Editorial do Jornal Página 13 de junho
Hoje, amplos setores da esquerda começam a se dar conta das decorrências práticas da chamada política de frente ampla. Assim como vão se dando conta dos efeitos negativos da chamada Federação.
Não se trata, apenas, das alianças que foram feitas nas eleições de 2022, mas principalmente da inexistência de um plano de voo que nos permita superar os limites impostos pela herança maldita, pela maioria de direita nas instituições, pela força da extrema direita em vários espaços de poder, com destaque para os aparatos de segurança.
Falta um plano de voo, acima de tudo, que nos permita superar a condição primário-exportadora, sem o que não vamos superar a desigualdade social estrutural existente no Brasil.
Nesse sentido, o mais grave do atual debate sobre o marco fiscal não são as medidas em si, mas o horizonte medíocre predominante no debate a respeito, projetando perspectivas também medíocres para o desenvolvimento nacional. Num país que precisa crescer 10% ao ano durante muitos anos, grande parte da elite política está focada em garantir seus privilégios e em “enxugar gastos”.
Do ponto de vista da política, o tema central é como alterar a correlação de forças. E isso não se fará sem elevar o nível do debate, sem colocar na pauta objetivos ambiciosos e imediatos, como por exemplo “40 anos em 4”.
Obviamente, a correlação de forças nas instituições só será alterada lentamente. Por conta disto, impõe-se a disjuntiva: i/ou vamos nos conformar com isso e apostar que “devagar se irá ao longe”, correndo o alto risco de logo mais sermos surpreendidos com novas derrotas e golpes, facilitadas pela implacável e inevitável biologia; ii/ou vamos adotar medidas que busquem alterar a correlação de forças nas instituições, agindo de fora para dentro e de baixo para cima, através de ações que contribuam para a conscientização, auto-organização e mobilização do povo.
A segunda opção exige que o PT adote uma política que combine apoiar o governo contra a extrema direita e a oposição em geral, mas também disputar os rumos do governo contra os setores da extrema direita e da direita neoliberal que fazem parte do próprio governo.
A segunda opção exige, ademais, perceber que é necessário mudar rápida e velozmente as condições de vida da maioria das pessoas. E isso se faz através de políticas públicas que incidam na vida material, mas também através de ações políticas que incidam no ambiente psicocultural do país.
Entretanto, parte dos petistas que está no governo, nas bancadas e na direção do Partido, não concorda com isto e, às vezes, nem se dá conta da existência da disjuntiva citada. Atuam como se a dinâmica institucional cotidiana fosse a única alternativa possível e, além disso, como se a dinâmica institucional fosse suficiente para superar as dificuldades e construir as alternativas de que necessitamos. Ademais, não compreendem a necessidade de, ao mesmo tempo, defender e disputar os rumos do governo.
Lula, em nossa opinião, percebe – ao menos em parte – esta necessidade e as demais questões citadas. Dizemos isso com base em parte importante de suas declarações públicas, que não falam apenas de “união e reconstrução”, mas também de “reconstrução e transformação”. Mas boa parte dos petistas que estão em postos-chave do governo estão à direita de Lula.
Sem politização, sem mobilização e sem luta não haverá mudanças. Neste sentido, entre outras propostas, defendemos a convocação de uma Conferência nacional pelo desenvolvimento, que possa servir de catalisador para um plano de “40 anos em 4”.
Nesta mesma perspectiva, defendemos a convocação – por exemplo pelas Frentes – de um encontro nacional do PT e das forças do campo democrático e popular, para debater o enfrentamento da situação atual e das eleições 2024.
É preciso romper o cerco, é preciso mais ousadia, é preciso convocar novamente a mobilização dos que nos deram a vitória em 2022.
A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda