O PCO e a “ liberdade irrestrita”

Por Valter Pomar (*)

O Rui Costa Pimenta, do Partido da Causa Operária, escreveu um artigo respondendo às críticas que fiz ao partido do qual ele é fundador e presidente.

O artigo foi publicado no Brasil 247.

Boa parte do referido artigo é divagação em torno de chavões & embromação autoreferente, que mereceria ser contestada por quem tenha tempo para isso, mas pouco ou nada tem que ver com minha crítica acerca do PCO estar se comportando como aliado objetivo do bolsonarismo.

Minhas críticas ao PCO estão em vários artigos, por exemplo: “Afinidades eletivas entre Aldo Rebelo, o PCO e o general Mourão”, “Rui Pimenta e Borba Gato”, “PCO: alguém sabe explicar como se produz esse tipo de análise?”, “O PCO, meu irmão e meu avô”, “A realidade paralela do PCO”, “Breno Altman, o PCO e a “liberdade de expressão”, “O PCO, aliado objetivo de Bolsonaro”, “PCO e Musk, quem diria”, “O PCO, Elon Musk e o Gari”.

Quem não tiver absolutamente mais nada o que fazer, pode dar uma olhada nesses textos, disponíveis  em valterpomar.blogspot.com e assim verá por quais motivos considero que o PCO é uma seita, que ultimamente vem conciliando de diversas formas com as posições de direita e extrema-direita.

Quanto ao debate da hora, o caso é simples: o PCO saiu em defesa de Elon Musk, dizendo ser “preciso defender a liberdade de expressão e ponto final. Seja Elon Musk, seja um gari.”

Acontece que Elon Musk não é uma pessoa, é um plutocrata multinacional.

Logo, se quisermos defender a liberdade de expressão da classe trabalhadora, inclusive dos garis, então devemos limitar a liberdade de expressão de Musk. Que o PCO não entenda isto, mas se diga defensor da causa operária, é apenas mais uma demonstração de que a dissociação cognitiva é uma praga dos tempos modernos.

O PCO diz que “a liberdade de expressão irrestrita” seria “uma reivindicação histórica do movimento operário socialista de todos os tempos e presente nos programas da maioria dos partidos socialistas e comunistas”. Pulo a parte de “todos os tempos”, assim como da “maioria dos partidos socialistas e comunistas” e vou direto ao grão: não existe “liberdade de expressão irrestrita”. Numa sociedade dividida em classes, defender os direitos de uns implica em restringir os direitos de outros.

Noutras palavras: nesta questão da liberdade “irrestrita”, o PCO adota uma posição que coloca a “Causa Operária” na mesma prateleira dos anarco-capitalistas e dos ultra-liberais.

Por outro lado, ser contra a tese da “liberdade de expressão irrestrita”  não implica em aplaudir as ações do Xandão em particular nem do STF em geral. Quem, por falta de coisa melhor para fazer, tiver se dado ao trabalho de ler o que escrevi a respeito, verá que não faço parte nem da seita de adoradores do Xandão, nem da igreja dos crentes no estado democrático de direito. Mas nada disto me leva a ficar do lado de Musk, de Bolsonaro et caterva. Sem falar, é claro, de outras figuras menores mas bem escrotas que o PCO defende regularmente, em nome da tal liberdade de expressão irrestrita e da crítica ao que eles chamam de identitarismo.

Isto posto, chamo a atenção para a seguinte passagem da análise de Pimenta: “na crise brasileira, há quatro classes fundamentais envolvidas: a burguesia imperialista, a burguesia nacional brasileira, a classe média e a classe operária” (…) “Bolsonaro (…) é apoiado por  setores menores da burguesia brasileira” (…) “Podemos não ficar ao lado de setores reacionários da burguesia média nacional em várias questões, mas (…) não podemos ficar ao lado do imperialismo”.

Novamente, só a dissonância cognitiva permite defender Musk e, ao mesmo tempo, dizer que não podemos ficar ao lado do imperialismo. Fora isso, peço que notem que a frase “podemos não ficar ao lado em várias questões” é o jeito esperto de dizer que “podemos ficar ao lado em outras questões”. Exatamente a atitude adotada pelo PCO no caso da
Intentona golpista de 8 de janeiro.

Ademais, dizer “com o imperialismo nunca, com a burguesia média nacional as vezes” seria uma postura razoável, se o imperialismo fosse uma coisa só e se a tal “burguesia nacional” também fosse uma coisa homogênea. Mas não são, como se pode constatar comparando as posições de Trump e Biden sobre Bolsonaro, ou as posições de Alckmin e Bolsonaro em 2022, por exemplo. Moral da história: não se faz política sem sociologia, mas não se deduz a política da sociologia.

De resto, não tenho a pretensão de estigmatizar o PCO. Uma seita tão dedicada não precisa da ajuda de ninguém para virar caricatura.

(*) Valter Pomar é professor e membro do diretório nacional do PT

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