Por Sonia Fardin e Adriano Bueno (*)
Foto: Fernanda Sunega / Fonte: Site da Prefeitura de Campinas
O governo Dario Saadi organizou, nesta semana, as comemorações oficiais do aniversário de 248 anos de Campinas. Segundo notícia do site oficial da prefeitura, as comemorações foram marcadas pela “integração entre os povos” (leia aqui). A foto acima não expressa exatamente esta “integração”.
Os 8 povos em questão são: Japão, Líbano, Itália, França, Estados Unidos, China, Equador e… Brasil (?). A matéria no site da prefeitura informa que os 7 países foram escolhidos por serem os “países com representações consulares em Campinas”.
Mas, o Ministério das Relações Exteriores, em seu site, informa que apenas 3 destes 8 países possuem representação consular na cidade de Campinas: Líbano, Itália e França. Veja com seus próprios olhos aqui.
Ou seja, 2 países que possuem representação consular não constam na lista (Portugal e Espanha); e 4 países sem representação consular constam (Japão, Estados Unidos, China e Equador).
O que fica explícito é que para a festa, com apresentação de danças e feira gastronômica típicas, nenhum país africano esteve presente e toda a diversidade de povos originários que também integra nossa raiz cultural foi reduzida a uma barraca chamada “Brasil”.
Detalhe: a barraca “Brasil” vendia espetinhos industrializados. Ficou resumida a isso toda a riqueza das matrizes indígena e africana que existem em nossa gastronomia ancestral.
O site destaca, ainda, uma fala do prefeito Dario Saadi:
“As pessoas que vieram para cá, como eu, as pessoas que nasceram aqui, enfim, todos ajudam a construir a cidade. Temos o desafio de fazer a cidade crescer e reduzir as desigualdades e a população de Campinas sabe enfrentar desafios”
Se a celebração do aniversário foi um momento de reunir de fato “todos (que) ajudam a construir a cidade”, é de causar espanto que o governo Dario Saadi não tenha viabilizado a presença de nenhum país africano nas celebrações.
O Brasil é o país que concentra a segunda maior população negra no mundo, ficando atrás apenas da Nigéria. Afrodescendentes são a maioria da população brasileira.
Campinas cresceu e se desenvolveu como polo produtor do café porque sua classe dominante usou o trabalho de africanos e seus descendentes. Trabalho escravizado.
Em Campinas vivem 1.043 indígenas. Parece pouco, mas não é, se pensarmos no genocídio a que foram submetidos. Campinas é a terceira cidade com maior população declarada indígena em contexto urbano no estado de São Paulo segundo o Censo Demográfico de 2010 (IBGE).
O mesmo Censo de 2010 nos mostra que 349.244 pessoas se auto declaram “pretas” ou “pardas” em Campinas.
A cidade está assentada sobre a vida de milhares de indígenas e africanos. Seus descendentes, por meio de muitas lutas, mantêm viva a herança cultural de matrizes africana e indígena.
No parágrafo final da matéria, no site da prefeitura, fala-se dos tropeiros; fala-se de Francisco Barreto Leme; fala-se da primeira missa na capela provisória de palha e do Frei Antônio de Pádua, que a celebrou. Nada sobre indígenas, negros ou negras.
Cabe, como fez Brecht, perguntar: “não tinha nenhum cozinheiro com eles?”
É como se não existissem. Mas, só que não. Existem, resistem, não se calam e seguem perguntando: como “fazer a cidade crescer e reduzir as desigualdades” deixando de lado uma expressiva parcela dos trabalhadores de Campinas nas comemorações de aniversário da cidade?
(*) Sonia Fardin e Adriano Bueno são integrantes do Conselho Municipal de Política Cultural e militantes do PT de Campinas.