Página 13 publica os dois textos apresentados ao debate de conjuntura na reunião do diretório nacional do PT realizado no dia 26 de março. Um texto foi apresentado pela tendência Articulação de Esquerda e outro pela Resistência Socialista.
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Proposta de resolução submetida à reunião de 26 de março do Diretório Nacional do PT
Segue uma proposta de resolução para debate e votação na reunião do Diretório Nacional do PT, neste 26 de março.
Saudações petistas
Jandyra Uehara, Júlio Quadros, Natália Sena, Patrick Campos e Valter Pomar
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1964-2024: 60 anos do golpe!
O golpe militar de 31 de março e 1º de abril de 1964 foi a resposta dada, pela classe dominante brasileira, contra um governo progressista, encabeçado pelo presidente João Goulart, do Partido Trabalhista Brasileiro.
O golpe militar de 1964, como todo golpe exitoso, não foi obra apenas das forças armadas. Os militares foram o braço armado do grande empresariado, do latifúndio e dos capitais estrangeiros. Muitas das empresas envolvidas no golpe, ou que cresceram durante o período da ditadura, seguem atuantes. As Organizações Globo, por exemplo.
Ademais, teve papel transcendental no golpe – desde a concepção até a execução, bem como no apoio à ditadura militar – o imperialismo estadunidense, como demonstrado, entre tantas outras evidências, pela divulgação das gravações das conversas entre o presidente Lyndon Johnson e o embaixador Lincoln Gordon, acerca da chamada Operação Brother Sam.
O que veio depois do golpe foi uma ditadura militar, que durou até 1985, causando imensos prejuízos para a maioria do povo brasileiro. Se o governo João Goulart tivesse tido êxito nas reformas de base, o Brasil seria outro, mais democrático, mais igualitário, mais soberano, mais desenvolvido.
A ditadura terminou, do ponto de vista formal, em 1985. Desde então e até hoje, nenhum golpista foi punido, nenhum ditador foi julgado, assim como seguem impunes os que, obedecendo ordens do Alto Comando das forças armadas e dos presidentes-ditadores, prenderam, torturaram, mataram e desapareceram com os cadáveres dos verdadeiros patriotas.
A impunidade contribuiu para que, entre 2016 e 2022, as forças armadas voltassem a contribuir para o golpe contra Dilma Roussef, para a prisão e interdição eleitoral de Lula, para a eleição e para o governo de Jair Bolsonaro. Assim como contribuíram na Intentona Golpista de 8 de janeiro de 2023.
Vale lembrar, ainda, que o assassinato de Marielle Franco e de Anderson ocorreu quando as forças armadas estavam no comando de uma intervenção federal no Rio de Janeiro.
Por tudo isso e por muitos outros motivos, a passagem de mais um aniversário do infame golpe militar de 1964 deve servir de mote a uma reflexão profunda da esquerda brasileira e, particularmente, do nosso Partido dos Trabalhadores, sobre a questão militar no Brasil.
As Forças Armadas, na sua atual configuração, não vêm se demonstrando capazes de cumprir sua missão constitucional. Mas seguem constituindo um grave fator de instabilidade política e, ademais, uma permanente ameaça à agenda de urgentes transformações econômicas e institucionais essenciais para enfrentar a crise brasileira. Agenda essa que, em 2022, levou mais de 60 milhões de brasileiras e brasileiros a elegerem Lula, mais uma vez, presidente da República.
Por essa razão, é preciso enfrentar o tema sem vacilações, tanto na elaboração partidária como por meio de medidas de governo, abrindo caminho para que a sociedade brasileira possa, ao mesmo tempo, livrar-se da tutela militar e assegurar forças armadas à altura das necessidades do Brasil. Metas que contribuirão para que o Brasil seja capaz de combater e superar a gigantesca e despudorada concentração de renda, poder e riqueza e, assim, superar a desigualdade social.
O enfrentamento da questão militar no âmbito do governo federal envolve, em primeiro lugar, a continuidade e aprofundamento das investigações da autoria intelectual e material da fracassada tentativa de golpe contra o governo federal em 8 de janeiro último, bem como a devida punição dos responsáveis, além dos remanejamentos necessários nos comandos das forças e das unidades militares e quaisquer outras medidas e adaptações institucionais pertinentes.
Envolve, também, medidas estruturais de médio e longo prazo capazes de democratizar as corporações, por exemplo a mudança das grades curriculares das escolas militares e a democratização da gestão escolar; a desmilitarização das Polícias Militares (PMs) e desvinculação de Exército e PMs; a alteração do artigo 142 da Constituição Federal, que prevê o instituto da “garantia da lei e da ordem” (GLO), para vedar a participação dos militares em atividades políticas.
Envolve, ainda, cumprir as determinações legais que implicam na punição criminal dos autores das atrocidades praticadas pela Ditadura Militar (torturas, assassinatos, ocultamento de restos mortais e outros crimes), na localização dos corpos de desaparecidos políticos, na abertura dos arquivos militares, ao pedido de perdão das Forças Armadas à sociedade brasileira e outras ações relacionadas à reparação de crimes e fraudes cometidos pela Ditadura Militar ou por seus agentes, e os devidos esclarecimentos à população.
A questão militar é estratégica. Não haverá sequer liberdades democráticas no Brasil, muito menos uma “democracia”, enquanto persistir a tutela militar sobre a sociedade civil, enquanto a tortura não for definitivamente banida, enquanto as Polícias Militares tiverem licença para matar. Razão pela qual reafirmamos que a questão militar é um dos temas prioritários da ação do PT e exortamos nossa bancada no Congresso e nosso presidente Lula a tomar medidas nesse sentido.
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CONTRIBUIÇÃO DA RESISTÊNCIA SOCIALISTA AO DIRETÓRIO NACIONAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES – 26/03
As graves revelações sobre o assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes tornadas publica ontem, dia 24 de março, dão a devida gravidade do momento político que atravessa o pais e sua democracia. O crime domina grandes frações do aparelho de Estado e as relações políticas passaram a ser parte constitutiva desse processo. Demonstrou, também, a importância do movimento democrático que levou Lula à vitória nas eleições de 2022. O fato de termos um governo democrático no País foi condição imprescindível para que o devido processo legal se estabelecesse e o crime seja efetivamente investigado.
O Brasil, como de resto a humanidade em todo o mundo, vive uma imensa batalha em defesa da democracia e dos direitos fundamentais. Foram as inúmeras lutas e movimentos de resistência que impediram até aqui que o reacionarismo, a extrema direita e as políticas de mercado impusessem uma derrota profunda da sociedade, dos movimentos sociais e dos ideais de igualdade e justiça. O governo Lula é a expressão dessa capacidade de resistir e do destemor em sonhar com novos tempos e com mudanças em direção à equidade e à paz.
Foi a vitória das forças progressistas nestas eleições de 2022 e o papel de Lula que garantiram as condições para impedir que o Estado democrático fosse soterrado e definitivamente contaminado pelo crime organizado e pela política de ódio, eliminação e destruição. Que pudesse, enfim, sobrepujar a tentativa de golpe de Estado de 08 de janeiro de 2023.
A identificação dos mandantes do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes realizada pela Polícia Federal, após seis anos de criminosa postergação e fraudes processuais, somente pôde ser levada a cabo porque o Governo Federal trabalhou afim sustentar as condições para enfrentar o aparelhamento do Estado pelo crime organizado e pelas milicias paramilitares que submetem amplas camadas da população à opressão, em suas várias facetas. O Brasil, entretanto, quer o aprofundamento dessas investigações de forma a avançarmos nos mecanismos que possam desvincular definitivamente a política do crime e o crime organizado do Estado e das instituições brasileiras. Este crime tem um nítido caráter político e ideológico. O assassinato de Marielle teve por objetivo amedrontar e acantonar as forças progressistas e populares. A resposta é avançar na eliminação da infiltração da extrema direita e do crime organizado no aparelho de Estado.
Da mesma forma, as investigações sobre a tentativa golpista liderada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro devem aprofundar-se sem titubear frente ao peso político dos prováveis implicados. A punição dos líderes golpistas de alto escalão, é fundamental para devolvermos o espectro do golpismo e da ditadura ao fundo da história, de onde deve ser compreendida para nunca mais ser repetida.
Chama atenção também as recentes imagens divulgadas sobre a estadia de Bolsonaro por dois dias na Embaixada da Hungria, que, presidida por Victor Orban, assumidamente xenofóbico e racista, é hoje o epicentrocentro da ultra direita no mundo ondese retiram direitos conquistasdos, se perseguem negros, LGBTs, imigrantes e universidades. Mais um sinal da importância que teve a eleição do Presidente Lula para a história do Brasil e nossa democracia.
Vencemos as eleições de 2022 com uma chapa e uma coligação que foram o retrato de um amplo leque de forças políticas democráticas. É preciso compreender a dinâmica que a amplitude deste campo de apoio ao governo impõe. São inúmeros os limites políticos que setores dessa própria base estabelecem. Contudo, a base efetivamente popular e progressista espera que que o partido e o governo enfrentem o desafio de trazer o eixo central da política de volta às conquistas sociais e a partir daí, avançar à esquerda, na ampliação da democracia, na busca de maior crescimento econômico com forte distribuição de renda, no combate permanente a todos os tipos de discriminação como a misoginia, racismo, lgbtfobia e capacitismo, e na construção de um verdadeiro projeto de nação baseada na ideia generosa do socialismo.
Há consenso que precisamos derrotar a extrema direita e o crime organizado nas urnas e nas ruas, na sociedade. Agora é necessário concordar no método e na ação. Precisamos de um grande movimento de massas, mobilizando contra a anistia dos golpistas, em especial dos líderes e financiadores desta intentona.
A proposta de anistia dá a linha política das próximas movimentações do golpismo. Criam narrativas falsas sobre perseguição e manipulação da justiça. A disputa de narrativas minuciosamente alimentadas pela guerra cultural e sua fábrica de mentiras distorcem a compreensão das nossas lutas anti opressão e buscam manipular a verdade e virar o jogo contra nós, em uma grande união do ressentimento e do ódio. A ameaça contínua de tentativas de golpe, como no 08/01/23, também nos obriga a manter o estado de alerta. Precisamos ser propositivos e retomar a dianteira das pautas públicas fortalecendo nossa militância digital na disputa de narrativa.
O embate entre a democracia e a extrema direita e o neoliberalismo é, entretanto, global. O presidente Lula tem cumprindo uma agenda que permitiu um novo fôlego para os setores democráticos, em especial, para os governos de esquerda e progressistas. A reinserção ativa do Brasil nas pautas ambientais, contra a crise climática, no combate à fome, pela paz, estabeleceu um contraponto às políticas de segregação social e de arrochos fiscais e diminuição de investimentos em bem estar social e direitos fundamentais.
A reação do rentismo e da direita não tardaria a vir. Lula tem razão ao denunciar o genocídio na Palestina executado pelo governo de extrema-direita Israelense. Exatamente por isso foi alvo de uma campanha de desgaste promovido pela extrema direita e pelos super-ricos com o intuito de descredencia-lo. O resultado foi ao contrário. A partir da iniciativa de Lula em denunciar o genocídio sionista, várias outras lideranças e governos passaram a exigir o cessar-fogo e a denunciar o assassinato de milhares de palestinos.
É fundamental continuarmos a nos situar na geopolítica junto ao eixo Sul-Sul, às forças anti-imperialistas, e à defesa da paz, contra provocações da OTAN e outros agentes correlatos. A paz é a saída, na Palestina, na Europa ou na África. É nesse cenário que compreendemos a defesa da democracia como central, pois ela se torna alvo das políticas de mercado, propostas pelo fanatismo neoliberal e seu modelo de economia financeirizada, que concentra cada vez mais renda e que está levando ao empobrecimento da maioria da população. A extrema direita ganha mais força para a implementação dessa política, no Brasil e no mundo. Alimenta-se da corrosão dos estados nacionais e sua cada vez menor capacidade de assistir a população mais empobrecida. A participação popular, a inserção do povo pobre no orçamento, as políticas de estabilização da economia e de retomada do crescimento levadas a cabo pelo Governo Lula e pela equipe do Ministro Fernando Haddad, são elementos fora da ordem dos ditames liberais.
Se na época do primeiro e segundo Governos Lula, a classe trabalhadora estava fortalecida, as instituições dos assalariados mais consolidadas, as disputas políticas se davam dentro dos limites da Constituição Federal de 1988; hoje o mundo do trabalho está fragmentado, a informalidade cresce, o capitalismo financeiro avança e a concentração de renda aumenta, no planeta todo. Colocam-se falsos debates comparando contas públicas a contas domésticas, impõe-se uma profunda ilusão neoliberal. Segmentos da população dizem querer menos Estado, mas criticam a falta de infraestrutura e qualidade dos serviços públicos. É uma era de profunda disputa programática, de corações e mentes; vivemos um acirramento da luta de classes. As discussões sobre o que é soberania dos povos, democracia, liberdades e direitos rodeadas de notícias falsas colaboram para as tensões entre narrativas que se encontram constantemente em disputa.
O Governo Lula 3 já trouxe conquistas fundamentais. Além da retomada de todos nossos característicos programas sociais, temos apresentado novidades. A Lei de Igualdade Salarial de Gênero, as cozinhas solidárias, o maior PAA e Plano Safra da história, o Pé-de-Meia e o Imóvel da Gente; projetos de transição energética e economia verde, a Nova Indústria Brasil, o financiamento para pequenas empresas, os diferentes segmentos do Desenrola. Temos feito, e precisamos ampliar, políticas públicas na base, que tragam qualidade de vida. Precisamos de programa de governo nítido, resgatando e aprimorando o Programa de Transformação e Reconstrução do Brasil. A construção de uma sociedade fraterna, socialista, democrática, fortalece nossa identidade frente ao povo brasileiro. Precisamos continuar a baixar o preço dos alimentos, da cesta básica, derrotar a dengue fortalecendo as ações do SUS e atuando intensamente de acordo com as orientações da ciência.. Continuar na luta por um novo papel e arcabouço institucional para o Banco Central, pela derrubada da taxa de juros. Há muito ainda a ser feito, como disse o Presidente Lula, e estamos no caminho certo.
Há espaço no partido, e em seguida no governo, para debatermos uma reforma do Estado e uma reforma política eleitoral. A dificuldade de governabilidade se dá também pela distância do perfil do povo para o perfil do parlamento, pela incidência do poder econômico na política. Vemos uma captura do orçamento público pelas emendas parlamentares. Precisamos fortalecer o papel do Estado como condutor do desenvolvimento e democratizá-lo radicalmente. É necessário superar aqueles que buscam ditar os rumos do país na contramão da ampliação de direitos e bem-estar social para o povo brasileiro.
Eleições Municipais
Nas eleições de 2024 teremos novamente a extrema direita como adversário principal. O processo eleitoral será muito polarizado, e portanto precisamos fortalecer a frente democrática, liderada pelo campo progressista. Devemos organizar nossa Federação Brasil da Esperança, ao lado de PCdoB e PV, estreitar laços com a Federação PSOL/REDE, e aprofundar o diálogo com PSB e PDT, bem como outros partidos que compõem a base do Governo Federal e entendem a importância de isolar o neofascismo.
Nesse sentido, a opinião pública precisa enxergar conquistas concretas e benefícios que nossos governos trazem. 2024 precisa ser mais um ano de profundos investimentos públicos, de garantir o PAC na sua totalidade, de avançar em legislações que regulem e controlem mais o poder do capital financeiro. Precisamos de avanços que garantam a soberania popular do governo federal eleito, e que sejam sustentados também por mobilização de massas e diálogo em todos os municípios.
O PT precisa ter uma estratégia de crescimento, por meio do fortalecimento dos Diretórios, com candidaturas majoritárias e proporcionais próprias ou composições que nos fortaleçam politicamente e permitam ampliação da nossa organização e mobilização na base dos territórios.
Que iniciativas como o Elas Por Elas, o Representa e o Todas as Cores sejam novamente ferramentas de promoção à diversidade e combate às desigualdades na política institucional, trazendo candidatos e candidatas capazes de se somarem à luta por uma sociedade mais igualitária e livre de violências.
É preciso organizar a batalha político-eleitoral desde já. Definir com antecedência as candidaturas majoritárias, construir alianças potentes, elaborar programaticamente para cada município brasileiro e construir chapas de vereadores(as) fortes e diversas.
As pesquisas mostram que somos o partido preferido do povo brasileiro, já vencemos, junto com nossos aliados, cinco das últimas seis eleições presidenciais e venceríamos as seis se Lula não tivesse sido impedido de disputar. Nosso desafio agora é vencer estas eleições municipais aumentando significativamente o número de prefeitos, prefeitas, vereadores, e vereadoras do PT, da nossa Federação e dos nossos aliados na luta contra o neofascismo e o Bolsonarismo em cada cidade brasileira.
Vamos juntos construir mais essa grande vitória! Viva o PT!