A terceira via pretende derrotar Lula e o PT

Por  Fausto Antonio (*)

Epigrafia sinuosa  

“A despeito das pesquisas favoráveis, o  sinal  de  alerta deve ser  enfático,  não ganhamos e corremos o risco de perder a eleição no vale tudo do segundo turno. A rigor, vale tudo contra Lula e o  PT.  O que  fazer, então, com as  pesquisas e a polarização? “

“A  terceira  via não almeja  apenas o segundo turno, ela pretende derrotar Lula, o PT, as forças   negro-populares e os trabalhadores (as).”

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 O presente texto tem a finalidade de refletir como a terceira via, produção derivada do  golpe de 2016, é construída e  atualizada no  advento do governo bolsonarista e das candidaturas de Ciro Gomes, Simone Tebet  e Soraia. Ela, a  via golpista, é o principal oponente político de Lula e  do PT. Para isso, como base empírica para a reflexão, será utilizada a sabatina  da Rede Globo e o debate da Band para a presidência do Brasil em contraste com  a base material da sociedade brasileira e o golpe de 2016.

A  nossa tese, para embasar a reflexão sobre a política  antiLula  e  antiPT,  se vale da  compreensão da classe social articuladora do golpe de 2016, do imperialismo e dos seus agentes no plano eleitoral e das finanças. Temos, então,  a partir das pesquisas, das intervenções, dos debatedores (as), dos entrevistadores (as) e das pesquisas de desempenho, da leitura das respostas dadas e medidas ( mediadas) pelas agências de comunicação, a terceira via  como principal sujeito do processo, que viabiliza o segundo turno e que buscará meios, na lógica do golpe de 2016, para  derrotar Lula e o PT no segundo turno.

A sabatina e o debate permitiram, por meio dos enunciados  que compõem a produção politica previamente traçada para encurralar  o ex-presidente Lula, o ponto de partida.  Houve uma ênfase, durante a  entrevista,  nas abordagens vinculadas à corrupção seletiva imputada exclusivamente  a Lula e  ao PT.  Os enunciados da corrupção foram apresentados  descolados do golpe de 2016  que os constituem; pois eles formam um conjunto  fundamental para a criação da imagem seletiva de corruptos apenas do PT.  O  conjunto enunciativo está  também  na produção falsa, discriminatória e  criminalizadora da política de esquerda.

O trabalho ainda reflete sobre a repercussão das entrevistas, dos debates e, principalmente, sobre  a centralidade da terceira via e da sua posição, como instrumento e corpo da burguesia branca, racista e golpista e braço interno do imperialismo, ao mesmo tempo,  no projeto e processo para tentar derrotar Lula no primeiro turno  e, na impossibilidade,  no segundo turno e com apoio reiterado a Bolsonaro.

A  sabatina na  Globo e  o  debate na Band comprovaram que  o  objetivo  central da terceira via é derrotar o PT e Lula.  Depois  do  golpe de 2016, da produção  e da viabilização eleitoral  de Bolsonaro em 2018, os  golpistas, nas  trincheiras da terceira via antiLula e antiPT, blindaram o governo Bolsonaro e defenderam o projeto econômico da gestão Bolsonaro-Guedes.  A  terceira  via não é  apenas uma  força auxiliar de Bolsonaro, ela  foi  derivada da principal força política no  espectro do golpe de Estado de 2016, isto é, ela  encarna os valores patronais de raiz  e os sujeitos mais  expressivos  da burguesia  branca  brasileira e , na  defesa  do  capital, encarna  notadamente  a relação de poder mais bem ajustada ao comando e privilégios do imperialismo estadunidense, sobretudo.  A  terceira  via não almeja  apenas o segundo turno, ela pretende derrotar Lula, o PT , as forças negro- populares e os trabalhadores (as).

O debate comprovou que  a  terceira via deseja investir na  produção de Simone Tebet e  na sua condução para o segundo turno. É  possível tamanha  proeza em curto espaço de tempo?   Numa eleição  dirigida pelo sistema de  comunicação golpista, com dinheiro e pesquisas em profusão e com a  ativação do antipetismo, tudo é possível.  Mas  de  qualquer modo e  sem Simone  Tebet, no segundo turno, a  terceira via será parte integrante, de modo  explícito  e  igualmente velado, da composição  de votos dirigidas  à campanha  bolsonarista. A adesão frontal  e silenciosa será, no segundo turno,  orgânica, isto é, não precisará  de carga discursiva adicional ao antipetismo.  A senha  é  antipetismo e, no avesso, voto consagrado a Bolsonaro; processo experimentado em 2018. O PT  precisa  mudar a intervenção  e retomar as mobilizações de rua.

Sem posição firme contra o golpe e contra  os golpistas, com o vice  que tem e  com a  composição da coligação firmada, Lula ficou sem dar  as respostas, com enorme propriedade popular que tem e de defesa  da classe trabalhadora.  Como explicar o  golpe com os  golpistas ao lado?, Há  um limite dado ou configurado pela política adotada pelo PT.  A  limitação não é  de Lula, que é um debatedor brilhante e com raiz real na  classe  trabalhadora.

O ataque foi e é dirigido ao candidato que tem  vínculo, é o único na disputa eleitoral, com a luta e a história dos trabalhadores (as) e igualmente com as suas estruturas e instâncias de organização e luta. Lula  não respondeu à  altura por conta das limitações impostas pela política da coligação e do PT. Por  outro lado, os  ataques  ao ex-presidente Lula  foram  articulados e  feitos pelos projetos e  quadros  da terceira via. Ciro é  agente  dessa via e  quadro orientado pelo imperialismo, conforme  carta endereçada a Biden e na  qual se  apresentou  como um serviçal dos  interesses  e privilégios  do complexo militar, industrial e intervencionista dos EUA.

A  terceira  via  é  decisiva no processo eleitoral e político e tem e terá muito peso na disputa e no provável segundo turno.  A  terceira via, pelo  alcance do seu espectro junto à esquerda liberal e junto à direita, tem  mais peso  do que  os dois campos definidos como de extrema direita  e  de  esquerda.

A  sabatina e o  debate mostraram o erro da política  do  PT  e  da coligação.  Não houve, contrariando  a  ilusão quase  intocada de certo setor da esquerda,  unidade  contra o fascismo, mas  unidade e ataques  rasteiros  contra Lula e as governanças  petistas.  Lula  foi o marginalizado do debate, o corrupto, de  acordo com as  candidaturas e  agentes midiáticos da terceira via,  para todos e para sempre.  Soraya, bolsonarista de origem e de orientação política fez  dupla com Simone Tebet, latifundiária e golpista. Elas foram as “vencedoras” do debate em concordância com o traçado previamente pela terceira via.

A versão, pró  mulheres brancas golpistas, foi e  era previsível. O  debate deixou  a  realidade expostas: a terceira via, com a  tarja  “democratas  ou civilizados”, fará  campanha  contra e para derrotar  Lula e o PT . A terceira via não pretende ou ela não  buscará apenas a produção do segundo turno; a terceira via pretende vencer a eleição e, sem dúvida, comandar o processo político antiLula e antiPT. No limite e sem o relativo sucesso de Simone Tebet, o campo alimentado pela terceira via dará apoio e sustentação, o que já fez  e o faz até o momento, à fascistada bolsonarenta e guiará a recondução de Bolsonaro, que  é  produto e instrumento do golpe de 2016 e dos  golpistas.

Fica  evidente que Lula  foi mal no debate, a  despeito de  ser um grande debatedor, por  conta da política adotada. Qual é mesmo  a  ilusão presente nas avaliações da esquerda liberal?  Ela  tem a crença que  o setor catalogado como  “civilizatório” da burguesia branca  racista está  ou  estará contra  Bolsonaro.  Impulsionar a terceira via significa  disputar e hegemonizar o processo eleitoral; o segundo turno não é o objetivo estratégico da terceira via. É  preciso desenhar  que o objetivo  estratégico não é  só  levar a eleição para o segundo turno, mas vencer  Lula no processo eleitoral e político?

Vou repetir para retirar as máscaras e desfazer crenças falsas: não é apenas levar para o segundo turno, mas sim ganhar a eleição. O movimento para levantar a candidatura burguesa, branca e golpista de  Simone  Tebet deve ser freado pelas forças populares e dos trabalhadores (as). O  tempo curto é  um problema para quem tem dinheiro e sob seu comando todas as estruturas de poder e de representação?  Como parte do jogo, o  debate não foi feito para outro fim senão para derrotar Lula.

A  política adotada pelo PT, sem falar do golpe e dos  golpistas, favoreceu e muito Ciro Gomes. Simone Tebet e Soraya, a tríade da terceira via. O vice do PT, além da coligação,  é um filtro ou impedimento para a discussão do  golpe  e  dos golpistas. Os  golpistas,  hoje  “ democratas” de plantão, prenderam Lula e golpearam Dilma.  Sendo o que  são os  golpistas, ataques  a  Lula, de modo coordenado, deram   a tônica do debate.  Há  uma articulação para derrotar o PT. Sem a atuação da terceira via,  Lula  derrotaria Bolsonaro no primeiro turno; mas há  a terceira via.

A  terceira via apoiará Bolsonaro. Bolsonaro não será derrotado no primeiro turno pela ação e  atuação da terceira via. A  terceira via é  decisiva nos dois polos. É  e  será  central para a rebaixar o programa  do governo Lula e será decisiva no processo de tudo ou nada para tentar reeleger Bolsonaro.

A despeito das pesquisas favoráveis, o  sinal  de  alerta deve ser  enfático,  não ganhamos e corremos o risco de perder a eleição no vale tudo do segundo turno. A rigor, vale tudo  contra Lula  e o  PT.  O que  fazer, então, com as  pesquisas e a polarização?  Na  soma, pesquisas  e polarização têm duas caras ou frentes. A  primeira frente diz  respeito ao enfrentamento, nas ruas, nos comitês de luta e  contra  a fascistada bolsonarenta e, considerando a outra frente, é fundamental debelar e derrotar  a terceira via. Qual  a dificuldade efetiva? Numa  dupla e convergente  intervenção,  a  polarização pede e precisa de alcance social e  também de processos  convulsionados  pela presença  e organização ativadas pelas ruas e pelos  comitês de luta.

O que  fazer?  Qual a política ideal? Temos, como resultado dos  brados  da rua,  que  pautar a retomada da soberania nacional e a erradicação da fome como prioridade inaugural do futuro governo Lula.  Outro delimitador político passa pelo  combate à  violência sistêmica, fruto da brutal desigualdade social racializada; o racismo e, na mesma intervenção,  é central não permitir, não naturalizar e criar mecanismos populares  para interromper a violência  policial contra negros   e pobres. A  cartada, relativa à   desprivatização, é outra medida esperada e terá que ser realizada pelo futuro  governo  Lula.  É  aconselhável, como meio para mobilizar e  avançar,  trazer para o debate o território usado  pelas populações originárias, quilombolas, negras  e  pobres. A redefinição das forças armadas que, relevando o  território como quadro de vida de milhões de brasileiro, terá, é  o que  esperamos,  o seu papel retraçado ou redefinido  pela defesa do  povo brasileiro, que é a base principal na  configuração territorial do país.

Numa  síntese, polarizar, contra o projeto neoliberal e contra  a tutela militar antipovo brasileiro e contra a violência do  racismo, entre outros pontos, é  central.  No  entanto,  os pontos expostos aqui  exigem a mobilização e a convulsão das ruas, que  põem  em destaque, na condução do projeto,  o povo preto e pobre, sem dúvida.

Não é ou na basta apenas  o discurso radical, operário, do Lula, mas sim buscar na mobilização e, com ela ou com classe trabalhadora e com os marginalizados (as), a polarização acompanhada pela convulsão que  ascende e  amplia o fogo e o foco de classe, raça, gênero e território usado pelos agentes sociais dirigentes da  mobilização.

Desse ponto de vista,  a  campanha que é convulcionada pelas ruas ganha não tão-somente legitimidade; ela consolida o voto e principalmente altera a correlação de forças para as urnas e para o avanço, ou seja, para  a defesa e materialização de uma política  de governo ditada e demandada pelos trabalhadores (as).  Um governo  dos trabalhadores (as)  se efetiva  derrotando o golpe e  os golpistas. O  golpe e  os  golpistas são redutores dos direitos dos trabalhadores  (as) . É   necessário  retomar os direitos solapados pelas políticas neo-liberais. No  quadro atual do  país, é  vital  a superação  da violência sistêmica, estrutural e policial contra negros.  Retomar os direitos, longe  de abstrações epistolares brancas e burguesas, é combater a violência policial contra negros, estancar as privatizações e reverte as realizadas pelos golpistas.

No  embate político ou na esfera do debate televisivo, ficar na defensiva é um erro.  Administrar a vitória, ainda uma promessa advinda da pesquisa, é um erro. Há polarização e  jogar na defesa no  eleitoral e, pior  ainda  no processo político de  longa duração, é uma tática errada no que  concerne  ao eleitoral e péssima no que tange à  estratégia de disputa de poder e de duração indeterminada.

(*) Fausto Antonio –  Escritor, poeta, dramaturgo e professor  da Unilab – Bahia

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