Rio Grande do Sul: AE é terceira força no estadual

Números apontam que PED só foi possível em 325 de 497 municípios

Por Marcos Jakoby (*)

Texto publicado na edição 283 do jornal Página 13

Depois de quase seis anos, voltamos a eleger novas direções para o Partido dos Trabalhadores. Se essa era uma necessidade urgente a nível nacional, não era diferente no plano estadual, pelo menos no caso do Rio Grande do Sul. Vivemos um período de fragilidade do Partido em nosso estado, em um contexto de hegemonia neoliberal, conservadora e de ascensão da extrema-direita.

Esses sinais de debilidade era muito visíveis, embora houvesse quem desafiasse o bom senso e falasse que vínhamos de um “período exitoso”: sucessivos governos de direita em nosso estado; o campo democrático-popular derrotado nas eleições de 2022, inclusive sem alternativa no segundo turno; avanço de medidas neoliberais no plano estadual; derrotas nas eleições de 2024 (diminuímos o número de prefeitos e vereadores eleitos pelo PT); ausência do Partido organizado em dezenas de municípios; pouca coordenação e estímulo das lutas populares e sociais. E oposição aquém do necessário ao governo Eduardo Leite.

Viemos alertando sobre essas dificuldades pelo menos desde 2023; e afirmando que precisávamos de mais partido, mais organização, mais instâncias funcionando, mais mobilização e mais formulação. E o que presenciamos foi justamente o oposto. Nesse processo do PED, foi exatamente o que a militância identificava nos mais diversos cantos do Rio Grande do Sul: a necessidade de recuperar a presença e o protagonismo do Partido.

O Rio Grande do Sul tem 497 municípios. O Partido não está atualmente organizado em 100 municípios, portanto somente 397 municípios estavam aptos para organizar o PED. Destes, 72 não inscreveram chapas municipais e, portanto, não realizaram o processo; restando o processo eleitoral em 325. Ao fim, no mínimo, em 172 municípios o PT não estará organizado com um diretório eleito. Somente esses dados dão a dimensão das dificuldades em vigor.

No dia 06 de julho, mais de 26.979 mil filiados compareceram às urnas. Em 2019, foram 22.078 votantes. Um aumento de 4.601 votos, ou seja 20%. Com destaques para Porto Alegre (que saiu de 1572 votantes em 2019 para 2483) , Santa Maria (de 877 para 1346) e Pelotas (de 335 para 886). Em Porto Alegre houve denúncia formal de filiação em massa. Em Santa Maria, é a base onde opera toda a máquina do deputado federal Paulo Pimenta e do deputado estadual Valdeci Oliveira. Em Pelotas, conquistamos a prefeitura nas eleições de 2024.

Havia seis candidaturas inscritas à presidência estadual: 1/ Valdeci Oliveira, do Socialismo em Construção, apoiada pela Construindo um Novo Brasil, Avante e dissidência da AE, composta, entre outros, por Edegar e Adão Pretto; 2/ Marcelo Carlini, do Diálogo e Ação Petista; 3/ Júlio Quadros, da Articulação de Esquerda; 4/ Thiago Braga, do Movimento PT; 5/ Stela Farias, da Resistência Socialista; 6/ Sofia Cavedon, da Democracia Socialista. Abaixo, segue o quadro das votações nas candidaturas:

Quanto às chapas estaduais ao diretório e encontro estadual, foram dez inscritas: 1/ Socialismo em Construção; 2/ Virar à Esquerda e Quilombo Socialista (DAP); 3/ A Esperança é Vermelha (AE); 4/ Lula lá e Edegar aqui (liderada pela dissidência da AE); 5/ Ampliar para vencer (MPT); 6/ Resistência Socialista (RS); 7/ Reconstrução pela Base (minoria da CNB); 8/ Avante; 9/ Vencer com Lula e o PT em todos os cantos (maioria da CNB); 10/ Mudar o PT vencer com Lula (DS). Abaixo, segue o quadro de votação de cada chapa.

Por fim, abaixo, seguem tabelas com os votos para as chapas e candidaturas nacionais no Rio Grande do Sul. Embora tenha chegado relativamente perto, a candidatura de Edinho não teve maioria no Rio Grande do Sul. A candidatura de Valter fez mais de 18% dos votos e a chapa nacional A Esperança é Vermelha mais de 16% dos votos válidos.

Nenhuma das candidaturas à presidência estadual conseguiu atingir os 50% no primeiro turno e nenhuma das chapas ao diretório estadual atingiu 25%. Cenário bem diferente do que era “plantado” na grande mídia no início do ano, quando se falava em consenso[1] com o propósito de criar um ambiente para acordos de cúpula. Mesmo quando a disputa pelo comando do PT gaúcho já estava colocada, embora houvesse a disputa entre vários candidatos, a versão de que a candidatura de Valdeci Oliveira – candidato da Soco, CNB, Avante, Pimenta e Edegar – venceria no primeiro turno com facilidade foi muito alardeada. Não foi o que aconteceu.

No decorrer da campanha, a insatisfação da militância com os rumos e a situação do PT gaúcho, e a parcela de responsabilidade do núcleo da atual direção — representada na candidatura de Valdeci — ficou evidente. Nos debates, era visível que seu representante não se sentia à vontade em defender a atual maioria das críticas feitas e, muitas vezes, às incorporava como se o seu campo político, especialmente a Soco, não tivesse responsabilidade nenhuma sobre. Outras vezes, adotava discursos genéricos que pouco diziam sobre os rumos que o PT gaúcho deveria seguir.

No fundo, o que estava — e segue — em disputa são dois caminhos para o PT gaúcho: 1/ um deles vai no sentido do alinhamento à política  nacional da CNB, da ampliação das alianças com o “centro” e setores da direita — para “isolar” a extrema-direita —, o uso do método de decisões por acordos de cúpulas no Partido, a centralidade cada vez maior nas eleições e a terceirização das lutas extrainstitucionais; 2/ o outro caminho é pela defesa de um Partido mais militante, com maior presença do Partido nas lutas populares e nos territórios, uma postura mais combativa do Partido, não só frente à extrema-direita, mas também à direita neoliberal, a urgência de instâncias partidárias funcionando mais e melhor, a defesa pela ampliação da democracia interna  e a importância da mobilização social na orientação do Partido para fazermos frente ao projeto das classes dominantes gaúchas.

Desde 2019, o primeiro caminho havia ganhado terreno com a eleição de Pimenta e, depois, de sua indicada, Juçara Dutra, para presidir o Partido. Autocrítica seja feita, com a colaboração do núcleo da antiga direção estadual da AE, hoje da dissidência.

A candidatura de Valdeci fez 46,6%, aquém do que projetavam. As candidaturas que apontavam para a necessidade de mudanças no PT gaúcho e que tinham disposição de marchar juntas no segundo turno — Júlio Quadros, Stela Farias e Sofia Cavedon —, somadas, fizeram 50,5% dos votos.

Já no quadro das chapas, as principais chapas apoiadoras de Valdeci fizeram cerca de 52% e as chapas mais identificadas com a mudança, e que se posicionaram mais à esquerda, fizeram cerca de 46%. Outros cerca de 2% são votos de chapas da minoria da CNB e do MPT, que, embora mais moderadas, possuem críticas ao atual núcleo da direção do PT.

Infelizmente, a candidatura de Sofia Cavedon, da Democracia Socialista (DS), que chegou ao segundo turno, optou por fazer um acordo com o campo moderado, abrindo mão de disputar o segundo turno e aceitando uma “gestão compartilhada”. A decisão revela que o método de acordos em cúpula — substituindo as decisões construídas por filiados e militantes e pelas instâncias partidárias — está muito arraigado no PT gaúcho. Não será fácil mudar essa forma de condução do Partido.

Para que se tenha uma ideia, as duas lideranças apontadas como possíveis candidatos a governador do estado em 2026 não participaram de nenhum dos debates estaduais, mas estavam entre os primeiros a falar em “unidade” do Partido logo após o primeiro turno. A decisão revela também que há setores do PT que falam em “mudanças” no Partido — e que dizem fazer parte da “esquerda petista” — que vacilam em momentos que exigem maior disposição de enfrentamentos.

Por fim, temos o balanço eleitoral da candidatura de Júlio Quadros e da chapa estadual A Esperança é Vermelha, impulsionadas pela Articulação de Esquerda. A candidatura fez 4.629 votos (17,7%) e a chapa 3.927 votos (15,3%). A AE será a terceira força do PT gaúcho (depois da Soco e da DS). Na disputa à presidência do Partido, ficamos a 668 votos do segundo turno. Cabe mencionar que, no decorrer do processo, consumou-se uma dissidência da AE que se desenhava desde 2023, depois de um congresso estadual. A direção dessa dissidência optou pela candidatura estadual de Valdeci Oliveira e a fazer parte do condomínio do campo moderado e, parte dela, inclusive, apoiou nacionalmente a candidatura de Edinho.

Nós continuaremos na luta por um PT democrático, combativo e socialista. E, entre as tarefas urgentes, ajudando em um melhor funcionamento das instâncias partidárias, preparando nossa participação no encontro estadual, contribuindo para fortalecer as lutas em curso — como a defesa da soberania nacional, a taxação dos super-ricos, o fim da escala 6×1 e a redução da jornada, e batalhando por uma linha no Partido que crie mais condições políticas para novas vitórias e conquistas da esquerda gaúcha.

(*) Marcos Jakoby é professor, militante petista e integrante da direção estadual da AE-RS.


[1] https://gauchazh.clicrbs.com.br/colunistas/rosane-de-oliveira/noticia/2025/01/eleicao-para-o-comando-do-pt-no-rs-pode-ter-consenso-entre-principais-correntes-cm5k4mu1y005s0169rklsczr0.html. Acesso em: 19 de julho de 2025.

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