1°de Maio e o valor da vida

Por Lucas Rafael Chianello (*)

Rodovia em São Paulo, inaugurada em 1º de maio de 1982,  foi batizada como rodovia dos Trabalhadores; hoje é a rodovia Ayrton Senna, em SP

Há 30 anos e um dia morria, em Ímola, o austríaco Roland Ratzenberger, que teve a morte ofuscada pela de Ayrton Senna, no dia seguinte.

Numa aula, a residentes de medicina do hospital Maggiore, de Bolonha, onde já descansavam ambos os corpos, o excêntrico médico legista Pierludovico Ricci, que manuseava cadáveres sem luvas, ensinava que a vida de alguém não valia mais que de outrem.

Ainda sim, há 30 anos escutamos a mesma ladainha: “F-1 era bom no tempo do Senna”, que sequer superou os feitos do maior rival, Alain Prost, que foi superado por Schumacher, Vettel e Hamilton e até o final da temporada terá Verstappen com mais títulos do que ele.

Quando os Beatles se separaram, John Lennon dizia que não havia o que lamentar, pois tudo o que eles fizeram estava gravado e à disposição de quem quisesse ouvir.

O mesmo acontece com Senna: tudo está fartamente documentado na era da eletrônica, sem que se passe um detalhe sequer.

O detalhe que infelizmente passa despercebido é a consciência de classe: para se tornar o “Ayrton Senna do Brasil” (por obra de um poços-caldense, diga-se de passagem), Senna, filho de um latifundiário certa vez acusado de trabalho escravo na Bahia, era vendido por si e pela Globo como uma vítima das injustiças do mundo na sua luta contra Alain Prost, dentro ou fora das pistas.

E vítima, mesmo, do sistema, é a classe social a quem pertence o 1° de Maio, pois 30 anos depois da morte de Senna, os problemas da grande massa da população continuam os mesmos: trabalho precarizado pela deforma trabalhista de Temer; transporte coletivo caótico; déficit de moradia enquanto residências não estão ocupadas; insegurança alimentar; desvalorização dos servidores e serviços públicos; violência policial nas periferias, etc.

Problemas sociais profundos sofridos na pele por guerreiras e guerreiros da vida diária que precisam vencer muitos mais do que um Alain Prost ou uma Williams de suspensão ativa para existirem: precisam vencer diariamente as mazelas provocadas no nosso país pela elite à qual Senna pertencia e dizia que bastava fé em deus e confianca que tudo daria certo.

Enquanto faz 30 anos que Senna se tornou lembrança prestando serviço às suas equipes e não ao país, a violência profunda gerada pela desigualdade escabrosa que benefeciava Senna continua presente na vida da imensa maioria dos brasileiros.

Estava certo o Dr. Pierludovico Ricci: nenhuma vida vale mais do que a de outrem.

(*) Lucas Rafael Chianello é militante petista de Minas Gerais

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