Por Adriano Bueno (*)
O ano 2020 foi marcado por contradições e conflitos raciais espalhados pelo mundo. Foi assim nos EUA. E foi assim no Brasil.
A vida dos trabalhadores negros e das trabalhadoras negras nunca foi fácil. Espremidos entre a exclusão social gerada pelas políticas econômicas neoliberais, de um lado; e pelo racismo e a violência racial, de outro lado; ano passado, passaram a lidar também com a pandemia de COVID-19.
Por outro lado, se é fato que a situação se agravou, também é fato que houve muita luta. Nos EUA, o Black Lives Matter – Vidas Negras Importam – ocupou as ruas, contribuindo para a derrota eleitoral de Trump. No Brasil, a juventude negra, ao lado de trabalhadores de aplicativos e torcidas organizadas, também ocupou as ruas contra Bolsonaro e o bolsonarismo.
Todos estes movimentos são muito bem vindos. Mas é necessário que façamos o debate sobre os rumos que eles devem tomar. Aqui no Brasil, a eleição presidencial acontece só em 2022 e o que ocorreu nos EUA dois anos antes nos serve de exemplo.
Os protestos contra o assassinato de George Floyd e a violência racial das polícias produziram avanços a serem comemorados. Mas é exemplar que dentro do Partido Democrata o pré-candidato Bernie Sanders tenha sido derrotado pela direita gourmet, com um programa “antirracista” nas declarações, mas racista em sua política econômica neoliberal.
Existe um vínculo entre o neoliberalismo e a violência racial praticada pelas polícias. Assim como existe vínculo entre o neoliberalismo e o encarceramento em massa. Uma coisa é consequência direta da outra. Não será possível obtermos avanços significativos na luta antirracista sem ao mesmo tempo superarmos o neoliberalismo.
A pré-candidatura de Bernie Sanders, que propunha um programa muito mais avançado e que dialogava muito mais com as necessidades materiais do povo negro, acabou derrotada internamente por Joe Biden.
A virada nas primárias ocorreu justamente na Carolina do Norte, onde o eleitorado negro possui peso no partido democrata. O movimento negro estadunidense derrotou o fascista Trump, mas não derrotou o neoliberalismo, que segue em curso com Joe Biden, a direita gourmet deles.
No Brasil, temos que derrotar Bolsonaro. Embora o PT seja muito diferente do Partido Democrata e Lula esteja muito bem posicionado nas pesquisas, tudo indica que 2022 será um ano de batalhas duras.
Mas não basta derrotar o fascista Bolsonaro, com seu racismo escancarado, se não derrotarmos também o programa econômico que os fascistas implementam. E muitas são as possibilidades que o Capital possui para garantir sobrevida ao neoliberalismo: de se realinhar em peso com Bolsonaro; passando por viabilizar uma terceira via gourmet até indicir sobre a própria política de alianças do PT.
O 20 de novembro deste ano, Dia da Consciência Negra, será marcado pelo encontro dos atos tradicionais do movimento negro com os atos Fora Bolsonaro. Espero que o movimento negro tenha o seu protagonismo garantido e suas pautas visibilizadas.
Mas espero também que o movimento negro, ao lado dos demais movimentos sociais e sindicais, use bem este momento para rejeitar Bolsonaro, expressão viva do racismo brasileiro atual, em sua versão fascista escancarada; e também rejeitar o neoliberalismo, tão prejudicial aos trabalhadores negros e às trabalhadoras negras, e que anda historicamente acompanhado com o racismo cordial tipicamente brasileiro!
Adriano Bueno é militante do MNU e do Setorial de Combate ao Racismo do PT.