Por Natália Sena (*)
Publicado originalmente no Saiba Mais
Estamos apenas na segunda semana de 2022 e já se confirmam as previsões sobre os imensos desafios dos setores populares e de esquerda para as eleições de outubro. Bolsonaro segue aplicando seu programa, colocou todas as dificuldades que pôde para a vacinação das crianças, fala em sair do país caso perca as eleições (nitidamente confessando seus crimes), e a contaminação pela Covid 19 voltou a bater recordes (com mortes controladas graças à vacinação, apesar do jogo contra do governo federal). Não há sinais de melhora imediata nas condições de vida da maioria do povo brasileiro.
No que diz respeito à tática para as eleições que se avizinham, há pelo menos dois caminhos em disputa na esquerda: de um lado, os que acham que “só se ganha eleição com aliança” e que querem esquecer que o golpe aconteceu, pois supostamente esse seria o único caminho para derrotar Bolsonaro. Curiosamente, esses mesmos tratam as pesquisas eleitorais como um ponto de partida certo, e sequer cogitam que, a depender de que tipo de aliança seja feita e de que programa elas representem, possamos ser prejudicados eleitoralmente e na governabilidade. Para estes, as alianças serviriam apenas para nos favorecer (fica a pergunta: por qual razão então os inimigos se aliariam conosco? Para nos ajudar?).
De outro lado, há os que defendem concentrar nossos esforços em uma forte campanha de mobilização popular, com foco nas medidas que implementaremos caso ganhemos as eleições (nacionais e nos estados), trabalhando as alianças a partir desse programa, e não o inverso. Estes não desprezam a importância de se articular alianças, mas também não acham que vale qualquer aliança, muito menos colocar embaixo do tapete o que os supostos aliados de hoje fizeram ontem contra nós (golpe em 2016, apoio a Bolsonaro em 2018, sustentação do governo Bolsonaro no Congresso, etc.) nem se iludir que seus ataques não irão se repetir.
Em nível nacional, a defesa de alguns sobre o PT fazer uma federação com o PSB e a cogitação de uma aliança com Alckmin na vice-presidência, são ilustrativos da primeira posição. E há os que são contra a federação da forma como está sendo proposta, com o PSB realmente existente (que é de direita em vários estados, metade da bancada vota nas medidas que sustentam o programa de Bolsonaro), e também contra colocar um golpista-neoliberal na vice. Em vários estados também estão em curso dilemas e disputas que envolvem o confronto dessas duas posições.
No Rio Grande do Norte, único estado governado pelo PT no qual disputaremos uma reeleição, o debate acerca da tática eleitoral para a chapa majoritária reflete alguns desses dilemas. A governadora Fátima lidera as pesquisas de intenção de voto em todos os cenários, e hoje sequer está nítido quem seriam seus adversários na disputa majoritária. A dificuldade da oposição em apresentar um nome já demonstra, de antemão, a força da governadora para a sua reeleição. Obviamente, pesquisa não é resultado de eleição, por isso é importante seguir firme e avançar no trabalho intenso e correto que vem sendo feito pelo governo petista no RN.
Alguns setores do Partido, no entanto, acham que “para ganhar eleição, é necessário fazer alianças”, e com isso defendem trazer para a nossa chapa majoritária o MDB de Garibaldi Alves, Walter Alves, Henrique Eduardo Alves, e até o PSDB de Ezequiel Ferreira, entre outros. O intrigante é que não há qualquer explicação sobre como, então, ganhamos as eleições em 2018, num cenário nacional onde Lula estava preso injustamente, sem esses “aliados”. Aliás, contra eles, que após serem suporte do golpe contra Dilma e do governo de Temer (do MDB), foram derrotados na eleição majoritária do Rio Grande do Norte em 2018.
O fato é que em uma conjuntura político-eleitoral muito pior que a atual, na qual não tínhamos o governo estadual, tínhamos acabado de sofrer um golpe que nos tirou do governo federal, estava em curso uma fraude eleitoral onde o nosso candidato a presidente foi preso e impedido de disputar a eleição nacional, neste cenário, ganhamos as eleições no Rio Grande do Norte. O que mudou de lá para cá que tornaria uma necessidade fundamental se aliar com quem foi derrotado por nós logo ali atrás? O governo está bem avaliado, as pesquisas indicam a vitória, tanto em nível estadual quando nacional, temos Lula, temos muito o que mostrar sobre o que foi feito no Rio Grande do Norte em 4 anos de governo petista. E vale lembrar que a força eleitoral de Lula pode ajudar candidatos e candidatas ao legislativo de esquerda, o que pode ser prejudicado pelas alianças amplas demais. Então, o que não está sendo dito sobre os motivos pelos quais supostamente precisaríamos fazer coligação com os Alves, com o MDB, e até com o PSDB? Quem defende essas alianças deveria também responder a isto.
Além disso, até agora, não debatemos de forma consistente sobre com que programa governaremos num segundo mandato, nem as consequências de ter um vice de direita no próximo governo, nacional ou no RN. Talvez alguém ache que alianças não tem consequências programáticas no futuro governo, que só servem para nos ajudar e para dar governabilidade para o nosso programa. E mais: no caso do RN, colocar na vice alguém de direita tem implicações em 2026, pois ou bem a governadora cumprirá seu segundo mandato até o último dia, ou poderemos criar para nós mesmos a situação de entregar o governo do RN de volta para a direita. Felizmente, a defesa dessas alianças não é unanimidade no PT-RN. Há setores contrários, e o debate vai acontecer, de forma pública e nas instâncias, assim que os dirigentes responsáveis fizerem as necessárias e devidas convocações, onde a defesa da manutenção da aliança com o PCdoB na vice e da reeleição do senador petista será feita.
Mas uma coisa é certa: nesse ambiente de destruição e desalento, de pandemia e desmonte, com a extrema-direita com forte influência política, eleitoral, ideológica, em nível nacional e em todos os estados brasileiros, os nossos esforços devem estar centrados em dialogar com a população e apresentar qual programa implementaremos para reverter a destruição feita pelo governo Bolsonaro. O que faremos nos primeiros 100 dias de 2023? Como geraremos emprego para os 40 milhões de desempregados e desalentados do nosso país? Como resolveremos o financiamento do SUS, da educação básica, das Universidades, da cultura? Como enfrentaremos os problemas de moradia, a questão ambiental? Enfim, como vamos reconstruir e transformar o Brasil vítima de um golpe em 2016, de uma fraude eleitoral em 2018, e que agoniza diante do negacionismo, do desprezo pela vida e da política ultraliberal implementada pela extrema-direita, é o grande desafio de 2022 e dos próximos anos. Não vai ser fácil fazer nada disso. Mas é para isso que queremos ganhar as eleições e governar em todos os níveis. Precisamos ter aliados de verdade, comprometidos com o mesmo projeto. Os golpistas de ontem e neoliberais de sempre defendem outros interesses, que não são os da classe trabalhadora.
(* ) Natália Sena é membro da direção nacional do PT.