Marcos Jakoby, militante petista, publica artigo a respeito de comentário de Gilberto Maringoni (PSOL) fazendo uma comparação entre a tática kirchnerista na Argentina e tática do PT nas eleições de 2018.
Comentários sobre um paralelo feito por Maringoni
O professor e dirigente do Psol, Gilberto Maringoni, fez uma postagem em rede social (segue o texto completo ao final) onde traça um breve paralelo entre a tática adotada pelo peronismo e Cristina Kirchner no processo eleitoral em curso na Argentina e aquela que foi adotada pelo PT nas eleições de 2018. Segundo Maringoni, elas seriam opostas. E elas teriam sido determinantes para a vitória nas primárias ocorridas, ontem, na Argentina e para derrota da esquerda no Brasil. Essa comparação, a meu ver, parece revelar elementos mais importantes do que autor pensa acerca do Brasil do que propriamente da Argentina.
Lá, segundo o autor, a tática foi pelo “caminho da ofensiva”. Com ampla crítica à política ultraliberal de Macri. Evitou-se “personalismos estéreis”. Cristina não insistiu em encabeçar a chapa, o que teria evitado um plebiscito sobre o período kirchnerista. Aqui o PT, nas palavras de Maringoni, “ao colocar o “volta Lula” e o vitimismo como centro da campanha, a agremiação deu um presente aos adversários. A extrema-direita transformou a eleição num julgamento sobre o ciclo petista – e a indefensável gestão Dilma II – e deixou a hecatombe do governo Temer – e sua associação com a extrema-direita – fora do escrutínio popular”.
Há que se dizer que o PT e a campanha de Haddad, sim, cometeram erros ao longo do período que antecedeu e na própria campanha, mas, em minha avaliação, não são os que Maringoni parece supor. Em primeiro lugar, há uma diferença substancial entre ambos os processos, diferença a qual Maringoni solenemente ignora. No caso da Argentina, a direita chegou ao governo em 2015 por meio do voto. Aqui a extrema direita alcançou o governo em um processo marcado por um golpe em três atos: o impeachment fajuto contra Dilma, a prisão política de Lula e sua interdição na corrida eleitoral, e as interferências ilegais no processo eleitoral em si.
Em segundo lugar, como decorrência do anterior, enquanto Cristina (principal liderança da oposição ao neoliberalismo na Argentina) pode concorrer na chapa, participando da campanha abertamente, a principal liderança política e popular do Brasil não pode nem mesmo dar uma declaração de apoio ao seu candidato, preocupação assumida do partido judiciário nas revelações recentes da Vaza Jato.
Em terceiro lugar, não está escrito nas estrelas e não compreendo que com Cristina Kirchner na “cabeça de chapa” o resultado seria necessariamente diferente. Ou será que o povo argentino não fez nestas primárias nenhuma comparação entre o desastre neoliberal de Macri e o período kirchnirista? Ou que sua capacidade convocatória e de mobilização demonstrada no processo de oposição e resistência às medidas neoliberais não foram importantes no resultado eleitoral?
Em quarto lugar, é lamentável (impossível usar um termo mais suave) que Maringoni descreva a denúncia e a defesa que o PT e a esquerda fizeram aos ataques golpistas como um “vitimismo”; e, ainda, critica o fato de que esta linha tenha sido um dos “centro da campanha”. Ora, Lula era publica e notoriamente o candidato mais bem colocado para vencer as eleições e o golpismo tira do processo eleitoral a alternativa de preferência do povo brasileiro, queria que se fizesse o quê? Deixar de dizer ao eleitorado que existia um golpe em curso com o objetivo de que a esquerda não voltasse a governar o país? Como se nada estivesse acontecendo?
Em quinto lugar, não é verdade que a campanha eleitoral petista “deixou a hecatombe do governo Temer – e sua associação com a extrema-direita – fora do escrutínio popular”. Aliás, como se poderia fazer isso sem denunciar o golpe de conjunto? Insistiu-se muito, à época das eleições, de que as medidas de Temer e da campanha de Bolsonaro (antipopulares, antinacionais e antidemocráticas) eram uma decorrência e uma causa do golpe. O “golpe é contra o povo”!
Por fim, em razão destes contextos é evidente que o momento das forças democráticas e populares do Brasil do ano passado e da Argentina em 2019 são diferentes. Que uma postura mais “ofensiva” do campo popular na Argentina agora tem mais viabilidade se comparada com as condições que encontrávamos aqui no ano passado. Ademais, objetivamente, essa comparação mal colocada entre as duas táticas, em minha opinião, ajuda a alimentar o ambiente na esquerda daqueles que acham possível “virar a página do golpe” e daqueles que entendem que a luta por #LulaLivre não tem centralidade. Mas, sobretudo, daqueles que fazem um esforço para que Lula deixe de ser uma alternativa política em nosso país. Fruto dessa leitura política, não surpreende que, para alguns a luta por Lula como candidato no ano passado, ou como possibilidade num futuro próximo, seja posta, lamentavelmente, em termos como de um “personalismo estéril”.
Marcos Jakoby, militante petista.
Confira abaixo o comentário publicado por Gilberto Maringoni.
#######################################################
AMPLIAR SEM PERDER A RADICALIDADE
Cristina Kirchner é a grande vitoriosa do dia. Sua tática de evitar personalismos estéreis faz com que as eleições argentinas se pautem por uma ampla crítica à política ultraliberal de Macri. É o caminho da ofensiva. Caso tivesse insistido em encabeçar a chapa peronista, provavelmente a agenda seria inversa e a direita forçaria um plebiscito sobre os anos K. Teríamos um cenário mais difícil para a oposição.
A hábil movimentação é oposta à tática adotada pelo PT em 2018. Ao colocar o “volta Lula” e o vitimismo como centro da campanha, a agremiação deu um presente aos adversários. A extrema-direita transformou a eleição num julgamento sobre o ciclo petista – e a indefensável gestão Dilma II – e deixou a hecatombe do governo Temer – e sua associação com a extrema-direita – fora do escrutínio popular.
O resultado é conhecido. E deve ter sido analisado em detalhes pelo peronismo.