Por Valter Pomar (*)
Primeiro foi Marilena Chauí, depois foi Breno Altman, agora é Tarso Genro.
Segundo o 247, reproduzindo o Valor, Tarso teria dito: “Não tenho nenhuma restrição de princípios em relação a Jilmar Tatto, mas sim ao fato de o PT forçar ter a cabeça de chapa. O PT precisa se abrir e mostrar a grandeza política que temos. Sabemos ser tanto cabeça de chapa como apoiar outro candidato. É preciso ter grandeza política para ter um candidato de unidade”.
Diferente do Tarso, eu tenho inúmeras restrições ao companheiro Jilmar Tatto. Inclusive por isso, não apoiei sua pré-candidatura a prefeito. Entretanto, igual a Tarso, não milito nem voto em São Paulo capital. Assim, a pergunta em primeiro lugar é: o que farão os petistas da maior cidade do país?
A julgar pelas primeiras pesquisas, formais e informais, parece que uma parte do eleitorado petista estaria migrando (ou propenso a migrar) para a candidatura Boulos.
Claro que em tese isto pode ser revertido, no curso da campanha eleitoral. Mas, a julgar pelo número de pessoas preocupadas, parece crescer a ideia de que, mantido Tatto, a migração será muito grande.
Surpresa? Ao menos para mim, não. Chega a ser óbvio que poderia dar nisto, não apenas por conta das características da candidatura Tatto, mas também por conta do método utilizado para escolhê-lo como candidato.
Vamos lembrar que o Diretório Municipal do PT de São Paulo escolheu um método que excluiu a imensa maioria da base petista, usando como pretexto a pandemia.
Pois bem: o PSOL acabou de escolher a chapa Boulos e Erundina fazendo uma prévia que respeitou os procedimentos sanitários, demonstrando mais uma vez que a direção municipal do PT de São Paulo errou ao optar por um colégio eleitoral.
A direção municipal do PT? Sim, mas não apenas, pois a direção estadual do PT e o Diretório nacional do PT endossaram as decisões do município.
Que fique claro: a maioria dos integrantes destas três instâncias, contra o voto de uma minoria, optou por um método de escolha que restringiu brutalmente o número de votantes.
A esse respeito, sugiro ler o seguinte: https://pagina13.org.br/nota-da-ae-sp-a-candidatura-do-pt-a-prefeitura-de-sao-paulo-deve-ser-eleita-em-previas-virtuais/
Tão logo Tatto foi escolhido, por pequena diferença em relação ao segundo colocado, um grupo de militantes do PT São Paulo encaminhou um recurso ao Diretório Nacional.
Este recurso repousa em alguma gaveta, mas pode ser lido aqui:
https://pagina13.org.br/ao-diretorio-nacional-do-pt-reabra-a-discussao-sobre-sao-paulo/
Isto posto, as pessoas ilustres que estão se posicionando publicamente poderiam fazer o mesmo que estes filiados acima-assinados fizeram, ou seja, encaminhar ao Diretório Nacional um apelo para que intervenha.
Afinal, é bom lembrar, se o Diretório Nacional tem o direito de escolher a candidata do PT em Recife, também tem a “potesdade” de escolher o candidato do PT em São Paulo.
Entretanto, Marilena e Tarso não falam em escolher outra candidatura petista. Falam em retirar a candidatura petista da disputa e em apoiar a candidatura de Boulos.
Ou seja, propõem algo que na prática vai eliminar o PT da disputa eleitoral da maior cidade do país, com impactos políticos e eleitorais em 2020 e para além (especialmente nas cidades ao redor de São Paulo, mas não só).
Digamos que o PT faça esta opção, mesmo não recebendo da parte do PSOL nenhuma contrapartida à altura (o PT já apoia o PSOL em Belém e queria apoiar o PSOL no Rio de Janeiro, mas as recíprocas são, digamos, “menos verdadeiras”).
A pergunta é: qual seria o impacto disto nas eleições?
Claro que a esta altura do campeonato e numa eleição tão anormal, é tudo hipótese, mas a minha hipótese é que tem gente superestimando as possibilidades de êxito eleitoral de uma chapa Boulos-Erundina, mesmo que com apoio do PT ou até com o PT na vice.
Os resultados das eleições 2012-2016 e 2018 mostram que o eleitorado de esquerda está muito reduzido em São Paulo. Além disso, a depender do que faça Marta Suplicy, uma parte deste eleitorado vai migrar em outra direção, que não o PSOL.
Infelizmente, como ocorreu no Rio de Janeiro, o debilitamento do PT em São Paulo não é acompanhado do fortalecimento de toda a esquerda; o eventual crescimento do PSOL, atraindo eleitores petistas, especialmente nos setores médios, não implica em crescimento do conjunto da esquerda, pelo contrário.
Isto pode mudar? Sempre pode, mas os indicadores que vejo não apontam para uma mudança agora, pelo menos.
Portanto, na minha opinião retirar Tatto da disputa pode contribuir para o PSOL e pode contribuir para um aparente e passageiro bem-estar daqueles que têm restrições (de princípio, ou não) contra sua candidatura.
Mas, até onde eu consigo ver, não vai contribuir nada, ou vai contribuir muito pouco, para aqueles que deveriam ser nossos objetivos centrais: disputar para valer a prefeitura de São Paulo e usar a campanha para fortalecer a oposição a Bolsonaro.
Haveria uma solução que ajudasse nesses objetivos?
Claro que sim, a solução chama-se Haddad.
Sua candidatura a prefeito daria uma estatura nacional para a disputa em São Paulo, ampliaria muito nossa votação, com mais chances de vitória do que qualquer outro nome.
Infelizmente, uma parte do PT segue achando que Haddad deve ser preservado para 2022 e/ou deve ter como prioridade em 2020 fazer campanha em todo o Brasil. E outra parte do PT, inclusive pessoas muito importantes que não concordam com as duas premissas expostas anteriormente, não fez até agora nenhum movimento prático para tentar convencer Haddad.
O resultado prático destas duas atitudes será, ou bem manter Tatto (enfrentando o risco da debandada de uma parte do nosso eleitorado), ou bem lançar outro nome (que, salvo Haddad, não terá desempenho eleitoral melhor), ou então… a “solução” proposta por Tarso e Marilena (e, em último caso, também apoiada por Breno Altman).
Não concordo com esta “solução”, entre outros motivos porque não considero que tirar Tatto em favor de Boulos seja solução para os nossos Problemas com P maiúsculo, a saber: disputar para valer a prefeitura de São Paulo e usar a campanha para fortalecer a oposição a Bolsonaro.
Por óbvio, também não acredito que este tipo de movimentação resulte numa “frente de esquerda” que mereça o nome e corresponda às expectativas.
Ademais, simplesmente não consigo entender o raciocínio segundo o qual, para impedir um péssimo desempenho, seria melhor não ter desempenho algum. Noutras palavras, com medo de um fiasco eleitoral, algumas pessoas preferem não ter candidatura!!!
Dizem que quem pode o mais, pode o menos. Se as pessoas acham possível que o Partido apoie Boulos, então também devem achar possível que o Diretório nacional do Partido diga ao companheiro Haddad – com todo o tato que cabe — para ser nosso candidato, em 2020, na cidade de São Paulo.
Um último comentário: eu combato os métodos e as opções políticas que deram em Tatto, e que conduzem nosso Partido a este tipo de situação.
Mas não acho que a melhor forma para enfrentar estes métodos e estas opções seja optar por soluções que, mesmo não sendo a intenção, na prática desconstroem o Partido.
(*) Valter Pomar é professor da UFABC e membro do Diretório Nacional do PT