Por Ana Lídia (*)
Desde quando o novo Governo Brasileiro assumiu, a educação tem sido um de seus principais alvos. O certo é que logo nos primeiros dias de seu mandato, Jair Bolsonaro vem aprofundando uma agenda de desmontes da educação pública já iniciada ao longo do governo de Michel Temer com a EC 95 de congelamento dos investimentos públicos nas áreas sociais, com a Reforma do Ensino Médio e com a Lei da Mordaça. Todas essas medidas seguem a pleno vapor, inviabilizando o financiamento de 10% do PIB no Plano Nacional de Educação (PNE) aprovado em 2014. Hoje, o alvo do governo é o aniquilamento do FUNDEB.
Nos primeiros meses de 2019 foram anunciados cortes de recursos destinados às universidades brasileiras que colocam em xeque o futuro das pesquisas e da ciência, atacando a autonomia das universidades e a soberania nacional. Foram expedidas portarias pelas agências de fomento à pesquisa adequando a distribuição de recursos apenas para áreas temáticas que estivessem em consonância com o caráter autoritário e conservador do atual governo. Desde o princípio, os sinais já eram claros: estaríamos sob um governo antidemocrático e anti-povo.
Além disso, são inúmeros casos de censuras e perseguições aos professores e pesquisadores. Bolsonaro ainda afirmou que o ensino superior não seria para todo mundo, em uma clara visão elitista que assola a história de nosso país, resguardando as cadeiras da Universidade apenas a uma elite e restringindo o acesso dos mais pobres que para o governo deveriam ser apenas mão de obra desqualificada e barata ao mercado.
Entre trocas de ministros da educação, em uma demonstração clara das pataquadas do governo e do total desprezo à educação pública e aos direitos sociais, Bolsonaro vetou integralmente um projeto de lei que tramitava desde 2015 e prevê a exigência de prestação de serviços de psicologia e serviço social nas redes públicas de educação básica. Além disso, o atual governo investe para aprovar o Ensino Domiciliar e em modelos de escolas cívico-militares que vão à contramão de uma educação mais diversa, plural, democrática e autônoma. Modelos esses que têm sido abraçados por governadores de diversos estados, inclusive do campo da esquerda.
O que temos percebido é que está em andamento um projeto que visa privatizar a educação pública, a qual tem sofrido os efeitos mais destrutivos com as estratégias neoliberais. Com a crise da democracia atual, a privatização das instituições públicas passou a ser defendida abertamente, conjuntamente com outro modelo de educação de fortes matrizes neoliberais. Entre uma experiência e outra e projetos desastrosos sendo implantados, o que se vê atualmente é o sucateamento deliberado com a finalidade de argumentar que a privatização é inevitável. É uma visão de mundo que reduz a educação à condição de mercadoria e os alunos em receptores de modelos empresariais e subordinados. A educação tem se mostrado um terreno fértil para o acúmulo de capital, movimentando 60 bilhões de dólares ao ano.
Nesse sentido, é importante entender eventos como os erros cometidos nas correções das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) prejudicando milhares de jovens que buscam uma vaga na universidade. Pois, situações como essas têm como objetivo privatizar e terceirizar a educação pública brasileira, beneficiando apenas grandes grupos educacionais internacionais.
O ministro de Bolsonaro, Paulo Guedes, declarou que o governo irá apoiar um grande programa de vouchers para a educação básica, o que significa designar ao capital privado internacional o futuro e recursos da educação brasileira. Essa situação já é uma realidade em muitas partes do país. Podemos considerar por exemplo, o caso das creches, as quais já são alvos das terceirizações e distribuição de vouchers para suprir a falta de vagas. Além disso, é importante considerar o caso das editoras de livros didáticos que atendem o conjunto das escolas, as quais nenhuma delas é nacional, isto é, temos aqui também o capital internacional operando na formação ideológica e curricular dos educandos.
No Estado de São Paulo, o que temos assistido é a entrada massiva de instituições e fundações privadas, por meio do programa INOVA, que operam tanto na elaboração do currículo, quanto na formação de professores, quanto na organização e “gestão” da escola. No início deste ano o governo de João Doria anunciou um novo projeto, o “Nova Escola”, o qual prevê entregar prédios “ociosos” e Unidades Escolares para a inciativa privada.
Os professores seguem na mira do governo. Depois da aprovação da reforma da previdência que impacta diretamente os trabalhadores da educação, anuncia ainda a criação de um canal para denunciar os docentes que atentem contra a “moral-familiar”. Nesse momento, Bolsonaro marcha em direção à reforma tributária e à reforma administrativa que ataca não apenas o servidor e os serviços públicos, mas também atinge diretamente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB).
O FUNDEB concentra mais de 60% dos recursos investidos na educação básica e se desenvolveu como uma das principais políticas sociais de financiamento da educação. Isso porque ele visa combater as desigualdades socioeconômicas e regionais, proporcionando o amplo acesso à educação básica com parte dos investimentos advindos do governo federal. Além disso, é o FUNDEB que garante a valorização do trabalhador da educação, com piso salarial do magistério, plano de carreira, jornada de trabalho extra- classe etc. No entanto, em dezembro deste ano encerra-se a sua vigência e os riscos de seu fim tem se mostrado uma realidade.
A reforma tributária prevê a desvinculação obrigatória dos tributos às áreas de serviços sociais, inclusive para a educação, isso nada mais é do que um esvaziamento dos recursos para, mais uma vez, justificar que a privatização é a saída. Já, a reforma administrativa ataca o funcionalismo público, o qual é o responsável pela efetivação dos direitos e da implementação do FUNDEB. O debate pelo acesso e garantia de direitos sociais hoje, passa pelo debate do financiamento, pois sem recursos não há a efetividade de direitos e sem FUNDEB não há direitos; sem FUNDEB não haverá escola pública!
O governo Bolsonaro implementa uma agenda de desmontes, de precarização da vida dos trabalhadores brasileiros. Segue cortando gastos da educação, promovendo o aniquilamento das políticas públicas, atacando a carreira do professor e os investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Seu governo caminha junto com forças ultracapitalistas autoritárias e conservadoras, e promete uma destruição profunda da democracia e dos direitos sociais, misturando a privatização da educação com terceirização, o resultado disso é a profunda precarização da vida da classe trabalhadora brasileira.
O que temos assistido nos últimos anos é um crime contra a educação pública e emancipadora. De um lado um desmonte profundo do currículo, o qual vem sendo promovido pelas instituições privadas que vomitam ideologias neoliberais, individualizantes e meritocráticas. De outro lado, vemos mais uma faceta do fascismo operando nas escolas na figura da Polícia Militar e dos modelos de escolas cívico-militares, com passe livre para agredir e disseminar mais ódio, violência e autoritarismo.
A escola, como um direito universal, deveria ser um local de emancipação do pensamento, onde se oferece outras perspectivas de vida aos jovens, os quais todos os dias sofrem com as violências, seja na busca de um emprego, ou por melhorias da qualidade de vida, em busca de lazer, etc, violências essas acometidas, principalmente pelo estado na figura das polícias. Nesse sentido, é fundamental não apenas defender a Educação pública, gratuita e de qualidade, mas também lutar por outro modelo educacional mais justo, inclusivo, diverso, popular e progressista. Nossa luta imediata precisa estar atrelada na defesa de um FUNDEB como política permanente, pois defendê-lo é disputar o poder do Estado, disputar a democracia e a soberania brasileira.
(*) Ana Lídia é professora da rede pública de ensino no Estado de São Paulo, militante da Apeoesp e do PT