A classe trabalhadora brasileira tem grandes tarefas e desafios. Mas para dar conta destas tarefas, é preciso que a esquerda, os movimentos sociais e sindicais, os partidos democrático-populares e, principalmente, o nosso Partido dos Trabalhadores superem suas limitações, dificuldades e erros.
Um desses erros é uma interpretação incorreta acerca da natureza da extrema-direita e acerca do tipo de política que devemos adotar para enfrentar a extrema-direita. O que está em jogo no Brasil não é uma luta entre “neofascistas versus progressistas”. Para compreender o que está em jogo, basta olhar para a realidade mundial.
Não é novidade que estamos frente à uma crise sistêmica, a um ambiente marcado por catástrofe climática, pandemias, ultraliberalismo, neocolonialismo, imperialismo, guerras e genocídio, ameaças nucleares, neofascismo, fundamentalismos, racismo, machismo, lgbtfobia, preconceitos e violências de todo tipo e sabor, sem falar da ameaça existencial que a inteligência artificial e a robotização lançam sobre toda a classe trabalhadora. Nesse contexto a direita e a extrema direita têm avançado de forma significativa.
No Brasil em especial, isso ocorre desde o golpe contra a Dilma em 2016, seguido da condenação, prisão e interdição eleitoral contra Lula, golpes que foram articulados principalmente pelo MDB e pelo PSDB. Naquela época, a extrema-direita neofascista era uma força muito pequena. Foi a direita tradicional que criou as condições para o crescimento da extrema-direita. Aliás, no segundo turno de 2018 a direita apoiou a extrema-direita, assim como ajudou na governabilidade de Bolsonaro.
Graças a direita tradicional, a extrema direita neofascista cresceu de forma significativa, não só eleitoralmente mas também socialmente, construindo o que hoje é uma forte base de massas. Com isso, a extrema direita “engoliu” e passou a ameaçar a sobrevivência da chamada “direita tradicional”. Um dos resultados disso é a decadência do moribundo PSDB. Outro dos resultados é a ofensiva contra o Supremo Tribunal Federal.
Embora haja conflitos entre as duas direitas, ambas defendem exatamente o mesmo programa econômico, marcado pelas privatizações, desmontes dos serviços públicos, retirada de direitos sociais e trabalhistas e, principalmente, favorecimento ao imperialismo, ao capital financeiro, ao agronegócio, às mineradoras que sustentam o modelo primário-exportador extrativista e predatório.
Portanto, não se pode separar a questão democrática da questão nacional, da questão social, do modelo de desenvolvimento. Pelo mesmo motivo, o PT não pode virar um partido “progressista” que fala em defesa da democracia ao mesmo tempo que faz alianças com a direita neoliberal supostamente democrática, que em aliança com a extrema-direita vem destruindo as condições de vida do povo e, assim, sabotam as condições básicas para que exista uma verdadeira democracia em nosso país.
No interior do PT existe uma posição que – supostamente com o objetivo de derrotar o neofascismo – está nos transformando em defensores do sistema, em defensores do modelo primário-exportador, em um partido que tem medo da polarização, em um partido que não fala mais de reformas estruturais e de socialismo, em um partido que relativiza o papel do grande empresariado na sustentação da extrema direita. Um dos resultados desta postura recuada é que seguimos fortemente constrangidos pelos neoliberais e ameaçados pelo neofascistas.
Mantida esta linha, corremos alto risco de termos “um grande passado pela frente”. Muita gente na cúpula do PT reconhece que estamos correndo este risco. Mas muitos destes que percebem o risco, desistiram de fazer algo diferente, entre outros motivos porque não acreditam mais que seja possível fazer algo muito diferente do que já vem sendo feito. Colocam a culpa na correlação de forças, e se comportam como se a conjuntura fosse algo imutável, impossível de ser transformada. Um dos efeitos desse comportamento é o baixíssimo grau de mobilização, disputa política e ideológica feita pelo Partido, permitindo à direita e à extrema direita ocupar de forma crescente o espaço da disputa de ideias, de projetos, de concepção de mundo. E, com isso, acumular cada vez mais força política.
Queremos, no PED de 2025, derrotar esta posição, elegendo um presidente e uma maioria no diretório nacional dispostas a construir outra posição. Para isso vamos debater todas as questões e fazer todas as críticas necessárias. O PT é um influente partido de massas. Os desdobramentos da nossa “luta interna” impactam o curso dos acontecimentos no Brasil e no mundo. Devemos fazer no Processo de Eleições Diretas do PT de 2025 um processo de grande debate político e intensa mobilização, que mude os rumos do Partido, ajude a mudar os rumos do governo, contribuindo para mudar os rumos do Brasil.
O desafio do Partido é muito maior do que o eleitoral
Nosso desafio é organizar a classe trabalhadora em todos os territórios onde ela mora, trabalha, estuda e se diverte. Para isso, é necessário que o Partido esteja presente nos territórios. Embora a militância esteja lá, o Partido enquanto tal não está atuando de forma permanente e organizada nos territórios, nas empresas, nas escolas, nos locais de moradia, nos espaços de cultura e lazer. Sem isso, é cada vez mais difícil ganhar eleições nas atuais regras do jogo. Mais importante que isso: sem presença organizada nos territórios perderemos nossa razão mesma de existir, que é participar permanentemente da luta da classe trabalhadora brasileira, não apenas dos processos eleitorais.
Para estar presente na luta cotidiana da classe trabalhadora, é preciso um partido organizado e militante. Mas só haverá militância partidária que mereça este nome, se houver conexão entre cada luta imediata e nossos objetivos estratégicos e históricos. É preciso, portanto, um partido que defenda abertamente as transformações estruturais pelas quais lutamos, entre as quais uma ampliação radical das liberdades democráticas e do bem-estar social, combinados com a afirmação da soberania nacional, da integração regional e de um desenvolvimento de novo tipo. É preciso, acima de tudo, um partido que compreenda que estas transformações estruturais estão indissoluvelmente ligadas a conquista do poder pela classe trabalhadora. E a conquista do poder pela classe trabalhadora é um passo fundamental na construção do socialismo. Portanto, um partido militante tem que ser um partido socialista e vice-versa.
As transformações históricas pelas quais lutamos só virarão realidade se a classe trabalhadora brasileira se colocar em movimento, de forma intensa, profunda, de massas, em favor de mudanças radicais na ordem em que vivemos. Uma mobilização deste tipo só terá êxito se dispuser do estímulo e do suporte de uma rede de organizações políticas e sociais verdadeiramente enraizadas no cotidiano da classe trabalhadora. Noutras palavras: precisamos de um partido de massas. É também por isto que um partido como o Partido dos Trabalhadores é insubstituível. Mas o Partido realmente existente tem muitas debilidades, que precisam ser enfrentadas e superadas por nós.
Reorganizar o partido
Para conseguirmos fortalecer nossa presença nos territórios, organizar diretórios, estimular a organização das lutas sociais, é preciso colocar o Partido no comando. O PT não pode continuar dependente, subordinado e tutelado pelos mandatos parlamentares, especialmente pelos mandatos de deputados estaduais e federais, que muitas vezes subordinam a estratégia do Partido a seus interesses eleitorais particulares.
O PT deve voltar a ter direção coletiva. Há dirigentes que se comportam como donos do Partido. Mas ninguém é dono do PT. Ninguém é maior do que o PT. Ninguém pode tomar decisões individuais que atropelam a democracia e os estatutos partidários. O PT deve dirigir os governos e mandatos parlamentares que conquistamos. Sem o PT, não haveria mandatos parlamentares, não haveria prefeituras, não haveria governos estaduais nem governo federal dirigidos por petistas. Entretanto, na maioria dos casos, o PT não tem influência nos mandatos executivos e legislativos que conquista. O Partido é chamado a apoiar, mas nem sempre é chamado a participar e quase nunca é chamado a dirigir. Precisamos mudar radicalmente esta postura subalterna e submissa que tem causado enormes danos ao Partido, inclusive do ponto de vista eleitoral.
O PT deve voltar a ser um partido que faz política o tempo todo, não apenas em anos pares, não apenas em épocas eleitorais, não apenas pelos meios institucionais. Nós petistas estamos por toda parte: estamos presentes nos bairros, estamos nos locais de trabalho, estamos nas escolas, estamos nos espaços e momentos de cultura e lazer, estamos nos sindicatos e nos movimentos sociais. Mas nem sempre a direção do Partido está onde os petistas estão. Muitas vezes a direção não existe, não funciona, está dominada por interesses estritamente eleitorais.
Nossa direção precisa ser ocupada por militantes dispostos a reafirmar o PT como o partido da luta, da mobilização e da organização cotidiana do povo. Afinal, criamos o PT para lutar pelos interesses imediatos e históricos da classe trabalhadora. Um partido anticapitalista, socialista, defensor da mais profunda democracia. Não haverá democracia verdadeira em nosso país enquanto a classe dominante e seus representantes políticos — a extrema-direita neofascista e a direita tradicional — mantiverem sob sua direção a maior parte do sistema judiciário, dos parlamentos, dos governos, dos meios de comunicação e das empresas. É missão do PT combater o racismo, o machismo, a misoginia, a lgbtfobia e todas as formas de discriminação e preconceito, combate que é parte integrante e inseparável da luta para libertar a classe trabalhadora das influências que recebe da classe dominante e exploradora.
Nosso Partido dos Trabalhadores tem que concentrar grandes energias no trabalho de reconexão com a classe trabalhadora, organizando e conscientizando melhor os que seguem conosco, buscando os setores que se distanciaram de nós e, também, os que nunca estiveram conosco, os que estão sob influência do desalento, da direita tradicional e da extrema-direita. Mas para fazer tudo isso, o PT precisa de pelo menos duas coisas: disposição de enfrentar, polarizar e derrotar nossos inimigos; e disposição de reorganizar profundamente nosso próprio partido.
Trabalhamos para eleger um presidente e uma direção nacional dispostos a fazer uma revolução organizativa no Partido dos Trabalhadores e das Trabalhadoras. Revolução que deve incluir, entre outras coisas:
a) a ampliação da democracia no interior do Partido, reforçando a soberania e a vida orgânica das instâncias em relação aos mandatos parlamentares que hoje constituem um centro de poder paralelo que hegemoniza a vida partidária;
b) alteração profunda nos métodos de comunicação partidária, criando condições para uma comunicação de massas, feita por militantes, para militantes e para o conjunto da classe trabalhadora, desde a produção e distribuição cotidiana de material impresso até a comunicação digital em suas diversas formas;
c) retomada da contribuição e financiamento militantes ao partido, incluindo, além da contribuição anual, a organização de atividades como almoços, produção de materiais para venda, bingos, rifas etc., que possam ao mesmo tempo contribuir para as finanças e conscientizar sobre o fato de que um Partido de Trabalhadores deve ser mantido pelos próprios trabalhadores;
d) ampliação das atividades de formação política, com destaque para a formação político-ideológica da militância;
e) estímulo e viabilização da participação das mulheres nos debates, formações, atividades e ações partidárias, inclusive suporte efetivo para a candidatura de mulheres;
f) persistência de inclusão da juventude nas instâncias deliberativas e representativas, com uma campanha de filiação de jovens ao Partido, lembrando que o principal atrativo para o PT ter mais jovens militando é que ele seja um partido socialista e de luta;
g) ampliar a participação de negros e negras na militância partidária, dando suporte efetivo para as candidaturas e dando a luta contra o racismo e pela reparação histórica, econômica e social um papel central na ação partidária.
h)presença na luta cultural de massas, necessária para construir uma consciência de classe socialista-revolucionário, democrático-radical e popular na classe trabalhadora;
i) compromisso de que a política eleitoral nos municípios e nos estados não será imposta de fora para dentro e de cima para baixo.
Para concluir, algumas tarefas imediatas que devem ser implementadas desde já e também no imediato pós-PED:
- apoiar o Plebiscito Popular que coloca em debate cobrar impostos dos ricos, reduzir a jornada e acabar com a escala 6×1.
- engajar o Partido na mobilização de rua e na pressão legislativa pelo fim da escala 6 por 1;
- engajar o Partido na campanha em defesa da Palestina Livre, contra o genocídio praticado pelo Estado de Israel.
- articular desde já a campanha nacional pela reeleição de Lula em 2026.
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A vitalidade do PT está na militância que defende nossas cores, nossa bandeira, nossas propostas e nossa estrela. É essa energia que nos permitirá reconstruir nossa atuação militante junto às lutas cotidianas da classe trabalhadora. É desta atuação militante cotidiana que dependeu, depende e continuará dependendo a vitalidade e o futuro do nosso Partido e da classe trabalhadora brasileira. Reafirmamos nossa defesa incondicional do Partido dos Trabalhadores, a quem dedicamos o melhor de nossos esforços para que continue sendo a principal referência e instrumento de luta da classe trabalhadora brasileira.
EM TEMPOS DE GUERRA, com A ESPERANÇA VERMELHA na cabeça e no coração.
Viva o PT, viva a classe trabalhadora, viva o socialismo!