O PCO e a aparente ironia

Por Valter Pomar (*)

O Partido da Causa Operária publicou um texto criticando a “esquerda eleitoreira”.

O texto está aqui: https://causaoperaria.org.br/2024/a-esquerda-eleitoreira-que-nao-entende-nem-de-eleicoes/

Tirando as afirmações grandiloquentes e meramente desqualificatórias, o que o texto do PCO diz de substancial -na minha opinião- é o seguinte:

-na França e na Inglaterra, “a direita foi vitoriosa com um golpe eleitoral”;

-o Labour “foi vitorioso, pois a burguesia preparou por anos o seu retorno”;

-o Labour “é dirigido por um direitista pior que Macron, Keir Starmer”;

-“Macron e Hollande [são] dois imperialistas neoliberais”;

“o FI, caso não tivesse entrado nessa frente, teria crescido muito mais”;

-“o principal motivo da derrota de Le Pen foi o sistema eleitoral antidemocrático francês”;

-“caso houvesse mais democracia na França, a esquerda teria sido derrotada pela extrema direita”;

-“no segundo turno, enquanto a esquerda de verdade, o FI e os outros partidos menores, deveriam apresentar um programa de esquerda, se aliaram com os antigos algozes dos trabalhadores”;

Das afirmações acima, as únicas que não vejo necessidade de debater são as referentes a Starmer, Hollande e Macron.

As demais são todas questionáveis.

Sem a Frente Popular, a esquerda não teria alcançado o primeiro lugar no segundo turno das eleições. Sem a Frente Popular, o segundo turno seria disputado entre Macron e Le Pen. Sem a Frente Popular, pouco importa o resultado individual da França Insubmissa, pois o resultado político seria a derrota global da esquerda.

O sistema eleitoral – tanto na França quanto na Inglaterra – distorce a vontade popular. No caso inglês, o sistema eleitoral superestimou o resultado dos trabalhistas. No caso francês, subestimou o resultado da extrema direita. Mas nenhuma das situações permite concluir que “a direita foi vitoriosa com um golpe eleitoral”, nem permite concluir que “caso houvesse mais democracia na França, a esquerda teria sido derrotada pela extrema direita”.

O Labour é o que é. Mas dizer que foi a burguesia que preparou o seu retorno é subestimar o principal recado da eleição: o protesto contra os tories. Que se manifestou de três maneiras: redução do voto na direita tradicional, vazamento de votos para a extrema-direita e voto no trabalhismo.

Enfim, o PCO faz uma salada.

Entre os vários ataques feitos ao autor dessas linhas, o PCO me acusa do seguinte: “sem aparente ironia, ele afirma que Macron, Mélenchon e Hollande são amigos! A confusão de Hollande com Mélenchon faz sentido, ambos estão dentro da mesma frente, a Nova Frente Popular (NFP). Mas é absurdo falar que Mélenchon é amigo de Macron”.

Verdade seja dita, a referência aos amigos foi feita por Lula, não por mim.

Lula, numa postagem no X, disse o seguinte: “Espero que meus amigos Macron, Melénchon e Hollande se coloquem de acordo para montar um governo que atenda aos interesses do povo francês”.

Aliás, meu texto criticado pelo PCO começa exatamente citando esta postagem de Lula, como pode ser constatado no endereço a seguir: https://valterpomar.blogspot.com/2024/07/viva-parte-da-franca.html

Quem escreveu os textos do PCO não viu a citação de Lula? Ou viu e achou melhor não fazer referência ao presidente?

Seja como for, me penitencio: eu devia ter colocado aspas, para que a ironia ficasse “aparente”.

E compreendo a preocupação do PCO com as ironias, aparentes ou não.

Recentemente o líder máximo do PCO foi fazer uma delas e o resultado pode ser visto aqui, a partir de 27:50: https://www.youtube.com/watch?v=gXayzldwxZI

 

 

Por essas e por outras (inclusive pela frase “caso houvesse mais democracia na França, a esquerda teria sido derrotada pela extrema direita”), sigo pensando o mesmo que já escrevi antes, acerca das afinidades eletivas entre o PCO e a extrema-direita.
(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT

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