Por Diego Félix Miguel (*) e Milton Roberto Furst Crenitte (**)
O envelhecimento populacional é uma realidade, ou seja, estamos vivendo mais e convivemos com muito mais pessoas idosas em nosso cotidiano. E isso não é e nunca deverá ser tratado como um problema.
O processo de envelhecimento e a velhice, muito mais que meros aspectos biológicos, são envolvidos por inúmeras influências sociais e culturais que determinam os espaços sociais que ocupamos e com isso, as condições que vivenciamos cada etapa da nossa vida. Por exemplo, pesquisas infelizmente mostram uma diferença na expectativa de vida entre bairros ricos e pobres de nossas cidades, além de um cenário mais favorável ao envelhecimento de pessoas idosas brancas em relação às pretas e pardas.
Por isso, envelhecer no Brasil ainda não é um direito de todos, e sim um privilégio de poucos. E somado a tudo o que vemos hoje, as suas condições podem ficar ainda piores se não avançarmos sobre as políticas neoliberais que enxergam o valor da vida apenas como números ou algo meramente monetário.
Promover o envelhecimento ativo e saudável não envolve apenas o fortalecimento da seguridade social acessível e de qualidade, mas o investimento em uma mudança de perspectiva, rompendo com visões perversas que desqualificam direitos humanos e tratam políticas públicas fundamentais como “prêmios de caridade”.
Pelo contrário, uma sociedade justa envolve políticas públicas que incentivam e favorecem a participação social e a representatividade, com equidade de direitos, com foco na promoção, segurança e apoio a todos que mais precisam, a fim de reduzir desigualdades e promover justiça social. Isso está na constituição e deve ser defendido!
Alguns opositores dessa visão irão defender que bastaria o enriquecimento dessa nação ou o crescimento do nosso PIB para que o Brasil tenha um envelhecimento melhor. Ledo engano. Ao contrário do que acreditam ou dizem por aí, o enriquecimento de um país não gera necessariamente a melhoria do bem-estar de sua população de forma igualitária, haja vista que desde sempre será o mesmo “1%” da população a embolsar esse dinheiro para manter-se nesse lugar de privilégio e poder.
Nesse contexto haverá sempre poucas perspectivas de mudanças, visto que os preconceitos “naturalizados” são perpetuados e apresentam poucas perspectivas de mudança social às pessoas que estão em situação de desprivilégio social.
Dessa forma, inspirados em documentos da Organização Mundial da Saúde, que estabelece diretrizes para a Promoção do Envelhecimento Ativo (2005) e institui a “Década do Envelhecimento Saudável 2021-2030” (2021) enumeramos 13 propostas para o debate do envelhecimento com direitos e cidadania, as quais consideramos relevantes para o fortalecimento da autonomia e independência da pessoa idosa.
Inclusive alguns partidos, candidaturas e setoriais de pessoas idosas estão enumerando propostas que conversam com esses princípios. Por isso, desejamos que essa carta corrobore também com tais iniciativas. Sabemos que a reflexão não se encerra aqui, mas queremos com essa proposta chamar atenção da sociedade sobre a necessidade de ocuparmos esse espaço de exercício da cidadania e participação social.
Lembramos que essa eleição é importantíssima e que poderá definir se essa década será conhecida como a do “Envelhecimento Saudável” ou mais uma “década perdida” entre discursos que pouco contribuem para a visibilidade de questões tão importantes que não só trata de pessoas idosas, mas da sociedade como um todo, principalmente às pessoas que estão em contextos de maior vulnerabilidade social e expostas aos efeitos da desigualdade.
13 pontos para um envelhecimento com direitos
1. Investir em seguridade social, com foco no fortalecimento das leis trabalhistas, no financiamento sustentável da previdência e facilidade de acesso aos benefícios sociais;
2. Fortalecer o SUS, com garantia de acesso aos cuidados integrais de saúde e estímulo às políticas de prevenção e promoção da saúde;
3. Fomentar programas de visibilidade à diversidade das velhices, que ressignifiquem a forma como enxergamos o envelhecimento, a fim de combater preconceitos como: Etarismo, Racismo, Elitismo, Capacitismo e LGBTfobia;
4. Assumir um compromisso com a “Década do Envelhecimento Saudável 2021-2030”, com ações intersetoriais focadas em garantir que as comunidades acolham e recebam as pessoas idosas em sua plenitude;
5. Fomentar e estimular a participação social de pessoas idosas em instâncias democráticas como os conselhos da pessoa idosa, conselhos de saúde, conselhos de segurança, entre outros, de modo que a representatividade das pessoas idosas esteja presente nas discussões políticas;
6. Criar e fortalecer políticas públicas de apoio aos cuidadores informais de pessoas idosas;
7. Investir em cursos de capacitação e na regulamentação da profissão de cuidadores formais de pessoas idosas, juntamente com cursos preparatórios e de formação, para capacitar e qualificar essa mão-de-obra e aumentar a empregabilidade dessas pessoas;
8. Fiscalizar e combater às formas de trabalho análogo à escravidão entre pessoas que cuidam de idosos;
9. Investir recursos para a construção e manutenção de instituições de longa permanência para pessoas idosas públicas, gratuitas e de qualidade;
10. Criar um complexo industrial da saúde e cuidado pautado na Gerontecnologia, alavancando o envelhecimento para uma perspectiva de geração de empregos e riquezas;
11. Combater e conscientizar contra todas as formas de violência contra as pessoas idosas;
12. Dialogar com os Estados e Municípios para a capacitação das cidades com o selo “Cidade amiga da pessoa idosa”;
13. Garantir e fortalecer os direitos e os salários dignos aos trabalhadores do Estado, para que possam se empenhar na proteção e promoção do envelhecimento ativo;
(*) Diego Félix Miguel, mestre em filosofia e doutorando em Saúde Pública FSP USP
(*) Milton Roberto Furst Crenitte, médico geriatra, doutor em ciências pela FMUSP