“Direitos Já”, versão para quem for impaciente

Por Valter Pomar (*)

Não pude assistir online live do movimento “Direitos Já”, realizada nesta última sexta-feira, dia 26 de junho.

Mas no sábado, 27 de junho, dediquei mais de 5 horas para assistir a coisa toda, de ponta a ponta.

Quem quiser fazer o mesmo, seguem algumas alternativas:

https://www.poder360.com.br/midia/ao-vivo-governadores-e-candidatos-a-presidente-em-2018-discutem-democracia/

https://www.facebook.com/direitosjaforumpelademocracia/videos/266520597789487/

https://www.youtube.com/watch?v=NnpG67Hlh8k

Neste último endereço, a transmissão durou 4 horas, 45 minutos e 45 segundos.

Desconheço se este detalhe (45, 45) tem algum significado oculto.

O movimento “Direitos Já” foi lançado em setembro de 2019, em um ato público realizado na PUC-SP, do qual teriam participado, segundo os organizadores, 1500 convidados, vinculados a 300 organizações e a 16 partidos políticos.

O nome completo da iniciativa é “Direitos Já! Fórum Pela Democracia”.

O coordenador é o sociólogo Fernando Guimarães, conhecido também como Fefo.

Fernando Guimarães foi filiado ao PSDB por três décadas, foi do Diretório Nacional do PSDB, mas parece ter sido expulso do partido em maio de 2019.

Em entrevista recente à Carta Capital, o próprio Fernando// Guimarães fala do assunto:

https://www.cartacapital.com.br/politica/expulso-do-psdb-lider-do-direitos-ja-diz-que-nao-foi-avisado-sobre-desfiliacao/

Para quem quiser saber mais, recomenda-se ler aqui:

 https://tucano.org.br/fernando-guimaraes-2/

O ato de 26 de junho foi denominado ato virtual “EM DEFESA DA DEMOCRACIA, DA VIDA E PROTEÇÃO SOCIAL”.

A atividade foi aberta com a leitura de um manifesto, que está disponível aqui, junto com a devida análise crítica:

https://pagina13.org.br/o-lado-b-de-um-manifesto/

Desta leitura, destaco a seguinte ideia: convocar todas as forças democráticas a se somarem conosco nesta tão necessária frente ampla, um movimento de caráter não eleitoral, em defesa da democracia, da vida e da proteção social.

Tomem nota disto, voltaremos ao tema no final.

Em seguida a leitura do manifesto, Fernando Rodrigues chamou os participantes a falar, por 1 minuto.

Isso, 1 minuto!

O que é bom, pois em 1 minuto as pessoas são obrigadas a adotar o papo reto de que Aécio Neves dizia gostar.

Aliás, Aécio não foi ao ato pelos “Direitos Já”.

Em seguida a leitura, Fernando Guimarães Rodrigues (que a partir de agora vou chamar de FGR) leu a lista de “professores” que redigiram o manifesto: Adriano Massuda, Alberto Almeida, Almir Surui, Felizardo Santos Junior, Gonzalo Vecina, Jose Alvaro, Lilian Vitorino, Jose Gregori, Maria Herminia Tavares, Pedro Serrano, Monica de Boe, Sergio Fausto, Eunice Prudente, Rogerio Studart, Silvia Pimentel, Ricardo Saens e Anderson Marques, este último o relator.

Alerto que posso ter anotado errado o nome de algum dos supracitados.

Vários deles são conhecidos por sua militância tucana.

Aliás, salvo melhor juízo, a maioria dos que falaram no ato era integrante dos setores médios, homens, brancos, tucanos, com doutorado.

Evidentemente, houve pontos fora da curva, mas esta era a curva.

Na sequência, FRG afirmou que a última vez que esse país assistiu a uma tão ampla união de forças, de campos políticos tão diversos, acima de tudo convergência no compromisso inalienável com a democracia, até para que nossas divergências estejam asseguradas, foi o movimento pela Diretas Já.

E então passou um vídeo de Osmar Santos, o célebre locutor dos comícios das diretas, hoje com 71 anos!

Uma respeitosa matéria sobre o locutor pode ser lida aqui:

https://esportes.r7.com/osmar-santos-celebra-70-anos-sem-perder-irreverencia-fiquei-velho-14082019

Vale lembrar que a emenda das Diretas foi derrotada e o movimento pelas Diretas Já rachou entre os que apoiaram o comparecimento ao Colégio Eleitoral, para votar em Tancredo Neves e José Sarney; e os que se recusaram a fazer isto, caso do Partido dos Trabalhadores.

Deixo aos leitores decidir se cada alguma reflexão sobre história, repetição, tragédia e farsa.

Em seguida houve um ato ecumênico, aberto pelo Rabino Michel, presidente da confederação israelita paulista, segundo o qual o Talmud afirma que onde houver 2 judeus, haverá 3 opiniões.

Depois falaram representantes de várias crenças, entre as quais um pastor batista, um pelas matrizes africanas, um padre, uma monja, um pastor, uma representante do Conic, um espírita, um clérigo islâmico.

Encerrada esta parte, foram chamadas “algumas das principais vozes do país” (sic), para usar da palavra por um minuto, ao final do qual seria dado “um sinal para que concluam”, senão o som seria silenciado.

A partir deste ponto, fui tomando nota dos nomes dos oradores e do que me chamou a atenção em suas falas. Alerto que posso ter entendido ou grafado algum nome incorretamente. Além disso, como é óbvio, destaquei o que me chamou a atenção.

O primeiro a falar foi o advogado Belisário dos Santos Jr: viva o SUS, a constituição cidadão, contra a tortura. Ao final, Belisário voltará a falar, num dos melhores momentos do ato.

O segundo a falar foi Rogério Studart, ex-diretor executivo do Banco Mundial.

Antes de abrir a a palavra, FGR disse que ele coordenou um grupo de economistas, que fez a elaboração de um documento que será apresentado a todos os parlamentares, com medidas de saída para a crise, grupo composto pelos economistas Monica de Bole, Rogerio Studart, Ricardo Saens, Nilson Araujo, Guilherme Melo, Baliseu Alves Margarido, Sérgio Buarque, Nelson Marconi, Vitor de Melo, Nelson Marconi, Vitor Pagani, Nilson Araújo, José Aurelio Oreiro.

Me chamou a atenção que FGR afirma que estes economistas teriam sido indicados pelos partidos.

Pelo menos no caso do PT, isto deve ser algum mal-entendido.

Mal entendido ou não, o fato é que Rogerio Studart comemora a impressionante capacidade que tivemos, de distintos matrizes de pensamento, de convergirmos em função de uma macroeconomia e de uma visão de desenvolvimento para o país.

Só lendo o tal documento é que poderemos ter certeza se esta “convergência” deve ser comemorada ou lamentada.

Em seguida falou o Vereador Gilberto Natalini, sobre quem se destacou ter sido torturado pelo próprio Ulstra.

Depois falou Flavia Piovesan, procuradora e jursta, da comissão interamericana de direitos humanos.

A fala de Flávia Piovesan pode ser tomada como paradigma de grande parte dos discursos feitos no ato: falas curtas e genéricas, politicamente corretas no que diz respeito a justiça social, mas essencialmente preocupadas em “salvar o Estado democrático de direito”.

Na fala de Piovesan e também em outras, um recado contra “a dor da polarização extrema”.

Depois falou a deputada federal Jandyra Fegali, a primeira Comunista do Brasil a quem se deu a palavra. Outros comunistas falariam, assim como petistas e psolistas. A maioria dos oradores destes partidos foi muito cuidadosa no uso das palavras, algumas vezes evitando até mesmo falar em impeachment e fora Bolsonaro, preferindo outras construções verbais (do tipo “com Bozo não dá”).

Falou em seguida Mario Nicacio, vice-coordenador das organizações indígenas da Amazonia brasileira; e aí veio um das celebridades da noite, Luciano Huck.

Este começou dizendo que, por conta da pandemia e das lives, estamos mais eficientes, mas com menos tempo para pensar e elaborar, por isso ele falaria o que estou sentindo, mas as coisas se conectam, e toca falar de uma menina de Goiânia, jovem cientista, a primeira de sua família a alcançar o ensino superior, na Federal de Goiás, e esta moça tinha uma demanda com ele Huck, que era o apoio para uma iniciativa de jovens cientistas, e a boa notícia é que esta moça não é exceção, pois existem milhares de Patrícias espalhadas pelo Brasil inteira.

Patrícia, esqueci de dizer, é o nome da moça de Goiânia, segundo Luciano Huck.

Pois bem: depois de nos informar que existem milhares de Patrícias espalhadas pelo Brasil inteiro, Huck falou da importância da educação, criticou as “papagaiadas” do último um ano e meio, disse que a educação deveria ser prioridade, nesses tempos em que a ciência está sendo negada, essa turma de jovens cientistas me inspirou na mensagem que ele deveria dar no ato pelos Direitos Já, eles são a exceção mas deveriam ser a regra, um país mais eficiente, onde os serviços funcionem de maneira potente, começando pela educação, um país mais afetivo, onde as soluções não irão despontar por geração espontânea, ou todos nós nos envolvemos, ou vamos seguir na mesma situação, dividios, disfuncionais, sem um sonho maior..

A essa altura, o FGR, visivelmente constrangido, lembrou de pedir que o Huck concluísse, mas o cidadão continuou falando da sociedade civil, dos novos atores de que ele se sente parte, do debate público, citou alguns colegas globais, falou que precisa de uma mudança de paradigma…

…ai o FGR lembrou de novo para ele concluir…

… mas o Huck continuou falando, disse que democracia é importante, que é uma obra aberta, novas emoções, imperfeita, a que deu mais certo até hoje, agradece muito e falou que “chega de iluminar o que nos separa e vamos buscar o que nos une”.

Enfim, diria que o cidadão ainda não ensaiou direito o seu papel. Mas a pauta está clara. E o vocabulário também.

Depois falou o ex-governador Márcio França: “a medida que estamos juntos é que nos reanimamos”.

Depois veio o Rapper Xis, que lembrou que democracia nunca existiu para os negros e para os indígenas, que estamos cansados, que precisamos democratizar cultura, política, moradia internet, saneamento básico.

Infelizmente, ninguém no ato lembrou da privatização recém-ocorrida do saneamento básico, com o voto e apoio de vários dos que ali estavam.

E aí o FGR chamou, com a pompa e circunstância possíveis, o “nosso presidente Fernando Henrique Cardoso”.

O “príncipe dos sociológos” não disse nada de memorável, falou de momento de união em torno da democracia e da Constituição, que as coisas mudam, que ele já está velho e viu de Getúlio as diretas já, que não é um momento igual, mas é importante começar e que está disposto a dar as mãos a todos os que queiram defender a democracia. E terminou dando vivas à liberdade e à democracia.

Fiquei tocado, especialmente sabendo que ele já lutou contra o golpe de 2016, contra a condenação e prisão de Lula, contra a eleição de Bolsonaro. Ops, não lutou não, esquece, sigamos adiante.

Aliás, sobre FHC, recomendo ler: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/fhc-prega-tolerancia-com-bolsonaro-e-mostra-que-a-tal-frente-ampla-nao-e-para-ser-levada-a-serio/]

Depois falaram Eduardo Paes, ex-prefeito do Rio de Janeiro, em defesa da permanente vigilância, “acima de qualquer diferença”, para defender a democracia; o professor Kabengele Munanga, que lembrou que nenhum país do mundo respeita integralmente a declaração de direitos humanos; o deputado federal Marcelo Calero, que leu um discurso em que esqueceu de citar que foi ministro da Cultura de Michel Temer.

Aliás, infelizmente Michel Temer e José Sarney não compareceram ao ato. Aqui há mais detalhes: https://www.brasil247.com/brasil/com-pretensao-de-ser-frente-ampla-movimento-direitos-ja-realiza-ato-com-defeccoes-de-temer-e-sarney

Sobre Moro, se foi convidado ou não, só ouvi boatos.

Depois falou o Miguel Torres, presidente da Força Sindical, que lembrou dos direitos que a classe trabalhadora vem perdendo nos últimos anos, relevando o fato de que no comício estavam alguns dos algozes destes direitos.

Em seguida falou Arnaldo Jardim, conhecido como Chefão pelos nem tão íntimos, que falou de unidade em defesa da democracia, que democracia rima com o combate da desigualdade, que democracia significa desenvolvimento que combate as desigualdades e busca a justiça social, para depois citar o Calero e o Roberto Freire!!!

Definitivamente, a consciência culpada já produziu peças retóricas de melhor qualidade. Mas em 1 minuto é difícil escapar da máxima: a hipocrisia é a homenagem que o vício rende à virtude.

Depois falou o Alessandro Molon, ex-petista, hoje no PSB, que também fez um discurso paradigma de muitos outros: devemos combater o desequilíbrio com bom senso, até porque a fé não costuma falhar.

Esta embocadura, segundo a qual frente ao fascismo vamos reagir mostrando que fomos educados no sacre coeur de marie, esteve presente em vários discursos. Infelizmente, na luta de classes, gentileza não costuma gerar gentileza.

Depois falou Petra Costa, que como muitos lembrou que para enfrentar a extrema-direita, é correto se aliar com inimigos históricos para defender a democracia; mas logo em seguida cometeu a suprema indelicadeza de lembrar, de maneira muito suave, que isto poderia ter sido feito em 2018 e aí não estaríamos na situação em que estamos agora.

Em seguida falou Marcelo Coelho, que disse que eles são muito poucos, nós somos muitos, acho que nunca houve uma aliança tão ampla, mais que diretas e mais que Fora Collor, que o governo está perdendo, está caindo, vai durar pouco, que a democracia vai vencer e rapidamente.

Esta também foi uma fala paradigmática. Não apenas pelo tom de extrema satisfação consigo mesmos, bem classe-média-como-nós-somos-inteligentes-bonitos-e-cheirosos, mas pela subestimação da força de Bolsonaro e da extrema direita. Aliás, é um paradoxo que uma frente que se convoca contra o fascismo (por definição, algo aterrorizante), tenha sido lançada com tantos discursos que minimizam o perigo, a tal ponto de não propor fazer nada de prático para enfrentar o problema (foram poucos os oradores que falaram em impeachment, por exemplo).

Depois falaram o Marcelo Ramos, do Partido Liberal do Amazonas, que descobri ser um especialista em Churchill; o Leoni, cantor e compositor, que lembrou que sempre que chega uma crise, quem paga a conta são os mais vulneráveis, além de citar Gilberto Gil como nosso melhor ministro da cultura (aliás, ministro de um governo que recebeu duríssima oposição de grande parte dos que participaram do encontro dos direitos já).

Depois falou o Jose Luis Penna, do Partido Verde, que lembrou do saudoso Alberto Goldman (que, verdade seja dita, chamou o golpe em 2016, mas chamou publicamente o voto em Haddad em 2018, coragem que faltou a muitos dos ali presentes), atacou o regime presidencialista como uma insuportável fábrica de crises e defendeu que devemos aproveitar a crise para refazer o mundo.

Aqui vale o registro: a defesa do parlamentarismo está no ar.

Depois falou o governador Camilo Santana, do Ceará.

E em seguida valou o governador Flávio Dino, celebrando a nossa união, defendendo valores e princípios, a democracia em sua dimensão institucional, que os poderes possam funcionar livremente, contra as pressões venham de onde vierem, em segundo lugar a dimensão social de democracia, cuidado com a vida e a saúde, a defesa do sus, a renda básica emergencial como uma proteção da democracia para os mais pobres, a geração de empregos, assim a democracia chega na casa do cidadão, e condições institucionais para que as investigações possam ser feitas, inclusiva aquelas gravíssimas, atinentes ao atual presidente e os que o cercam, lei para todos.

Depois falou a Rosana Barros, presidenta da Ubes, que fez um discurso vintage.

Em seguida veio o Roberto Freire, dizendo que a época atual e a época das Diretas Já são coisas distintas, pois ali tratava-se de restaurar a democracia e hoje trata-se de defender a democracia. E, talvez numa menção ao seu passado, perguntou “que fazer”, dizendo que temos amplíssima maioria na sociedade, que precisamos ampliar ainda mais, sem vetos, nas diretas saudávamos todos aqueles que eram arrependidos.

Hehe. Nas diretas saudávamos os arrependidos que apoiavam as diretas. Hoje os supostamente arrependidos muitas vezes não defendem nem mesmo o impeachment.

Depois falaram o Paulo Câmara, governador de Pernambuco; o Lupi, presidente do PDT; e a Zélia Duncan. Antônio Neto, presidente da Central de Sindicatos Brasileiros, disse que nossas diferenças debateremos no momento certo, que o atacado que nos une é maior do que o varejo que nos separa, terminando com um unidos contra o fascismo.

Ironicamente, logo em seguida falou Bruno Araújo, presidente nacional do PSDB, que afirmou que “não há mais espaço para aventuras autoritárias” (talvez para os tucanos o fascismo seja um tigre de papel???) e que o Brasil pode contar sempre com o PSDB.

Depois veio mais uma fala paradigmática, da socióloga Neca Setubal, para quem é uma honra estar aqui no meio de tantas pessoas, super parabéns!!!

Como disse antes, muitos dos que ali estavam gastaram parte de sua fala para se afirmar satisfeitos com estarem ali, tudo tão lindo, tão legal, com um discurso tão politicamente correto.

Uma cabotinice G-E-N-I-A-L.

Depois veio o jornalista Juca Kfouri, cuja fala infelizmente teve problemas de conexão, pois foi um dos pouquíssimos que falou do Lula. Kfouri também falou das fake news, da perda dos direitos dos trabalhadores, da violência da PM, do Estado de Direito, Basta de Bolsonaro, direitos já.

Depois veio o prefeito de Manaus, Arthur Virgilio, uma das falas mais hilárias da sessão, com direito a se dizer mais bonito que um bonequinho que, pelo visto, alguém mostrou enquanto ele falava.

Depois veio o Fernando Haddad.

Em seguida falou o senador Randolfe Rodrigues, que lembrou Ulysses Guimarães ao promulgar a Constituição de 1988. Sem dúvida Ulysses parece um gigante, em comparação com os anões que transitam pelo atual Congresso, mas convenhamos: é sintomático ver um dos gestores da transição conservadora serem apresentados como exemplos de boa política.

Depois veio o Drauzio Varela. A respeito da fala dele, dois comentários. Um, é impressionante como todo mundo virou defensor do SUS. Dois, Drauzio afirmou que não será jogando um brasileiro contra o outro que vamos construir uma solução. Esta lógica, segundo a qual a democracia não rima com conflitos e lutas, esteve presente em muitos oradores. É uma visão autoritária e elitista de democracia, antagônica a ideia de que a luta faz a lei.

Por falar nisso, o orador seguinte foi o ex-governador Geraldo Alckmin, que pediu para deixarmos de lado os personalismos (de quem será que ele estaria falando?), da união em defesa das instituições, da paciência frente a impaciência, da tolerância frente a intolerância etc.

E por falar em tolerância, o seguinte orador foi o Ciro Gomes, que saudou a legião de brasileiros de boa fé, falou de um profundo e generoso sentimento de reconciliação, para logo em seguida dizer que haverá a hora de debater o que deu margem ao Bolsonaro (ele não disse, mas até as pedras ouviram que a culpa é do PT). Tirante isto, fez algo que muita gente boa esqueceu de fazer: falar dos desempregados, dos míseros 413 reais, num discurso que tem pegada popular.

Aí veio a Monica de Bole, apresentando a plataforma social-liberal, cujo centro é a renda básica universal; e cuidando de contrapor a democracia, de um lado, e a polarização e a divisão, de outro lado.

Em seguida tivemos o Eduardo Leite, governador do RS, que disse ser um democrata desde criancinha.

Depois veio a Marina Silva, com um discurso de sempre, mas também com o cuidado que outros não tiveram, de falar dos desempregados, dos jovens, das mulheres.

Iago Montalvão, presidente da UNE, nos ofereceu uma poesia do Honestino Guimarães.

Boulos, do PSOL, falou em seguida, dizendo que defender a democracia é derrotar Bolsonaro, por impeachment ou por cassação da chapa. Diferente de outros, lembrou de Dilma, ao falar que impeachment sem crime é golpe e crime sem impeachment é omissão. E falou a frase proibida: Fora Bolsonaro.

Gabeira, o próximo a falar, disse que essa ditadura, diferente da anterior, está comendo a democracia pela beirada.

A Priscila Cruz, diretora executiva do Todos Pela Educação, se disse honrada por estar participando, e arrematou que nenhuma visão é mais potente do que cuidar das crianças mais pobres, pretas, periféricas. Recomendo a quem puder que veja este discurso, com atenção aos detalhes da decoração.

Depois João Signorelli citou Gandhi, o amor cura, une, nutre, pulsa, educa, encoraja, faz nascer, entusiasma etc.

Depois falou o Tarso Genro, que elogiou a plenária democrática amplíssima, mencionando a presença de Marina, Haddad, Ciro, Alckmin e Boulos. Elogia nominalmente o Boulos, igualmente aos demais.

Diz que ali se está aplicando uma tecnologia política testada na Europa, uma concertação por uma agenda de unidade, deixando de lado as questões que não estão incidentes diretamente na realidade, que seriam a democrática, a pandemia e os direitos fundamentais. Fala que o fascismo chegou ao poder através de uma ampla frente política, inclusive através de processos eleitorais, e que precisamos nos unir para bloquear o fascismo, que está agindo a partir do poder de Estado. Que devemos defender a Constituição de 1988 e guardar as nossas diferenças para compor uma agenda posterior. Que ninguém ali está a beira de chegar no governo, que estamos a beira de sermos derrotados pelo fascismo.

Noutro lugar, comentarei o que acho da posição do Tarso.

Em seguida veio o Reinaldo Azevedo, dizendo-se feliz em encontrar um momento de políticos, porque foi a demonização dos políticos que nos fez chegar a esse ponto. E defendeu um novo normal que inclua os pretos e os pobres.

Fiquei pensando comigo se, convidado para um evento de petistas, Reinaldo Azevedo também dir-se-ia feliz, porque foi a demonização dos petistas que nos fez chegar a esse ponto. Quem foi mesmo que inventou o termo “petralha”???

Depois falou o Carlos Siqueira, presidente nacional do PSB, falando não apenas de tirar o Bolsonaro do poder, mas também em unir a nação para reconstruir. Aliás, esta foi a pegada de muitos ali: não se trata apenas de tirar Bolsonaro, mas de unidade depois. O curioso é que a imensa maioria não falou de impeachment já. Para que mesmo seria esta frente??

Na mesma linha, de preocupar-se com o depois, foi Aldo Rebelo, para quem tão importante quanto a democracia é a retomada do crescimento, voltar a crescer, devemos nos unir em torno de uma agenda do crescimento.

Depois falaram Renata Abreu, do Podemos; Arlindo Filipe, coordenador da comissão étnico racial do Direitos Já; e a vice governadora de Pernambuco.

Curiosamente, foi só depois de Luciana Santos falar que FGC corrigiu a gafe e lembrou que Luciana é presidenta nacional do PCdoB.

Luciana defendeu que em momentos agudos, de virada, sempre se buscou frentes amplas, heterogêneas, e concluiu citando Pablo Milanes e Chico Buarque.

Em seguida falou Pedro Ivo, porta voz nacional da Rede Sustentabilidade. Disse que vivemos uma crise civilizatória, que a maior doença é a insustentabilidade, falou da normose, disse que o novo normal tem que ser sustentável, baixo carbono, democracia ampliada e direitos humanos e da natureza.

Sim, este Pedro Ivo é aquele Pedro Ivo da antiga Tendência Marxista, acho até que foi do PRC. Aliás, do comício participaram muitos ex-petistas (Molon, Cristovam, Pedro Ivo, Eduardo Jorge, Weffort e wefraco, Marta).

Depois José Carlos Dias defendeu o direito de dizer não a um governante truculento e despreparado.

E Marta Suplicy repetiu um discurso que eu já tinha ouvido ela fazer, acho eu, em 2016, sobre deixar de lado as diferenças de lado pelo que importa, em nome de algo muito maior, uma frente ampla que acabe com o risco, que dê esperanças para o povo brasileiro, lembrando que até em guerras ocorrem união de adversários. E que dos liberais aos mais progressistas (quem seriam os mais progressistas, ela não disse), trata-se da formação de um programa que permita tirar o país desta situação tão difícil.

Como se vê no discurso da Marta e de outros, não basta ajoelhar, vai ter que rezar: participar desta frente-supostamente-ampla-que-não-é-pelo-impeachment, implicará em assumir compromissos com um programa etc e tal.

Depois de Marta falou Fernanda Melchiona, do PSOL, defendendo a mais ampla unidade de ação contra o autoritarismo, alerta que é um erro sangrar Bolsonaro até 2022, ataca a agenda ultraliberal (que inclui privatizar o saneamento, algo feito por vários dos que ali estavam, mas a Melchiona não citou isso) e também disse as palavras proibidas: Fora Bolsonaro.

Depois falou o Diogens Lucca, fundador do GATE, da PM de SP. Ele nos informa ter aprendido na caserna os valores da democracia, bem como que é parte dos 70%.

Depois falaram a Joênia Wapichana (falou Fora Bolsonaro), o Ricardo Patah da UGT, o governador Wellington Dias, Flávia Cale (ANPG), Adilson de Araújo (CTB), Lidice da Mada (a democracia é a vacina contra o fascismo).

Aqui vale a pena refletir sobre um certo paradoxo. Alguns salientaram que a democracia seria uma vacina contra o fascismo. Outros chamaram a atenção para que a democracia tem que se traduzir em uma vida decente para o povo, sob pena do povo não ter apreço pela democracia. E alguns, como o Senador José Anibal, do PSDB de SP, orador que falou depois, fizeram questão de criticar o pacto pela desigualdade enraizado na sociedade brasileira. E ainda tem a desfaçatez de citar o saneamento, empurrado para a privatização total por uma frente com as digitais tucanas.

Depois de Anibal, falou Maite Schneider, fundadora da TransEmpregos, que disse que a destruição da democracia começa toda vez que a gente encontra brigas, brigas entre esquerda e direita, brigas entre homens e mulheres, pretos e brancos etc.

Maite defendeu, como outros e outras que falaram antes e depois, uma concepção de democracia sem conflito.

Falaram depois Eduardo Suplicy e Cristovam Buarque. Este último reclamou que muitos de nós ainda ficamos pensando em 2020 e não no próximo ano. E disse que precisamos de um plano que nos unifique, elogiando José Anibal e defendendo um pacto pela superação da pobreza.

Depois vieram Jamila Ribeiro e o deputado federal Eduardo Barbosa (PSDB MG), que confessou que não imaginávamos que a crise ia se agravar tanto, dizendo que projetos individuais (não disse de quem) não podem estar acima de projetos de nação e defendendo sobretudo combater as desigualdades (não explicou o que isso tem que ver com privatizar o saneamento).

Depois vieram José Nelton, do Podemos de Goiás; a atriz Lulu Pavarini, o líder indígena Almir Surui e a deputada federal Erica Kokay, que defendeu uma democracia de alta intensidade, criticou a necropolitica e propôs arrancar a faixa presidencial que está no peito do fascismo.

Em seguida falou o deputado federal Alexandre Padilha, filho de pais perseguidos pela ditadura, que lembrou ter sido ministro de Lula e de Dilma, defensor do SUS, afirmou ter ficado muito triste quando aprovaram o congelamento (EC95), portanto teria motivos para não estar aqui e para colocar as divergências em primeiro lugar, mas que os mortos e contaminados pelo Covid19 leva a que estejamos unidos para barrar o mais rápido possível o genocida. Defende o Fora Bolsonaro e da recuperação dos direitos políticos do Lula.

Registre-se, uma vez mais, que a maioria dos que ali estavam não falou do impeachment, mas enfim…

Depois veio o Eduardo Moreira, apresentado como criador do movimento somos 70%, diz que chegou a hora de compreendermos que durante todo este tempo fomos a maioria, criticou a estratégia do medo, que se especializou em destruir reputações, falou que quer a Amazônia preservada, um governo que ouça a medicina, que trate a desigualdade como principal assunto, com as regras democráticas prevalecendo, agregando que cansamos de viver num pais onde antes as pessoas eram torturadas pela ditadura e agora por esta politica de desigualdade, direitos já e não aguentamos mais este governo de Bolsonaro.

Divertido este Eduardo Moreira, ele tem um gêmeo que apoiou o impeachment da Dilma e que atacou Lula e Haddad em 2018.

Depois falou o Roberto Cláudio, prefeito de Fortaleza, orgulhoso de fazer parte deste coletivo; a Carolina Kotscho, que disse ser muito emocionante estar aqui, que é muito importante estar aqui com a classe politica, que estamos juntos é um movimento da sociedade civil que acredita na politica, que é preciso deixar de lado projetos pessoais de poder por um projeto comum de país. E depois dessa quase citação da pior frase de Frei Beto, Carolina diz que é hora da elite entender que, se não for por solidariedade, por consciência, por compaixão, que seja por inteligência, egoísmo, que igualdade é fundamental. Carolina também diz que é preciso ir além de Bolsonaro, estar junto para o que vem depois, que este governo já acabou. Ecoa Ciro Gomes na pergunta sobre onde está/esteve nosso erro, buscar a responsabilidade de cada um de nós. E termina pedindo que esta não seja mais uma reunião de brancos clamando por igualdade.

Pois é.

Depois entrou na passarela aquele que ganharia o prêmio fantasia radical da noite: Raul Jungman, segundo o qual “as forças armadas tem tido um comportamento absolutamente democrático e impecável no seu compromisso constitucional”!!!

Depois veio o deputado federal David Miranda, defendendo o impeachment mais urgente, para que a população possa respirar, viver, seguir em frente, renda emergencial por mais período, pois a fome é a próxima pandemia.

Em seguida veio o jornalista Glenn Greenwald, apelando para que coloquemos em segundo lugar questões de ideologia, política, partido, porque quando a democracia está sendo ameaçada nada disto importa. Faz comentários sobre Trump e a força da democracia nos Estados Unidos que eu não saberia traduzir.

É assustador ouvir este tipo de coisa, pois não é por razões “técnicas”, a-ideológicas, a-políticas, a-partidárias, que as pessoas lutam contra o fascismo e pela democracia.

Depois falam Douglas Belchior, da UNIAFRO; a atriz Lulu, que lê um poema feito pelo filho dela; o Márcio Jerry, presidente do PCdoB do Maranhão, que fala da linda passarela, pela qual desfila nosso compromisso com a democracia; o Danilo Passaro, do Somos Democracia; a Eunice Prudente, que diz que o povo é titular do poder, que o povo precisa de mais esclarecimentos, que é pela via da educação em direitos que vamos construir o novo cidadão brasileiro, informação, crença, esperança em suas lideranças.

A Tabata Amaral é a próxima a falar e também diz estar muito feliz de participar deste movimento (Direitos Já é, definitivamente, um movimento de gente feliz em estar juntos).

Depois fala o Estevão André Silva, da Advocacia Negra; e o Eduardo Jorge, ex-candidato a presidente da República, que diz que em março de 2020 ele constatou a atitude sabotadora do PR quanto a pandemia, desde março ele vem defendendo que se use outra vez a constituição e que o PR seja impedido imediatamente, que cada dia dele, mais mortes para a sociedade brasileira, este é o motivo que une a maior parte da população, que une a maior parte contra ele, há outros motivos, mas é esse que possibilita o fora Bolsonaro, que deputados precisam acordar para isso, Fora Bolsonaro já.

Em seguida Mauricio Parrone lê um trechinho da natureza das coisas, do Lucrecio!! E em seguida FGR introduz na passarela da democracia aquele que FGR diz ter tido a alegria de ter como professor, o Jose Alvaro Moises, também conhecido pelo carinhoso apelido de wefraco. E que nos explica que devemos defender a democratização da democracia, que a democracia tem que “incorporar as pessoas mais simples”.

Os mais simples…

Depois Gonzalo Vecina nos informa que descobriram que, neste momento de loucura e desgoverno, estamos sonhando mais, é tempo de sonhar portanto, sonhar com utopias, igualdade e direitos já.

Depois Gustavo Fruet, ex-prefeito de Curitiba, nos fala da relação direta entre democracia e qualidade de vida, criticando em seguida o populismo (sic). Depois vem a poetisa Elisa Lucinda, o Adriano Massuda (que defende enfaticamente o SUS e ataca a austeridade fiscal) e o Ricardo Borgens Martins, que alerta para não cair na cilada que a defesa da democracia seja a defesa do status quo, defender a democracia é entender que só construiremos um país mais justo por meio da democracia.

Depois  a atriz Ana Petta fala que é uma honra estar aqui, que é um momento muito bonito que já é histórico, defende as gestões Gil e Juca (não cita a Marta…).

Logo vem o Daniel Cara, que defende uma frente ampla substantiva, com pão na mesa, educação publica de qualidade, 10% para a escola pública, o SUS e muitas coisas mais (não cita o saneamento).

Depois é a vez do jurista Pedro Serrano, que defende o impeachment de Bolsonaro e diz que esta frente só tem um sentido, a saber, desembocar no impeachment do Bolsonaro.

Ou seja, se Serrano tem razão, e considerando que a maior parte dos presentes não  se declarou a favor do impeachment…

Depois vem o dramaturgo Kiko Rieser, que lê um trecho de uma peça de Brecht. E depois Henrique Melo faz uma performance, com direito a bataclava, luvas, efeitos especiais e tudo o mais.

Depois tem um vídeo do Ubiraci Dantas, da CGTB;  outro vídeo da Maria Perpetua, do PCdoB do Acre; a fala do José Calixto Ramos, presidente da Nova Central Sindical, que dita a EC95; o deputado federal do PSOL Freixo, o Francisco Weffort, a Leci Brandão (um ato que renova as esperanças) e o José Gregori, para quem a peste está entrando pela frente e o autoritarismo pela porta dos fundos.

Por coincidência, o próximo a falar (contra o radicalismo de direita e de esquerda) foi o Tasso Jereissati. Defendeu o pragmatismo, o bom senso, o equilíbrio. Definitivamente um cara a favor do saneamento!!!!

Depois temos um vídeo, acho, do André Figueiredo, um depoimento do Walter Casagrande (orgulhoso do convite), uma performance da atriz Cleo (bolo, vela, parabéns para voce) e uma canção do Gilberto Gil.

E no final vem o melhor.

Depois de uns vídeos e de uns agradecimentos, FGR diz que “começamos com Belisário, vamos terminar com Belisário”.

Belisário diz que “foi sensacional”, que seguramente será possível montar esta frente, porque as pessoas que por aqui passaram mostraram generosidade, tolerância, quase todo mundo falando direitos já. E engatou explicando que esta é uma frente ampla, que de início não é eleitoral, mas…

FGR sentiu o perigo e rapidamente reassumiu o comando, explicando que a frente não é eleitoral, é uma frente pela democracia… e vamos encerrar.

Pano rápido!!!!

E assim terminou o comício virtual pelos “direitos já”.

(*) Valter Pomar é professor da UFABC e integrante do Diretório Nacional do PT

(**) TEXTO ACIMA NÃO FOI REVISADO PELO AUTOR. 

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