Texto publicado originalmente no site da OAB-PR
A OAB Paraná cumpriu desagravo no dia 18 de junho em favor do advogado Renato de Almeida Freitas Júnior. O ato público foi realizado durante sessão do Conselho Pleno frente aos constrangimentos físico e moral sofridos pelo advogado diante da conduta praticada por policiais militares, em especial o sargento Marcos Santiago Simionato, lotado no 12º Batalhão da Polícia Militar do Paraná, durante uma abordagem truculenta na Praça do Gaúcho/Redentor.
Renato de Almeida Freitas Junior aguardava a chegada de amigos na Praça do Gaúcho em dezembro de 2018 para a realização de uma reunião quando foi surpreendido pela atuação arbitrária da Polícia Militar do Paraná. Ao chegar no local, uma viatura da Polícia Militar estacionou nos arredores e, sem qualquer motivo aparente, abordou e revistou o grupo em que se encontrava o advogado.
Freitas Junior afirmou que uma vez não havendo mandado de prisão contra qualquer um dos que ali estavam presentes, não tendo sido encontrado qualquer ilícito e, não estando eles cometendo qualquer crime, teriam direito de permanecer na praça, momento no qual se identificou como advogado. Neste momento foi questionado pelo Sargento Simionato, que perguntou o número de inscrição na OAB e, depois de respondido, algemou o advogado, jogando-o no porta-malas da viatura. Sob ameaças, agressões, humilhações e ofensas, Renato foi levado de forma arbitrária para um módulo policial administrativo no centro da capital, que não se tratava de uma Delegacia de Polícia.
O presidente Cássio Telles descreveu os detalhes do Boletim de Ocorrência, frisando a narrativa construída pela PM de que o advogado teria tentado intimidar a equipe ao se intitular advogado, usando de sua “suposta posição” para criticar a ação policial e desobedecendo a ordem de abordagem. “Além de causar indignação nos leva a uma reflexão sobre a atuação de policiais como esse atuando no sentido de privar a liberdade de cidadãos, a partir de presunções”, disse Telles.
“Manifestamos absoluto repúdio à conduta que este policial e sua equipe exerceu contra você. Toda a advocacia paranaense faz um brado no sentido de que as autoridades públicas cumpram os seus deveres, que tenham em mente que estão a serviço da população e que o que deve orientar suas atitudes são os valores previstos na Constituição. Repudiamos o ato ao mesmo tempo em que manifestamos nossa solidariedade ao nosso colega”, concluiu o presidente da seccional.
Na nota de desagravo, lida pela vice-presidente Marilena Winter, a OAB Paraná conclama a advocacia a repudiar qualquer violação de direitos garantidos na Constituição Federal. No documento, a seccional frisa que o direito do exercício de advogar impõe às autoridades civis e militares a observância do tratamento digno à advocacia. A Ordem destaca ainda que o advogado sofreu constrangimentos físico e moral, que atingiram não só o indivíduo, mas o advogado e, desse modo, toda classe.
O secretário-geral Rodrigo Rios, presidente da Câmara de Defesa de Prerrogativas, defendeu a tomada de ações mais enérgicas contra situações de violação de prerrogativas do advogado e direitos do cidadão como a experienciada por Renato de Almeida Freitas Junior, manifestando a solidariedade da classe ao advogado.
“Lembro-me como se fosse hoje do momento em que recebemos este caso. Gostaria, Renato, que levasse daqui a nossa solidariedade. Sempre estaremos com você. Os nossos não têm cor, não tem sexo, são seres humanos que merecem respeito. Sinta-se abraçado e saiba que pode contar conosco”, disse o diretor de Prerrogativas Alexandre Salomão.
Em um emocionante relato sobre sua trajetória pessoal, Renato afirmou que aprendeu muito cedo o valor da liberdade. Trabalhando desde muito jovem para ajudar a família, apenas em 2007 recebeu a notícia de que havia passado no vestibular em Direito pelo regime de cotas. “Encontrei ali na universidade um tratamento marcado pela humanidade. Ali a linguagem não era a da violência, como a dos bairros de onde eu vinha. Aprendi que era possível uma outra forma de linguagem. Em 2016 passei na prova da OAB e passei no Exame, depois no concurso da Defensoria Pública. A universidade me deu a possibilidade de perceber o mundo de outra forma e o Direito foi uma delas. Isso dá um sentimento de igualdade, de pertencimento ao mundo, muitas vezes enganosa”, afirmou.
O advogado relatou que antes do evento de 2018 já havia passado por uma abordagem policial em 2016, em que foi violentamente detido. Depois de uma série de humilhações e violências sofridas, praticamente abandonou o Direito. “Após aquele episódio me vi um nada, conforme eles me pintaram”, disse. “Em 2018 estava na Praça do Gaúcho, num dia de sol, e os policiais nos abordaram num flagrante ato de racismo. Fomos abordados numa abordagem truculenta. Ao final da abordagem, quando o PM falou ‘Sumam daqui, seus lixos’, eu disse que não podia, e que tinha o direito de ir e vir e permanecer ali. O PM foi até a viatura e quando voltou já sabia o que iria acontecer”, disse. “É uma vida de pessoas afirmando que você é menos, não é fácil, é uma luta”, afirmou.