Efeitos econômicos da Operação Lava Jato

Por Luiz Sergio Canário (*)

Obras paradas do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj)

A dita operação Lava Jato já teve os seus aspectos políticos e jurídicos exaustivamente estudados, comentados e analisados. Seus impactos na história de nosso país serão sentidos ainda por anos. Do golpe de 2016 à eleição de Bolsonaro em 2018 há a influência dessa ação criminosa, que os tribunais estão revendo, mesmo que os efeitos não possam mais serem superados.

Mas os impactos da Lava Jato foram muito fortes também na nossa economia. E esse é um aspecto ainda pouco estudado e analisado. Há poucas semanas o DIEESE lançou um estudo realizado em parceria com a CUT que joga luz sobre esse assunto. E o que se vê é desconcertante. A importância desse estudo é que apresenta números baseados em premissas sólidas e bem documentadas. Sai do campo da especulação para o da dura realidade dos números, analisando um período entre os anos 2013 a 2017 e alguns dos efeitos após esse período. Três dos principais dados apresentados no estudo:

  • A Lava Jato custou 4,4 milhões de empregos e 3,6% do PIB;
  • Deixou de arrecadar R$ 47,4 bilhões de impostos e R$ 20,3 bilhões em contribuições sobre a folha, além de ter reduzido a massa salarial do país em R$ 85,8 bilhões;
  • Afetou os setores envolvidos diretamente (construção civil, petróleo e gás), mas também uma gama importante de outros segmentos (devido aos impactos indiretos e ao efeito renda).

O trabalho é repleto de números e dos conceitos usados para se chegar a eles.

A destruição de valor causada pela operação é de difícil recuperação. Os dois setores mais atingidos foram feridos gravemente. Empresas de construção civil brasileiras eram competidoras importantes no mercado internacional de serviços de engenharia e formavam uma barreira natural à entrada do capital estrangeiro no setor. A engenharia brasileira era reconhecida com uma das melhores do mundo e ganhava cada vez mais espaço no mercado internacional, especialmente na África, na América Latina e no Caribe. Empregava dezenas de milhares de brasileiros no país e no exterior. E dominava tecnologias construtivas e soluções de engenharia importantes para o desenvolvimento nacional.

No que pese seu envolvimento histórico com a corrupção, o valor e o acúmulo tecnológico gerado por dezenas de milhares de trabalhadores não poderiam ser destruídos em função das práticas ilegais e imorais de seus gestores. Esses devem encarar com todo rigor seus julgamentos, cumprir rigidamente suas penas e terem seus patrimônios pessoais bilionários confiscados para reparar os danos causados por suas ações. O trabalho do DIEESE estima que, no período analisado, na construção civil:

  • Houve redução dos investimentos na casa dos R$68 bilhões em função de obras paralisadas e de obras em que as empresas declararam incapacidade financeira para continuar;
  • Deixaram de ser gerados cerca de 1,1 milhões de empregos em toda a cadeia da construção, em função dos investimentos suspensos;
  • Deixou de ser adicionado na economia cerca de R$36 bilhões também por conta dos investimentos suspensos.

Claro que não se trata, e essa seguramente não é a intenção nem do DIEESE nem da CUT, de se proteger empresas capitalistas corruptas. Se trata de “não se jogar a criança fora com a água do banho”. O combate à corrupção e ao crime empresarial interessa fundamentalmente à classe trabalhadora. As punições duras em toda a cadeia da corrupção são bandeiras de todos os setores comprometidos com as lutas populares. Sem mais palavras ou meias medidas. Mas os maiores prejudicados com esses ataques da Lava Jato às empresas e não aos seus gestores e donos, jogou fora patrimônio do povo brasileiro. Enquanto isso Emilio Odebrecht, il capo di tutti capi, segue sendo um dos homens mais ricos do país, com uma fortuna de bilhões de dólares. E nunca passou um dia na cadeia. Já dezenas de milhares de trabalhadores de sua empresa perderam seus empregos.

O setor de óleo e gás foi também duramente atingido pela Lava Jato, com os ataques sistemáticos contra a Petrobras, foco principal da “operação”. O estudo mostra que:

  • Houve redução dos investimentos na casa dos R$104 bilhões em função dos investimentos previstos e não realizados pela Petrobras;
  • Deixaram de ser gerados cerca de 44 mil empregos na cadeia de extração de petróleo/gás e de refino;
  • Deixaram de ser adicionados na economia cerca de R$29 bilhões, também por conta dos investimentos suspensos.

As investigações da “operação” provocaram um desastre em toda a cadeia de óleo e gás. A paralização dos investimentos jogou fora anos de investimento na construção de uma cadeia sólida de fornecedores de produtos e serviços de alta tecnologia da Petrobras. A empresa foi paralisada por ser apontada como o antro da corrupção. Toda a empresa entrou na mira da suspeição de ser corrupta. Todos os contratos foram pré considerados contaminados por toda sorte de corrupção. Todos os dias pareciam novas denúncias. De novo a punição não focou nos executivos responsáveis por terem se associado a partidos e políticos para tirar dinheiro da empresa para irrigar campanhas eleitorais e bolsos largos de várias pessoas, inclusive dos próprios executivos. A empresa e toda a cadeia produtiva foi pesadamente atingida. A Petrobras pagou generosa indenização de US$ bilhões por teóricos prejuízos nunca quantificados a investidores nos EUA. Os executivos da empresa em troca de suas delações foram premiados não só com reduções de pena, mas também com a preservação de partes significativas de suas fortunas obtidas nos desvios da corrupção. Seguiram ricos e felizes enquanto o país sangrava.

Olhada em conjunto a Lava Jato representou:

  • Uma redução de investimentos na casa de R$172 bilhões somente na construção civil e na Petrobras;
  • O PIB deixou de crescer 3,6% entre 2014 e 2017 em função de não haver esses investimentos;
  • A geração de cerca de 4,4 milhões de empregos pela mesma razão anterior em todo o país;
  • Um valor de cerca de R$245 bilhões deixou de ser adicionado na nossa economia.

Que tipo de interesses estão por trás dessa destruição de empregos, valor e riqueza? Duas cadeias industriais estratégicas para o crescimento em que o Brasil tinha posição de destaque no mundo foram atacadas ao acaso? Por pura intuição dos procuradores e do juiz federal de primeira instância de Curitiba, uma cidade afastada dos principais centros de decisão do país? Os desdobramentos das investigações sobre a Lava Jato e as revelações vindas à luz do dia da “Vaza à Jato” mostram que não há nada de acaso. As relações entre Sérgio Moro e os procuradores com o Departamento de Justiça dos EUA e o FBI mostram que a participação do governo dos EUA foi fundamental para a instalação e prosseguimento da “operação”. A promiscuidade ilegal, imoral e indecente entre o juiz e os procuradores; e de todos eles com as autoridades dos EUA, mostram que houve uma ação deliberada de destruição dessas duas cadeias de valor. E com isso os interesses dos EUA, principalmente sobre a cadeia de óleo e gás foram atendidos. A Petrobras segue sendo desmontada, vendida aos pedaços, com as bençãos do STF, até que sobre pouco mais de um nome e mesmo esse nome seja vendido para alguma das petroleiras estrangeiras.

É esse o cenário de submissão completa da nossa burguesia ao imperialismo. À comer o bolo inteiro, prefere as migalhas deixadas na mesa pelas potências imperiais. O que importa é todas essas migalhas irem parar em seus bolsos. O povo que se contente em tentar viver em um país mergulhado em uma crise sem precedentes, resultado da soma de uma crise econômica severa – que gera miséria, desemprego e morte – e de longa duração; e de uma pandemia que ceifa centenas de milhares de vidas. Não há sinais no horizonte de resolução dessa crise. A burguesia é incapaz, além de indiferente, de gerar alguma saída. Cabe à classe trabalhadora e ao povo unidos construírem um cenário que nos permita ter soluções gestadas por políticas públicas, voltadas para os interesses de nosso povo. Fora Bolsonaro o mais rápido possível!

(*) Luiz Sergio Canário é militante petista em São Paulo.

O trabalho do DIEESE-CUT está disponível em: https://www.dieese.org.br/outraspublicacoes/2021/impactosLavaJatoEconomia.html


(**) Textos assinados não refletem, necessariamente, a opinião da tendência Articulação de Esquerda ou do Página 13.

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