Nota da CNTE critica agenda do MEC e nomeação em secretaria

Página 13 divulga nota da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), publicada nesta quinta-feira (12), onde a entidade manifesta profunda preocupação com a agenda instalada no Ministério da Educação (MEC), perpassando pela composição dos órgãos autárquicos, diretorias e secretarias ministeriais.

NOTA PÚBLICA (*)

 Agendas impostas por fundações privadas e nomeação de Secretária de Educação Básica, no MEC, são flagrantes desrespeitos ao direito à educação e aos profissionais da área. Não toleraremos!

 Ao tempo em que reiteramos o compromisso intransigente dos trabalhadores e das trabalhadoras da educação básica pública do Brasil na defesa da democracia e contra a tentativa de golpe que depredou as sedes dos Três Poderes da República, no último domingo (8) – devendo todos os envolvidos, direta ou indiretamente, serem punidos (sem anistia!) -, a CNTE se volta à pauta educacional do país para manifestar profunda preocupação com a agenda instalada no Ministério da Educação, perpassando pela composição dos órgãos autárquicos, diretorias e secretarias ministeriais.

Em relação às nomeações para o segundo escalão do MEC, chama a atenção a predominância de indicações alinhadas às pautas defendidas por fundações empresariais que não mantêm quaisquer elos com os movimentos sociais que deram sustentação à eleição do atual governo, mas que têm orientado decisivamente a política ministerial. Neste sentido, lamentamos o fato de vários nomes do mais alto gabarito e de diferentes regiões e setores da educação, que estiveram à frente da construção do Plano Nacional de Educação e da resistência contra o desmonte da educação pública brasileira, nos últimos seis anos, não estarem integrando a equipe de trabalho do MEC.

Entre os problemas que envolvem as nomeações no MEC, está a titular da Secretaria de Educação Básica, que até recentemente comandou a pasta educacional de Manaus – AM, sob a gestão do Prefeito Arthur Virgílio Neto (PSDB). Lá a gestão da então secretária foi marcada por agressões pessoais aos profissionais da educação manauaras – chamando sua organização de criminosa –, sem contar os indícios de irregularidades na gestão do Fundo da Educação Básica – FUNDEB e as manobras para melhorar o ranqueamento do município no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB, tendo promovido, segundo informações prestadas por profissionais da rede municipal, o fechamento de turmas noturnas dos anos finais do ensino fundamental que atendiam trabalhadores/as das periferias da cidade.

É indispensável registrar que as condutas da Secretária da SEB/MEC não são compatíveis com os propósitos de governos democráticos e populares que defendem a inclusão, o fim das desigualdades socioeducacionais e o respeito aos profissionais da educação, razão pela qual necessita ser revista com urgência.

Em relação a política do MEC, diferente da gestão do primeiro governo Lula (2003) – à época também eleito com grandes expectativas de mudanças na condução da política educacional, as quais se realizaram em grande medida  –, o que se observa, agora,  é o distanciamento do Ministério da Educação dos movimentos social e sindical que contribuíram em grande medida para a vitória do projeto democrático no país. De outro lado, há indiscutível acomodação de setores privados na estrutura do MEC, com pautas amplamente mercantilistas e privatistas para a educação pública.

O projeto de avaliação meritocrática do desempenho escolar, defendido pelo MEC em parceria com fundações privadas que atuam intermediando ou mesmo comercializando serviços de gestão, de conectividade escolar, de formação profissional, de organização curricular, de elaboração e venda de material didático, entre outros, nunca fez parte do programa do Partido dos Trabalhadores – PT, do qual o Presidente Lula é membro, tampouco compôs a plataforma do governo eleito. Este projeto é oriundo de experiências pontuais e bastante questionáveis do ponto de vista ético, educacional, social, cultural e profissional, amparado em pseudos resultados de melhoria da qualidade da educação, com o qual setores progressistas da sociedade civil e da educação pública não concordam.

A CNTE e parte expressiva das entidades sociais que defendem a educação pública, gratuita, laica, emancipatória, democrática, de qualidade socialmente referenciada, para todos e todas e com valorização de seus profissionais, combate historicamente a pseudo meritocracia escolar, que, mais recentemente no Brasil, tem sido sustentada por instrumentos aprovados no período pós-golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, com ênfase em:

  1. matriz curricular instrumental e superficial previamente determinada pela Base Nacional Comum Curricular – BNCC, aprovada na gestão golpista de Michel Temer;
  2. modulações para a formação e o trabalho docente dispostos em grande parte na BNC- Formação, formulada no desgoverno Bolsonaro;
  3. fomento à privatização da oferta escolar aprovada na reforma do Ensino Médio e nas diretrizes para a oferta escolar híbrida no Ensino Fundamental, esta última em discussão no CNE de composição AINDA integralmente bolsonarista;
  4. mitigação e burocratização da gestão democrática escolar, tendo como um dos pilares a Matriz Nacional de Competência do Diretor Escolar, também em debate no atual CNE;
  5. responsabilização do magistério e destruição das carreiras profissionais, promovendo políticas de bonificação e criando graves distorções, competições e até mesmo burla nos indicadores escolares para atingir metas numéricas.

Essa estrutura arcaica e similar à denunciada na obra da profª. Diane Ravitch, que retratou a pseudo meritocracia na educação dos EUA, sob o título “Vida e morte do grande sistema educacional americano”, ataca gravemente o direito à educação pública na medida em que restringe o conhecimento à matriz dos testes nacionais e aos anseios do capital, dificultando, inclusive, a mobilidade entre classes sociais. Entre os efeitos colaterais dessa política equivocada, constam as inúmeras formas de restrições ao acesso de bolsões da pobreza à escola pública – sobretudo dos quase 80 milhões de jovens e adultos brasileiros que não concluíram a educação básica –, uma vez que representam AMEAÇA aos indicadores educacionais dos sistemas de ensino, tal como denunciado na Secretaria de Educação de Manaus.

Também contribui para ampliar os abismos na oferta escolar, os repasses financeiros às redes de ensino vinculados a resultados pretensamente qualitativos, tais como os já previstos no VAAR- FUNDEB, no ICMS-Educação, em bonificações que desvalorizam as carreiras dos profissionais da educação, e, agora, com possibilidade de vincular mais transferências da União aos Estados, DF e Municípios através de um novo regramento meritocrático vinculado ao Fundo de Participação dos Estados – FPE e ao Fundo de Participação dos Municípios – FPM.

A CNTE luta por outro projeto de educação pública pautado na formação humanística, cidadã e para o trabalho (art. 205 da CF/1988) e que não seja meramente de competência instrumental. Por essa razão, defendemos:

  1. as revogações da Reforma do Ensino Médio e da BNCC;
  2. a autonomia universitária e mais qualidade na formação dos profissionais da educação (docentes e funcionários), com consequente revogação da Resolução CNE/CP nº 02/2019 (BNC- Formação) e imediata implementação do Decreto 752/2016;
  3. a superação na defasagem da formação docente (quase metade do magistério público no Brasil atua em áreas sem a devida formação) e maior regulação do ensino privado, com reformulação dos cursos de formação de professores, dado que mais de 60% dos atuais docentes da educação básica são formados em cursos a distância e em instituições de qualidade duvidosa;
  4. a valorização dos profissionais da educação, com ingresso por concurso público, piso salarial e diretrizes nacionais de carreira e condições dignas de trabalho;
  5. a aprovação do Sistema Nacional de Educação, com Custo Aluno Qualidade (CAQi e CAQ);
  6. a estruturação de um Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – SINAEB com perfil diagnóstico, sistêmico e que considere as expertises intraescolares, objetivando corrigir as políticas educacionais sem fraudes ou perseguições, conforme dispõe o art. 11, § 1º, II e as estratégias 3 e 7.21 da Lei 13.005, que aprovou o Plano Nacional de Educação;
  7. a democratização de todos os canais de formulação, implementação, acompanhamento e avaliação das políticas educacionais, incluindo a gestão e o financiamento dos sistemas de ensino e das unidades escolares.

Diante do exposto, a CNTE espera que o MEC reposicione suas agendas e parcerias, a fim de resgatar as dívidas históricas para com a educação brasileira e seus profissionais, fortalecendo o direito à educação pública, gratuita, emancipadora, democrática, de qualidade socialmente referenciada, com universalização do acesso e combate ao analfabetismo literal e funcional.

A CNTE também aguarda a confirmação de audiência com o Ministro da Educação, solicitada há mais de uma semana, bem como o anúncio oficial, pelo MEC, do percentual de 14,95% para atualização do piso salarial nacional do magistério em 2023. O referido anúncio se ampara na Lei 11.738 e nos pareceres do MEC e da AGU, julgados constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, em âmbito da ação direta de inconstitucionalidade nº 4.848, tal como é feito, ininterruptamente, desde 2010, pelo MEC.

Por um MEC democrático, plural e emancipador, e com representantes da sociedade civil que defendam verdadeiramente o legado de Paulo Freire, patrono da educação brasileira!

Brasília, 12 de janeiro de 2023

Diretoria da CNTE


(*) Publicado https://www.cnte.org.br

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