Por Lucas Reinehr (*)
Desde o início da pandemia do novo Coronavírus, as universidades, institutos federais e escolas brasileiras passam por um período atípico e extremamente desafiador. A partir da portaria publicada pelo Ministério da Educação em março, que autorizou a implementação do ensino remoto, seguida das decisões de governos estaduais sobre o funcionamento das escolas, o ambiente virtual se tornou, aos poucos, nossa nova “instituição de ensino”. Marcado pela desigualdade no acesso às tecnologias da informação e comunicação, o ensino remoto tornou-se uma alternativa emergencial – e foi implementado de forma excludente pelo Mec. Ficou à cargo das universidades, sem um planejamento do governo federal ou políticas nacionalizadas, decidir como dar continuidade – ou não – aos semestres letivos.
Quase um ano depois do início da “quarentena” no Brasil, o foco da discussão é outro. Se, no início, o Mec – à época, comandado por Abraham Weintraub – não hesitou em autorizar a implementação irresponsável do ensino remoto, agora a urgência é pelo retorno das atividades presenciais – tanto por parte do governo federal, quanto por parte de inúmeros governos estaduais. Que bom seria se pudéssemos retornar à modalidade presencial porque estamos vacinados e os estudantes estão prontos para voltar à sala de aula, ao restaurante universitário, à residência estudantil e, principalmente, a fazer luta nas ruas. Mas esse não é o caso: o Brasil segue num poço sem fundo, com níveis de contaminações ainda altíssimos e um agravamento da crise sanitária em função da política gerenciada por Jair Bolsonaro e seus capangas. Nas universidades, além do ensino remoto que condicionou a evasão e o trancamento de matrícula de muitos estudantes, surgem interventores indicados pelo governo federal, que têm como principal objetivo representar e agilizar o projeto bolsonarista para a educação.
Neste cenário caótico, surgem alguns questionamentos: para quem serve o retorno das aulas presenciais? Em que termos se dará esse retorno? Possuímos condições sanitárias para isto? O governo federal e muitos governos estaduais, que não possuem compromisso com a vida nem com a educação, acreditam que o retorno deve acontecer, mesmo com as condições atuais. No final de 2020, o Mec havia publicado uma portaria que estabelecia o retorno presencial para o dia 4 de janeiro. Graças à rejeição e contestação por parte dos trabalhadores da educação e do movimento estudantil, recuou e adiou a data para 28 de fevereiro. A questão é que pela forma desastrosa que a pandemia tem sido gerenciada no Brasil, não há condições de retornar às aulas presenciais sem um planejamento que envolva todas os segmentos da educação e políticas sérias e comprometidas com o combate ao Coronavírus. Uma certeza temos: não é com o governo Bolsonaro que teremos esse diálogo e estas garantias.
O retorno às aulas presenciais deve ser pensado e planejado em conjunto com outras questões que permeiam o dia a dia das escolas e universidades: o transporte coletivo utilizados pelos estudantes para chegar às instituições; os refeitórios e restaurantes universitários que são espaços de grande aglomeração; as residências universitárias, auditórios e outros espaços que são utilizados no dia a dia do ensino presencial; as políticas de assistência estudantil que devem ser reforçadas e ampliadas para garantir um retorno que reforce a permanência e combata a evasão; e mais uma série de políticas que devem ser resultado de um diálogo e uma ampla consulta aos setores da educação. Apesar de termos essa compreensão, o objetivo do governo federal é outro: retomar o ensino presencial para ceder à pressão de setores da sociedade e porque não há preocupação com o aumento do contágio. Nossa resposta deve ser simples: se há o entendimento, por parte da sociedade, de que a escola e as universidades são serviços essenciais, os estudantes e trabalhadores da educação devem ser incluídos nos grupos prioritários de vacinação. E para isso, é preciso acelerar o plano nacional de vacinação, que também tem sido conduzido de forma incompetente pelo governo Bolsonaro. E para que haja um retorno seguro, deve se estabelecer a premissa de que só haverá retorno presencial com um plano de regresso híbrido e com boa parte dos estudantes e trabalhadores da educação vacinados.
O nosso compromisso é com a vida e com a educação de qualidade, que deve ser tratada como um direito. O retorno às aulas presenciais deve ser debatido com base nesse pressuposto e precisa ser pautado a partir da realidade de milhões de estudantes vulneráveis, que não podem perder o vínculo com a escola ou a universidade. O futuro nos joga desafios grandes: o crescimento da evasão e da precarização do trabalho na juventude. Essas devem ser nossas reivindicações: por um retorno presencial seguro e acompanhado de políticas de permanência; pela ampliação de políticas de democratização do acesso às tecnologias de informação e comunicação enquanto dure a pandemia; e devemos fazer, acima de tudo, uma luta contundente pelo fim do governo Bolsonaro, que tem tomado espaço da forma mais autoritária e cretina possível. Querer o retorno às aulas presenciais sem diálogo, planejamento e principalmente sem as condições sanitárias é mais um crime na lista de Bolsonaro. Por isso, lutaremos incansavelmente contra essa decisão e pelo fim imediato desse governo criminoso.
(*) Lucas Reinehr é estudante da UFSM e diretor de assistência estudantil da UNE