadastros inteiramente revistos. Sob a liderança de Lula, os ministérios da área realizaram durante meses um verdadeiro mutirão cívico para devolver a milhões de famílias brasileiras os serviços e benefícios que tinham sidos cortados por Bolsonaro e Guedes. E os resultados são de fato impressionantes. Basta citar alguns dados para que se tenha uma ideia do seu alcance. Da assistência social: no Governo Bolsonaro, a fome, que o Brasil havia erradicado em 2014, voltou com força total, atingindo 33,1 milhões de pessoas. No final de 2023, esse número já havia sido reduzido para 8,7 milhões e hoje estamos caminhando a passos largos para erradicá-la novamente. Da saúde: o Mais Médicos dobrou de tamanho, ultrapassando os 26 mil profissionais (Bolsonaro havia reduzido para 13 mil); a Farmácia Popular voltou mais forte, com 100% de seus medicamentos distribuídos gratuitamente; o SUS está batendo 12 recorde de cirurgias eletivas, com mais de 14 milhões de procedimentos realizados em 2024; as cidades brasileiras receberam 5 vezes mais ambulâncias do SAMU (de 2019 a 2022, só 366 foram distribuídas. Nos últimos dois anos, este número subiu para 2.067). Da educação: mais de 70 mil escolas públicas de ensino básico foram conectadas à internet; as bolsas de estudo foram reajustadas após 10 anos (de 25% a 75%); um milhão de novos estudantes passaram a frequentar escolas de tempo integral; os investimentos em universidades e institutos federais foram retomados: 10 novos Campi, 400 obras em universidades e hospitais universitários pelo PAC, 102 novos institutos federais e R$1,4 bilhão para equipamentos e instalações. Isso não significa que as universidades federais não tenham outros problemas a resolver, como a recomposição de seu orçamento, severamente comprometida no governo anterior, bem como a valorização dos servidores, a permanência estudantil, a produção cientifica, a extensão.
Da mesma forma, é fundamental que o Governo aprofunde o diálogo com as universidades para que elas criem espaços de reflexão sobre os desafios do país e ofereçam propostas inovadoras para resolvê-los. Da cultura: a Lei Paulo Gustavo e a Política Nacional Aldir Blanc garantiram inéditos R$ 6,86 bilhões para o setor. Do esporte: o Bolsa Atleta foi reajustado após 14 anos de congelamento (100% dos nossos atletas olímpicos e paraolímpicos que conquistaram medalhas em 2024, nos jogos de Paris, foram beneficiados pelo programa). Da agricultura familiar: mais de R$ 147 bilhões em crédito foram destinados ao Plano Safra da Agricultura Familiar e R$ 1,2 bilhão investidos no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Os trabalhadores sem terra, no entanto, reclamam do ritmo da Reforma Agrária, reivindicando a sua aceleração. Do meio ambiente: em 2024, o desmatamento da Amazônia caiu pela metade em relação a 2022, atingindo o menor índice dos últimos 10 anos; também em 2024, ocorreu a primeira redução em 5 anos do desmatamento no Cerrado (a queda foi de 25,7%); nos últimos 2 anos, a produção brasileira de energia renovável foi ampliada em mais de 10 gigawatts, quantidade suficiente para garantir o consumo de todas as residências de um estado com 10 milhões de habitantes. Além de tudo que foi reconstruído ou revitalizado, deve-se acrescentar programas criados no atual governo, a exemplo do Pé-de-Meia, uma ousada iniciativa para garantir que os jovens que frequentam escolas públicas de ensino médio não abandonem os estudos por dificuldades financeiras. Em um ano, já são mais de 4 milhões de jovens recebendo a bolsa do Pé-de-Meia. No entanto, esse formidável conjunto de realizações, que está melhorando rapidamente a situação do país, e criando inúmeras 13 oportunidades de trabalho, renda e estudo, não está sendo devidamente percebido por uma parcela da população, inclusive por alguns setores populares que votaram em Lula. Hoje, esse é com certeza um dos maiores desafios do Governo Lula e dos partidos políticos e movimentos sociais que o apoiam — o de transformar os importantes resultados econômicos e sociais já obtidos, frutos da retomada do desenvolvimento, em um apoio mais amplo e efetivo ao nosso governo e ao nosso projeto de país. É claro que a campanha permanente de desinformação e sabotagem da direita e sobretudo da extrema direita—que possui uma vasta rede de manipulação da opinião pública — interfere nessa percepção, e devemos continuar denunciando as falsidades dos nossos adversários, que muitas vezem agem como inimigos do país, apoiando até mesmo medidas de potências estrangeiras contra o Brasil. Mas não podemos nos limitar a essa denúncia, precisamos travar e vencer a batalha político-cultural para que a percepção das maiorias sociais se torne cada vez mais favorável ao nosso Governo e ao nosso modelo de desenvolvimento. O Governo tem procurado melhorar sua comunicação institucional, o que é importante, mas a batalha vai muito além da publicidade oficial e da comunicação em sentido estrito. Divulgar melhor as realizações do Governo é essencial, mas precisamos também disputar o sentido do que estamos fazendo, o rumo que está sendo impresso ao país. Pois as forças reacionárias, que continuam tendo bastante peso na vida brasileira, além das constantes mentiras e calúnias que espalham, confundindo uma parte da população, também negam sistematicamente as conquistas do povo e do governo com base em valores opostos aos nossos e à tradição democrática e humanista da qual somos parte. E o fazem propagando valores autoritários, negacionistas, preconceituosos, discriminatórios, excludentes, regressivos, e de apologia da violência e da injustiça.
Valores que, apesar de tudo, atraem muitos corações e mentes. Para travar com mais eficácia essa batalha, tanto o Governo quanto as forças que o apoiam precisam de uma nova postura no diálogo com a sociedade, muito mais proativa e direta, mais sintonizada com as preocupações e dúvidas das pessoas comuns. Isso supõe potencializar o carisma e a palavra do próprio Presidente Lula, assim como sua presença nas várias regiões do país, que é sempre esclarecedora e entusiasmante. Supõe também aproveitar melhor o prestígio e a capacidade de interlocução social dos principais ministros e dirigentes do Governo. Da mesma forma, supõe dar uma dimensão mais participativa, de verdadeiro envolvimento popular, às chamadas entregas do Governo, que hoje são 14 cada vez mais numerosas e concretas. O PT e os partidos aliados, junto com as organizações populares progressistas, têm igualmente um papel fundamental a cumprir nesse embate. Nosso partido dá total sustentação ao Governo, em todos os níveis, e isso tem sido importante para o seu êxito – mas precisamos fazer ainda mais, mobilizando de forma articulada e planejada, e com os instrumentos necessários, a base petista em todo o país para disputar os valores, o sentido e os rumos do projeto de mudança social que está sendo implementando no Brasil. Para isso, nosso partido precisa também revigorar sua construção e organização. Devemos ser cada vez mais um partido capaz de disputar projetos, sonhos, ideias em cada canto do território. Não apenas nos momentos eleitorais, mas no dia a dia da vida do povo.Com mutirões de debates, de organização, de filiação, de presença física, para além das redes sociais. Ao mesmo tempo, se queremos consolidar o apoio majoritário da sociedade, é necessário avançar com firmeza na agenda transformadora do Governo, com novas iniciativas de mudança econômica e social. A isenção do imposto de renda para quem ganha até R$5.000 mensais foi uma evidente demonstração disso, obtendo forte apoio da opinião pública. Tudo indica que o fim da jornada 6X1 e a redução da jornada semanal de trabalho para 40 horas, além da criação de um imposto sobre lucros e dividendos, medidas que já vigoram nas principais democracias do mundo, mesmo sendo criticadas pelas minorias privilegiadas, contarão com idêntico respaldo da maioria do povo. A força dos pequenos negócios O Brasil é um país de empreendedores e, notadamente, de pequenos negócios. Não é à toa que, das cerca de 23,9 milhões de empresas formalizadas em atividade no país, 21,7 milhões, ou seja, cerca de 91% são Microempreendedores Individuais (MEI), Microempresas (ME) e Empresas de Pequeno Porte (EPP). São essas empresas que, no ano de 2024, foram as responsáveis pela geração de 70% do saldo de 1,7 milhões de empregos com carteira assinada criados no país de janeiro a dezembro. Os números mostram esses pequenos negócios como importantes motores da nossa economia real, aquela que está presente no dia a dia das pessoas, nas cidades, nos bairros e nas comunidades. E esse número de empreendedores continua a crescer em todo o país, segundo dados da Receita Federal e do Sebrae. 15 Somente no mês de fevereiro de 2025, o somatório dos MEI, ME e EPP abertas é de mais de 433 mil novos pequenos negócios. Esse número representa 96,7% de todas as empresas abertas neste período. Se analisarmos os resultados de janeiro e fevereiro, o número de pequenos negócios abertos chega a cerca de 1 milhão de empresas, representando 97% de empresas formalizadas nos dois meses. Mais do que uma questão de necessidade, abrir a própria empresa está entre os três principais sonhos dos brasileiros, de acordo com dados da última pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM). Destaca-se ainda o crescimento da participação de jovens no empreendedorismo nos últimos anos.
O IBGE aponta aumento de 23% no número de empreendedores entre 18 e 29 anos de 2013 a 2023. O empreendedorismo também representa uma oportunidade para as mulheres. O estudo “Empreendedorismo Feminino – sob a Ótica da PNAD Contínua”, realizado pelo Sebrae com base em dados do IBGE, revela que há atualmente 10,4 milhões de mulheres empreendedoras no país, um recorde na série histórica. Os mais de dez anos que separam a primeira e a mais recente análise da pesquisa também trazem mudanças significativas no papel econômico da mulher na família. Segundo o estudo, o número de mulheres proprietárias de negócio e que são também chefes de domicílio subiu nos últimos anos, chegando a mais da metade (52,3%) do total de empreendedoras. Mas esses resultados não foram obtidos ao acaso ou somente pela vontade e capacidade dos milhões de empreendedores e empreendedoras do nosso país. Eles são também fruto de duas décadas de políticas progressistas para o setor desenvolvidas no Brasil, tendo como marco a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, sancionada pelo presidente Lula em dezembro de 2006. Conhecida como “Super Simples”, a legislação agilizou e unificou o recolhimento de impostos da união, estados e municípios, beneficiando os pequenos negócios de todo o país e facilitando a abertura de novas empresas, além de garantir benefícios como tratamento diferenciado para esses negócios em processos de compras governamentais. De lá pra cá, houve atualizações importantes na Lei Geral como a sanção, também pelo Presidente Lula, da Lei Complementar 128/2008 que criou o Microempreendedor Individual e trouxe amparo legal a milhões de brasileiros que trabalhavam na informalidade, garantindo benefícios previdenciários, simplificação tributária, menor custo e possibilidade de acesso a linhas de crédito. 16 Hoje já são mais de 11 milhões de MEI em atividades no país, representando cerca de 46% das empresas formalizadas ativas, ajudando também a ampliar a receita pública, tão necessária para o financiamento de atividades essenciais à sociedade. O terceiro mandato do Presidente Lula tem se notabilizado por um olhar ainda mais atento a este segmento, o que se traduz em importantes ações como a criação do Ministério do Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte (MEMP), o Desenrola Pequenos Negócios, que viabilizou a renegociação de R$ 7,5 bilhões em dívidas bancárias para mais de 120 mil microempreendedores individuais (MEIs), microempresas e empresas de pequeno porte entre maio e dezembro de 2024, com descontos de até 95%. O Presidente também lançou o programa Acredita que cria linhas de crédito especiais, disponibilizando cerca de 30 bilhões para serem acessados pelos pequenos negócios, garantidos pelo Fundo de Aval da Micro e Pequena Empresa (FAMPE) do Sebrae, além de orientação técnica para o uso correto dos recursos obtidos. Desde o 5º Encontro Nacional do PT, realizado em 1988, o nosso partido sustenta que, em termos de projeto de país, a causa da micro e pequena empresa tem um papel fundamental e é convergente com a causa dos trabalhadores e oprimidos. Coerentes com essa visão, foram os nossos governos que conceberam e implantaram as principais políticas de apoio ao empreendedorismo no país. Falta, no entanto, uma interlocução mais articulada e permanente do PT com o setor, dando a ele maior relevância em nosso discurso e em nossa própria organização partidária. Está na hora, por exemplo, de criarmos no partido os setoriais nacionais e estaduais da micro e pequena empresa. A Centralidade da Emancipação A construção do novo Brasil que almejamos, na perspectiva histórica do socialismo democrático, exige a combinação – e, mais que isso, a integração – de dois tipos de políticas transformadoras: aquelas que buscam a igualdade social por meio da universalização dos direitos (saúde, educação, trabalho, moradia, cultura, lazer) e aquelas que visam à emancipação das maiorias e minorias discriminadas: as mulheres, a população negra, os povos indígenas, a comunidade LGBTQI+, a juventude. 17 Para o PT não há nenhuma contradição entre essas duas dimensões, ao contrário: elas são complementares. Tão importantes — e necessárias – quanto as lutas pela igualdade de direitos são as lutas pelo direito à diferença. Mulheres na luta por democracia, direitos e cuidado A violência contra as mulheres segue como uma das questões mais graves da sociedade brasileira. O Brasil, que registrou mais de 1.400 feminicídios em 2023, vê a escalada da violência de gênero se intensificar em diversas frentes: doméstica, institucional e política. Em meio a essa realidade, o Partido dos Trabalhadores reafirma que a luta das mulheres não é uma pauta setorial, mas estruturante para qualquer projeto democrático e popular. A retórica de setores conservadores ainda sustenta um modelo de sociedade que nega os direitos das mulheres e criminaliza sua organização, sobretudo quando elas ocupam espaços de poder. Ao mesmo tempo, o avanço da extrema direita impôs retrocessos em políticas públicas, especialmente aquelas voltadas ao cuidado, à autonomia e à proteção social. Hoje, com Lula de volta ao governo, novos marcos têm sido estabelecidos, como a criação da Política Nacional de Cuidados, que coloca no centro do debate o reconhecimento do trabalho não remunerado realizado majoritariamente por mulheres – um passo fundamental na construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
Essa política, construída com participação social, responde à urgência de redistribuir responsabilidades entre Estado, sociedade e famílias. Além disso, pautas históricas do movimento feminista e do PT vêm ganhando centralidade nas agendas legislativas e executivas, como: • A igualdade salarial entre mulheres e homens por trabalho equivalente, hoje respaldada por legislação federal; • O combate à violência política de gênero, com a Lei nº 14.192/2021, que estabelece normas para prevenir, reprimir e punir a violência contra mulheres no exercício de funções públicas e políticas; • O fortalecimento da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, que volta a ter protagonismo na formulação de políticas públicas; 18 • O compromisso com a paridade de gênero nas instâncias partidárias e nos processos eleitorais. Mesmo com avanços institucionais, as mulheres que se colocam na arena política seguem sendo alvo de ataques, silenciamentos e ameaças. O assassinato de Marielle Franco permanece como símbolo de uma violência política que tenta expulsar as mulheres – sobretudo negras, indígenas, trans e pobres – dos espaços de decisão. O enfrentamento a essa realidade exige leis mais duras, mas também uma cultura democrática que respeite a presença das mulheres com voz própria e autonomia política. Por isso, é fundamental dar continuidade e aprofundar a autonomia das mulheres na gestão dos recursos destinados à sua participação política, tanto do fundo partidário quanto do fundo eleitoral. Essa prática, que já vem sendo construída com avanços concretos, é estratégica para ampliar candidaturas femininas viáveis, fortalecer campanhas e garantir que mais mulheres cheguem ao poder com condições reais de governar e transformar. A avaliação exercida pelas mulheres de forma coletiva sobre esses recursos é essencial para corrigir desigualdades históricas e consolidar uma democracia verdadeiramente representativa. É nesse contexto que o PT reafirma a importância de garantir espaços de formação, decisão e protagonismo para as mulheres, tanto no interior dos partidos quanto nos governos e movimentos sociais. A defesa da autonomia das mulheres em suas decisões, inclusive sobre seus corpos, seus territórios e suas campanhas, é parte inegociável de um projeto popular e emancipador. Diante disso, o PT reforça: a defesa dos direitos das mulheres deve estar no centro do projeto democrático-popular, ao lado do combate à fome, da geração de empregos, da soberania nacional e da justiça social. Não há justiça de gênero sem democracia, nem democracia plena sem o empoderamento das mulheres. É por isso que a atuação das mulheres petistas nos parlamentos, nos governos, nos movimentos e nas ruas é vital para construir um Brasil onde o cuidado, a liberdade e a igualdade floresçam. 19 Enfrentando o racismo para construir um novo Brasil. A construção de um novo Brasil passa, necessariamente, pelo enfrentamento do racismo estrutural que marca nossa sociedade desde a escravidão. O Brasil é um país majoritariamente negro: 56,1% da população se autodeclara preta ou parda (IBGE, Censo 2022). No entanto, os indicadores sociais revelam a permanência de um projeto de exclusão que atravessa séculos. Pessoas negras são a maioria entre os desempregados (64,2%, IBGE, 2023), subempregados e trabalhadores informais — 47,2% dos trabalhadores negros estão na informalidade, frente a 34,5% dos brancos. Representam também mais de 70% da população em situação de rua (IPEA, 2023) e 67% da população carcerária (DEPEN, 2022). Em 2022, 76,9% das vítimas de homicídio no país eram negras (Atlas da Violência, 2024), com destaque para a juventude negra: a cada 10 jovens assassinados, 8 são negros. As mulheres negras estão na base da pirâmide social. Elas ganham, em média, R$ 1.016 por mês — menos da metade do rendimento médio das mulheres brancas (R$ 2.528) e quase um terço do salário dos homens brancos (R$ 3.505) (PNAD Contínua, 2023). São também as mais afetadas pela precarização do trabalho doméstico, pela violência obstétrica e pela falta de acesso a serviços de saúde de qualidade. Esse quadro de desigualdade não é uma fatalidade, mas o resultado de uma estrutura econômica e social racista, que concentra renda, terra e poder político nas mãos de uma minoria branca. Enquanto isso, apenas 27,7% dos cargos de liderança no mercado formal são ocupados por pessoas negras (Dieese, 2022), e apenas 25% dos parlamentares eleitos em 2022 se autodeclaram negros. A resistência negra, no entanto, também é histórica: das revoltas quilombolas às mobilizações contemporâneas, o povo negro tem sido protagonista das lutas por democracia, justiça e igualdade no Brasil. A tendência interna Construindo um Novo Brasil reafirma o compromisso estratégico com a luta antirracista como um dos eixos centrais de um projeto democrático-popular. A superação das desigualdades raciais exige políticas estruturantes: ações afirmativas nas universidades e no mercado de trabalho, reforma do sistema de justiça, 20 combate à violência policial, fortalecimento da economia popular e solidária, valorização das culturas negras e políticas de reparação histórica. O Estado deve reconhecer e apoiar as formas de organização e saberes produzidos pelas comunidades negras urbanas e rurais, como os quilombos (cerca de 6 mil comunidades identificadas pela Fundação Palmares), as religiões de matriz africana, as redes de cuidado lideradas por mulheres negras e a juventude das periferias. Mais do que combater o racismo como uma “questão setorial”, é preciso enfrentá-lo como uma contradição central do desenvolvimento brasileiro. O novo Brasil que queremos construir só será possível com a centralidade da luta do povo negro. Reparação, redistribuição de riquezas e bem viver são compromissos que devemos assumir com radicalidade. Afinal, não há verdadeiro projeto de emancipação nacional sem justiça racial. As lutas da população LGBTQIA+ A população LGBTQIA+ brasileira representa uma parcela significativa e cada vez mais visível da sociedade. No entanto, essa visibilidade cresceu em meio a fortes tensões políticas e sociais, exigindo muita resistência e mobilização. Os últimos 20 anos foram marcados por ciclos de avanços institucionais e de severos retrocessos. Até 2016, tivemos um crescimento relevante das ações afirmativas e de reconhecimento: sobretudo a continuidade de políticas públicas lançadas anteriormente, como o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos LGBT (de 2009), ainda que com execução limitada. Tivemos igualmente projetos em áreas como saúde da população trans e inclusão de temáticas de diversidade nos materiais escolares – fortemente criticadas e obstaculizadas pelos segmentos conservadores. Ao mesmo tempo, foram obtidos alguns avanços institucionais, como a consolidação de conselhos e comissões interministeriais voltados para a diversidade sexual. Em 2018 e 2019, o maior protagonismo foi do Judiciário, reconhecendo discriminação contra pessoas LGBTQUIA+ como crime, equiparando-a ao racismo (ADI 26 e MI 4733, julgados em 2019), e instituindo a retificação do nome e gênero em cartórios sem necessidade de ação judicial (regulamentada pelo CNJ em 2018). 21 No Governo Bolsonaro, o retrocesso foi total. Passou a prevalecer uma política de desmonte e estigmatização. Foi extinto o Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT, eliminando a instância oficial de diálogo com a sociedade civil. Instaurou-se o silêncio institucional, com o fim de qualquer campanha pública de combate à LGBTfobia, além de vetos e censuras a materiais educativos e culturais que abordavam a diversidade sexual e de gênero. O Governo adotou oficialmente um discurso ideológico negacionista e moralizante, taxando políticas de gênero e sexualidade como “ideologia de gênero”, com o propósito de alimentar a intolerância e a violência simbólica.
A população LGBTQIA+ foi sistematicamente excluída dos planos federais, inclusive do Censo de 2022, que não coletou dados sobre orientação sexual ou identidade de gênero. Tudo isso resultou em um forte aumento da violência. Segundo dados do Grupo Gay da Bahia (GGB) e da ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), o Brasil continuou a ser o país que mais mata pessoas trans no mundo, com picos de violência nesse período. O Governo Bolsonaro foi também um período de alinhamento do Brasil com pautas e articulações ultraconservadoras globais em alianças com governos e instituições fundamentalistas de extrema direita. A partir de 2023, com a volta de Lula ao Governo, houve uma notável mudança de rumos. Lula promoveu um drástico reposicionamento internacional, que incidiu também sobre as questões LGBT e, além disso, tomou importantes medidas na esfera nacional. Restauração de políticas públicas: • Criação do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania com uma Secretaria Nacional dos Direitos da População LGBTQIA+, restaurando o papel institucional dessa pauta. • Retomada do Conselho Nacional LGBTQIA+: Em 2023, o governo reinstalou o órgão, promovendo a interlocução com movimentos sociais. • Plano Nacional LGBTQIA+: Em desenvolvimento, busca implementar ações transversais nas áreas de saúde, segurança pública, trabalho e educação. Campanhas públicas e reconhecimento: • Reativação de campanhas de visibilidade, combate à LGBTfobia e incentivo à inclusão no serviço público. 22 • Discussão para coleta de dados demográficos e sociais da população LGBTQIA+ nas próximas pesquisas oficiais (como o Censo). Mas há desafios persistentes que precisam ser debatidos e enfrentados e que demandam também um engajamento cada vez mais coletivo e vigoroso do PT. • Resistência institucional: Apesar dos avanços no Executivo, parte do Congresso Nacional e setores do Judiciário ainda têm perfil conservador, o que dificulta a aprovação de leis protetivas. • Estagnação legislativa: O Estatuto da Diversidade Sexual e de Gênero, proposto desde 2018, segue sem aprovação. • Violência estrutural: Mesmo com avanços institucionais, a violência cotidiana e o preconceito social permanecem altos. Com o atual governo federal tentando resgatar e avançar nas políticas públicas LGBTQIA+, o desafio central é garantir que essas políticas se tornem estruturais, perenes e juridicamente blindadas contra mudanças políticas futuras, garantindo de fato igualdade, segurança e dignidade para todas as pessoas LGBTQIA+ no país. O papel estratégico da juventude Vivemos um novo quadro histórico no Brasil, em especial para as juventudes. Diante da polarização política nacional e internacional, do avanço das big-techs e das novas tecnologias, assim como das transformações no mundo do trabalho, os jovens enfrentam não apenas incertezas sobre o futuro, mas também obstáculos concretos em sua vida cotidiana e na sua própria participação política. Uma parcela dos jovens acaba sendo arregimentada pelas ideologias conservadoras e de direita. A política partidária no Brasil tem sido marcada por um tensionamento ideólogico e cultural cada vez mais forte, substituindo muitas vezes o debate político pelo embate raso nas redes sociais. A disputa entre projetos antagonicos de país se acirrou tanto que as juventudes vivem um dilema: ou se alienam inteiramente da política ou assumem um protagonismo efetivo na vida nacional. A propagação acelerada de fake news e teorias conspiratórias, 23 principalmente nas redes sociais, onde a juventude tem presença massiva, tornou-se rotineira. Os algoritmos das plataformas priorizam o “engajamento” a qualquer preço, mesmo que isso signifique impulsionar conteúdos violentos, sensacionalistas e perigosamente manipuladores. Na maioria dos casos, os usúarios são induzidos a posturas políticas reacionárias ou à negação da política. O fortalecimento de figuras políticas da extrema direita brasileira está intimamente ligado à desinformação na internet. Elas se apresentam como porta-vozes de um conservadorismo supostamente jovial, que combina discursos fáceis e de prosperidade, uma estética de “influencers” e o domínio do marketing digital. A ascensão desses personagens revela a eficácia da extrema direita para pautar e contagiar o imaginário das pessoas, ainda que de forma deturpada, e representa um grande desafio para a esquerda e, em especial, para o PT. Essa realidade nos obriga a revisitar o nosso programa e oferecer à sociedade, particularmente aos jovens, novas perspectivas educacionais, culturais e profissionais que dialoguem com as suas angústias, espectativas e desejos. O desafio, no entanto, não é simples. As novas gerações são impactadas diretamente pela uberização do emprego e precarização do trabalho, ao mesmo tempo que são fascinadas pelas possibilidades, reais ou imaginárias, de empreendedorismo. São afetadas pela crise ambiental, pelo racismo estrutural, pela dificuldade de acesso à educação de qualidade. São jovens que vivem a contradição entre uma super conexão digital e uma profunda desconexão com o mundo real, o que impacta diretamente as formas tradicionais de organização política. É nesse contexto que o Partido dos Trabalhadores precisa olhar com atenção redobrada para a juventude. A renovação partidária precisa ser programática e profundamente conectada às pautas da juventude de hoje. É preciso muita escuta, formação política e esforço organizativo para criar novas modalidades de agregação e mobilização da juventude nos territórios e nas redes. A nova geração de jovens militantes participa pela primeira vez do Processo de Eleições Diretas (PED) do nosso partido. Além disso, tem pela primeira vez a experiência de governar com o Presidente Lula. A juventude petista quer que esse PED seja um momento de transição e de potência, onde possamos ser um motor de renovação política e cultural, sem abrir mão da história que foi construída até aqui. O PT tem uma bela trajetória, que resultou em grandes conquistas populares, mas precisa encarar as novas realidades do país, sem abandonar seus principios. Para isso, importantes programas como o Pé-de-Meia, 24 #PartiuIF, ID Jovem, Plano Juventude Negra Viva, Bolsa Atleta, Programa Rouanet da Juventude, entre outros criados pelo Governo Lula, precisam estar mais fortemente associados ao imaginário da juventude e ser também um vetor de motivação para ampliar a nossa participação na política. No último período, o PT elegeu o maior número de jovens deputados e deputadas, vereadores, prefeitas e prefeitos de sua história. Precisamos potencializar mulheres, jovens, negros e negras, LGBTQI+, periféricos, PCDS para os espaços de poder. A eleição de jovens parlamentares pelo PT, com o apoio do Movimento Representa, expressa não apenas uma renovação de quadros, mas também a força de uma juventude capaz de disputar o protagonismo eleitoral contra a direita brasileira. Se quisermos um futuro em que a juventude brasileira tenha vez, voz e poder, precisamos garantir que ela esteja no centro do nosso projeto de partido, na linha de frente da luta por um país mais justo. Mudança Climática e Transição Energética Hoje, a urgência de uma transformação radical no uso da energia do nosso planeta é inegável. O aquecimento global nos confronta com uma realidade alarmante: inundações devastadoras, secas severas, tempestades violentas e mudanças climáticas extremas. Calor insuportável e falta de chuva onde ela é necessária. Tragicamente, são os mais pobres os que sofrem as consequências mais graves dessa crise. Nesse contexto, o Brasil surge como uma esperança. Com uma matriz energética majoritariamente renovável, nosso país tem o potencial de se tornar um modelo exemplar. Ao contrário de grande parte do mundo, onde a eletricidade é gerada em usinas a carvão e veículos, aeronaves e navios consomem combustíveis fósseis que são as principais causas do aquecimento global, as emissões do Brasil provêm do desmatamento e da gestão insustentável da terra. Em 2025, o Brasil está em uma posição privilegiada para liderar as políticas climáticas, sediando a COP 29 em Belém e presidindo os BRICS, abrindo caminho para moldar o futuro do combate às emissões. Defendemos uma ação global coordenada, na qual os países mais ricos devem financiar políticas que mitiguem os efeitos das mudanças climáticas e contribuam para evitá-las. Afinal, são esses países que 25 carregam a maior responsabilidade pelas emissões que impactam o clima. Eles têm o poder e o dever de promover mudanças significativas. Internamente, precisamos garantir que mais brasileiros e brasileiras tenham acesso a um sistema energético moderno, seguro e sustentável. A busca pela sustentabilidade não pode ocorrer à custa da perpetuação da pobreza energética. Devemos eletrificar cada lar e elevar a qualidade do consumo de energia em todos os aspectos da vida – desde a luz que ilumina nossos lares até os veículos que nos transportam, desde o calor e o ar condicionado que nos confortam até as indústrias que impulsionam nossa economia. Precisamos de uma política direcionada para revolucionar o uso de combustíveis domésticos, particularmente o gás de cozinha. Embora os preços do mercado internacional ofereçam orientação, não podemos ser seus escravos. Devemos traçar nosso caminho, guiados pela nossa capacidade doméstica de fornecer combustíveis e eletricidade sustentáveis, abraçando biocombustíveis, combustíveis sintéticos e o potencial ilimitado das fontes renováveis. Não podemos aceitar o risco de apagões, o aumento exorbitante dos custos de energia ou o aprofundamento das desigualdades regionais (a energia na Amazônia não pode ser mais cara do que nas outras regiões do país). A energia deve ser um motor de crescimento, não um obstáculo à redução da pobreza e das desigualdades. Precisamos aumentar o consumo de energia no Nordeste e a produção de biocombustíveis nas outras regiões brasileiras. No Norte, assim como no Centro-Oeste e no Nordeste, é crucial preservar os biomas para evitar o desmatamento e os incêndios que afetam o clima. Podemos e devemos construir um projeto de desenvolvimento articulado para a Amazônia. É uma questão de justiça social e de soberania nacional. Na Amazônia vivem quase 20 milhões de brasileiras e brasileiros que aspiram, com todo direito, ao bem estar material e espiritual, e lutam para conquistá-lo. A região sofre com a exploração predatória e a devastação mas tem, ao mesmo tempo, notáveis experiências de manejo responsável da floresta e de valorização de sua riquíssima biodiversidade. Seus povos tradicionais possuem saberes admiráveis e, além disso, a Amazônia conta com algumas das melhores universidades e institutos científicos do país, que há décadas elaboram, junto com as forças democráticas e os movimentos populares, propostas alternativas de crescimento socioeconômico com a floresta em pé. O desenvolvimento sustentável da Amazônia carece de um modelo diferenciado de financiamento. 26 O Brasil é privilegiado também por sua riqueza em recursos energéticos. Temos petróleo suficiente para garantir nossa autossuficiência e ainda exportar por um tempo. Podemos manter essas reservas de forma responsável. A maior parte das emissões associadas ao petróleo ocorre no seu uso, especialmente nos transportes. Nossa frota de veículos flex-fuel é a maior do mundo, e a combinação com nossas hidrelétricas resulta em uma matriz energética das mais limpas do planeta. Estamos em um momento de crescimento na produção de biocombustíveis, e a legislação brasileira impulsiona sua inclusão na gasolina e no diesel. O Nordeste brasileiro dispõe das áreas com melhores condições naturais no mundo para a produção de energia do sol e dos ventos. Podemos usar essa expansão para reduzir desigualdades regionais, promovendo indústrias verdes, especialmente no Nordeste, e a produção de biocombustíveis em outras regiões do país. Não podemos ser apenas exportadores dos produtos que usam as nossas vantagens naturais. Precisamos fazer com que mais transformação ocorra em território nacional. Devemos fortalecer nossa própria cadeia produtiva, fomentando a produção local e reduzindo custos. Ao mesmo tempo, devemos estimular novos utilizadores das energias renovaveis e de seus produtos. Um exemplo é a cadeia do hidrogênio verde. Devemos fomentar seu uso em setores como siderurgia, transporte e produção de fertilizantes. Os combustíveis sintéticos derivados de hidrogênio são uma possibilidade de nova industrialização, assim como a transformação da biomassa em combustíveis limpos. Todos intensivos em hidrogênio. Contudo, o crescimento das energias renováveis não é isento de tensões. As comunidades locais sentem os impactos, e suas vidas tradicionais devem ser respeitadas. Barulho, efeitos sobre o solo e mudanças de estilo de vida, com repercussões sobre a saúde, preocupam e precisam ser controlados. Precisamos de regulamentações mais rigorosas para assegurar que as vozes dos afetados sejam ouvidas e que os eventuais impactos negativos sejam minimizados. Nossas políticas energéticas não podem depender exclusivamente do mercado. O reconhecimento global é claro: sem uma ação estatal firme, a transição energética será lenta e ineficaz. O retrocesso em algumas partes do mundo, como a eleição de líderes que promovem combustíveis fósseis e fazem regredir as agendas de transição energética, nos alerta sobre a 27 importância da liderança do Brasil na defesa das políticas de mitigação e enfrentamento das mudanças climáticas. A Europa, a China e os EUA têm estimulado a eletrificação de suas frotas de veículos leves como forma de reduzir as emissões. O Brasil, com sua enorme frota de veículos que podem usar misturas de gasolina, etanol e até gás, tem condições industriais de implementar a expansão de veículos híbridos com biocombustíveis que podem ser mais eficientes do que veículos puramente elétricos nas contribuições contra as mudanças climáticas. É hora de agir, de sonhar e de transformar. O futuro do nosso planeta e das próximas gerações depende das decisões que tomarmos agora. O Brasil precisa ser um dos líderes do movimento de transição energética, combinando o crescimento de fontes renováveis com a substituição progressiva das fontes fósseis. Segurança Pública: É preciso uma nova abordagem Ninguém ignora a grave situação da segurança pública no país. Posta na Constituição da República como uma responsabilidade dos estados, vê se, hoje, a insuficiência do preceito constitucional. As gestões petistas nos estados e agora no governo federal indicam a necessidade de um projeto inovador, mais articulado e ousado, para enfrentar esse desafio. Um desafio,alíiás, que não é só do Brasil, mas de quase toda a América Latina e também dos países mais avançados. Ainda que o Governo Lula esteja fazendo um grande esforço com os instrumentos de que dispõe (a Polícia Federal, sobretudo) para melhorar de alguma forma esse quadro, e que alguns indicadores comecem a melhorar (a redução do número de assassinatos, por exemplo), a verdade é que o problema continua em aberto e parece exigir uma nova abordagem não só do Poder Executivo, mas do conjunto das instituições e da sociedade como um todo. A PEC da Segurança Pública apresentada pelo Governo Federal é uma excelente iniciativa. Porém, se não for acompanhada de um Pacto Nacional contra a violência e a criminalidade, que também conte com a participação do Legislativo e do Judiciário, pode não ser suficiente para estancar e reverter o quadro dramático de largas faixas da população brasileira vivendo à mercê do crime. O esforço para desarmar a população civil tem de vir junto com o 28 fortalecimento – e qualificação – das forças de segurança do Estado, mas a valorização do papel das polícias não pode, de modo algum, ser confundido com o estímulo à violência como tem ocorrido em vários estados. O que a sociedade quer é uma polícia eficiente, que aja na prevenção e superação dos conflitos. Que exerça a prerrogativa estatal de combate aos ilícitos, inclusive no interior de suas coorporações, e respeite a cidadania. As comunidades não querem viver entre dois fogos, querem viver em paz. A integração das forças de segurança no SUSP, Sistema Único de Segurança Pública, coordenado pelo Governo Federal, respeitando a autonomia de estados e munícipios, é um passo importante para barrar o crescimento das maiores organizações criminosas e de suas variantes locais, as milícias. É preciso investir em policiamento de proximidade exercido pelas polícias militares que, para isso, devem contar com o apoio das guardas civis nos municipios. Esse tipo de policiamento, aliado a mecanismos tecnológicos como o uso das câmeras de vigilância nas cidades e aplicativos de bloqueio, ajudará a inibir a prática de roubos e furtos. De altíssima relevância é também o investimento na polícia investigativa: a Polícia Federal e as polícias civis dos estados. São esses os órgãos responsáveis pela elucidação dos crimes contra a vida. Crimes dessa natureza muitas vezes não são elucidados pelo enfraquecimento das polícias civis em detrimento das polícias militares. A recuperção dos territórios dominados pelas facções criminosas/milícias é uma urgência nacional. O que também inclui os territórios índigenas no que diz respeito ao garimpo ilegal e à grilagem. Reaver o seu direito de ir e vir em paz já será uma conquista importante para as populações que vivem nesses territórios. Os melhores resultados no combate às organizações criminosas tem sido obtidos por meio de operações de inteligência, identificando e desmontando esquemas (nacionais e internacionais) de lavagem de dinheiro e de compra de armas, indispensáveis para o crime. Investir em profissionais e tecnologias avançadas de inteligência é crucial nesse combate. A construção de presídios federais de segurança máxima, geridos pela Polícia Penal Federal, nos quais hoje se encontram muito dos principais chefes do crime no Brasil, é um legado dos governos do PT. A luta contra a violência e a criminalidade é complexa e difícil, mas é imprescindivel para assegurar a qualidade de vida do nosso povo, sobretudo nas periferias pobres, e para possibilitar o avanço do nosso projeto de desenvolvimento com justiça e paz social. 29 Rumo às eleições de 2026 A vitória de Lula em 2026 é vital para que o Brasil possa dar continuidade ao seu projeto de desenvolvimento nacional e se torne cada vez mais uma nação independente, próspera e justa. Não podemos de modo algum permitir que a construção nacional, para usar uma expressão do saudoso Celso Furtado, seja novamente interrompida, como ocorreu com o golpe de 2016. Somos testemunhas do que significaram os governos Temer e Bolsonaro em termos de retrocesso político, econômico e social, de perda da nossa soberania, de esvaziamento da nossa democracia, de desnacionalização das nossas riquezas e de ataque aos direitos básicos da população, causando um enorme sofrimento popular. Vimos como o ódio e a intolerância, alimentados pela própria Presidência da República, se apossaram da sociedade brasileira, envenenando o convívio social e a relação entre as pessoas. Nunca esqueceremos o que nos custou – e ainda custa – recuperar a soberania, reconstruir a democracia, a economia, as políticas públicas e o direito elementar de vivermos em paz. A vitória em 2026 é crucial para o futuro imediato e histórico do país, e passa, é claro, pelo êxito do nosso governo e a capacidade de fazermos com que as maiorias sociais se identifiquem com ele, desejando a sua continuidade. Passa, obviamente, pelo imenso prestigio e carisma de Lula, que continua sendo, de longe, o maior líder político e popular do país, e o mais respeitado. Mas passa também, necessariamente, pela reedição — se possível, com uma qualidade mais avançada – da ampla frente democrática que foi tão importante na vitória de 2022. Frente que, de alguma forma, já vinha sendo posta em prática pelos governos estaduais liderados pelo PT no Nordeste, com resultados regionais muito significativos e notável impacto em nossas campanhas nacionais. Temos sem dúvida condições de derrotar a direita e a extrema direita, mas não podemos menosprezar a sua força política nem a capilaridade do aparato conservador no país. Não é por acaso que ela governa vários grandes estados da Federação e têm importante peso no Legislativo. Suas posições golpistas, discriminatórias e antipopulares geram repulsa em amplos setores, mas isso não significa automaticamente fragilidade eleitoral. Para vencê-la, além de fazer a mais ampla aliança democrática possível, de partidos e organizações sociais, precisamos constituir um vasto movimento popular, que vá além do campo político e incorpore milhões de pessoas comuns que acreditam na liberdade e na 30 democracia, que prezam a paz e a solidariedade e aspiram a um convívio social sem violência nem opressão. Pessoas que muitas vezes não são de esquerda, mas que compartilham conosco o valor inegociável da dignidade humana, do bem estar e da concórdia. Pessoas que podem se unir ativamente em torno da candidatura Lula como o melhor caminho para evitar retrocessos e continuar avançando no rumo do progresso e da justiça social. Nesse sentido, devemos manter e incrementar nossa fecunda relação com o mundo católico e aprofundar o diálogo com a população evangélica, sem partidarizar de modo algum a questão religiosa, mas, ao mesmo tempo, sem aceitar que lideranças de ultradireita, cuja conduta é essencialmente anticristã, se apropriem do autentico sentimento religioso e tentem falar arbitrariamente em seu nome. Reafirmamos o nosso compromisso com o Estado Laico, o único que pode assegurar de fato a liberdade e a diversidade religiosa, e o nosso respeito por todas as opções espirituais existentes na sociedade brasileira, que devem ser tratadas com a mesma dignidade. Por outro lado, é fundamental intensificar cada vez mais a nossa aliança democrática com a intelectualidade, os cientistas e o mundo da cultura em geral, ao qual o nosso governo tem dado forte apoio. A arte e a ciência se alimentam da liberdade. Independente de vínculos partidários, cientistas, artistas e ativistas da cultura são grandes parceiros na defesa da democracia e do desenvolvimento. A vitória de 2022 reacendeu a chama da esperança na maioria do povo brasileiro. As conquistas do Governo Lula comprovam que valeu a pena. Essa chama precisa estar ainda mais forte e viva na campanha de 2026.