Por Wilson Ramos Filho (Xixo) (*)
Josete, Renato Freitas e Carol Dartora
Os resultados eleitorais atestam uma importante reconfiguração das esquerdas e do próprio conceito do que é ser esquerda na atualidade brasileira.
Tome-se o que ocorreu em Curitiba, uma das mais reacionárias cidades da região mais retrógada do pais.
Avalie-se as quatro principais candidaturas para a Câmara de vereadores. A mais votada obteve 8874 votos. Negra, sindicalista, classista. A segunda, também sindicalista, logrou a merecida reeleição, com 5856 votos, defensora leal e incansável do funcionalismo público. A terceira, um jovem negro, brilhante, advogado e mestre em direito, que nunca abandonou suas origens periféricas, orgulhosamente um representante “das quebradas”, conquistando 5.097 votos. A quarta mais votada, Ana Júlia Ribeiro – 13013, primeira suplente, com apenas 20 anos, líder estudantil, obteve 4586 votos, mesmo sem ter como atingir sua base social de representação em razão da pandemia. Caso as escolas e faculdades estivessem funcionando, permitindo o corpo a corpo, seguramente teria ainda mais votos.
Essas quatro candidaturas têm muita coisa em comum. A primeira e mais importante reside na autenticidade de seus enraizamentos sociais. Além disso têm uma inegável componente geracional. À exceção da reeleita, as três demais candidaturas são jovens, iniciantes nas disputas eleitorais. Isso não é pouca coisa, nem irrelevante. Por fim, para ficar apenas nas principais similitudes, três delas não se vinculam organicamente às correntes internas do PT. Professora Josete é da DS, sempre foi liderança da Democracia Socialista. Os demais são independentes, embora com maior ou menor proximidade com uma das correntes. Ana Carolina Dartora foi apoiada por parte da militância da DS mas de forma não orgânica. Ana Júlia se identifica muito com a CNB, mas sua candidatura se demonstrou bastante mais ampla. Renato Freitas – 13123, da mesma forma, foi apoiado por militantes de várias correntes internas do partido.
Nas eleições anteriores cada corrente tinha seus candidatos e candidatas preferenciais. Nesta também. Todavia, três dos mais votados nesta eleição não foram os vinculados organicamente às correntes. Essa novidade não pode ser minimizada.
Digna de reconhecimento foi a posição adotada pela corrente majoritária. Embora seu principal quadro político seja o presidente municipal do PT, a CNB teve a grandeza de não concentrar votos na sua campanha. Vinculados à corrente havia mais de uma dezena de candidaturas. Mesmo assim, Angelo Vanhoni foi o quinto mais votado, com mais de quatro mil votos.
No PT a solidariedade ao projeto político geral sempre esteve acima das pretensões individuais. Nessas eleições cada uma das candidaturas teve um papel fundamental para que a legenda conquistasse três cadeiras. Sejam aquelas vinculadas a correntes, sejam todas as demais que se apresentaram na representação de segmentos sociais específicos, sejam as que fizeram muitos, seja as que obtiveram centenas de votos. Foi, sem dúvida, um projeto coletivo em que todos os petistas, candidatos ou não, tiveram um papel fundamental. Essa é uma das principais características do PT.
Representando um amplo espectro de reivindicações e pautas setoriais, o PT ressurge, não como fênix, mas como continuidade e como reencontro com suas origens. A estratégia eleitoral foi tão acertada que recuperou eleitores que em outras ocasiões preferiram votar no Psol ou no PCdoB para a câmara de vereadores. Novamente aqui merece aplausos a direção municipal do PT e seu presidente, grande articulador da chapa petista.
O PT, com os eleitos, se renova, se aproxima de suas origens e se credencia para o futuro das lutas socialistas. O pragmatismo cedeu lugar para a reafirmação ideológica. Isso não é pouco, reitera-se.
Muito provavelmente Ana Júlia e Vanhoni assumirão cadeiras na câmara municipal. Talvez até a Mandata Coletiva das Pretas, sexta colocada, com mais de 3.500 votos, outra grande novidade, negras, lésbicas, vinculadas aos movimentos populares.
Renovado, reconciliado com suas origens ideológicas, o PT deve estimular as candidaturas de seus vereadores e vereadoras eleitos à assembleia legislativa estadual. E serão candidaturas muito competitivas em Curitiba e região metropolitana.
Por fim, uma referência à candidatura a prefeito. O partido acertou na escolha. Paulo Opuszka 13 cumpriu, com disciplina e talento, a tarefa que lhe foi atribuída. É um fortíssimo candidato a deputado federal em 2020, peça importante na reconstrução partidária.
O PT de Curitiba não renasceu porque, ao contrário do que desejavam seus detratores, não estava morto. Evoluiu, se renovou, geracional e ideologicamente, como continuidade, como permanência, como reencontro consigo mesmo.
(*) Wilson Ramos Filho é professor na UFPR, presidente do Instituto Defesa da Classe Trabalhadora