O Governo Bolsonaro não é um raio em céu azul

Por Leandro Eliel P. Moraes (*)

Os defensores da Frente Ampla e da indicação do golpista e neoliberal Geraldo Alckmin para a vice de Lula alegam que estamos num momento atípico, o que justificaria todo tipo de alianças diante do risco de um novo governo Bolsonaro, que a luta não é entre direita e esquerda, mas entre a democracia e o fascismo. Tratam Bolsonaro como se fosse um raio em céu azul, como se ele colocasse em risco o funcionamento das instituições, e, diante disso, é preciso defender a democracia.

Sem desconsiderar os riscos que representam o atual governo e as possibilidades de uma maior escalada autoritária, não é adequado tratar o atual governo como algo fora da curva. Em nossa história, em diversos momentos, a elite brasileira já demonstrou intolerância com as possibilidades de melhoria nas condições de vida e de trabalho da classe trabalhadora, apelando aos golpes preventivos. Foi assim com Getúlio Vargas, com o Golpe Militar de 1964 e com o golpe de 2016, com o impeachment de Dilma, com a prisão arbitrária de Lula e de sua interdição na participação das eleições de 2018, quando estava em primeiro lugar nas pesquisas eleitorais. As elites brasileiras e o imperialismo não permitem níveis crescentes de participação popular, ampliação de direitos políticos, econômicos e sociais, sem os quais falar em democracia é apenas uma abstração.

O governo Bolsonaro não é um raio em céu azul, é a aplicação de um programa econômico neoliberal sonhado por tucanos, descrito no programa Ponte para o Futuro de Temer e do PMDB, defendido pelo Centrão, apoiado por outros setores, inclusive daqueles que se intitulam de centro-esquerda, como podemos ver no apoio que setores parlamentares do PSB, PDT, entre outros, emprestam ao atual governo no Congresso Nacional. Nesse sentido, em seu conteúdo, o governo Bolsonaro é a continuidade dos governos Collor, FHC, Temer. A oposição dos diversos setores da direita ao atual governo é de forma, não de conteúdo.

Se realmente o atual governo fosse fascista, em seu sentido clássico, teríamos que adotar medidas muito mais radicais de atuação, já que nenhuma experiência histórica do fascismo foi derrotada por meio de eleições. É mais adequado tratarmos o atual governo como neo fascista, com a compreensão de que o atual estágio de desenvolvimento capitalista necessita de formas cada vez mais agudas de super exploração do trabalho, acompanhada de mais repressão para o aumento da lucratividade do capital. O neofascismo e o liberalismo caminham juntos.

Diante disso, não basta enfrentar a forma do governo Bolsonaro, é preciso enfrentar seu conteúdo neoliberal.  A aliança com neoliberais, como Alckmin, além de desmobilizar nossa militância, o que pode colocar em risco a eleição de Lula, caso tenha êxito eleitoral,  poderá desmoralizar um futuro governo progressista ao não enfrentar as grandes questões de fundo que aprofundam as desigualdades sociais.

A aliança com Alckmin e com os demais setores neoliberais, num futuro governo, será a permanente ameaça para que Lula não avance o sinal, ou seja, para que não altere as estruturas de poder econômico, político e social das elites. Qualquer tentativa dessa superação terá o neofascista Alckmin como elemento de chantagem dessas elites. Se, para os seus defensores, o “picolé de chuchu” poderá trazer ampliação de votos (o que até agora não aconteceu), é preciso que digam que estão dispostos a reforçar um programa social liberal, defendido por setores de nossa elite desde a redemocratização e que transformarão o PT num partido domesticado, que não representa mais nenhuma ameaça às instituições burguesas.

A Direção Nacional do PT até o presente momento não apresentou nem abriu o debate nas instâncias partidárias sobre a indicação da vice-presidência, mas, alguns membros, do campo majoritário, atuam informalmente e transformam essa indicação em fato consumado, mesmo com maioria nas instâncias. Da mesma forma fizeram com a questão da Federação Partidária, criando um ambiente interno de desgaste e de crítica de amplos setores.

O resultado dessa prática partidária antidemocrática tem produzido muita confusão. Desde críticas as mais contundentes até a resignação, desânimo e desmobilização. Parcela considerável da militância petista, sem conseguir defender adequadamente essa aliança, tem utilizado todo tipo de argumento despolitizado, de que Lula sabe o que faz, produzindo um culto à personalidade ao invés de um projeto coletivo, de que os setores críticos agem como puristas, sectários e outros estereótipos infantilizados, rebaixando o nível crítico da consciência social petista.

Essa possível aliança tem produzido efeitos negativos, entre eles, o rebaixamento programático. Lula poderia percorrer o país defendendo as revogações das reformas neoliberais produzidas desde o governo Temer, mas está limitado pela companhia dos neoliberais. Como defender e reversão das privatizações com um privatista? Como defender o aumento dos salários e melhorias nas condições de vida dos/as trabalhadores/as com alguém que aplicou arrocho salarial e reprimiu violentamente os/as professores/as? Como defender programas sociais com alguém que promoveu o Massacre do Pinheirinho?

É compreensível que os setores dominantes defendam a Frente Ampla como estratégia de domesticação de Lula e do PT, mas é um erro que a esquerda a defenda como estratégia eleitoral sem levar em consideração suas implicações. Como bem disse Hans Magnus Enzensberger em seu poema, “O que exigem do chacal, do lobo, que mude de pele? Querem que ele mesmo extraia seus dentes?” A resistência de setores petistas e da esquerda brasileira às alianças com golpistas e neoliberais expressa um projeto político que preserve as possibilidade de reformas estruturais necessárias para o enfrentamento das desigualdades sociais, articulada com as transformações mais profundas em nossa sociedade, com a luta pelo socialismo, e que o PT continue sendo o instrumento político da classe trabalhadora.

(*) Leandro Eliel P. Moraes é militante do PT Campinas

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