‘Joe Biden mantém política externa trumpista nos EUA’, diz Mônica Valente

Por Camila Alvarenga | Publicado originalmente no Opera Mundi

Lula Marques/Agência PT

Se aprofundando no tema norte-americano, Valente aponta que houve uma manutenção da política externa iniciada por Trump, no qual Biden falhou em cumprir com as promessas que fez durante sua campanha. “A expectativa era com Cuba e Venezuela, que ele tinha feito promessas de acabar com os bloqueios. Se esperava outra postura e acho que parte da esquerda ficou decepcionada”, afirmou.

Para ela, os EUA quiseram se aproveitar da aparente reação à “onda progressista” que começava a crescer no continente para tentar recuperar sua hegemonia, por isso mantiveram o bloqueio contra Cuba, as sanções contra a Venezuela e adotaram uma postura dúbia em relação à Bolívia.

“Pensamos que isso pode ter a ver com a tentativa de aprovar o Plano Biden no Senado norte-americano, para conseguir o apoio de senadores republicanos. Mas só saberemos os motivos reais daqui a muito tempo”, disse.

Por sorte, ela comemorou a resistência da esquerda latino-americana às ofensivas imperialistas, por exemplo em Cuba.

Completa-se cinco anos da morte de Fidel Castro e a “força da revolução segue muito grande, não arrefeceu com a morte de Fidel, está muito arraigada na sociedade cubana”. De acordo com Valente, nem o recrudescimento do bloqueio durante o período Trump, mantido por Biden, está conseguindo romper com os ideais da população

O mesmo com a Venezuela, cujo processo eleitoral celebrado no último domingo (21/11) “comprovou a força popular do chavismo”.

“Viver sob o bloqueio é uma tarefa heroica. O resultado, com 42% de participação popular em eleições legislativas, nem presidenciais, mostra a confiança da população na política de seu governo. Acho que isso também faz a gente caminhar no sentido de uma normalização da relação entre EUA e Venezuela, mas ainda temos muito trabalho diplomático adiante”, frisou.

Reeleição de Ortega na Nicarágua

Valente também disse nunca ter visto a política externa latino-americana tão em debate na mídia corporativa, que busca fortalecer a contraofensiva conservadora aos governos progressistas do continente.

A dirigente petista citou como exemplo a situação da Nicarágua, em que a reeleição de Daniel Ortega foi classificada como antidemocrática por haver supostos presos políticos no país, sendo que, em 2018, o país “aprovou uma lei que regula a entrada e o financiamento interno para ONGs e partidos, proibindo o recebimento de financiamento externo, então o governo nicaraguense em defesa de sua própria soberania tem toda a razão de processar essas pessoas. No Brasil, o recebimento de financiamento externo é razão de cancelamento do registro de um partido”.

Ela reiterou que, até o momento da prisão, nenhum dos atores era candidato à Presidência, afirmando ser necessário que os organismos e governos progressistas da América Latina sejam solidários ao país para evitar que se aprofunde o isolamento “que o império tenta recrudescer”.

Aliás, ela elogiou a postura do Partido dos Trabalhadores e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de não cair nas provocações de classificar o governo de Ortega como ditatorial, e ressaltou que o partido não tem nada a provar.

“Falando como dirigente partidária, o PT e os governos petistas já deram mostras suficientes de compromisso com as regras da democracia brasileira. Lula já disse que poderia ter tido um terceiro mandato, mas quis respeitar o pacto ao que se chegou durante a redemocratização. O PT não precisa fazer declarações sobre o seu compromisso democrático. Quem não teve compromisso com a democracia foi quem deu o golpe na Dilma e encarcerou Lula para que ele não participasse das eleições”, argumentou.

A secretária-executiva do Foro de São Paulo ainda reforçou, portanto, que não há contradições entre defender a democracia e defender o governo nicaraguense, “porque o direito internacional é muito claro sobre a ingerência”. “Os EUA ocuparam o Afeganistão durante 20 anos e tudo o que eles disseram que estavam lá para combater voltou duas semanas depois que eles saíram”, disse.

Outros processos eleitorais

A secretária-executiva do Foro de São Paulo ainda discorreu sobre os outros processos eleitorais que estão acontecendo na América do Sul.

Começando pelo Peru, ela lamentou que Pedro Castillo siga “sob um ataque brutal”. Com pouco mais de 100 dias de governo, o presidente ainda não conseguiu colocar em prática seu projeto para o país devido aos ataques liderados pelo fujimorismo, como apontado por Valente, e às divisões internas em seu partido.

“O governo de Castillo é um governo que ainda não conseguiu se estabelecer. O partido dele está rachado, metade dos parlamentares dele apoiam o governo, metade não, e ele precisa se unificar porque é a sua força de sustentação. Nós, como Foro, temos que nos colocar à disposição para o debate e troca de ideias e experiências”, defendeu.

Na Argentina, a dirigente declarou ainda ser cedo para falar de um retorno liberal, apesar dos resultados decepcionantes do peronismo: “O jogo ainda está sendo jogado e Alberto Fernández [presidente argentino] está sabendo reagir rapidamente”.

No Chile, por outro lado, “o perigo está à vista” com o segundo turno do pleito presidencial a ponto de ser disputado entre o progressista Gabriel Boric e o pinochetista José Antonio Kast. Ela alertou o povo chileno, pois no Brasil tampouco se acreditava que venceria Jair Bolsonaro, e animou a população a lutar para derrotar o que classificou como “neopinochetismo”.

“No Chile se juntou desesperança e despolitização. A Constituinte, por ter um ritmo mais lento, próprio do processo, criou uma expectativa alta e não consegue entregar os resultados no ritmo que a população queria. E o país vem vivendo um processo de desacreditar na política, vem caindo a participação nas eleições e isso é algo que precisa chamar a atenção da esquerda. No fim, é Boric quem tem condições de oferecer o que a população quer e será preciso lutar por sua vitória”, concluiu.

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