Por Marcos Jakoby (*)
Carta Capital publica matéria onde revela “que o candidato do PT à Prefeitura de São Gonçalo (RJ), Dimas Gadelha, assinou na última quarta-feira 18 uma carta compromisso à Igreja Cristã em que se diz contrário ao aborto e à “ideologia de gênero”.
No texto, o candidato diz que se for eleito também criará a Subsecretaria de Assuntos Religiosos.
“Entendo que a oposição aos pontos expostos acima reforçam os valores fundamentais defendidos pela Igreja Cristã, seja ela católica ou evangélica, valores estes que têm norteado a sociedade ao decorrer dos séculos”, afirmou Gadelha.
A reportagem [da Carta Capital] apurou que a assinatura da carta foi uma tentativa de barrar as fake news divulgadas contra o candidato. Os ataques feitos pelos opositores do petista buscam associá-lo ao aborto e a ideologia de gênero, por exemplo.”
Fico pensando: por essa lógica, todos os candidatos petistas que sofrem com as fake news deveriam capitular e aderir à pauta do fundamentalismo religioso, do ultraliberalismo, das milícias, dos grandes capitalistas, do imperialismo, do neofascismo, do racismo e do machismo toda vez que são alvos de fake news envolvendo tais temas. Ou seja, seria uma descaracterização ideológica e programática completa e generalizada. Para que mesmo partido?
Aliás, ceder às fake news não as fortalece ainda mais? Não serão usadas ainda de forma mais sistemática na próxima eleição? O caminho não seria desconstituir o senso comum conservador das quais esse tipo de manipulação se alimenta? A começar pela falácia do combate à “ideologia de gênero”, que nada mais é do que uma tentativa de impedir os avanços dos direitos sociais, civis e políticos das mulheres e LGBTI?
E o que seria combater a “doutrinação nas escolas”? Quem atua na educação sabe que esse discurso tem como propósito acabar com pluralidade de pensamento, a liberdade de ensino e o pensamento crítico. Tudo aquilo que contraria o fundamentalismo religioso e o conservadorismo é considerado “doutrinário”, portanto passivo de censura e vigilância, como atestam os inúmeros episódios de invasão às escolas e às salas de aula, patrocinados por esses setores, pelo fato de que nessas escolas trabalhava-se com história e cultura afro-brasileira e indígena, ou porque havia trabalhos escolares que criticavam a violência policial, ou por inúmeras outras razões que não agradam o ideário conservador, fundamentalista e autoritário.
Criar uma subsecretaria de Assuntos Religiosos? Onde fica o estado laico nessa história? Aquela coisa de separação entre igreja e Estado? Voltamos ao século XIX? Nossos representantes deveriam ser os primeiros a explicar e a defender algo que é tão básico, constitucional!!!
Uma matéria publicada no site do PT anuncia que “Contra o bolsonarismo, Dimas Gadelha lidera em São Gonçalo”. Podemos vencer as eleições em São Gonçalo, espero que sim, mas se assumimos pautas que são as do bolsonarismo, não necessariamente estaremos derrotando-o. Sabemos que o fundamentalismo religioso é aliado do neofascismo.
Por fim, detalhe curioso. Dimas Gadelha disputou as eleições de 2018 pelo DEM. Foi candidato a deputado federal e não se elegeu. Em uma recente entrevista ele alegou que a “partir daquele momento não me enxergariam mais somente como técnico [ele é médico] e decidi buscar um partido que apresentasse a linha ideológica mais próxima à minha, e cheguei ao PT “. Está na hora de Dimas aproveitar o ambiente das eleições e dialogar mais com o petismo e seus aliados e conhecer melhor a linha ideológica do Partido, pois não é esta que está na carta.
(*) Marcos Jakoby é professor e militante do PT
(**) Com informações da Carta Capital