Por Valter Pomar (*)
Memória é uma coisa traiçoeira. Mas tenho a impressão de ter conhecido o José Guimarães em Belém do Pará, numa reunião ocorrida entre o final dos anos 1970 e o início dos anos 1980.
O principal tema da reunião era a Guerrilha do Araguaia.
De um lado estávamos os que criticavam a estratégia política que levara o PCdoB a organizar a guerrilha, bem como criticavam o balanço que um setor da direção do PCdoB fazia acerca do desfecho.
De outro lado estavam os que, além de defender a justeza da linha e fazer um balanço positivo, algumas vezes manifestavam sua repulsa contra os que divergiam.
Um dos principais alvos daquela repulsa era José Genoíno, guerrilheiro do Araguaia e irmão de Guimarães.
A lembrança deste episódio, ocorrido há décadas, deve-se à seguinte declaração de Guimarães: “Têm a minha repulsa os que votaram contra as medidas do governo Lula”.
A declaração de Guimarães foi publicada aqui:
“Repulsa”: líder de Lula dá bronca em petistas por voto contra governo | Metrópoles
Guimarães não nomina. Mas entre os alvos imagino que estejam os deputados Falcão e Marcon e a deputada Natália Bonavides.
As razões de Rui Falcão estão aqui: Rui Falcão critica pacote do governo e vota contra medidas que reduzem direitos | Brasil 247
As razões de Natália estão aqui: Natália Bonavides no X: “Votamos contra a PEC do corte de gastos e não apoiaremos propostas que diminuam o poder do governo de mudar a vida de nosso povo. O “mercado” busca chantagear o governo com seu tom de sempre: retirar direitos dos mais pobres e manter privilégios dos de cima. (1/9)” / X
As razões de Marcon estão aqui: Sobre meu voto contrário ao Pacote de Corte de Gastos do Governo Federal | Página 13
Vale dizer que José Genoíno, irmão de Guimarães, declarou à imprensa que “se ainda fosse deputado, votaria com o Rui Falcão”. A declaração de Genoíno está aqui.
Como se pode ler nas declarações acima citadas, os motivos dos petistas que votaram contra o pacote são políticos.
Assim como são políticos os motivos de quem concebeu o pacote, de quem autorizou o pacote e de quem votou no pacote.
É neste terreno que o debate deve ser mantido.
Neste debate, é geralmente um erro usar termos como “repulsa” e quetais.
Em primeiro lugar, porque se há algo que deve gerar repulsa entre nós, é a chantagem do capital financeiro.
Sem falar na repulsa que deve ser dedicada aos “argumentos” utilizados pela direita, seja para votar contra, seja para votar a favor do pacote.
A esse respeito, vale a pena ler isto aqui: Governo foi cúmplice do golpe de Lira, diz líder do governo – revista piauí
Em segundo lugar, porque divergir não é crime, nem tampouco traição, especialmente quando não houve fechamento de questão.
Em terceiro lugar, embora o líder do governo tenha óbvia dificuldade de compreender isto, Lula, Haddad e o governo também erram.
(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT