RESOLUÇÃO DA JAE PARA O 60° CONUNE
Entre os dias 16 e 20 de julho milhares de estudantes do ensino superior de todos os cantos do Brasil reúnem-se em Goiânia para participar do 60º Congresso da União Nacional de Estudantes em 2025, que vai definir os rumos da luta do movimento estudantil no próximo período e eleger a nova diretoria da UNE.
É rumo ao fortalecimento da UNE que a Juventude da Articulação de Esquerda apresenta suas resoluções:
RESUMO
A vitória popular de 2022, com a eleição de Lula, representou um avanço fundamental da esquerda e dos movimentos sociais, mas não derrotou a extrema-direita nem alterou a correlação de forças no Congresso. O governo enfrenta forte oposição da direita tradicional, do centrão e da base bolsonarista, que seguem articulados para sabotar as mudanças necessárias. A extrema-direita não foi derrotada e, somada ao avanço internacional do neofascismo e à ação das BigTechs, mantém o Brasil sob pressão.
Nesse cenário, é urgente fortalecer a frente popular e retomar a mobilização estudantil como instrumento central da luta. A UNE deve se reconectar às bases e recuperar seu papel histórico de organização e enfrentamento. É necessário romper com ilusões neoliberais, disputar corações e mentes e recolocar as pautas históricas na ordem do dia: soberania, democracia, combate às opressões, defesa do SUS, da educação, das cotas e da assistência estudantil.
A UNE deve voltar às ruas com um programa claro em defesa do projeto popular e enfrentar as ofensivas neofascistas e neoliberais, fortalecendo a luta estudantil e popular como condição para garantir avanços concretos e consolidar a esperança que conquistamos em 2022.
1. CONJUNTURA
A vitória eleitoral em 2022 – derrotando a extrema-direita e elegendo pela terceira vez o presidente Lula para comandar os rumos do Brasil na reconstrução de um projeto popular de país – reflete a força da esquerda, através dos movimentos sociais, entidades e partidos políticos em nosso país, em especial, o movimento estudantil, o qual esteve na coordenação dos inúmeros atos contra o governo genocida.
No entanto, como já apontavamos, a vitória nas urnas para a eleição presidencial não significou a derrota política da direita tradicional e da extrema-direita, muito menos foi capaz de refletir uma outra correlação de forças no Congresso Nacional. É notório que o governo Lula 3 avançou em alguns programas importantes, como o Programa Pé-de-Meia, mas no conjunto, o governo está sofrendo forte pressão das elites brasileiras, demasiadamente representadas pelo Congresso Nacional, que, nos últimos períodos, se sobrepõe ao Executivo por meio dos valores exorbitantes de emendas parlamentares.
Nesse sentido, há uma dificuldade do governo em construir uma agenda econômica que não atinja diretamente os trabalhadores, pois há uma exigência da política nacional, capitaneada pelo Congresso Nacional, de redução de gastos, porém os cortes são direcionados para os setores que contemplam programas sociais e setores como educação, saúde e assistência social. No caso das universidades públicas, destaca-se que, até os últimos meses, ainda buscavam formas de conseguir orçamento para dar continuidade às suas atividades no terceiro ano de mandato do governo. Tal diagnóstico é semelhante ao que ocorria no governo anterior.
Percebe-se ainda que a agenda econômica neoliberal e o acirramento do capital sobre o trabalho se alia fundamentalmente com a potência de integrantes ultraconservadores do Congresso Nacional. Por meio das redes sociais, setores conservadores emplacam discursos que buscam deslegitimar as políticas de enfrentamento à pobreza objetivas pelo governo. E mais, buscam criar caminhos para que a educação brasileira seja refém de ideologias conservadores, protagonizando episódios de perseguições a professores em escolas e universidades.
Com uma agenda econômica própria, a direita tradicional e a extrema direita realizam uma empreitada constante para desgastar o presidente Lula e viabilizar seja Bolsonaro – para a extrema-direita – seja uma alternativa – para a direita tradicional – nas eleições de 2026. Dessa forma, o programa político aprovado nas urnas em 2022 ainda não conseguiu ser alcançado em mais da metade do mandato. Assim, apesar da vitória eleitoral, as tarefas frente ao momento histórico exige a defesa incansável de reestruturação da nossa sociedade com a superação do capitalismo.
Além disso, as dificuldades encontradas no cenário brasileiro para a população devem estar alinhadas com o momento histórico internacional. Destaca-se o fortalecimento do neofascismo internacional expresso pelo sionismo de Israel que extermina o povo palestino (apoiado nas grandes nações capitalistas), bem como a vitória de Trump nos EUA, que recentemente deu todas as demonstrações de que espera do Brasil: subordinação e controle. O governo norte-americano fará o necessário para auxiliar a extrema-direita na retomada do poder nacional com o auxílio das BigTechs, as quais contribuem para a disseminação de mentiras nas redes e para o impulsionamento de contas vinculadas à extrema direita.
Ao passo disso, o planeta que mais do que nunca clama por socorro e a recente aprovação do PL da Devastação no Congresso Nacional comprova que por parte de quem detém de fato o poder todos os esforços de mudança serão combaridos e se aprofundará a crise. Enfrentamos uma das piores correlações de força que se possa imaginar, sendo urgente e necessária a transformação social que o povo, o país e o planeta precisam.
É preciso ampliar forças junto à frente popular dos movimentos sociais, centrais sindicais e partidos políticos de esquerda, mas principalmente, nosso dever é apostar na organização da luta dentro das Universidades e faculdades brasileiras junto aos milhões de estudantes que querem construir o presente e o futuro do movimento estudantil mas sentem falta da UNE em seu dia-a-dia. A referência da UNE para com milhões de estudantes Brasil afora não se deu por reuniões em gabinetes, mas sim por apostar na luta nas ruas, na defesa da educação, da democracia e do povo brasileiro.
A esquerda enfrenta um momento de desmobilização, e a postura puramente institucional da UNE fragilizou o movimento estudantil enquanto força motriz nas mobilizações de massa, aumentando o distanciamento que já era evidente entre a entidade e estudantes. Depois do Tsunami da Educação tivemos imensa dificuldade em dar respostas à altura dos ataques sistemáticos da direita e extrema-direita à educação, às Universidades e aos direitos sociais e hoje não somos capazes de impor ao novo MEC a agenda política do movimento estudantil para a educação brasileira.
É necessário acabar com as ilusões com os setores neoliberais que tentam e seguirão tentando nos enfraquecer, à medida que colocamos força máxima no acúmulo de forças do movimento estudantil, conquistando corações e mentes do povo. Promover estrategicamente a pressão social com a finalidade de colocar pautas históricas na ordem do dia é urgente!
A luta pela soberania e pela democracia precisa se concretizar em questões concretas para o povo, como redução da jornada de trabalho e aumento salarial, as ações pela erradicação da fome e da pobreza, a defesa do SUS, a luta contra o racismo, machismo, LGBTfobia, o capacitismo e todas as formas de opressão, a luta pelas reformas agrária e urbana junto aos movimentos do campo e da cidade, o fortalecimento do PNAES e defesa intransigente das cotas e de sua ampliação para pessoas trans, a luta pelo passe-livre estudantil e trabalhador, a valorização dos saberes ancestrais e tradicionais, a retomada da reforma universitária e a implementação de uma agenda em defesa do planeta e da natureza demandam uma disputa feroz contra os inimigos do povo para garantir que nossas demandas se tornem política de Estado.
Diante dessa conjuntura, é vital que os movimentos sociais e populares, incluindo a UNE, desempenhem um papel ativo e mobilizador para defender as demandas do povo brasileiro e garantir que as políticas públicas reflitam seus interesses.
2. EDUCAÇÃO
É fato que conquistamos mudanças importantes em nossas Universidades ao longo das últimas décadas e que elas foram responsáveis por ampliar o número de estudantes, democratizar o acesso e a permanência, ao ponto de enfrentar a lógica na qual o ensino superior foi forjado no país. Milhares de estudantes que constroem o movimento estudantil e outros tantos milhões espalhados pelo Brasil são fruto dessa virada de chave: cotistas, pobres, periféricos que não apenas sonharam, mas conquistaram o acesso a esse espaço inimaginável até aquele momento. São estas e estes, em sua grande maioria, a primeira pessoa da família a estar numa Universidade e que estão podendo ter outra perspectiva de vida.
É em respeito a esse legado construído pelas políticas e programas que conseguimos implementar que o movimento estudantil precisa ter a dimensão de sua tarefa e responsabilidade. Mesmo após as eleições de 2022, o movimento estudantil não consegue pautar uma reforma universitária popular, e mesmo mudan. Avanços importantes ocorreram, mas pontos cruciais seguem em aberto e continua sendo urgente disputar o orçamento para a educação e para nossas universidades, pois vimos a capacidade do Congresso Nacional de congelar até a aprovação da LOA e aprovar barbaridades, enquanto nossos estudantes continuam sendo indeferidos nas bolsas e auxílios da assistência estudantil.
É preciso ter uma posição nítida da nossa maior entidade estudantil do país de que é urgente a retirada da educação e das políticas sociais do arcabouço fiscal, pois o arcabouço mantém a lógica neoliberal do Teto de Gastos. Não obstante, precisamos lembrar que as nossas vidas não podem ser debatidas pela metade. Quer dizer, é necessário concluir a revogação do Novo Ensino Médio, é fundamental que a renegociação de dívida do FIES seja uma política permanente e de Estado, que as nossas universidades não aceitem a exploração da escala 6×1 em qualquer nível de funcionamento e que o marco da construção de novos IFs também se transforme em abertura de novas universidades no país inteiro.
Além disso, a implementação do Pé-de-Meia representa uma medida fundamental, em especial no ensino médio, para garantir que nossos jovens sigam estudando para mudar suas vidas e de suas famílias. Sua ampliação para inclusão das licenciaturas também foi importante, como forma de valorização de cursos historicamente secundarizados e alvos constantes da falta de recursos e investimentos. No entanto, essa medida não substitui a necessidade de ampliação da política nacional de assistência estudantil e a elaboração de medidas que organizem rupturas na cultura do assédio, racismo e LGBTfobia das nossas instituições.
Conquistamos a democratização do acesso ao ensino superior e melhoria nas condições de permanência, mas ainda é necessário muito mais para de fato transformar não apenas as condições, mas a concepção a qual as universidades estão postas, deixando de lado a lógica neoliberal e voltando todo o esforço para construção do projeto popular de universidade, que passa pela ampliação das políticas de acesso, como com a criação das cotas trans, pelo investimento maciço na assistência estudantil em todas as esferas do ensino superior, incluindo universidades federais, estaduais, municipais, privadas e comunitárias, pelo fortalecimento da democracia e autonomia universitária, valorização dos saberes ancestrais, defesa do planeta e garantia de que a produção científica não seja tratada como mera mercadoria a serviço do setor privado e estudantes como trabalhadores precarizados postos sob uma lógica extremamente produtivista e utilizados para essencialmente atender esses interesses.
3. MOVIMENTO ESTUDANTIL
A União Nacional de Estudantes tem um papel histórico na luta por um projeto democrático e popular para o Brasil. Ela reflete o desejo de um país melhor para a classe trabalhadora onde a dignidade e emancipação humana não sejam apenas um sonho, mas uma realidade. Apesar das dificuldades enfrentadas, a UNE representa uma força motriz importante para as mobilizações de massa fruto de um legado construído por décadas.
No entanto, nos últimos tempos, o movimento estudantil tem enfrentado um período de desmobilização que deriva da conjuntura, mas também de um equívoco de estratégia por concentrar esforços na disputa institucional e secundarizar a mobilização estudantil como uma ferramenta concreta da disputa política na correlação de forças. É fato que o Congresso da UNE não é um reflexo de realidade de alta mobilização em torno da construção do movimento estudantil de fato no país hoje.
Nada nunca nos foi dado, tudo foi fruto de luta e conquistado a duras penas, por isso é fundamental que a UNE reassuma seu protagonismo nos rumos do país para contribuir com as grandes transformações que o Brasil urgentemente necessita. É necessário ir para além do discurso e construir uma agenda política capaz de potencializar a formação política, acumular forças e mobilizar de fato o movimento estudantil por todos os cantos do país em defesa da educação e do projeto popular de país que historicamente defendemos.
É fundamental que a UNE amplie suas alianças com movimentos sociais, centrais sindicais e partidos políticos de esquerda, mas principalmente, que esteja presente no dia a dia das universidades e faculdades brasileiras. A história da UNE foi construída nas ruas, defendendo a educação, a democracia e o povo brasileiro. A UNE deve estar na linha de frente da organização dos estudantes para enfrentar as ofensivas neofascistas e neoliberais. A juventude, o povo negro, as mulheres, a comunidade LGBTQIAPN+, os povos originários e o conjunto da classe trabalhadora devem ser os principais atores nesta luta.
A frente ampla reflete um governo de coalizão com partidos de centro-direita e tem demonstrado fortes limitações pois esses setores têm atuado para conter a todo custo o projeto que elegemos nas urnas, impedindo avanços necessários e é preciso que os estudantes façam esse debate, apresentando o programa popular que elegemos e onde devemos avançar.
A luta pela soberania e pela democracia precisa se concretizar em questões concretas para o povo através das bandeiras de lutas defendidas pelo movimento estudantil. O fortalecimento do plebiscito popular pela taxação das grandes fortunas e pelo fim da escala 6×1, a campanha pelas cotas trans e a pressão para tirar a saúde, a educação e assistência social do arcabouço fiscal para garantir o investimento necessário nas políticas sociais são exemplos práticos do caminho que a UNE precisa seguir.
Apresentar esses aspectos não é ser oposição ao governo, mas sim fortalecê-lo, defendendo o projeto representado pelo presidente Lula que elegemos nas urnas. O momento que vivemos exige uma estratégia para colocar nossa maior entidade estudantil à altura do nosso tempo. Não basta apenas manter sua existência institucional, a UNE precisa voltar a potencializar o movimento estudantil para mudar a correlação de forças. Só isso será capaz de proporcionar conquistas nas lutas que estão sendo travadas.
Para que a esperança conquistada em 2022 se concretize na transformação do nosso país a UNE precisa retomar seu papel de liderança nas mobilizações de massa, construindo uma entidade com vontade política de mudar os rumos do Brasil.
Goiânia, 18 de julho de 2025. Coordenação Nacional da Juventude da Articulação de Esquerda.