A gente que lute

Por Ana Flávia (*)

Há pouco mais de um mês, o DCE Romana Barros, da Universidade Federal Rural do Semiárido, passou por um processo eleitoral, que teve como vitoriosa do pleito a Chapa 01 – A gente que lute. As eleições não foram um campo de batalha fácil, apesar de terem sido duas chapas de esquerda e petistas disputando o pleito. Neste campo de batalha, participamos ativamente da luta entre uma campanha militante e autofinanciada, feita com livro de ouro, cota xerox e cartolina, contra uma campanha que contou com uma grande estrutura oriunda de financiamento escuso. Presenciamos a batalha por um DCE feito por e para os estudantes contra um DCE que apenas serve de comitê central para reuniões de coletivos de juventude e funciona como uma empresa de fazer carteirinha.

Fizemos uma campanha pautada no debate político, em sala de aula e nos espaços da universidade, contra uma campanha alicerçada na agitação e propaganda. Foi uma batalha, portanto, em que se emergiram duas concepções de movimento estudantil distintas: uma vinculada à necessidade de resgatar o DCE para o cotidiano dos estudantes, um DCE que coloque na ordem do dia as mais diversas pautas que nos dizem respeito, e outra agarrada à ideia de um DCE como uma entidade a mais para confeccionar carteirinha de estudante e disputar congressos, estando cada vez mais distante da nossa realidade.

Defendemos nas eleições que estávamos passando por um momento de refluxo no movimento estudantil da UFERSA e que para reverter este quadro e enfrentar os desafios que exigem a atual conjuntura, qual seja uma conjuntura de desmonte da universidade pública, gratuita e de qualidade, seria tarefa central dos estudantes da UFERSA rearticular e fortalecer a rede de movimento estudantil que construímos no período passado para que,junto aos sindicatos e movimentos sociais, pudéssemos ocupar as ruas, as universidades e as escolas contra os sucessivos ataque que temos sofrido.

A nossa campanha, portanto, sem sombra de dúvidas, foi uma campanha de resgate histórico das lutas travadas em um passado recente (2013-2016) pelo nosso DCE, que foi protagonista de importantes e expressivas batalhas, dentre elas o Movimento Pau-de-Arara em Mossoró no ano de 2013; a luta das mulheres estudantes da UFERSA contra o assédio através da campanha “Meu servidor secreto” em 2014; a luta e conquista da paridade do voto entre professores, técnicos e estudantes nas eleições para reitoria e direção de campus em 2015; a luta pelo café da manhã a ser ofertado no RU para os estudantes; a conquista de um Restaurante Universitário que fosse, de fato, acessível para os estudantes trabalhadores, etc.

Entretanto, não foi uma campanha que teve apenas o resgate histórico como um fim, mas sobretudo apontou diretamente para um cenário de imensos e novos desafios que estaremos dispostos a travar no atual período, os quais foram debatidos amplamente em sala de aula e através dos nossos “A gente que lute para debater…”, que se constituíram como importantes espaços de rodas de conversas temáticas para apresentação e construção do nosso programa de chapa.

Elencamos como desafios prioritários da nossa gestão três, quais sejam:

a) a rearticulação da nossa rede de movimento estudantil, que consiste na fundação/reativação e fortalecimento das nossas entidades de base (CA’s e DA’s), bem como na convocação de constantes reuniões de Conselho de Entidades de Base, para que consigamos construir uma luta coesa dentro e fora da nossa universidade, rompendo a barreira meramente administrativa e de repasse financeiro, que vinha sendo tocada nas últimas gestões, e imprimindo um teor político na relação do DCE com os centros e diretórios ;

b) a articulação da luta contra os cortes orçamentários que vem desmontando e fechando as portas da nossa universidade para a classe trabalhadora, promovendo demissão de trabalhadores terceirizados, cortes de bolsas de iniciação científica, de extensão e de permanência estudantil. Este ano, para além dos cortes de 20 milhões na LOA, estamos com um contingenciamento de cerca de 17 milhões nos recursos de custeio, que estão sob supervisão legislativa, isto é, a depender da autorização/liberação legislativa a posteriori. Nesse sentido, é tarefa central nossa dialogar com os estudantes e com a comunidade externa sobre os cortes e os impactos nas nossas vidas ao passo em que engajamos o debate sobre a piora nas condições de vida da classe trabalhadora, bem como provocar a UNE para construir uma luta nacional em defesa do PNAES, das universidades e pela liberação do orçamento sob supervisão legislativa;

c) e a luta pela garantia da paridade no voto dos estudantes, docentes e técnicos-administrativos nas eleições para diretor de campus e reitor da universidade, bem como a luta para que o candidato mais votado seja o nomeado pelo reitor e presidente, respectivamente.

Compreendemos que só conseguiremos dar conta dos desafios colocados se formos capazes de colocar na ordem do dia as pautas mais sensíveis e concretas dos estudantes da UFERSA de forma a articulá-las com as pautas que envolvem a defesa de um projeto de país e de universidade que estejam à serviço do povo trabalhador e do semiárido. Por isso, entendemos como fundamental que o DCE atue na fiscalização dos serviços fornecidos pelo Restaurante Universitário, pela cantina e pela xerox, não permitindo preços abusivos e lutando por serviços de qualidade; que cobre a resolução dos problemas de Ordem de Serviço dos estudantes residentes da Vila Acadêmica; que cobre da universidade as salas para os Centros Acadêmicos, Empresas Juniores e grupos de pesquisa e extensão; que promova espaços de interação e convivência entre os estudantes; que dialogue e organize a luta por permanência, principalmente junto aos residentes universitários; que paute a assistência estudantil para os estudantes da pós-graduação; e que cobre a manutenção dos laboratórios, casas, prédios e das bibliotecas.

Exemplo disto foram duas ações que realizamos neste primeiro mês de gestão, uma relacionada ao problema da falta de água na universidade e outra vinculada ao fechamento do Restaurante Universitário em período de provas finais. Enquanto a universidade desassistia aos estudantes, o DCE atuou não só cobrando da universidade a resolução dos problemas como chegou a fazer o próprio papel dela em alguns momentos, seja contratando um carro-pipa para a Vila Feminina ao passo em que organizou uma assembleia na vila com o mote “Sem Água Não Há Permanência”, no qual – a partir da pressão organizada dos estudantes – conseguimos que a universidade resolvesse o problema; seja fazendo, durante quatro dias, o papel que seria do RU em fornecer almoço e janta para os estudantes, organizando amplos espaços de jantar coletivo, sob o lema “Nenhum Estudante Sem Pão”, nos quais debatemos os cortes orçamentários na assistência estudantil e fortalecemos uma ampla pauta de lutas nessa área. Conseguimos garantir, enfim, que, nos próximos semestres, o Restaurante estará funcionando até o último dia de provas finais, o que não vinha ocorrendo há três semestres letivos.

Assim, pretendemos construir um DCE vivo, atual, de base, capilarizado e que discuta os problemas do cotidiano dos estudantes a fim de construir uma nova dinâmica para o dia-a-dia da nossa entidade, apontando para um movimento estudantil combativo e diverso – mas coeso no encaminhamento das lutas, que faça o debate na sala de aula e que seja referência para os estudantes. É retomando o modelo mais antigo, passando em sala, promovendo debates, assembleias de cursos, nas vilas e assembleias gerais, e panfletagem que conseguiremos desenvolver um leque de ações concretas que consigam dialogar com os estudantes de forma receptiva, formativa e informativa e, a partir disso, apontar e construir alternativas reais para o enfrentamento necessário nesses tempos de guerra.

Portanto, será construindo a luta real dos estudantes que conseguiremos acumular forças para construir uma intensa agenda de lutas em defesa do PNAES, de uma universidade pública, gratuita e de qualidade e contra o avanço do capital sobre o trabalho. Estamos, nesse sentido, empenhados na construção dos chamados nacionais deste mês de março, centrando forças na Greve Geral do dia 18, de forma a imprimir como pauta a articulação da luta pela liberação do orçamento sob supervisão legislativa das universidades federais ao passo em que engajamos os estudantes na derrota do governo Bolsonaro e de todo o seu projeto, bem como na luta pela anulação das penas criminosas impostas ao presidente Lula. A nós, só nos resta uma alternativa: organizar, organizar e organizar! Rumo à Greve Geral!

(*) Ana Flávia é Coordenadora Geral do DCE da UFERSA e membro da Executiva Estadual do PT/RN.

 

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