Por Valter Pomar (*)
Brasil e Colômbia divulgaram, no dia 24 de agosto, uma “Declaração conjunta”.
A íntegra pode ser conferida aqui: Declaração conjunta de Brasil e Colômbia — Planalto (www.gov.br)
Segundo a Declaração, Petro e Lula “permanecem convencidos de que a credibilidade do processo eleitoral somente poderá ser restabelecida mediante a publicação transparente dos dados desagregados por seção eleitoral e verificáveis”.
No plano subjetivo, não há o que dizer: os dois presidentes informam que somente ficarão convencidos acerca da vitória de Maduro se os resultados forem publicados de forma desagregada “por seção eleitoral e verificáveis”.
No plano diplomático, entretanto, não é nada trivial o questionamento à credibilidade do Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela. Afinal, uma coisa é uma pessoa ou um partido fazerem isto; mas quando um governo comete este gesto, trata-se em algum nível de ingerência, ainda que possa ser explicada pelo fato de sermos parte do Acordos de Barbados.
No plano político, contudo, é improvável (para ser otimista) que a “publicação transparente dos dados desagregados” consiga mudar a postura da oposição de extrema-direita.
Muito mais provável é o seguinte: aqueles que antes mesmo da eleição estavam seguros de que ganhariam, que no dia da votação já estimulavam um golpe militar, que no dia seguinte denunciaram fraude e seguem denunciando, vão dizer que publicar agora os “dados desagregados” se trata de uma nova etapa do que consideram ser uma fraude.
Se isso for verdade, então a solicitada “publicação transparente” pode criar as condições para que Colômbia e Brasil reconheçam o resultado, mas não vai “normalizar” a situação da Venezuela.
Isto posto, a crítica e a solicitação feita pela Declaração não é inócua.
Ao menos no curtíssimo prazo, mesmo que não seja esse o propósito, o texto da Declaração na prática contribui para prolongar a pressão da oposição da extrema direita. Uma oposição que não está interessada no “diálogo pacífico” e na “convivência democrática na diversidade”.
Mais grave ainda, uma oposição que não respeita e quer subverter a Constituição venezuelana.
Cabe perguntar por quais motivos os governos da Colômbia e do Brasil publicam uma Declaração cujo efeito prático imediato é prolongar a pressão de uma oposição que, além de todos os outros problemas, é aliada da extrema-direita brasileira e colombiana?
Talvez um dos motivos, ao menos no caso brasileiro, seja o profundo apego à democracia, acima de tudo e de todos.
Um apego tão grande que nos leva a questionar a justiça de lá, no mesmíssimo momento em que a extrema-direita questiona a justiça daqui.
Mas se o apego à democracia for mesmo um dos motivos, vale registrar uma “curiosidade”: ao fazer uma justa crítica às sanções unilaterais (embora sem citar quem as pratica), a Declaração cita que tais sanções são “contrárias ao direito internacional e prejudicam a população dos países sancionados, em especial as camadas mais vulneráveis”.
Verdade.
Mas também é verdade que as sanções afetam a democracia.
Aliás, este é um dos objetivos centrais das sanções: fazer “a economia gemer”, prejudicar a população mais vulnerável e reduzir o apoio ao governo, com o objetivo de favorecer a oposição.
Este tipo de ingerência descarada no processo eleitoral, praticada pelos Estados Unidos e Europa, precisaria ser denunciada sempre, sob pena de reforçar uma interpretação parcial e enviesada dos problemas ocorridos no processo eleitoral.
(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT