Por Valter Pomar (*)
Um companheiro me enviou um texto intitulado “O equívoco de Valter Pomar”.
A seguir comento e respondo ao que é dito no tal texto, que reproduzo ao final.
Começo agradecendo ao autor do texto, pelo tempo gasto e por me permitir, ao responder, desfazer alguns equívocos a respeito do que defendo.
Começando pelo começo: “Se Valter Pomar for eleito para a presidência do PT e aplicar as suas diretrizes, ele irá causar um estrago irremediável ao partido, ao governo Lula e estará contribuindo para reconduzir a direita ao poder, uma tragédia para o povo e Nação brasileira”.
Ou seja: a vitória da esquerda no PED seria, na verdade, a vitória do fascismo.
Eu obviamente não concordo com isso, mas acho ótimo quando as pessoas dizem o quê realmente pensam.
Eu por exemplo acho que a vitória de Edinho contribuirá na destruição do PT e para a vitória dos nossos inimigos. E tenho dito isto publicamente.
Vejamos os argumentos do texto para achar que o “desastre c’est moi”.
Primeiro, “o PT é o partido do presidente e deverá ser suporte ao governo Lula”.
Concordo inteiramente com isto. A divergência está no que significa “dar suporte”. Edinho, por exemplo, dá a entender que “dar suporte” é concordar com tudo e não divergir de nada. Como o governo é amplo, se o PT concordar com tudo o que o governo faz, quem vai disputar os rumos do governo pela esquerda? Ou o autor do texto acha que isso não é necessário, acha que o máximo de esquerda possível é a síntese que o próprio governo formular? O efeito prático disto seria deixar o PT com todo o ônus e deixar aos aliados de direita todo o bônus.
Segundo: “O presidente, governadores, vereadores, deputados e senadores não foram eleitos, pelo povo, em apoio a um programa do PT, mas em apoio a uma ampla coligação de esquerda-centro-direita. Querer mudar tudo no meio do percurso, fazendo prevalecer o ideário programático específico do PT, é aplicar um estelionato eleitoral ao eleitor que não votou em nossos candidatos para isso”.
Concordo inteiramente. Não defendo que o governo Lula seja exclusivamente petista. O que eu defendo são basicamente duas coisas: primeiro, que os aliados de direita votem com o governo e assumam o compromisso de apoiar Lula em 2026. Hoje não é assim: muitos de nossos supostos aliados são inimigos e vão estar noutra campanha ano que vem. Em segundo lugar, eu defendo que se implemente o programa que apresentamos na campanha. Este programa, registrado no TSE, chamava “reconstrução e transformação”. Mas quando começou o governo, desapareceram com a “transformação” e o slogan do governo passou a ser “união e reconstrução”. Eu defendo que se busque a transformação vitoriosa nas urnas de 2022.
Terceira: “Pomar fala em retorno do PT as suas bases históricas sem se dar conta de que as bases não estão mais lá. Nada a ver o ideário do trabalhador de hoje em relação ao de 45 anos atrás. Lá, ele se orgulhava de ser operário e o capacete lhe era um símbolo; hoje, sente-se constrangido pois se vê como um profissional especializado, operador de processo, analista de qualidade, eletricista especializado, carpinteiro. Uma Empregada Doméstica se classifica hoje como Assistente do Lar, não quer mais ser chamada de Empregada Doméstica e, de fato, profissionalmente, é muito diferente do que era. É o PT de hoje, sua direção e o governo Lula que estão junto a essas bases, ao seu ideário prevalecente; caminhar para as bases como prega o Pomar significa o PT afastar-se das bases atuais”.
Neste tópico o autor do texto faz uma salada e tanto.
Primeiro, é óbvio que as “bases” de 1980 não existem mais. Quanto falo em “bases”, portanto, me refiro a duas outras coisas. Primeiro, o PT tem que voltar a defender as bases programáticas que ele defendia quando foi fundado. Segundo, defendo que as direções partidárias tem que coordenar o trabalho que a militância já faz, no seu cotidiano, nos locais de moradia, trabalho, ensino e lazer.
Segundo, nas classes trabalhadoras tem de tudo. Tem urbanos e rurais, tem setor privado e público, tem operários especializados e tem pessoas que não tem especialização. O que eu “prego” é que o PT precisa organizar todos estes setores. E hoje, ao contrário do que diz o texto, o PT organiza muito pouca gente. Quem dera fosse verdade que o PT está de verdade “junto”, no sentido de organizar a maioria de cada um dos setores da classe trabalhadora.
Quarto: “Pomar levanta, ostensivamente, a bandeira do Socialismo. Ideologicamente, é isso que desejamos, mas, sob o enfoque eleitoral estratégico, é um grande equívoco. A maioria do povo não é socialista e nem sabe o que é isso. Uma parcela significativa é radicalmente contra o socialismo / comunismo. As religiões são contra, pregam isso todo dia e 80% do brasileiro é religioso. Caminhar para o socialismo de forma eficaz é fazer o que o governo Lula e o PT estão fazendo. Pregar e implantar medidas socialistas como fortalecimento socioeconômico e político do Estado, distribuição de renda, combate à miséria, justiça na igualdade dos direitos, atendimento às necessidades amplas da população, lutar contra o imperialismo e tantas outras medidas. É, enfim, fazer o que a China fez, sem grandes alardes, e grande sucesso. Quando o povo se der conta, irá perceber que tudo o que ele desejava e conseguiu é, na verdade, o socialismo e o nosso almejo final estará concretizado”.
Esta parte do texto pode ser resumida assim: vamos enganar o povo.
Sou contra isso. Primeiro, seria inútil, pois além do povo ser mais inteligente do que o autor do texto parece achar, a direita faz questão de lembrar o tempo todo que somos socialistas. Segundo, porque para implantar “medidas socialistas” é preciso politizar as pessoas, senão acontece o que aconteceu entre 2003 e 2016: fizemos muita coisa mas o povo não se politizou na mesma proporção. E não há como politizar as pessoas sem também falar, por exemplo, de capitalismo e socialismo.
Por último, o autor do texto deve estar falando de uma China que eu não conheço. A China que eu conheço fez uma revolução socialista e lá se fala disso o tempo todo.
Quinto: “A fala de Pomar induz que tudo o que o governo Lula não está conseguindo fazer é porque ele não quer, sem considerar a dificuldade diante de um inimigo tão poderoso, com todas as instituições contra, em menor grau as esferas superiores do Poder Judiciário superior e uma população totalmente dividida. O candidato coloca-se na posição de torcedor que, posicionado na arquibancada, exige o gol, sem entrar em campo. É a mesma estratégia que a direita usa contra o governo”.
Bom, se o autor do texto foi induzido a concluir isso, lamento, mas a culpa não é minha. Eu sempre aponto que a correlação de forças é horrível. A divergência está noutro lugar: eu sou de opinião que não se está fazendo o que pode e precisa ser feito para mudar a correlação de forças. Como fizemos na campanha Lula Livre, que ajudei a coordenar. Naquela época, aliás, muitos dos hoje puxa-saco do Lula se esconderam e entregaram os pontos…
Sexto: “Finalmente, caro candidato, querer dar lições de firmeza ideológica e estratégia de luta política ao Lula é muita pretensão, autoufanismo exacerbado. O que temos a fazer é aderir à estratégia de luta bem sucedida em toda sua vida do presidente, apoiar o seu governo e seguir o rumo que está sendo dado, enfrentando os desvios de forma crítica e participativa e não, apenas, como juiz de condenação. As mudanças políticas mais radicais ocorrerão como resultado final de um processo contínuo em evolução, a apoteose final dos suaves acordes de uma inebriante melodia.”
O problema aqui está, entre outras coisas, na confusão entre o “Lula pessoa jurídica” com o “Lula pessoa física”. O Lula pessoa jurídica todos nós apoiamos e defendemos. No meu caso desde 1982. Mas o Lula pessoa física é um militante como todos nós, acerta mas também erra. Ninguém acerta todas. Não é verdade que a estratégia defendida por Lula pessoa física tenha sido “bem sucedida em toda sua vida”. Por esse e por outros motivos é um erro usar o Lula pessoa jurídica como argumento de autoridade. E quanto ao Lula pessoa física, lembro que em 1993 ele defendia o parlamentarismo e tinha, então, o apoio de 70% do Diretório Nacional do PT. Mas na base a posição de Lula só teve 30% dos votos: a maioria escolheu o presidencialismo. A base naquela época soube muito bem diferenciar a pessoa física da jurídica. Espero que continue sabendo fazer isso.
(*) Valter Pomar é professor e candidato à presidência nacional do PT
Acima sem revisão. Abaixo o texto criticado.
O EQUÍVOCO DE VALTER POMAR
Se Valter Pomar for eleito para a presidência do PT e aplicar as suas diretrizes, ele irá causar um estrago irremediável ao partido, ao governo Lula e estará contribuindo para reconduzir a direita ao poder, uma tragédia para o povo e Nação brasileira. Digo isso, não sob o enfoque do Partido como sistema isolado, mas inserido no contexto político amplo da nossa realidade.
Justifico:
(1) O PT é o partido do presidente e deverá ser suporte ao governo Lula. Existem 3 dezenas de partidos que estão desempenhando, e muito bem, esse papel de críticos contumazes;
(2) O presidente, governadores, vereadores, deputados e senadores não foram eleitos, pelo povo, em apoio a um programa do PT, mas em apoio a uma ampla coligação de esquerda-centro-direita. Querer mudar tudo no meio do percurso, fazendo prevalecer o ideário programático específico do PT, é aplicar um estelionato eleitoral ao eleitor que não votou em nossos candidatos para isso;
(3) Pomar fala em retorno do PT as suas bases históricas sem se dar conta de que as bases não estão mais lá. Nada a ver o ideário do trabalhador de hoje em relação ao de 45 anos atrás. Lá, ele se orgulhava de ser operário e o capacete lhe era um símbolo; hoje, sente-se constrangido pois se vê como um profissional especializado, operador de processo, analista de qualidade, eletricista especializado, carpinteiro. Uma Empregada Doméstica se classifica hoje como Assistente do Lar, não quer mais ser chamada de Empregada Doméstica e, de fato, profissionalmente, é muito diferente do que era. É o PT de hoje, sua direção e o governo Lula que estão junto a essas bases, ao seu ideário prevalecente; caminhar para as bases como prega o Pomar significa o PT afastar-se das bases atuais;
(4) Pomar levanta, ostensivamente, a bandeira do Socialismo. Ideologicamente, é isso que desejamos, mas, sob o enfoque eleitoral estratégico, é um grande equívoco. A maioria do povo não é socialista e nem sabe o que é isso. Uma parcela significativa é radicalmente contra o socialismo / comunismo. As religiões são contra, pregam isso todo dia e 80% do brasileiro é religioso. Caminhar para o socialismo de forma eficaz é fazer o que o governo Lula e o PT estão fazendo. Pregar e implantar medidas socialistas como fortalecimento socioeconômico e político do Estado, distribuição de renda, combate à miséria, justiça na igualdade dos direitos, atendimento às necessidades amplas da população, lutar contra o imperialismo e tantas outras medidas. É, enfim, fazer o que a China fez, sem grandes alardes, e grande sucesso. Quando o povo se der conta, irá perceber que tudo o que ele desejava e conseguiu é, na verdade, o socialismo e o nosso almejo final estará concretizado;
(5) A fala de Pomar induz que tudo o que o governo Lula não está conseguindo fazer é porque ele não quer, sem considerar a dificuldade diante de um inimigo tão poderoso, com todas as instituições contra, em menor grau as esferas superiores do Poder Judiciário superior e uma população totalmente dividida. O candidato coloca-se na posição de torcedor que, posicionado na arquibancada, exige o gol, sem entrar em campo. É a mesma estratégia que a direita usa contra o governo;
(6) Finalmente, caro candidato, querer dar lições de firmeza ideológica e estratégia de luta política ao Lula é muita pretensão, autoufanismo exacerbado. O que temos a fazer é aderir à estratégia de luta bem sucedida em toda sua vida do presidente, apoiar o seu governo e seguir o rumo que está sendo dado, enfrentando os desvios de forma crítica e participativa e não, apenas, como juiz de condenação. As mudanças políticas mais radicais ocorrerão como resultado final de um processo contínuo em evolução, a apoteose final dos suaves acordes de uma inebriante melodia.