Por Lucas Reinehr (*)
Nos últimos dias, uma questão importante tornou-se tema de calorosos debates na esquerda brasileira: a participação nos atos do dia 12 de setembro, convocados pelo Movimento Brasil Livre (MBL) e outros setores da direita.
Bastasse memória e noção, participar dos atos do dia 12 não seria uma discussão, afinal, não faz sentido marchar junto com quem possui o mesmo projeto político e econômico de Bolsonaro, apenas com outra retórica e outras figuras. Entretanto, parece que alguns setores da esquerda preferiram buscar justificativas escusas para fortalecer a mobilização do lado de lá.
Na União Nacional dos Estudantes – e em outras entidades estudantis -, a situação não foi diferente. Na tarde de ontem (11), a diretoria executiva da União Nacional dos Estudantes reuniu-se às pressas para debater a participação (ou não) nos atos deste domingo. Infelizmente, nós da JAE não pudemos participar da reunião, pois não estamos na Executiva da entidade e sequer recebemos convocação – ainda que fosse para participar como ouvintes. Ou seja, a unidade e amplitude defendidas no dia a dia não parecem contar pra o debate político, pois as forças de oposição não são convocadas a participar.
Ainda que não tenhamos participado da discussão, os relatos dos demais diretores e diretoras da entidade constatam que o debate foi caloroso, afinal, a maior força da entidade – União da Juventude Socialista – foi defensora da participação nos atos do MBL.
Após muita discussão e tentativas de mediação, foi aprovado um documento que, aparentemente, constata que a UNE não convoca ou organiza os atos do dia 12. Mas entre o escrito, o falado e o feito, há um mar de contradições.
A UNE publicou a nota em suas redes dando centralidade ao seguinte trecho:
Alguns minutos depois, o trecho em destaque foi alterado e a “cara” do post passou a ser essa:
Além das mudanças nas redes da própria entidade, o presidente da UJS surpreendeu muita gente com os seguintes tweets:
Ou seja, apesar do esforço coletivo de debater e da tentativa das forças de oposição de barrar a participação da UNE nos atos deste domingo, o que venceu foi a desonestidade e o oportunismo.
A União da Juventude Socialista ignora as discussões coletivas e faz com as entidades nacionais estudantis publicizem apenas a política que lhes convém, apesar das grandes diferenças existentes no interior delas. A necessidade de amplitude – tão defendida por seus dirigentes – chegou longe, afinal, atingiu a extrema-direita de sapatênis que chocou o ovo da serpente para que estivéssemos aqui.
Querer que a UNE, a UBES e a ANPG marchem junto com MBL e outros setores é um desrespeito à base estudantil que constrói a luta diárias nas escolas e universidades. Esses setores de direita são responsáveis diretos pela política de sucateamento que vivemos hoje em nossas instituições de ensino, além de serem declaradamente conservadores, ultraliberais e defenderem a privatização da educação. O que nos UNE, afinal? Uma suposta vontade de derrubar Bolsonaro?
Sejamos sinceros: o problema desses setores é apenas a figura grotesca de Bolsonaro, não sua política. A briga é por protagonismo na implementação do projeto de maldades, não contra o projeto em si. Devemos lembrar que o MBL queimava bandeiras da UNE e contribui diariamente em seus discursos para a criminalizaçã da luta estudantil.
É lamentável que dirigentes das entidades desvirtuem um acordo coletivo e publicizem uma narrativa ambígua, que confunde a base e apequena a UNE diante de seus desafios.
As tarefas fundamentais da UNE são articular a rede do movimento estudantil através da criação de grupos de trabalho com as entidades gerais e de base, debater o retorno seguro às aulas presenciais, fortalecer os atos puxados pela Frente Fora Bolsonaro e fortalecer a luta social no dia a dia. Somar forças com os golpistas de ontem (que continuarão sendo amanhã) é um erro tremendo que afasta a entidade das demandas dos estudantes brasileiros.
Apesar de não termos tido voz ou voto na diretoria executiva, nos colocamos contra a participação nos atos deste domingo. E mais do que isso: nos colocamos contra essa política ambígua que decide uma coisa e divulga outra. A UNE não pode ignorar uma diretoria inteira em virtude de uma força política e suas necessidades.
Não ir aos atos do dia 12 não significa que somos sectários. Significa que sabemos onde devemos pisar, com quem devemos estar e por qual projeto lutamos. É preciso coerência, firmeza e muita luta.
(*) Lucas Reinehr é diretor de assistência estudantil da UNE