Por Fausto Antonio (*)
Thomas Sankara, presidente de Burkina Fasso, assassinado em 1987
Epigrafia dos presidentes africanos assassinados pelo imperialismo
– Em 1961: Patrice Lumumba, Primeiro Ministro da República Democrática do Congo
– 1963: Sylvanus Olympio , Presidente da República do Togo
– Em 1966: John-Aguiyi Ironsi, Presidente da República da Nigéria
– Em 1969: Abdirachid-Ali Shermake, Presidente da República Somália
– Em 1972: Abeid-Amani Karumé, Presidente da República De Zanzibar
-Em 1975: Richard Ratsimandrava, Presidente da República de Madagascar
-Em 1975: François-Ngarta Tombaye, Presidente da República do Chade
– Em 1976: Murtala-Ramat Mohammed, Presidente da República da Nigéria
-Em 1977: Marien Ngouabi, Presidente da República do Congo-Brazzaville
-Em 1977: Teferi Bante, Presidente da República da Etiópia
-Em 1981: Anouar El-Sadate, Presidente da República do Egito
-Em 1981: Willia,-Richard Tolbet, Presidente da República da Libéria
– Em 1987: Thomas Sankara, Presidente da República Burkina
– Em 1989: Ahmed Abdallah, Presidente da República de Comoros
-Em 1989: Samuel-Kanyon, Presidente da República da Libéria
– Em 1992: Mohammed Boudiaf, Presidente da República Argélia
– Em 1993: Melchior Ndadayé, Presente da República de Burundi
– Em 1994: Cyprien Ntaryamira, Presidente da República de Burundi
-Em 1994: Juvenal Habyarimana, Presidente da República de Ruanda
– Em 1999: Ibrahim Barré-Mainassara, Presidente do Niger
– Em 2001: Laurent-Desired Kabila, presidente da República do Congo -Kinshasa
– Em 2009: João Bernardo Vieira, Presidente da Guiné Bissau
-Em 2011: Muammar Gaddafi, Presidente da República da Líbia
(Imperialismo Assassinou 22 Presidentes Africanos Desde … 27 de ago. de 2019 )
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O Dia da África, 25 de maio, não apenas uma data comemorativa e discursiva, deveria ser , necessariamente, um artefato político contra o imperialismo. A mesma perspectiva deveria ser aplicada às denominadas independências dos países africanos. Elas não deveriam ser datas apenas para a mobilização festiva, mas instrumento de luta e de enfrentamento do imperialismo, que é o ápice da dominação e opressão iniciada pelo processo colonial e escravista.
Desde o processo criminoso de escravização e assalto dos recursos sociais, energéticos, minerais, antes e fundamentalmente após a chamada Conferência de Berlim, 15 de novembro de 1884, os alicerces, os motores de dominação e os seus vetores estão em conexão, nos países africanos, com os condomínios yanque -e-países-europeus. De modo específico, há o condomínio luso-yanque, franco-yanque , belga-yange, anglo -yanque, belgo-yanque, germano-yanque e hispano-yanque que são organizadores e atualizadores de privilégios políticos , econômicos e de poder para o bloco atlanticista. O poder é regulado, a serviço do bloco totalitário atlanticista, sempre pela força de golpes, assassinatos de líderes, bloqueios e sanções. Para fechar o tópico inicial, dedicado à opressão de africanos, é útil dizer que a propalada Conferência de Berlim foi , de modo arbitrário , criminoso e imperialista, a partilha do continente para a rapinagem econômica e toda sorte de violência e genocídios promovidos pelas potências europeias e pelos EUA.
O motor luso-yanque
No caso de Portugal, à guisa de explicitar o estágio da dominação imperialista, é útil entender que o motor colonial e opressor luso não existe de modo independente. Como parte da Europa, que é colônia dos EUA, Portugal é falado e comandado pela ordem e lógica imperial de quem comanda o bloco. Desse modo, a intervenção portuguesa, no contexto das ex-colônias africanas, se dá a partir do condomínio luso-yanque.
O poder anglo-estadunidense na África do Sul
Apesar de participar dos BRICS, a África do Sul é um espaço de influência da OTAN. Existe uma grande quantidade de multinacionais no país. Desse modo, não é possível desconsiderar a capacidade e o potencial de espraiamento econômico da África do Sul, sob o controle do Ocidente, na África autral e na totalidade do continente. O controle passa, vale repetir para fixar, pelo capital financeiro e pelos processos industriais operados por empresários e empresas multinacionais oriundos ou alinhados ao imperialismo anglo-estadunidense. O quadro esboçado aqui, a respeito da Áfica do Sul, explica o último embate eleitoral e os retrocessos na arena governamental? A coligação, balizada pela suposta política de unidade nacional, poderá implodir o país. No centro da “unidade” , temos o ANC e o partido remanescente do apartheid, Aliança Democrática, que é liderada por brancos. Os dois partidos, numa frente com partidos menores, formam um governo impossível de dar certo do ponto de vista dos interesses nacionais e da maioria negra sul-africana. A frente, supostamente apresentada para promover a unidade nacional, a rigor, eleva a participação do partido dirigido pelos brancos e, de modo a pautar de modo concreto a política deliberada pelo imperialismo, promove cisão no ANC e fragiliza a futura governabilidade.
Comemorar o quê nas chamadas independências e Dia da África?
De modo invertido e relevando a realidade concreta dos países africanos, cresce a necessidade de luta para assegurar as soberanias nacionais; as independências, no contexto africano e internacional, estão inconclusas. Os condomínios fraturam as soberanias indígenas, autóctones, impondo, primeiro, as línguas verticais universalizantes das metrópoles imperiais e, ao mesmo tempo, as moedas despóticas e o subsequente assalto perverso dos recursos minerais , energéticos, entre tantos outros. A rigor, são igualmente despóticas as línguas verticais e não apenas e isoladamente as moedas das metrópoles do bloco imperial. Na dominação, ainda em marcha, persiste uma simbiose, que se define pela dominação alicerçada pelas moedas e línguas impostas pela escravização , violência estrutural e epistêmica eurocêntrica e/ou euroestadunidense. As violências, conforme genocídios em profusão no território africano, são acompanhadas literalmente pelo apagamento dos valores filosóficos, linguísticos e notadamente pelo assassinato das principais lideranças anti-imperialismo. A lista de assassinados é extensa e contínua. Alguns nomes são emblemáticos: Patrice Lumumba, Thomas Sankara, João Bernardo Vieira e Muammar Gaddafi são alguns dos mártires assassinados pelas agências de inteligência e ações militares do imperialismo. Na epígrafe do artigo, cara leitora e leitor, há uma lista copiosa de 22 líderes africanos assassinados.
O Dia da África e das independências relativas
O Dia da África e o dia das independências relativas, superando a invisibilidade do continente e dos seus países, devem romper, no plano teórico, com o distanciamento e com a projetada e executada ignorância da África, que se define pelos países e mais ainda pelos lugares. Há, na produção da ignorância, o papel central, no Brasil, das mídias brancas burguesas, do ensino de primeiro e segundo graus e especialmente do ensino universitário. Numa síntese, a política de ignorância do que ocorre na África histórica e territorializada é sistematizada pelo currículo das ciências universalizantes da branquitude totalitária.
Presos e capturados pelas políticas de ignorância,de invisibilidade e de silêncio, os movimentos sociais do campo negro-africano e antirracismo ficam paralisados. Desse modo, não há notícias de atos de rua , de mobilização e de organização articulando africanos (as) residentes e/ou em deslocamento pelo Brasil , militantes antirracismo e movimentos negros em geral. Sem atos de rua e campanha sistemática , sustentados por mobilização e solidariedade, por exemplo, aos levantes na África Ocidental , sem excluir outros embates, crescem as invisibilidades e silêncios. Sobram, no entanto, de modo frouxo e sem eficácia para a luta efetiva de independência dos países africanos, palestras, conferências e uma multiplicidade de gestos simbólicos. Úteis do ponto de vista tático, atos simbólicos têm pouca eficácia efetiva para a superação da opressão a que estão submetidos os povos africanos.
A África real, relevando e revelando os países e lugares, emergirá da luta contra o estágio atual de dominação branca, que é reelaborada e ativada pelo imperialismo. A propósito, dominação branca chancelada pelas burguesias negro-africanas e vassalas das metrópoles atlanticistas. Eis o eixo de mobilização que deveria orientar as ações e políticas dos movimentos negros, africanos e dos africanos fixados e/ou em transito pelo territorio brasileiro. Numa mesma chave interventiva e no continente aafricano, as mobilizações deveriam ser orientadas contra as burguesias nacionais negras e serviçais dos condomínios euro-yanque e, no mesmo golpe, contra o imperialismo.
No tabuleiro geopolítico, podemos,então, indagar: de que modo a data do Dia da África e os atos das inconclusas independências são atualizados pelas lutas priorizadas pelos trabalhadores e pelo chão dos países africanos? Assim, a data alusiva à independência, como artefato para alicerçar as lutas contra os opressores , terá papel ativo, libertário e estratégico. A reorientação do foco de luta poderá inserir , na análise e posterior intervenção, o protagonismo africano.
Quais os dilemas geopolíticos presentes no norte do continente?
A indagação, longe de apresentar uma resposta acabada, visa taticamente entender e, quem sabe estrategicamente, reverter as políticas que bloqueiam as soberanias esboçadas por Muammar Gaddafi, na Líbia, e extensiva, como possibilidade, aos demais países africanos? Gaddafi queria a constituição de uma espécie de federação dos países africanos. A federação de países, com uma moeda unificada e unificadora das soberanias, de conjunto, seria mola propulsora das especificidades nacionais. Hoje, 2024, como se posicionam Argélia,Edito, Líbia,Marrocos,Sudão,Sudão do Sul e Tunísia? A alusão aos países que ficam acima do Saara tem por objetivo pautar a discussão, que oriente uma intervenção libertária, de conjunto , para o continente.
A inseparabilidade da parelha racismo e imperialismo
A produção permanente de ignorância e de invisibilidade do continente africano, sistematizada pelo racismo no Brasil e pelo poder do imperialismo no continente, não será entendida e desfeita se não for, no mínimo, pautada para ser objeto de posterior análise e intervenção . Abrir a discussão e depois, com dados e relevando o quadro geopolítico, esboçar a análise, a crítica e viabilizar a intervenção política são pontos centrais. Método semelhante deve ser aplicado aos países que estão no chamado chifre da África. Quais as realidades e tensões que envolvem ativa e passivamente Djibuti, Somália, Eritréia e Etiópia? Há, na encruza da região, os embates, no sudoeste asiático e com implicações nos países que estão no chifre da África, das lutas do Iêmen contra o imperialismo. Por outro lado, a Etiópia, relevando questões estratégicas postas pela nova rota da seda, foi conduzida como membro dos BRICS. A adesão da Etiópia responderá às necessidades internas do país e, no contexto geopolítico delineado pelas novas rotas da seda? O ingresso do país será uma das bases para a construção de estruturas, que viabilizem a conexão viária, comercial e geopolítica dos BRICS, com ênfase na conexão Ásia, África e Europa? Com certeza, os conflitos,as tensões e as soluções propostas serão objeto de embates dos BRICS em oposição ao imperialismo.
Temos também os golpes de Estado categorizados como levantes, na África Ocidental, contra o imperialismo constituído pelo condomínio franco-yanque.
Quais os significados políticos e estratégicos dos processos de luta que querem se livrar das garras dos EUA e dos condomínios com os países da Europa? No caso específico da África Ocidental, os levantes são nacionalistas e querem, na contramão do condomínio franco-yanque, o controle dos recursos sociais, minerais, energéticos e linguísticos. No embate, os levantes querem o controle dos recursos que estão no solo e no subsolo e, por indiscutível importância para as soberanias, priorizam a centralidade das línguas dos lugares africanos e das moedas nacionais.
O Quênia como peça da geopolítica opressora dos EUA
Como se apresenta, no Quênia, país governado pelo empresário pró Ocidente William Ruto , esta realidade de dominação imperialista ? Lá, histórico condomínio anglo-yanque, não se trata apenas da captura dos recursos sociais existentes no solo e subsolo do país. O governo, típico bilionário africano neoliberal e lesa nacionalismo, subiu os impostos e desvalorizou a moeda do país. O país está convulsionado diante da submissão do governo aos interesses dos EUA. Por outro lado e numa comunhão, o país, na voz e ação do governo, atua ordinariamente para se submeter à lógica ditada pelos interesses da OTAN.
Na mesma direção e a partir da força e opressão, os EUA querem treinar o exército do Quênia para controlar o país e agir, com certeza, contra os levantes nacionalistas e os avanços dos BRICS; o que inclui políticas contra as novas rotas da seda. Mas as forças armadas do Quênia, como exército mercenário adestrado pelos EUA , executarão também missões opressivas no Haiti; tudo a serviço do imperialismo. Treinar o exército do Quênia, cujo histórico de violência é de conhecimento internacional, será um meio para constituir uma base armada dos EUA no país? De imediato, há o objetivo de uso desse contingente mercenário no Haiti. Relevando o histórico do condomínio franco-yanque, as forças militares, controladas pelo imperialismo no Quênia, estarão à disposição nos embates contra os levantes nacionalistas na África Ocidenta?. No geral, o objetivo é se contrapor à presença da China e, por derivada equivalência, atuar na contenção dos BRICS. especialmente para se contrapor às novas rotas da seda. A política do imperialismo pretende se contrapor também aos levantes , à unidade interna africana e à externa. No tocante à unidade externa, ela está interseccionada, de um lado, com os países que lutam contra a imposição e consumo das moedas atlanticistas e, de outro lado, contra a geopolítica totalitária a serviço dos privilégios absolutos para a OTAN.
(*) Fausto Antonio é escritor, poeta , dramaturgo e professor da Unilab – Bahia.
Uma resposta
Interessante e profunda reflexão sobre a continuidade da opressão sistemática do imperialismo/capitalismo no solo do continente africano. A falta de um posicionamento contundente das organizações negras de modo efetivo diante dessa situação ocasiona que a independência da África seja mais um engodo ilusório da máquina engendrada pelos mesmos países colonialistas com seus métodos de dominação territorial, cultural e econômico.