O despertar dos mortos da Bahia

Por Gabriel Cavalcante (*)

Em 1978, George Romero dirigiu o clássico do cinema “despertar dos mortos”. A obra se imortalizou pela descrição de um mundo onde a infestação zumbi havia se generalizado. O zumbi como conhecemos se caracteriza como um ente que estando morto caminha e ataca suas vítimas, mesmo que desprovido de consciência.

O PED na Bahia, assim como na grande maioria dos estados do Brasil, acabou no dia 09 de julho. No entanto, o pós PED revela os esqueletos no armário dos processos que se desenvolveram ao longo do dia de votação. Trata-se aqui de modalidades múltiplas de votações zumbi.

Em Camaçari, Itabuna e Barro Preto, demonstrou-se cabalmente que falecidos vieram a votar no processo do PED. Os documentos que comprovam a fraude foram devidamente encaminhados à Executiva Estadual do Partido e à COE estadual, no entanto um setor expressivo da direção do PT nega-se a fazer o que se deve: anular o processo viciado para fins de preservar a lisura da eleição interna do Partido.

Por outro lado, há que se falar que existe uma outra modalidade de “voto zumbi”, para além da demonstrada fraude utilizando o nome de companheiros falecidos: a do voto atrelado ao poder econômico. A instrumentalização de órgãos do estado para controlar (através do cabresto) a votação em massa em determinadas chapas e candidaturas, configura-se como expressão do voto sem consciência.

Ampliar o número de filiados no Partido dos Trabalhadores é uma tarefa de todo militante. No entanto, ter um partido de massas em nada significa “comprar filiados” no atacado. A prática de atrelar trabalhadores à votação em troca de benefícios econômicos configura-se como instrumental recorrentemente utilizado pela direita, desde os primórdios da República e não deveria em absoluto ser aceita num partido operário.

Iniciou-se as eleições internas do Partido com inúmeros apontamentos críticos a respeito da forma como o PT foi conduzido na Bahia no último período. No entanto, ao se analisar a maneira como se deu o PED, sem muitos debates para a militância e utilizando-se para a votação desses instrumentos “zumbis”, o saldo final é que estes problemas se avolumaram.

Formas de blindar o Partido dessas práticas há. Desde muito tempo se fala sobre a necessidade de se fazer um recadastramento no PT. Em outro sentido, a validação da filiação deveria ser atrelada a um processo mínimo de formação política para que o novo (ou nova) membro(a) do Partido seja introduzido reconhecendo o espaço político que se apresenta diante de si. O próprio candidato a presidente nacional declarado vitorioso muito falou sobre a existência de “filiações sem critérios”, cabe a ele criar e conduzir métodos que ajudem a alterar essa realidade.

Assim, o PED do PT na Bahia revelou, de forma alarmante, a presença de “votos zumbis” — seja pela utilização fraudulenta de nomes de falecidos, seja pela instrumentalização do poder econômico para coagir eleitores. Essas práticas, além de ferirem os princípios democráticos e éticos que regem um partido comprometido com a classe trabalhadora, colocam em xeque a legitimidade do processo interno. Se o PT deseja verdadeiramente representar os interesses do povo, não pode compactuar com métodos herdados da velha política, tão combatidos em sua origem.

Anular os votos fraudulentos e promover um debate aberto e transparente com a militância não é apenas uma necessidade, mas um dever para resgatar a credibilidade do partido. Caso contrário, o risco não é apenas a perpetuação de vícios, mas a transformação do PT em algo que, assim como os zumbis de Romero, caminha sem consciência — um espectro do que um dia foi seu projeto revolucionário. Os zumbis, invariavelmente, para além de não terem consciência, também devoram os cérebros de suas vítimas; esperamos, então, que o PT consiga sobreviver ao ataque da horda, para o bem do próprio Partido e da classe trabalhadora brasileira.

(*) Gabriel Cavalcante, militante petista e da Articulação de Esquerda na Bahia.

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