Por Clarice Avila (*)
À frente do Ministério da Educação do governo Lula está Camilo Santana (PT), que traz no currículo aquilo que lhe cacifou ao ministério. Ao suceder a Cid Gomes (PDT), que transformou o Estado do Ceará em vitrine e laboratório de pesquisa em educação básica, a partir do “modelo Sobral” em educação, Camilo deu continuidade a esta política construída pela oligárquica família Gomes Ferreira.
De acordo com o Anuário da Educação 2021, o Ceará é a unidade da federação com maior proporção de matrículas em tempo integral em escolas públicas na Educação Básica. Em comparação a muitos estados, o Ceará deu um salto no seu IDEB no período de 2005 a 2019, passando de 3,3 para 6,4; 3,2 para 5,4 e 3,3 para 4,4 nos anos iniciais, finais e médio respectivamente. O Estado também desponta com as melhores médias em aprovação e as menores em reprovação e abandono escolar neste mesmo período.
Maurício Holanda, que foi escolhido pelo ministro Camilo para ser o secretário de Articulação com os Sistemas de Ensino e é ex-secretário de educação do Ceará nos governos de Cid e do próprio Camilo, acredita que o modelo de educação cearense não pode ser transplantado automaticamente para o Brasil todo. Mas acredita que ele oferece “boas lições” para o governo federal.
O Banco Mundial, por sua vez, está de olho nas mudanças ofertadas pelo sistema de educação cearense. A educação é encarada pelo BM, e por outros organismos internacionais alojados no Brasil, como peça fundamental de um jogo de interesses em torno da formação do capital humano e da reprodução das desigualdades, tão necessárias para fazer do campo da educação o campo do mercado. Recentemente, uma reportagem da BBC com Leandro Costa — consultor do Banco Mundial — revelou o que eles pensam. Para Costa, o modelo cearense deve e precisa ser imitado por todos os estados brasileiros e disse, ainda, que o próprio FUNDEB já sinaliza mecanismos de incentivo como os usados no Estado do Ceará.
Aprovado no governo fascista de Jair Bolsonaro, o Novo Fundeb apresenta mecanismos que induzem gestores a utilizarem o dinheiro do Fundo para pagamento de abonos meritocráticos que, por muitas vezes, substituem a implementação do Plano de Cargos e Salários da categoria. Esse modelo de incentivo, importado de países como EUA e Inglaterra, são políticas que dividem a classe do magistério entre os que merecem e os que não merecem receber a bonificação que resulta das notas de desempenho dos alunos. Tais políticas desencadeiam a formação de accountability, ou seja, os resultados do desempenho dos alunos são encarados como responsabilidade do professor e da escola. Assim, as premiações ou bonificações garantem o incentivo e melhora aparente da performance educacional, motivando negativamente a disputa entre as unidades escolares e mascarando a verdadeira realidade da desigualdade educacional do Brasil.
Em Sobral, o foco é sobre as avaliações externas e o material produzido para formar e capacitar os professores e professoras é adquirido de organizações empresariais. Rudá Ricci, em sua análise sobre o tema, condena o forte gerencialismo e a concentração de esforços em apenas duas disciplinas para obtenção da nota do IDEB: português e matemática. Este tipo de “treinamento” é desaprovado por especialistas e profissionais da educação, por entenderem que, neste aspecto, há nítida manipulação dos resultados.
Por vez, o que temos para hoje é um MEC recheado do “modelo Sobral”, que passa entre outros indicados, pela secretária executiva, cargo que fica abaixo apenas do Ministro da Educação. Izolda Cela também já governou o Ceará, sendo uma das mentoras do “modelo Sobral”. Segundo Ricci, a mesma concepção se espraia por outros nomes indicados por Camilo nas pastas da SASE, SESU, SEB e INEP. Precisamos construir, neste 3º mandato do Lula, uma educação pública com a visão do campo progressista e não do campo empresarial que segue firme, impondo o modelo de educação que está na contramão da educação libertadora defendida pelos Freireanos.
(*) Clarice Avila é professora em Barra do Piraí (RJ), mestra em Políticas Públicas (FLACSO) e doutoranda no PPGCS (UFRRJ).