Por Valter Pomar (*)
Depois de meu texto de 13 de abril, pensei que o cidadão havia encontrado algo mais útil com o que se preocupar. Errei: no dia 29 de abril ele voltou à carga, como se pode ler aqui: Mais uma vez, Valter Pomar: errar é humano, insistir no erro… | Brasil 247
Para variar, neste texto Pimenta leva o debate para algum lugar distante do ponto de partida, a saber: a liberdade irrestrita de Elon Musk. Lembro deste ponto de partida, pois é essa a polêmica que interessa a imensa maioria das pessoas.
Na minha opinião, nesta polêmica – e em outras assemelhadas – o PCO e Pimenta são aliados objetivos da extrema-direita. Ele ficou chateado com essa minha afirmação, embora me acuse ser um “propagandista incosciente da política do imperialismo”.
Aliás, o “estilo” literário de Pimenta é um caso a parte, que o pessoal da teologia conhece muito bem. Neste estilo, afirmações a priori são apresentadas como se prova fossem. Um bom exemplo deste estilo está na seguinte afirmação: “o método marxista (…)consiste em esclarecer as ideias políticas e teóricas à luz do marxismo”. Ou seja: ser marxista é… ser marxista, ideias confirmam ideias.
Do meu ponto de vista, o chamado método marxista toma a prática como critério da verdade, consiste na análise concreta da situação concreta. E, quando olhamos a prática, uma constatação é: ao defender Elon Musk e vários escrotos do gênero, o PCO e Pimenta se tornam aliados objetivos da extrema-direita; ao sustentar a tese da liberdade irrestrita, o PCO e Pimenta adotam posições similares às dos ultraliberais, às dos anarcocapitalistas et caterva.
Sei que o marxismo é uma tradição ampla, onde há de tudo. Mas acho que o PCO e Pimenta causam um belo prejuízo ao marxismo, quando defendem o que defendem, atribuindo isso ao marxismo.
Vou dar uns exemplos, sacados do texto mais recente cometido por Pimenta.
Segundo Pimenta, “a caracterização de partidos e elementos de esquerda como pequeno-burgueses nada tem a ver com se e onde trabalham”. Na minha opinião, errado. Vários elementos influem na caracterização do caráter de classe de uma orientação política. Um desses elementos é a classe ou fração de classe a que pertencem as pessoas que formulam esta orientação. Não é o único elemento, como demonstra o caso sempre citado de Engels. Mas é um dos elementos.
Pimenta diz, sobre o debate acerca da ditadura do proletariado, que “esse não é o problema colocado pela discussão sobre a liberdade de expressão (irrestrita, porque qualquer outra coisa é censura, ou seja, restrição da expressão). Não estamos na e nem na véspera da ditadura proletária”. Errado. A questão do caráter de classe do Estado, a questão do caráter de classe da democracia, estão postas antes, durante e depois de uma revolução. Ao defender a “liberdade de expressão irrestrita”, sem perguntar para quem, Pimenta e o PCO aderem a uma concepção liberal de democracia.
Pimenta diz que “a política proletária para o longo período de ditadura da burguesia (…) é a luta por reformas sob o capitalismo”. Errado. Posto desta forma reducionista, a política da esquerda revolucionária não se distinguiria da política da esquerda reformista. Acreditar que “a luta pelas reformas (…) é o meio para o objetivo final que é a revolução socialista” é simplificar o problema, roçando o alambrado que no final do século XIX Berstein atravessou de corpo inteiro. Se as coisas fossem como Pimenta diz, a revolução socialista já teria triunfado em todas as partes, pois se há algo que a classe trabalhadora e a maior parte da esquerda fazem é lutar por reformas.
Pimenta diz que “a política marxista para a questão democrática” inclui a “luta pela liberdade de expressão irrestrita, a luta pelo alargamento da democracia burguesa, o que permite um maior escopo de ação para o proletariado e as massas exploradas”. Errado. A luta pelas liberdades democráticas para o proletariado não é igual a luta pela liberdade de expressão “irrestrita” (por exemplo, para Elon Musk). Pelo contrário, a luta pela liberdade dos setores populares implica em restringir as liberdades da classe dominante.
Aqui um detalhe literário: Pimenta sabe muito bem que os teóricos fundadores da tradição a qual ele diz pertencer, sempre apontaram que a democracia tem caráter de classe. Sabe, também, que foi a direita do movimento socialista quem questionou o caráter de classe da democracia, afirmando como alternativa o caráter supostamente “universal” da democracia. Sabedor disto tudo, ele tenta escapar da armadilha que criou para si mesmo dizendo que “direito” é uma coisa maravilhosa e que tudo que não é maravilhoso é “privilégio”. E como ele sabe muito bem que na vida real não é assim, ele tenta sair pela tangente dizendo o seguinte: “a menos que Pomar utilize como definição de direito, a mais reacionária e formalista das definições, ou seja, que tudo o que está escrito na lei é um direito. Contudo, se fosse assim, a ditadura militar brasileira e até o regime hitleriano seriam a personificação do estado de direito”.
A seguir nessa linha, Pimenta vai acabar defendendo o “estado democrático de direito” como sendo o suprassumo da democracia proletária.
Aos fatos: tanto o nazismo, quando as ditaduras “normais” e também as “democracias burguesas”, têm o seu “estado de direito”. O que as diferencia, no plano estritamente político? O quanto de liberdades democráticas são conquistadas pela classe trabalhadora.
O tema de fundo é que o direito também tem caráter de classe. Não existe “o” direito, não existe “a” democracia. Tudo, absolutamente tudo que existe numa sociedade desigual, ganha sentido a partir desta desigualdade.
Pimenta diz que eu não acredito “em lutar por direitos democráticos sob o capitalismo”, mas acredito “na capacidade da classe operária reprimir… os capitalistas sob o capitalismo. E pergunta: “sendo que o Estado sob o capitalismo é, sendo obrigados a ser tautológicos, o Estado dos capitalistas, quem é que vai retirar o direito dos capitalistas, o PT?”
Respondo: eu defendo lutar por direitos democráticos, para a classe trabalhadora, sob o capitalismo. E acho possível retirar direitos dos capitalistas, sob o capitalismo.
Tanto isso é verdade que os capitalistas lutam o tempo todo para revogar a legislação trabalhista, para revogar a legislação previdenciária, para alterar a legislação eleitoral, para ampliar a tutela militar etc. Pois eles sabem que só retirando os direitos da classe trabalhadora, eles podem ampliar os direitos da classe dominante.
Pimenta diz que “os jornais burgueses que foram fechados em revoluções o foram como resultado da própria luta e da atitude contrarrevolucionária da burguesia e não como norma”. Errado. Concordemos ou não com isso, o fato é que em todas as revoluções socialistas, mais cedo ou mais tarde impôs-se a “norma” e os jornais da antiga classe dominante foram proibidos de existir.
Pimenta diz que “por algum motivo misterioso, nosso autor acredita que a restrição da democracia burguesa seria benéfica para os trabalhadores”. Errado. Primeiro, no que eu acredito é outra coisa: acredito que a restrição da democracia para a burguesia seria benéfica para os trabalhadores. Segundo, não há nada de misterioso. Há motivos de sobra para pararmos de chamar de “democracia burguesa” o conjunto das liberdades conquistadas pelo povo contra a burguesia. Afinal, as liberdades arrancadas pelo povo, desde 1789 até hoje, não fazem parte da “democracia burguesa”; foram conquistadas contra a burguesia e contra a “democracia burguesa”.
Pimenta diz que “em regime capitalista, na realidade, qualquer restrição dos direitos democráticos significa amarrar as mãos da classe trabalhadora na luta contra a burguesia”. Errado. Por exemplo: é correto restringir os “direitos democráticos” dos nazistas, dos racistas, dos homofóbicos etc. Claro que Pimenta não concorda e é por isto, entre outros motivos, que ele sai em defesa de tantos escrotos, como por exemplo Elon Musk.
Para não dizer que não falei de flores, estou de acordo com Pimenta no seguinte: “a classe operária pode e deve utilizar a democracia burguesa, por mais restrita que seja, contra a própria burguesia”. Totalmente de acordo. Por isso, aliás, é que no caso Moraes versus Musk, considero possível apoiar algumas medidas (não todas) adotadas por Moraes.
Pimenta diz que “o direito é para todos. Se existe liberdade de imprensa, qualquer pessoa pode abrir um jornal”. Haha. Só rindo. Isto não é verdade. Primeiro, pelo motivo que o próprio Pimenta aponta: a desigualdade geralmente torna o usufruto desse direito um fato limitado ou até mesmo uma ficção”. Segundo, porque não basta “abrir um jornal”: é preciso que os meios de comunicação da classe trabalhadora sejam capazes de competir com os meios de comunicação dos capitalistas. E poderíamos continuar a lista de obstáculos, até concluir que, mesmo quando o direito abstrato parece universal, na prática ele se torna uma “ficção”.
Pimenta sabe disto e chega a cometer a seguinte frase: “não podemos concluir que o direito político seja uma ficção absoluta, apenas relativa”. Ou seja: o tal “direito” que ele vinha elogiando é reduzido à condição de ficção. Relativa, mas uma ficção. E o que isso quer dizer? Que para alguns o tal direito existe, para outros não existe. Portanto, o Tico do Pimenta acaba de demonstrar que o Teco do Pimenta está mentindo, quando fala que “o direito é para todos”.
Pimenta diz que “a liberdade de imprensa, se existe, é real para todos”. Vou desenhar o problema de outra forma: a força das classes, se existem, é real para todos. Mas para que a força de uns seja maior, é preciso que a força de outros seja menor. Ou seja: trata-se de um problema de correlação de forças. Não se trata de saber se é “real” ou não, se trata de perceber que é real para uns em detrimento de outros.
Pimenta diz que “se as liberdades democráticas não significassem nada, nem haveria sentido em se lutar por elas”. Verdade. O problema está em outro lugar, a saber: a ampliação das liberdades democráticas da classe trabalhadora implica em restringir as liberdades democráticas da burguesia. As vezes parece que Pimenta sabe disso, apenas troca as palavras “liberdades democráticas da burguesia” por “privilégios”. Mas ao defender os direitos democráticos de Elon Musk, ele demonstra que não se trata apenas de uma questão de palavras.
Pimenta diz que “para fazer as massas compreenderem o caráter de classe da democracia burguesia é necessário que exista essa democracia, mesmo na forma completamente bastarda e fictícia que temos no Brasil e, portanto, é uma necessidade fundamental que lutemos pela mais ampla e mais irrestrita democracia política sob o capitalismo”. Parcialmente errado. Enquanto existir capitalismo, não haverá a “mais ampla e irrestrita democracia política”. Logo, lutamos por algo que não é realizável nos marcos do capitalismo. Isso porque existe a tal democracia burguesa. Aliás, notem: de repente, caído de paraquedas, aparece a frase “caráter de classe da democracia burguesa”. Ora, se a “democracia” tem “caráter de classe”, então as “liberdades democráticas” também têm “caráter de classe”; logo o que é “irrestrito para alguns” é “restrito” para outros.
Concluindo: Pimenta diz ser ridículo “acreditar que alguma força no mundo seja capaz de restringir o ‘direito de mentir’.” Entendo que Pimenta se sinta afetado por isto. E, de fato, seria ridículo achar que é possível eliminar a mentira. Mas não há nada de ridículo em achar que é possível restringir o “direito de mentir”. Dou um exemplo: a justiça eleitoral pode ou não retirar do ar propaganda eleitoral mentirosa? Outra pergunta: os nazistas podem fazer manifestações ou elas devem ser proibidas? Musk pode falar e fazer qualquer coisa?
Termino por onde comecei: nesta questão em tela, o PCO defende posições que a tornam aliada objetiva da extrema-direita. Aliás, como ouvinte da Jovem Pan e observador das redes sociais da extrema-direita, vejo que o outro lado percebe isto. Ademais, considero que o PCO é uma seita, cujo comportamento lembra em alguns aspectos o MR8 do final dos anos 1970. No que vai dar este coquetel explosivo, talvez só o Dugin saberá dizer.
(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT
SEGUE O TEXTO COMENTADO
Mais uma vez, Valter Pomar: errar é humano, insistir no erro…
“‘Marxismo’ de Pomar fica devendo”, escreve Rui Costa Pimenta
Valter Pomar volta à carga contra o PCO num texto que revela um certo estado de alienação da realidade. Repete todos os argumentos que refutamos, sem considerar a refutação. Errar é humano, diz o ditado, mas insistir no erro…
Segundo o marxista Pomar, ele não pode ser considerado um pequeno-burguês pois “todos sabemos quem, nesta vida, efetivamente trabalha para ganhar seu pão”. Aparte do fato de que o trabalho de intelectuais e profissionais liberais não é um trabalho proletário e deixando de lado a insinuação de que eu não trabalho (outra calúnia, sem justificativa), a caracterização de partidos e elementos de esquerda como pequeno-burgueses nada tem a ver com se e onde trabalham. Aqui, também o “marxismo” de Pomar fica devendo. Mas vamos demonstrar o método pequeno-burguês que Pomar tem usado nesta polêmica: “Pela graça do bom pai, estou viajando e sem tempo para ler, muito menos responder, toda a verborragia que o Rui Costa Pimenta e o PCO andam escrevendo a meu respeito.
Acontece que não consigo resistir ao estilo do referido cidadão, estilo que classifico como de assédio doentio (aliás, este é mais um ponto de contato com a extrema direita, além das já citadas defesas de vários escrotos, de Musk e de Brazão, o convívio com o Movimento Nova Resistência etc.). Novamente, vou deixar de lado grande parte das abobrinhas, inclusive a minha inclusão na “esquerda pequeno burguesa”. Durante toda a discussão, Pomar se esforça para tentar diminuir o oponente. O PCO seria uma “seita”, defendemos “escrotos”, nossas respostas às suas críticas seriam “assédio doentio”, etc. São comentários reveladores do caráter pequeno-burguês das concepções de Pomar: ele não pode nunca ficar por baixo e, por esse motivo, procurar desqualificar o adversário, assumindo uma empostação arrogante mesmo que não tenha motivo para isso. Nos artigos anteriores insiste em que somos uma “seita”, o que quer que ele entenda por isso, uma vez que nunca explicou, diz que prefere ignorar nossos argumentos porque não seriam merecedores da sua sapiência e do seu precioso tempo e, novamente, sai pela tangente no debate classificando nossas posições de “abobrinhas”. Está claro que em momento algum justifica tudo isso. É só para induzir o leitor incauto a acreditar na importância que ele atribui a si mesmo. O fato objetivo é que Pomar escreveu uma meia dúzia de artigos de crítica ao PCO e, ao ser respondido, foi incapaz de refutar um único argumento nosso. Na verdade, nosso grande crime seria responder a críticas sem fundamentação. O método marxista, porém, consiste em esclarecer as ideias políticas e teóricas à luz do marxismo. Não debatemos desopilar o fígado, mas para defender um programa político. Os textos do nosso contraditor estão tão longe desse método como a terra está da lua.
Isto é dito pela pessoa que publica sistematicamente artigos de “crítica” ao PCO sem qualquer provocação da nossa parte. Ao leitor de julgar quem sofre de “assédio doentio”. Seria útil que o Sr. Valter Pomar explicasse tanto a nós como aos leitores qual é a razão da sua implicância com uma “seita” que só fala “abobrinhas”, particularmente quando esta “seita” tem uma atitude muito correta com o seu partido, o PT. Não procuramos retirar ao militante petista o direito de escrever o que quiser, com a motivação que tiver, mas para esclarecimento do público geral seria importante explicar o que destaca o PCO de vários outros setores da esquerda, inclusive dentro do seu próprio partido, que, na nossa opinião merecem maior empenho crítico.
Novamente, neste artigo, somos apresentados com uma completa incompreensão do caráter da luta democrática: “Segundo Pimenta, ‘a única política séria sob a ditadura da burguesia seria a de lutar para ampliar o mais possível os direitos do povo trabalhador, o que obviamente é uma luta contra a burguesia'”.
É verdade. E é exatamente por isso que vários marxistas defendiam e seguem defendendo a ‘ditadura do proletariado'”. Logicamente, porém, esse não é o problema colocado pela discussão sobre a liberdade de expressão (irrestrita, porque qualquer outra coisa é censura, ou seja, restrição da expressão). Não estamos na e nem na véspera da ditadura proletária. Ao contrário, nossa tarefa é a de organizar a classe operária para que ela, diante da eclosão da revolução (que não depende de nós) esteja preparada para dirigi-la. Ora, isso significa que temos que definir qual é a política proletária para o longo período de ditadura da burguesia ou, dito de outra forma, qual é a política segundo a qual essa preparação possa ser realizada. É uma questão simples: é a luta por reformas sob o capitalismo. A luta pelas reformas, políticas e econômicas, é o meio para o objetivo final que é a revolução socialista. Esclarecido esse problema, qual deve ser a política marxista para a questão democrática? Sem dúvida, as reformas democráticas, entre elas a luta pela liberdade de expressão irrestrita, a luta pelo alargamento da democracia burguesa, o que permite um maior escopo de ação para o proletariado e as massas exploradas. Será demais dizer que isso é o be-a-bá do marxismo, que o nosso crítico não compreende este problema elementar e que repete os seus argumentos em entrar no mérito desta consideração?
Se passarmos o tempo respondendo com a ditadura do proletariado aos problemas do presente, logicamente nunca chegaremos à ditadura do proletariado. Pior, tal conduta seria a conduta de um propagandismo estéril e sectário, por falar em seitas.
Tudo aquilo que Pomar fala sobre a ditadura do proletariado tem esse pequeno senão: não estamos na ditadura do proletariado, mas na ditadura da burguesia.
Somos obrigados a explicar novamente que o direito de escravizar não é de fato um direito. Que monopólio do voto pelos homens ou pelos ricos como nos primeiros estágios do regime parlamentar não é um direito, mas um privilégio e uma ditadura, um fato antidemocrático. A menos que Pomar utilize como definição de direito, a mais reacionária e formalista das definições, ou seja, que tudo o que está escrito na lei é um direito. Contudo, se fosse assim, a ditadura militar brasileira e até o regime hitleriano seriam a personificação do estado de direito. Se o nosso contraditor não consegue entender nem mesmo isso, o que podemos fazer?
Pomar diz que não quer censurar os trabalhadores, mas Elon Musk. Quer dizer, ele não acredita em lutar por direitos democráticos sob o capitalismo, mas acredita, pasmem, na capacidade da classe operária reprimir… os capitalistas sob o capitalismo. Sendo que o Estado sob o capitalismo é, sendo obrigados a ser tautológicos, o Estado dos capitalistas, quem é que vai retirar o direito dos capitalistas, o PT?
Uma vez mais, confundindo alhos com bugalhos, o petista esclarece que “censurar os jornais burgueses, fechar os jornais burgueses, impedir a burguesia de mentir para o povo, foi algo comum a todas as revoluções socialistas.” Somos novamente obrigados a chamar a atenção para o fato de que não estamos em uma revolução e nem mesmo numa etapa pré-revolucionária. Porém, ressalvamos que os jornais burgueses que foram fechados em revoluções o foram como resultado da própria luta e da atitude contrarrevolucionária da burguesia e não como norma.
Mais confusão: “Pois então: a ‘ditadura’ que eu pretendo ‘restringir’ é a ditadura exercida pela burguesia contra a classe trabalhadora. Acontece que essa ditadura é, ao mesmo tempo, uma democracia para a burguesia; a democracia da burguesia é a ditadura para os trabalhadores. Repito: não fui eu quem inventou esse jeito de pensar, quem fez isso foi o Marx, foi o Lenin etc e tal.” Quando ouvimos tais explicações terminando com a invocação da autoridade de Marx ou Lênin, chegamos a sentir dó dos grandes marxistas, senão de nós mesmos. Segundo Pomar, num regime capitalista (lembrando sempre que estamos no regime reacionário do Brasil de abril de 2024 e não na futura ditadura do proletariado ou em meio a uma revolução), devemos lutar para restringir… a democracia burguesa! Por algum motivo misterioso, nosso autor acredita que a restrição da democracia burguesa seria benéfica para os trabalhadores. Em regime capitalista, na realidade, qualquer restrição dos direitos democráticos significa amarrar as mãos da classe trabalhadora na luta contra a burguesia. A classe operária pode e deve utilizar a democracia burguesa, por mais restrita que seja, contra a própria burguesia.
É um erro no entanto, pensar que a restrição dos direitos democráticos seja um problema para a própria burguesia. A burguesia de verdade, não a imaginária de Valter Pomar, no entanto, não pensa assim. Quando os direitos democráticos (da democracia burguesa) tornam-se um meio para as massas ameaçarem a sua dominação, a burguesia apela para restrição total dos direitos democráticos burgueses… contra as massas. Quem estiver acompanhando esse debate deve pensar que ninguém nunca viu uma ditadura como o regime militar no Brasil e em outros países.
Pelo aqui exposto concluímos que, se Pomar representa a ala marxista e revolucionária do PT, a situação desse partido está muito mais confusa do que parece e, somos obrigados a dizer, parece já muito confusa.
Pomar insiste: “para ele (para mim, n. do r.) existiria um direito genérico, que ou é restringido para todos, ou é ampliado para todos. Mas na vida real, na sociedade de classes, não funciona assim. Numa sociedade dividida em classes, para ampliar o direito de uns, é preciso restringir o direito de outros.” Já demonstramos que o direito, estamos falando logicamente do direito democrático, só se opõe a privilégios e ditaduras, mas aqui ele introduz uma outra novidade: não existe um direito genérico, para todos os cidadãos. Isso é obviamente falso. Do ponto de vista do regime burguês, o direito é para todos. Se existe liberdade de imprensa, qualquer pessoa pode abrir um jornal. Se este direito for restringido pela lei ou arbitrariamente para qualquer setor social, ele torna-se um privilégio e estamos diante de um fato autoritário, ou seja, do abandono total ou parcial do estado de direito. Outra coisa, que parece ser o que pensa o nosso contumaz polemista, é que a desigualdade econômica e social torne o usufruto desse direito um fato limitado ou até mesmo uma ficção. Mas, mesmo desse ponto de vista, não podemos concluir que o direito político seja uma ficção absoluta, apenas relativa.
A liberdade de imprensa, se existe, é real para todos. Pomar, por exemplo, mantém um blogue que é um órgão de imprensa pequeno, mas que existe. Ele está exercendo seu direito democrático e embora com limitações econômicas, ele continua sendo real. É por isso que os marxistas sempre lutaram pela democracia burguesa política em oposição à ditadura. Se as liberdades democráticas não significassem nada, nem haveria sentido em se lutar por elas. Até mesmo para fazer as massas compreenderem o caráter de classe da democracia burguesia é necessário que exista essa democracia, mesmo na forma completamente bastarda e fictícia que temos no Brasil e, portanto, é uma necessidade fundamental que lutemos pela mais ampla e mais irrestrita democracia política sob o capitalismo.
No que diz respeito às liberdades políticas e civis, é absolutamente necessário que sejam absolutas e irrestritas: liberdade de pensamento e de palavra, direito de manifestação, de greve, etc. porque qualquer tentativa de restrição e de limitação desses direitos em nome da “necessidade social”, do bom senso, etc. é um avanço da ditadura da burguesia sobre os direitos do povo.
A confusão pomariana é como um novelo de linha, quanto mais se puxa, mas aumenta. Segundo ele, “por óbvio, eu não defendo censura sobre os trabalhadores. Quem defende censura contra os trabalhadores é quem defende o Musk.
Eu, pelo contrário, defendo restringir o direito de mentir do Musk, assim como defendo restringir o direito de mentir dos oligopólios.”
Além do ridículo de acreditar que alguma força no mundo seja capaz de restringir o “direito de mentir”, quem vai fazer isso? Pomar, enebriado pela cruzada do Sr. Alexandre de Moraes e pelos arroubos totalitários do imperialismo, acredita que seja realmente possível reprimir a classe dominante. Por isso, temos que dizer que o alvo fundamental da campanha pela censura, orquestrada desde Washington, não é Musk, Bill Gates ou outro empresário da Internet, mas as massas do mundo todo que tendem a se rebelar contra os “democráticos” senhores do mundo. Pomar é apenas um propagandista inconsciente da política do imperialismo.
Toda essa enorme confusão política está refletida na política do PT que ignora a fantasia da ditadura e da revolução e adapta totalmente ao atual regime política reacionário, denominado por ele como “a democracia” e não propõe nenhuma reforma política por menor que seja. A ala do Sr. Pomar também não propõe nada nesse sentido e o sonho da repressão da burguesia se transforma numa adaptação passiva ao regime político burguês.
Para concluir, uma palavra aos enfadonhos canceladores que apoiam a confusão de Valter Pomar dizendo que devemos ser cancelados pelo Brasil247. Vocês não têm argumentos para debater e demonstram isso com as costumeiras tiradas grosseiras e ofensivas e como o uso do cachimbo faz a boca torta, quanto mais gritam “cancelamento!” mais se tornam incapazes de argumentar. Esse é um dos motivos do crescimento da direita no nosso país e no mundo.