Por Ulisses Moreira (*)

O atual modelo do setor elétrico brasileiro, que transformou a energia — um direito essencial do povo — em mercadoria de exploração, subordinada à lógica do lucro, da especulação e da financeirização.
O Brasil vive um escândalo estrutural. Mesmo com excesso de produção de energia, forte expansão da energia solar e ampla capacidade instalada, a conta de luz segue cara, abusiva e socialmente excludente. Isso não é falha técnica, nem consequência inevitável do mercado. É resultado direto de um modelo político e econômico imposto pelas privatizações e pela desmontagem do planejamento público do setor elétrico.
A recente proliferação de empresas que oferecem “desconto” na conta de luz por meio de contratos de energia solar por assinatura escancara essa distorção. Se há abundância energética, o preço deveria cair para todos. No entanto, o que se impõe ao povo são contratos privados, fidelizações e percentuais limitados, como se o consumidor devesse agradecer por pagar um pouco menos por um serviço essencial que já financia coletivamente.
Esse modelo cria uma escassez artificial para justificar intermediários e manter tarifas infladas. A energia não chega como política pública, chega como produto. O desconto não é estrutural, é comercial. Serve para preservar a rentabilidade do sistema e garantir ganhos privados, não para assegurar justiça tarifária.
As privatizações do setor elétrico aprofundaram esse processo. Prometeram eficiência e modicidade tarifária, mas entregaram transferência de renda, fragmentação do sistema e submissão do interesse público aos contratos privados. A energia deixou de ser planejada como instrumento estratégico de desenvolvimento nacional e passou a ser tratada como ativo financeiro.
O resultado é um verdadeiro apartheid energético. Quem pode assinar contratos escapa parcialmente do abuso. Quem não pode, paga a tarifa cheia. Em vez de universalizar o acesso à energia barata, institucionaliza-se a desigualdade. Em vez de garantir direitos, normaliza-se a exploração.
Reafirmo, como dirigente sindical: energia não é favor, não é assinatura, não é negócio especulativo. Energia é bem público, estratégico e fundamental à dignidade humana, ao trabalho e ao desenvolvimento do país.
Defendo publicamente:
-A retomada do planejamento público do setor elétrico;
-O fim da lógica de exploração via contratos privados;
-A redução estrutural das tarifas, compatível com a capacidade produtiva do país;
-A reversão das privatizações que submetem a energia ao lucro em detrimento do povo brasileiro.
Sem enfrentar esse modelo, seguiremos vivendo o absurdo de um país iluminado pelo sol, mas com trabalhadores pagando caro para manter a luz acesa.
Energia é direito. Não mercadoria.
(*) Ulisses Moreira é diretor do Sindicato Mova-se
