Por Fausto Antonio (*)
Os atos de 7 de setembro exigiram, mesmo de modo vacilante, a fundamental participação da esquerda no Grito dos Excluídos e no Fora Bolsonaro. A extrema direita não ocupou sozinha as ruas. Sem Lula nos atos de Brasília e São Paulo, a maior liderança popular dos trabalhadores brasileiros, e sem uma organização à altura, o bolsonarismo levou vantagem nos atos, especialmente em São Paulo, capital financeira do país e em Brasília, centro político do Brasil.
Além do salto organizativo desperdiçado, no transcorrer dos movimentos de rua anteriores, faltaram , além das células de militantes da CUT, PT , MST e das categorias sindicais e movimentos sociais, as participações substantivas das bases dessas forças políticas na organização e no ato. A participação e antes a organização ficaram muito abaixo da necessidade bradada pelo momento histórico. Com a presença de Lula e com bases expressivas das categorias sindicais e da CUT, as ruas poderiam pautar a mobilização e desenvolver uma política como a greve geral, a luta contra a violência policial e minar as forças advindas do golpe de 2016.
Os atos de 7 de setembro aceleraram a disputa entre setores da burguesia. Bolsonaro, acossado pela terceira via delineada pelo Bolsodoria, deu as cartas e jogou uma cartada contra um dos instrumentos do PSDB, o STF. A cartada é apenas tática. Bolsonaro e Doria estão estrategicamente no mesmo campo, mas disputam a hegemonia exclusivamente no campo tático eleitoral. Contra o PT e Lula, estarão juntos. A propósito, BolsoDoria não é uma aliança perfeita, mas é completa do ponto de vista da tática e da estratégia anti-PT e anti-Lula.
A composição do Bolsonarismo Verde amarelo e armado
Bolsonaro contou, nas ruas, com apoios dos militares, do sistema policial e parcela branca, racista, boçal e direitista da sociedade civil, que se expressou materialmente e financeiramente pelo engajamento do setor comercial da burguesia branca brasileira; a mesma que hegemonizava os atos contra Dilma. Na mesma ordem, setores de evangélicos e parte significativa da classe média branca complementaram, em parte, a composição civil. Por sua vez, a composição militar contou com o partido militar, que engloba as forças armadas e o sistema policial, com especial adesão das polícias militares .
As PMs nos atos de 7 de setembro de 2021 merecem uma construção política da esquerda, que pressupõe mecanismos de defesa às ações racistas e fascistas, que são as marcas e registros históricos das corporações policiais brasileiras.
Bolsonaro, que não deve ser analisado isoladamente, é produção da burguesia branca e racista brasileira. Sendo dessa natureza histórica e não apenas um ponto fora do contexto nacional; ele e suas forças políticas de extrema direita sabem que os fascistas e racistas estão organizados, além do sistema judiciário, no sistema policial (PM especialmente), forças armadas e policias privadas . Bolsonaro não criou nada, ele apenas estimulou as milícias regulares existentes no país. Em outros termos, não é preciso criar, basta apenas impulsionar.
O golpe de 2016 e o 7 de setembro de 2021
A esquerda não organizou, de modo satisfatório, o ato de 7 de setembro . A ESQUERDA HEGEMÔNICA conta com uma saída eleitoral para o processo desenvolvido pelo Golpe de 2016. É um erro grave e custara caro. Sem alterar a correlação de forças, através das ruas e lutas, 2022 terá como fim trágico Bolsonaro X BolsoDória e a consagração da política anti-Lula e anti-PT.
A mudança de regime, e com ele o golpe de 2016, revelam um novo estágio, isto é, mudou o pacto relativo, tático ou conjuntural da burguesia com os setores populares. A burguesia branca , racista e perversa brasileira, a exemplo do imperialismo, não querem Lula e nem o PT no processo político e eleitoral. O regime mudou , as instituições, entre outras, o STF, são agentes do golpe e do seu desenvolvimento. As mudanças à esquerda virão das ruas e das lutas. Com as ruas, às avessas das instituições corroídas pelo golpe de 2016, é possível enfrentar a burguesia, especialmente no momento no qual ela está taticamente dividida entre Bolsonaro e Dória. A rigor, a burguesia e o imperialismo pretendem levar para o segundo turno Bolsonaro x Dória. A terceira via é o instrumento para tal façanha.
A situação não é fácil. Mas poderá ser revertida. Mas é preciso estabelecer, com a mudança de correlação de forças, o regime político sobre novas bases. Sem radicalização e força, convulsionada pelas bases populares e ruas, a crise continuará após 2022.
Os democratas entre aspas não estão e não estarão com a esquerda
Não por outra razão, no ato de SP, Dória entregou a Paulista para aquele que poderá ser o seu parceiro ou aliado na disputa eventual com Lula .
Sem considerar o golpe de 2016 e a mudança de regime, fica difícil contar , organizar e avançar com as forças populares e classe trabalhadora. As posições vacilantes e à direita dão o rumo para a escolha errada e sem a força das ruas. Dentro desses limites, parte da esquerda acha que apoiar Lula é algo problemático. Outro setor acha que a saída é o eleitoral. O problema para viabilizar a terceira via, a fator Lula e PT, passa a ser um problema da esquerda. Lula é a maior liderança da classe trabalhadora e do setor popular, ele é um problema para o sucesso da terceira via, que é pilar para assegurar Bolsonaro X BolsoDória.
Outro ponto que merece analise ou consideração diz respeito à mudança do regime pós golpe de 2016.
A máquina do golpe está em movimento e o regime desmorona. A saída não passa pelo institucional corroído pelo golpe. O congresso nacional e o STF são instituições zeladoras do golpe e do seu desenvolvimento atual. É preciso uma frente de esquerda, sem ilusão com o STF e o Congresso Nacional. O Golpe colocou outro marco, que será alterado com a força das ruas, da classe trabalhadora e com radicalização à esquerda. Sem embate com a burguesia branca, o imperialismo e sem radicalização, não teremos chance alguma. Bolsonaro deu demonstração de força.
Toda a movimentação está em conexão com a disputa de 2022 e com a luta interna da burguesia. A reeleição e o enfrentamento tático/eleitoral com Bosodoria marcaram os atos da extrema direita. Bolsonaro segue, a esquerda não sabe exatamente o que faz. A ausência de Lula e a convocação mal feita para o dia 7 são alguns dados que revelam que a esquerda perdeu o rumo. Parte da esquerda tem ilusões infantis, uma delas é a confiança nas instituições oficiais. Aos ingênuos ou interlocutores da terceira via, é bom negritar que as instituições burguesas não farão oposição a Bolsonaro.
Outro problema, que tem implicação na organização e na luta política, está alojado em setores da esquerda que tratam e consideram Bolsonaro como produção individual e, por igual erro de análise, o consideram fraco. Bolsonaro, entendido como expressão, voz e corpo branco de setores da burguesia brasileira, não é fraco. Por outro lado ou do mesmo lado, as forças que o apoiam estão em alta do ponto de vista eleitoral. O 7 de setembro foi uma cartada contra a terceira via de cunho eleitoral. Ele se prepara para 2022. A despeito do caráter eleitoral do movimento, com exceção da esquerda, os demais setores de direita não têm força para ir às ruas, só “ele” tem condição.
Na disputa entre setores da burguesia que estão com Bolsonaro versus setores que estão com o PSDB, o STF, um dos pilares do golpe de 2016, faz jogo de cena apenas. O STF é instrumento também da burguesia. Sendo assim, e sem ilusões com o STF, o conjunto da esquerda teria que materializar uma confrontação política ao bolsonarismo e às instituições e estruturas burguesas. Confrontação convulsionada pelas ruas. É preciso investir na mobilização e com organização. Mobilização popular é a saída, a única. A Bolívia é um ótimo exemplo; lá a virada eleitoral veio das ruas. Não podemos ficar na alça do congresso e do STF; o regime politico está em decomposição desde 2016. Sem alterar o quadro golpista, a solução de força da burguesia brasileira e do imperialismo virá de Bolsonaro ou do Bosodoria, a imagem e corpo da terceira via.
(*) Fausto Antonio é escritor, poeta, dramaturgo e professor da Unilab – Bahia