Nossa questão meridional: o Nordeste na eleição de 2002

Por Patrick Campos (*)

Comício da candidatura “Lula Presidente” (PT) nas eleições de 2002 (Caruaru-PE, 2002) / Foto: Olívio Lamas

Este é o terceiro texto de uma série sobre a nossa “questão meridional”, que é como estamos chamando o papel que a Região Nordeste do Brasil tem desempenhado desde o segundo turno de 2006 para decidir as eleições presidenciais em favor das candidaturas do Partido dos Trabalhadores.

No primeiro texto, publicado da edição nº 14 da Revista Esquerda Petista, abordamos especificamente o “fator Nordeste” nas eleições presidenciais, analisando de forma mais geral os resultados das eleições de 1989 a 2022, e demonstrando que é a partir do segundo turno de 2006 que as candidaturas petistas passam a ter maioria eleitoral para presidência em todos os estados da região.

No segundo texto, publicado na edição de março de 2023 do jornal Página 13, além do desempenho do PT nas eleições presidenciais, analisamos também os resultados das eleições proporcionais. Por esta razão, demos alguns passos atrás e fomos até 1982, quando o PT disputou sua primeira eleição proporcional, e fomos até 2002, ano em que Lula foi eleito presidente pela primeira vez.

Uma constatação inicial deste período é que o “fator Nordeste” não esteve presente nos primeiros 20 anos de disputas eleitorais do Partido dos Trabalhadores, ao menos não como estaria anos mais tarde. Justamente para mensurar qual a tendência e o papel que a Região Nordeste passou a ter a partir daquela eleição, retomamos a eleição de 2002, analisando mais alguns de seus dados.

Naquela eleição, o total do eleitorado brasileiro era de 115.253.816 eleitores. Foram efetivamente votar em algum candidato no primeiro turno 84.951.149 (89,61%), que corresponde ao total dos chamados votos válidos (excluindo-se brancos e nulos). Do total destes votos válidos, Lula recebeu 39.455.233 (46,44%), enquanto José Serra obteve 19.705.445 (23,19%).

Especificamente na região Nordeste, a situação era de um total de 30.990.109 eleitores (26,89% do eleitoral nacional). Destes, foram contabilizados 20.424.847 de votos válidos (24,04% do total dos votos válidos do país). Lula obteve no Nordeste 9.370.565 de votos (45,88% de todos os votos da região), que representaram 23,75% de sua votação total no primeiro turno, perdendo apenas em Alagoas, para José Serra (PSDB), e no Ceará, para Ciro Gomes (PPS).

Ou seja, a participação da região Nordeste na votação total de Lula no primeiro turno representou menos de ¼ do total da votação que ele obteve no país, mas muito próximo ao que a região representava no total dos votos válidos. Isso foi um resultado muito significativo, uma vez que sozinho ele obteve quase metade dos votos de toda a região, em um primeiro turno que tinha seis candidaturas presidenciais.

No segundo turno daquela eleição, o quantitativo total de votos válidos aumentou para 86.173.103, ocorrendo um aumento também no Nordeste para 21.450.364 (24,89% do total). Lula foi eleito com 52.793.364 votos (61,27%), sendo 13.197.199 no Nordeste (61,52% de todos os votos da região), o que correspondeu a 25% do total da sua votação.

Assim, em uma disputa com apenas duas candidaturas, Lula cresceu 3.817.634 votos, que representam um grande quantitativo, mas que, diferente de eleições futuras, não representaria uma mudança no resultado final da eleição, uma vez que José Serra obteve 33.370.739 de votos naquele segundo turno.

Esse desempenho, no entanto, não foi o mesmo com relação às candidaturas petistas proporcionais na região. Como já comentado no texto anterior, o PT elegeu, em 2002, 91 deputados federais (o melhor resultado obtido pelo partido até hoje). Destes, 17 foram eleitos a partir de estados do Nordeste (sete na Bahia, três em Pernambuco, dois no Ceará, e um nos estados do Maranhão, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe). A participação do Nordeste na bancada federal do PT em 2002, portanto, foi de 18,68%. Uma vez que o Nordeste elege um total de 151 deputados federais, a participação petista na representação federal da região foi de 11,26%.

Em comparação com as demais regiões, o Nordeste foi a segunda maior em quantidade de eleitores aptos e votos válidos e isso se repetiu no que diz respeito à votação de Lula. Apenas o Sudeste (SP, MG, RJ e ES), região com maior quantidade de eleitores aptos e votos válidos, ficou à frente, com 47,19% do total da votação de Lula no segundo turno (24.911.248 votos). Com relação à bancada federal, o Sudeste elegeu 37 deputados (40,66% do total da bancada do partido). Assim, considerando o total de 179 deputados federais eleitos na região, a participação petista foi de 20,67%.

Os estados da Região Sul do país (RS, SC e PR), por sua vez, com um total de 17.833.494 eleitores aptos (15,47% do total nacional) e de 14.009.446 votos válidos (16,49%), foram responsáveis por 6.927.518 de votos para Lula no primeiro turno (17,56% do total) e por 8.141.465 no segundo turno (15,42% do total). Ainda assim, elegeram 19 deputados federais em 2002, o que representou 20,88% da bancada federal petista. A região como um todo elegeu 77 deputados federais, e a participação petista foi de 24,68% (proporcionalmente, a região em que a bancada petista esteve com maior representação).

No Centro-Oeste (MT, MS, GO e DF), o PT elegeu oito deputados federais (8,79% da bancada) de um total de 41 eleitos na região, o que significou 19,51% de representação petista da região na Câmara dos Deputados. E, no Norte do país, o PT elegeu 10 Deputados Federais (10,99% da bancada) de um total de 65 eleitos na região, o que significou 15,68% da bancada federal da região.

Em resumo, o Nordeste, na eleição de 2002, teve a menor representação proporcional petista na Câmara dos Deputados, quando comparado com as demais regiões (11,26%), mesmo tendo sido a segunda região que, tanto em números absolutos quanto proporcionais, mais deu votos para a candidatura de Lula nos dois turnos. Além disso, ainda não podemos afirmar que houve, naquele momento, um peso desproporcional dos votos na região para decidir a eleição em favor da candidatura petista. Ou seja, não podemos afirmar a existência de um “fator Nordeste” nas eleições de 2002.

Será que este fator surge no difícil primeiro turno das eleições de 2006? Talvez no segundo? Ou apenas após a saída de Lula da Presidência? E a progressiva redução da bancada federal petista ocorre também no Nordeste ou é uma questão maior nas regiões que até 2002 pareciam ser as mais decisivas para o resultado eleitoral presidencial? Estas e outras questões, seguiremos tratando nas próximas edições.

Errata: no texto publicado na edição de março, escrevemos que “em 1990, ocorreram eleições gerais, a primeira com voto direto para os governos estaduais após o fim da ditadura militar”. Esta informação está errada, pois as eleições diretas para os governos estaduais voltaram a ocorrer já em 1982.

(*) Patrick Campos é membro do Diretório Nacional do PT.

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