Por Adriano Bueno (*)
Em Las Vegas, EUA, cidade símbolo de opulência e ostentação, mesmo com hotéis e cassinos vazios em decorrência da quarentena, moradores de rua foram colocados para dormir no chão num grande estacionamento com retângulos pintados delimitando espaço para distanciamento mínimo entre uma “cama” e outra.
Em São Francisco, 70 sem tetos testaram positivo em um só abrigo. A notícia acende ainda mais a luz amarela no estado da Califórnia, onde vivem cerca de 150 mil moradores de rua.
Na outra ponta do imenso abismo social norteamericano, o bilionário David Geffen postava uma foto de seu iate em seu Instagram, com o seguinte texto: “Por do sol ontem a noite… isolado nas Granadinas evitando o vírus. Espero que todo mundo esteja seguro”.
Um Iate de 590 milhões de dólares. Na cotação atual, mais de 3 bilhões de reais.
Em seu editorial do dia 9 de abril de 2020, o NY Times reconhece: “esta nação estava doente muito antes do coronavírus chegar às suas costas”.
No mesmo editorial, Francis Fukuyama (quem diria!) alerta sobre como os países que possuem um Estado forte e que inspira confiança, como Alemanha e Cingapura, são capazes de enfrentar a pandemia com maior sucesso.
Mais a frente, o editorial conclui reconhecendo que “gerações de formuladores de políticas federais priorizaram a busca do crescimento econômico com pouca consideração pela estabilidade ou distribuição”.
Em fevereiro, enquanto Donald Trump debochava da Covid-19, Richard Burr e Kelly Loeffler, ambos senadores republicanos, usaram as informações privilegiadas que receberam com antecipação sobre a iminente pandemia para ganhar com especulação na Bolsa de Valores.
Norteamericanos já são os maiores derrotados nesta pandemia. Assistiram os chineses conseguindo lidar com o surto com mais sucesso: mesmo sendo um país mais populoso, tiveram menos mortes.
Trump, que inicialmente debochou da pandemia, errou em não parar o país mais cedo. Esse erro custará muitas vidas, e arruinará a economia da mesma forma, uma vez que esta era a justificativa para não entrar cedo na quarentena.
Nos EUA, o novo epicentro da pandemia, já são quase 17 mil mortes. A maior potência do capitalismo mundial viu seu sistema de saúde colapsar rapidamente. O assustador número de mortes, que atingiu afro-americanos e pobres com maior força, escancarou as fragilidades que o neoliberalismo possui, ao privilegiar a iniciativa privada na saúde.
Norteamericanos viram ruir diante do mundo, depois de décadas de construção hollywoodiana, sua imagem de liderança redentora que salva o planeta em cenários de catástrofe. A guerra antiética e desleal travada pela aquisição de insumos hospitalares contrasta com a postura de Cuba, a vizinha que envia médicos ao mundo. O “heroísmo salvador” coube à pequena ilha socialista.
A frieza com que os neoliberais seguem “abrigando” sem tetos ao ar livre nos mostra que nenhuma mudança virá de bandeja após a pandemia. Mas a janela de oportunidade está aberta para aqueles que sonham com a superação do capitalismo. As contradições do capitalismo nunca estiveram tão expostas.
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Artigo do NY Times citado: The America We Need
(*) Adriano Bueno é militante do MNU, do CONEPPA e do PT. Mestrando em Políticas Educacionais na Unicamp
(**) Texto publicado originalmente em https://medium.com/