Por Ricardo Menezes (*)
A última coisa que, no início da epidemia no Brasil, eu imaginei foi que o Ministério da Saúde – MS iria errar feio e no ponto mais básico no enfrentamento de um fenômeno coletivo dessa natureza: a notificação compulsória.
Escreverei depois porque não esperava isso.
Mas agora precisamos reverberar a pressão de atores coletivos e individuais que vem pressionando o MS a mudar, já, a sua esdrúxula orientação.
Não dá para continuar no escuro, como tem insistido diversos companheiros e diversas companheiras que estão na luta coordenando diversas instâncias e órgãos do Sistema Único de Saúde – SUS.
Com teste ou sem teste (não dá para esperar chegar ou produzirmos testes), é preciso instituir já a notificação compulsória de síndrome que possa ser originária da infecção pelo coronavírus.
Ou seja, notificar aos órgãos de vigilância epidemiológica:
1. Casos suspeitos atendidos por profissionais de quaisquer equipamentos de saúde, públicos e privados;
2. Resultados positivos de testes laboratoriais (sorológico ou molecular), realizados em quaisquer laboratórios, públicos e privados;
3. Óbitos suspeitos de terem sido originados pelo coronavírus, ocorridos em quaisquer hospitais, públicos e privados, e fora de hospitais.
Claro, os casos e óbitos confirmados, causados pela infecção pelo coronavírus, que estão sendo notificados.
As situações que envolvem a notificação, naturalmente, celeremente devem ser disciplinadas pela autoridade sanitária federal, discutida previamente com as representações das autoridades sanitárias estaduais e municipais.
As orientações, sobre cada situação que enseja a notificação, devem ser veiculadas, amplamente, nos serviços de saúde e fora deles.
Adesão da população e credibilidade são vitais para enfrentarmos a epidemia. Ocorre que, paulatinamente, ouvimos afirmações deste tipo: “são muitos mais casos”, “eles estão escondendo, não é só isso”, “será que é isso que acontece no Brasil?” e outras.
Por fim, na última grande guerra mundial, foi dito algo assim: “a condução política da guerra não é assunto para militares”.
Nessa linha, a Pandemia pelo Coronavírus deve ser conduzida pelas instâncias políticas, consultando, no caso da saúde, equipes multidisciplinares, de certo.
Mas não dá para se guiar somente pelo saber e raciocínio clínico, sem se valer do saber e raciocínio do sanitarismo, ou seja, é urgente acoplar ao raciocínio clínico o epidemiológico e, por decorrência, propostas que dele se originem, como, por exemplo, a intervenção temporária na realidade – na organização da sociedade, na dinâmica de vida das pessoas e nas prioridades de atuação do aparato de saúde, público e privado, instalado, hoje, no País.
(*) Ricardo Menezes é médico e militante petista em São Paulo