A lição do Niger

Por Fausto Antonio (*)

Epigrafia  do  golpe no Niger e a enunciação de um bloco  anti-imperialismo na África Ocidental

Será  que o golpe  em si é sua própria  didática política?  Nesses limites, cria-se  uma  compreensão aparente, não uma dialética  compreensão, além da forma, do  conteúdo. A  análise produtiva passa pelo entendimento do  conteúdo alicerçado pela soberania nacional e anti-imperialismo. É  o que  nos  ensinam  as  posições  do Mali e  de Burkina  Faso, que dizem  que ao defendermos a  soberania do Niger, enunciamos a necessidade de construção de um bloco anti-imperialismo na África Ocidental. 

A   forma  de  qualquer  golpe militar é  determinada historicamente  pelo conteúdo

Historicamente, no continente africano e no mundo, os golpes militares, tipologia de golpes de Estado, dividem-se, sem desconsiderar  outros arranjos,  em dois  grupos.  Há  os  golpes convencionais alimentados, executados e protegidos ideológica e midiaticamente  para assegurar privilégios para o  condomínio euro-estadunidense. Na  outra  margem ou lado, existem golpes de natureza e conteúdo nacionalista.

O caso em pauta, na África Ocidental, diz  que o  golpe, levante contra o império franco -yanque, além das formas “democráticas”, tem conteúdos determinados historicamente pelas necessidades internas e nacionais. Avultam, na  encruzilhada do Niger, Mali e Burkina Faso, os  processos para as independências  econômicas, que  exigem mais do que meros  arranjos institucionais.

Por revelarem profunda oposição à  real indepenência econômica,  os golpes militares  convencionais, emblemático  na categoria  foi o  de 1964, no Brasil, são aqueles cuja relação de  comando é externa, a despeito de elevarem taticamente os privilégios das burguesias nacionais.  Em outros  termos, o levante ou insurreição  armada não é motivado por interesses sociais intrinsicamente voltados à  soberania nacional e ao controle dos recursos minerais, energéticos, estratégicos, como urânio e petróleo,  e possibilitadores  de relativa  independência econômica .

O  papel da  imprensa capitalista e totalitária 

Desse  modo, a  imprensa hegemônica e  voz do neo-liberanismo apoia  golpes que  significam a permissão para a  rapinagem ou roubo, sem limites, dos recursos energéticos, minerais e humanos. O  golpe no Niger não  terá  apoio da mídia capitalista por  tal razão. Em outros  termos, a chave de leitura  da imprensa capitalista e dos  seus donos, correlegionários burgueses e imperialistas, não é defensora, a  rigor, da democracia ou de  qualquer plumagem ligada à  liberdade, mas sim de  tenaz e  articulada oposição à  natureza e ao conteúdo do golpe em processo no Niger.

Não há  nenhuma relação estratégica  possível  entre o  conteúdo e a natureza do  golpe do Niger  com o  processo, por  exemplo, de imposição do franco como moeda e o mesmo caso  se  aplica à  língua francesa, que é, como a moeda do poder, língua  despótica e lastro do poder e impositiva de valores exógenos, nada mais.

Golpes e conteúdos nacionalistas   

Não o  golpe  em si, mas  o  conteúdo do golpe  militar  no Niger é exemplo para o mundo anti-imperialismo.  A bandeira da soberania  nacional e de investida contra a moeda e língua despóticas da metrópole opressora, não a  forma  golpe militar, pode  ser uma inspiração para os  países da África Ocidental e para o continente  de  conjunto.

O conteúdo  político renova ou categoriza  o  movimento  político militar, com apoio das  ruas, de levante insubmisso à  França. O  conteúdo do processo é  modelar ou  inspirador  para os países que querem  a soberania nacional e autodeterminação dos seus povos no  continente  africano.

Golpes militares são corriqueiros e orquestrados, no continente africano, para derrubar governos nacionalistas quando esboçados  e/ou arquitetados em confronto ou contrários aos condomínios da parelha euro- estadunidense.

O Niger contraria a regra e sustenta um golpe militar para  enfrentar os  privilégios angariados perversamente  pelo condomínio  franco -yanque no páís. O  Niger conta com a  adesão firme e manifesta do Mali e Burkina  Faso, entre outros  países da África  Ocidental.

A derrota momentâneada França e da OTAN, expressão máxima do imperialismo, mostra e comprova que para enfrentar  o imperialismo é preciso, no mínimo, a defesa dos interesses nacionais e contar, é o caso doNiger, com apoio popular. O ideal, no entanto, é contar com a população organizada, ponto que  virá com o  crescimento da  consciência  nacional e contrária à  espoliação externa.

Conteúdo  e  bloco  anti-imperialismo

Será  que o  golpe  em si é sua própria  didática política?  Nesses limites, cria-se  uma  compreensão aparente, não uma dialética  compreensão, além da forma, do  conteúdo. A  análise produtiva passa pelo entendimento do  conteúdo alicerçado pela soberania nacional e anti-imperialismo. É  o que  nos  ensinam  as  posições  do Mali e  de Burkina  Faso, que dizem  que ao   defendermos a  soberania do Niger, enunciamos a necessidade de construção de um bloco anti-imperialismo na África Ocidental.

O  tabuleiro e as posições  encruzilhadas na África  Ocidental  

O Niger materializa, em parte e com apoio do Mali e Burkina Faso, uma investida contra a opressão francesa, que é corpo e ação projetiva  daOTAN. Somente um processo anti-imperialismo e popular, articuladocom uma federação de países africanos, poderá varrer do continente as intervenções bélicas e antinacionais sintetizadas pelos condomínios imperialista da OTAN.

Os interesses e a manutenção de privilégios geopolíticos explicam o porquê da sanha imperialista na região.Na mesma tônica, explica a razão pela qual o exército, no Niger, defende a soberania nacional e se contrapõe à moeda despótica do poder, o franco, e na mesma senda também se apõe à língua despótica e universalizante dos privilégios historicamente acumulados pela condomínio franco-yanque no país, que é esmagado e ocupa as últimas posições sociais e humanitárias no concerto das nações.

No caso do Niger, o que vale, para a França, é o território em si; o urânio e outros recursos minerais e energéticos, e não o povo e/ou o território como quadro de vida dos naturaisdo Niger.

Niger,Burkina Faso e Mali estão no jogo ou tabuleiro da geopolítica da região. A Nigéria, como possível e provável braço armado e por procuração, é ou será o principal aliado, caso se confirme o embate, da OTAN. A Nigéria fará, sem considerar os seus conflitos internos e manifestações nacionais contrárias, o papel de capitão do mato a serviço dos privilégios para o império? Qual será o papeldo CDEAO? A despeito da força nacionalista do golpe no Niger e do apoio popular ao processo de luta contra a metrópole, fica patente que o exercito do Nige ragiu politicamente ou diplomaticamente orientado pela encruzilhada política da região, especialmente à presença da Rússia, que deriva da firmeza anti-imperialismo sustentada por Putin.

Há um xadrez pontilhado pelas adesões de outros países da África Ocidental, que se alinharam em oposição ao proposto pela  Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental,  CEDEAO,  que defende golpes em profusão, desde que afinados com o ideário proposto e dirigido pela OTAN. Sem apoio da União Africana, a propalada  invasão do  Niger fica, pelo menos temporariamente, fora do  escopo político e serviçal da CEDEAO.

A situação  interna da Nigéria  não é  favorável à guerra por procuração a  serviço da OTAN. Neste  sentido, há  os conflitos internos, a  posição contrária dos parlamentares e especialmente, o que  é por demais relevante,  de  parte significativa da população nigeriana. O  levante  no  Niger põe, no xadrez geopolítico,  dialeticamente a  guerra da OTAN, na  Ucrânia,  contra  a  Rússia.

Vale  também  incluir, no  palco ou cenário de luta e  disputa, a deseperada  busca, por parte  das  colônias dos EUA, na Europa, por  recursos energéticos no continente africano. Sobe, a  partir dessa chave interpretativa, a razão e posição anti-hegemônica do levante no Niger e África  Ocidental de conjunto.

Com derrotas sucessivas na Ásia, especialmente no sudoeste dessecontinente e sem a energia fornecida pela Rússia, os  países africanos  serão o foco do imperialismo do ponto de vista da rapinagem sem  limites  dos recursos energéticos, o que dará força para ações intervencionistas para assegurar privilégio e o consequente monopólio na exploração dos recursos minerais e energéticos,sobretudo.

O  conflito está  aberto  e distante de  qualquer solução imediata.

(*) FaustoAntonio é escritor, poeta, dramaturgo e professor da Unilab-Bahia.

Uma resposta

  1. Só os alienados, cegos defensores dos valores ocidentais e gananciosos não entendem a lógica imperialista euroamericana!
    O povo, a cultura não importa para esses imperialistas na África! Eles só se preocupam com os recursos naturais e em acabar com eventuais pensadores críticos africanos que só tem suas falas e canetas para lutar contra esse mal!!

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