Por Valter Pomar (*)
Graças ao camarada Vaccari, eu pude ler as Obras Completas do Lênin, de ponta a ponta. E assim pude confirmar que não era fake news: Lênin realmente disse que não se devia confiar nos advogados, especialmente naqueles que diziam ser membros do Partido
Claro que, como tudo em Lênin, aquela boutade dizia respeito a uma situação muito concreta, impossível de detalhar aqui.
Lembrei dessa história ao ler a matéria abaixo:
Se for verdade o que se atribui, nesta matéria, ao companheiro Aloizio Mercadante, ele seria merecedor de um troféu “zuper” da Associação de Pioneiros Comunistas da República Democrática Alemã. Pois só no finado socialismo real alguém poderia dizer, sem corar, que um partido devia sustentar um governo “em qualquer cenário”. Especialmente em se tratando de um governo de frente amplíssima.
Aliás, chega a ser engraçado ler este tipo de declaração, vinda de quem dizia o que dizia na época da queda do Muro de Berlim. Mas tudo bem, coerência e memória são mercadorias escassas nestes tempos bicudos.
Também é diversionismo afirmar que caberia ao Partido “sustentar a narrativa sobre os excelentes resultados na economia”. Se Aloizio se deu ao trabalho de ler o Manifesto que ele critica, constatará que essa “narrativa” está lá. Portanto, o que está em jogo é outra coisa, a saber: perceber que, apesar dos “excelentes resultados”, podemos por tudo a perder se aceitarmos ceder às pressões da Faria Lima.
Como diria o Olaf Scholz, Aloizio utiliza uma linguagem “obscura” quando afirma que “precisamos ter uma trajetória previsível das despesas obrigatórias, para garantir o investimento. O crescimento vai melhorar as condições para a estabilização da dívida pública”.
Para além disso, Aloizio deveria lembrar que a maior ameaça à “estabilização da dívida pública” vem – não das “despesas obrigatórias” – mas dos juros e da especulação, sem esquecer dos subsídios ao andar de cima. Mas, pelo visto, Aloizio aderiu à máxima haddadiana segundo a qual “a Faria Lima tem razão”.
Resultou. Mas um erro não precisa levar a outro.
ps1. Que Aloizio pense mesmo o que está publicado na imprensa não me surpreenderia. Afinal, noutros tempos ele também saiu em defesa da política de Palocci. Sem falar de sua participação no ocorrido em 2015. Sua fidelidade à política econômica “em qualquer cenário”, ademais de sincera e compreensível, é também conveniente no caso de ser necessário substituir alguém.
ps2. Como a realidade é sempre concreta e toda regra sempre tem exceção, a boutade sobre os banqueiros não vale, por exemplo, para a presidenta Dilma, que – ao contrário de outros integrantes de sua equipe – parece ter aprendido com os erros, especialmente os de 2015, e consegue combinar a função de presidenta de banco com uma cabeça de estadista, não de planilha.
(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT