O caso Renato Freitas

Por Valter Pomar (*)

Renato Freitas

Mataram Durval Teófilo Filho.

Mataram Moise Katagambe.

Mataram muitos mais, desde há muito. E se deixar vão seguir matando.

Houve manifestações em todo o país, contra o racismo.

Uma das manifestações foi em Curitiba.

A manifestação de Curitiba aconteceu no sábado, 5 de fevereiro.

Soube dela na segunda, 7 de fevereiro, as 10h46 da manhã, quando um integrante do Diretório Nacional do PT postou um twitter da Gazeta do Povo, onde se podia ler o seguinte: “vereador do PT lidera invasão de igreja católica durante missa”.

Seguiu-se um animado debate na lista de zap do Diretório Nacional do PT.

Em paralelo, rolava o debate nas redes sociais e na mídia empresarial, como gosta de falar um companheiro, provavelmente por considerar este termo mais asséptico do que “oligopólio”.

Em ambos espaços, havia gente condenando a “invasão” e a interrupção de uma “missa”.

Fato?

Não, mentira.

A palavra invasão tem um significado muito conhecido.

Até por isso os movimentos de luta pela terra e por moradia preferem usar “ocupação”.

Não houve “invasão”: a porta da igreja estava aberta, não foi forçada; os manifestantes entraram pacificamente, não houve nenhuma depredação; os manifestantes fizeram uma declaração e saíram.

Algumas imagens da performance estão nas imagens deste link:

https://www.instagram.com/p/CZrnwIeg05q/

Também não houve interrupção de missa: como se pode ver nas imagens citadas acima, no momento da entrada dos manifestantes não havia nenhuma celebração ocorrendo na igreja.

Hoje cedo, alertado a respeito de estar difundindo fake news, um professor universitário apagou seu post – sem reconhecer o erro – e agregou um questionamento: não via motivo para a manifestação ser feita na porta de uma Igreja.

O professor escreveu assim: “Poderiam protestar na porta de um quartel da Marinha, mas escolheram uma igreja”.

O motivo pode não fazer sentido para o colega professor universitário, mas faz absoluto sentido para quem compreende porque a igreja em tela se chama Igreja de Nossa Senhora do Rosário de São Benedito.

Ou seja: o protesto não foi contra a igreja, o protesto foi defronte a igreja, pelo simbolismo desta igreja para o movimento negro.

Os fatos são esses: não houve invasão, não houve interrupção de missa, nem houve intenção de atacar a igreja.

(Diferente de outro mais famoso, os manifestantes de Curitiba não entraram no templo para protestar contra os vendilhões.)

Mas como no caso da mamadeira de piroca, a direita não perdeu tempo: entre outros, Bolsonaro e Moro já se pronunciaram a respeito, em suas contas pessoais.

Conclusão?

Primeiro, é preciso saber que – como no passado – este tipo de situação vai acontecer muitas e muitas vezes. Portanto, menos pânico e mais cabeça fria.

Segundo, não podemos repetir as mentiras do lado de lá. Cada militante que repercutiu a “narrativa” sobre “invasão” e “interrupção de culto” deveria pensar duas vezes a respeito dos motivos pelos quais continua caindo neste tipo de parola.

Terceiro: ninguém precisa concordar com o feito. Aliás, se possível não devemos cair em tentações, digo: provocações.

Os relatos são convergentes: um diácono da igreja foi grosseiro com os manifestantes. Estes obviamente não acharam graça nenhuma em ser enxotados, enxotados logo daquela igreja, enxotados no contexto daquela manifestação. E por isso resolveram entrar na Igreja, criando inadvertida mas previsivelmente o pretexto e as imagens usadas para falar em “profanação injuriosa”

(Aliás, Cantalice que me perdoe, mas a nota de Dom José Antonio Peruzzo tem momentos de pura desfaçatez. E como ainda vivemos num Estado laico, o fato dele ser Arcebispo não o livra de ser criticado pelo dito e pelo não dito).

Por fim: ninguém precisa pedir licença para lutar. Mas é preciso saber que nestes tempos tenebrosos, a direita não dá trégua e uma parte dos chamados “progressistas” está com medo até de sua sombra.

Por isso, quem quiser fazer algo um pouquinho fora do esquadro precisa estar disposto a segurar a onda, pois a solidariedade não é líquida e certa como (parecia ser) noutros tempos.

E por falar em solidariedade, ninguém se iluda: vai aumentar a pressão para Renato Freitas ser cassado de sua cadeira de vereador do PT em Curitiba (PR).

 Além disso, Renato Freitas já era e vai continuar sendo cada vez mais caçado, com o objetivo de massacrar sua imagem e sua vida.

Motivo a mais para as pessoas preocupadas com a “dignidade do templo”, não esquecerem da necessidade de proteger a dignidade e a vida do nosso companheiro.

(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT

 

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