A cara de paisagem do Banco Central

Por Valter Pomar (*)

É um clássico.

O governo decide o que acha por bem decidir.

E o mercado age como sempre: alguns batem muito, outros assopram, mas todos (eles) ganham.

E o Banco Central faz cara de paisagem.

Nas palavras do líder do PT na Câmara dos Deputados: “É inaceitável a omissão do Banco Central frente à onda especulativa contra o real nos últimos dias. É um crime contra o povo brasileiro e a economia nacional a inércia de Campos Neto, cuja postura é uma mistura de omissão e ação de sabotagem contra o Brasil. É sua obrigação intervir no mercado, pois há diferentes instrumentos à disposição do BC. No governo passado, o presidente do BC usou US$ 65,8 bilhões a fim de manter o câmbio sob controle. Só na véspera das eleições de 2022, Campos Neto vendeu US$ 20,85 bilhões. O BC interveio 122 vezes no mercado de câmbio no governo anterior; no atual, só duas vezes. Com o governo Lula, fica inerte, com papel decisivo na espiral especulativa. Um absurdo!

Nota de rodapé: de que adiantou tentar pacificar a relação com o Banco Central? A pacificação, como se percebe, é de mão única. Aliás, de que adiantou termos indicado parte da diretoria do Banco Central?

A onda especulativa denunciada pelo líder do PT é um sinal de que o plano apresentado pelo ministro da Fazenda estaria “do lado certo da força”?

Esta é a opinião de muitos dirigentes do PT, para quem a onda especulativa seria a prova definitiva do acerto das medidas.

A experiência demonstra algo, digamos assim, um pouquinho diferente. O motivo da especulação é ganhar dinheiro. E como o BC faz cara de paisagem, todo ocasião vira motivo.

Entretanto, é verdade que o chamado “mercado” queria mais, muito mais. As posições inicialmente defendidas pela Fazenda e pelo Planejamento iam muito além do que foi anunciado. Como é óbvio e público, o presidente Lula deu uma segurada nos cabeças de planilha.

Nota de rodapé: por onde anda a ministra Tebet?

Isto posto, as medidas realmente adotadas:

-não tocam na variável taxa de juros;

-não tocam nos gastos tributários (gastos estimados, por economista amigo, “em 6% do PIB, R$ 600 bilhões, dos quais R$ 100 bilhões ou 1% do PIB são concedidos diretamente às empresas”);

-incluem medidas positivas (IR, militares, emendas), algumas das quais dependem do Congresso Nacional;

-mas incluem, também, medidas negativas, que se forem implementadas vão recair sobre a base eleitoral e social do governo.

Dos 71,9 bilhões estimados de “economia” no biênio 2025-2026, a maior fatia – 26,6 bilhões de reais – sairá do abono salarial do salário mínimo, do bolsa família e do BPC.

Do jeito que está escrito, a “economia” não recairá apenas nem principalmente no lombo de eventuais “malandros” que recebem benefícios que não merecem. Recairá sobre gente pobre e trabalhadora.

Aliás, vamos combinar: os grandes malandros deste país são os que vivem da especulação e dos benefícios tributários. Estes não foram alvos das medidas da Fazenda.

O mais grave, entretanto, não é isso.

O mais grave é que o pacote opera nos marcos definidos pelos nossos inimigos. A pauta deles é corte de gastos. E nosso debate é sobre que tipo de corte é aceitável ou não.

Nossa pauta precisa ser desenvolvimento, reindustrialização, ampliação do bem-estar social. Qualquer que seja nossa avaliação sobre as medidas da Fazenda, precisamos mudar de pauta.

Ou fazemos isso, ou seguiremos na defensiva neste debate sobre a economia nacional.

(*) Valter Pomar é membro do diretório nacional do PT

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