Declaração de voto

Por Valter Pomar (*)

O Diretório Nacional do PT acabou de aprovar o seguinte:

Art. 11º: O disposto nos artigos 32 e 141 do Estatuto do Partido não se aplicarão (sic) ao PED realizado em 6 de julho de 2025 e às eleições parlamentares de 2026, permitindo que dirigentes e parlamentares possam renovar seus mandatos eletivos. a) O disposto nos artigos 32 e 141 do Estatuto será debatido e atualizado considerando-se a realidade e condições políticas atuais no Congresso Nacional que debaterá a reforma estatutária.

O artigo 32 diz o seguinte: “Art. 32. Serão inelegíveis para cargos em Comissões Executivas, em qualquer nível, filiados e filiadas que tenham sido membros de uma mesma Comissão Executiva por mais de 3 (três) mandatos consecutivos ou dois mandatos consecutivos no mesmo cargo”.

O artigo 141 diz o seguinte: “Art. 141. Não poderá se apresentar como pré-candidato ou pré-candidata para postular o mesmo cargo, o parlamentar que já tiver sido eleito para três mandatos consecutivos na mesma Casa Legislativa, e no caso do cargo de Senador ou Senadora, o parlamentar que já tiver sido eleito para dois mandatos consecutivos no Senado Federal”.

A proposta acima foi aprovada com 60 votos. Houve 27 votos contra. E quatro abstenções.

Me abstive e pedi para fazer a declaração de voto que segue abaixo.

Me abstive porque não reconheço a legitimidade e a legalidade desta votação e desta decisão.

O DN foi convocado para debater o regulamento do PED. Não foi convocado para debater o mandato dos parlamentares que serão eleitos em 2026.

Solicitei que as duas questões – mandatos de parlamentares e mandatos de dirigentes partidários – fossem separadas e que o tema dos parlamentares fosse debatido numa reunião convocada especificamente para este fim.

O DN decidiu, por 46 votos a favor, que os temas deveriam ser debatidos ao mesmo tempo. Votaram contra a mistura 31 integrantes do DN.

Solicitei então que a proposta de alteração só fosse válida se tivesse pelo menos 2/3 de apoio dentre os integrantes do Diretório Nacional.

A presidenta do Partido, que estava dirigindo a reunião, não aceitou minha questão de ordem. E o argumento para recusar foi apresentado pelo Jilmar Tatto. Segundo ele, o estatuto não prevê a exigência de maioria qualificada para aprovar mudanças estatutárias.

De fato, o estatuto do Partido prevê que alterações só podem ser feitas por um encontro ou congresso convocado com esta finalidade.

Diz o estatuto: Art. 264. O presente Estatuto poderá ser alterado em Encontro Nacional, pelo voto da maioria de seus delegados e delegadas. §1º: Para efeito do disposto neste artigo, a Comissão Executiva Nacional designará uma Comissão que elaborará o projeto de reforma e promoverá sua publicação e sua distribuição aos Diretórios em todos os níveis para apresentação de emendas, dentro dos prazos que fixar. §2º: Toda alteração estatutária deverá ser registrada no Ofício Civil competente e encaminhada para o mesmo fim ao Tribunal Superior Eleitoral, nos termos da lei.

Portanto, adotar a necessidade de 2/3 para aprovar uma alteração estatutária já é uma enorme liberalidade. Mas pelo menos garante que alguma alteração estatutária só possa ser feita com maioria qualificada. O que Jilmar Tatto defendeu e Gleisi Hoffmann encaminharam é baseado na lei da selva: qualquer maioria pode alterar qualquer item do estatuto que uma maioria eventual considere passível de alterar.

No caso específico, a alteração proposta não atingiu os 2/3.

Por tudo isso, não reconheço a legitimidade e a legalidade desta decisão. E por isso escolhi me abster, pois entendo que votar contra seria no limite considerar aceitável que esta votação ilegal e ilegítima poderia ocorrer.

Por fim: entendo as razões de quem defende retirar quaisquer limites para a reeleição de parlamentares. Não concordo com a solução proposta, mas reconheço que o problema existe, causado por regras que são definidas em grande medida por nossos inimigos.

Mas não concordo nem com o diagnóstico, nem com a solução proposta para os mandatos de dirigentes partidários. O Partido tem dificuldades em renovar suas direções? Claro. Mas a solução proposta só vai dificultar a renovação, facilitando a burocratização, a perpetuação, a oligarquização.

Há quem avalie que um dos motivos para aprovar esta alteração estatutária, neste momento, com tanto atropelo, está diretamente relacionado com as divergências existentes na cúpula do grupo atualmente majoritário no DN, a saber, a chamada CNB.

Divergências que retardaram a aprovação do regulamento do PED. E que nos levam, neste dia 17 de fevereiro, a gastar horas e horas debatendo regimento, sem dedicar o tempo necessário para o debate sobre a grave situação política que estamos vivendo.

Quaisquer que sejam as razões da CNB e de quem a apoiou (principalmente Avante e Movimento PT), o fato é que a democracia partidária foi atropelada. E isso a gente sabe como começa e sabe como termina. E não termina bem.

ps.um companheiro me alertou que estariam dizendo que teriam sido 62 votos a favor. Não foi isso que a mesa anunciou, não é isso que está no áudio da reunião nem no registro fotográfico. Mas a alegação -e a tentativa de contabilizar votos a posteriori – só confirma que a hipocrisia é a homenagem que o vício rende à virtude.

(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT

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