Tentativa de evitar condenação de Bolsonaro exige ação de instituições fora do Judiciário
Por Jonathas Moreth (*)
Os processos criminais da intentona golpista, nos quais os réus são acusados, entre outros crimes, de tentarem um Golpe de Estado e a Abolição ao Estado Democrático de Direito anda em passos acelerados no Supremo Tribunal Federal.
Para relembrar o leitor, essa leva de processos, que começou após a condenação de centenas de golpistas de base, visa os seus principais líderes, ficando de fora, até o momento, a conclusão das investigações quanto aos financiadores. Essa denúncia contra os líderes da intentona foi organizada pelo Procurador-Geral da República em quatro grupos, somando ao todo 34 denunciados.
O primeiro grupo, denominado “núcleo crucial”, tem Jair Bolsonaro, Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira, Anderson Torres, Braga Netto, entre outros. O segundo grupo, de “coordenação das forças policiais”, conta com ex-diretor-geral da PRF Silvinei Vasques. O terceiro grupo, “disseminação de desinformação”, é composto por militares e civis, dos quais destaca-se o golpista e filho de golpista João Figueiredo. Já o quarto grupo, “ações táticas”, tem, entre outros, o general Nilton Rodrigues”. Por fim, o quinto grupo, “monitoramento e ações de neutralização”, é composto pelo general Estevam Carlos e o tenente-coronel Hélio Lima.
O primeiro grupo, que tem Jair Bolsonaro como principal denunciado, está em sua reta final, estando concluída toda a fase de produção de provas e alegações finais do Ministério Público.
Até aqui, destacam-se dois pontos. O primeiro é a participação do ministro Luiz Fux nos depoimentos e interrogatórios, em que foi o único além do ministro relator a participar, sempre fazendo perguntas que reforçavam – ou no mínimo colaborava – com a narrativa das defesas. Não a propósito, segundo têm noticiado alguns jornais, não sofreu com cancelamento de vistos dos Estados Unidos, o mesmo ocorrendo também com os ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, não por coincidência, os dois últimos indicados por Jair Bolsonaro.
O segundo ponto de destaque refere-se às alegações finais do Ministério Público, um documento de 517 páginas no qual foram melhor aprofundadas as acusações e rebatidas algumas teses da defesa, e onde Gonet destacou que Bolsonaro, “com o apoio de membros do alto escalão do governo e de setores estratégicos das Forças Armadas, mobilizou sistematicamente agentes, recursos e competências estatais, à revelia do interesse público, para propagar narrativas inverídicas, provocar a instabilidade social e defender medidas autoritárias”.
Ocorre que, em meio a este cenário de iminência de condenação de Jair Bolsonaro, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, utilizou-se de mecanismos de política econômica – taxação de importações – para chantagear o Estado brasileiro para beneficiar um aliado político (família Bolsonaro) e as big techs que foram as principais doadoras de sua campanha.
Que não fiquem dúvidas: a medida do governo Trump visa apoiar a anistia ou alteração da condenação certa de Bolsonaro e seus apoiadores, bem como a derrubada da decisão do STF que declarou inconstitucional parte do Marco Civil da Internet, desagradando interesses econômicos das big techs em um indiscutível ataque à nossa soberania.
Essa ofensiva dos EUA, que tenta ser capitalizada por Eduardo Bolsonaro e o jornalista Paulo Figueiredo, internamente, teve um objetivo principal e um secundário. O principal consiste em livrar da cadeia Jair Bolsonaro e parte de seus apoiadores. O objetivo secundário é melhor posicionar Eduardo Bolsonaro nas prévias da extrema-direita para escolher o adversário de Lula em 2026. Aparentemente, segundo a última pesquisa da Quaest, de fato, Eduardo melhorou um pouco o seu desempenho. Como efeito colateral, o governador Tarcísio saiu da situação de conforto que parte da mídia o colocou, como um representante do bolsonarismo e do capital financeiro, tentando passar a imagem de moderado e não o que realmente é: um político radical e subserviente a Jair Bolsonaro.
Em meio a essa escalada de ações da família Bolsonaro contra a soberania nacional, durante a qual, por mais de uma oportunidade, foram feitas ameaças de que sem anistia as ações de Trump se intensificariam, abriu inquérito contra Eduardo e, fundamentalmente, determinou busca e apreensão na casa de Jair, uso de tornozeleira eletrônica com proibição de sair de casa à noite e aos finais de semana, conversar com Eduardo, utilizar redes sociais e se aproximar de embaixadas.
Essa decisão visa, segundo o ministro Alexandre de Moraes, evitar a continuidade de possível prática criminosa, bem como evitar a fuga de Jair Bolsonaro, o que impediria a correta aplicação de eventual pena eventualmente aplicada com a conclusão do julgamento. Em meio a este tensionamento, o secretário de Estado dos EUA, Marco Rúbio, anunciou a já citada revogação de passaporte de ministros do STF.
No meio jurídico, a decisão contra Jair e Eduardo foi majoritariamente defendida, havendo algumas críticas quanto ao alcance da medida, em especial quanto à proibição do uso das redes sociais.
Ademais, com maior ou menor intensidade, importantes entidades e lideranças manifestaram-se em defesa de nossa soberania e do STF, como a OAB e presidências da Câmara e do Senado.
É inegável, e deve ser motivo de maior reflexão, que o STF tem ampliado, ativa e passivamente, sua atuação política e institucional, passando por agente de governabilidade em um governo de minoria parlamentar como o Lula III, assim como antagonista de um conflito diplomático com a maior potência mundial.
Apesar do reconhecido êxito do STF em fazer o contraponto ao bolsonarismo, tomando decisões importantes e corajosas em defesa de nossa democracia, é imprescindível que este contraponto passe a ser realizado, com maior ênfase, por outras de nossas instituições constituídas, partidos políticos e organizações e movimentos sociais, deixando ao Judiciário um papel mais contido.
(*) Jonathas Moreth é militante do PT-DF.