Por Pedro Augusto Domingos (*)
Neste 6 de outubro, teve início no Vaticano, um encontro entre bispos da Igreja Católica e o Papa Francisco. Na nomenclatura religiosa, esses encontros recebem o nome de Sínodo e são convocados pelo Papa para discutir temas de caráter universal.
O Sínodo pela Amazônia, chamado dessa forma pelo pontífice, resgata pautas apontadas por Francisco desde o início do seu papado em 2013. Ao visitar o Brasil, três meses após tomar posse, o Papa fez um discurso voltado aos povos da periferia global e destacou os problemas que o sistema econômico atual tem trazido para o meio ambiente. Ali, já foi possível perceber que a linha adotada pelo novo líder seria diferente dos seus antecessores João Paulo II e Bento XVI, conhecidos por defender doutrinas mais conservadoras.
Desde então, algumas declarações do Papa tem não só chamado a atenção, mas também estremecido as relações com alguns grupos mais tradicionalistas. Pautas como uma maior abertura para casais homoafetivos e a possibilidade de divorciados participarem ativamente dos rituais não foram bem aceitas por tais grupos.
A postura mais progressista de um Papa sulamericano tem incomodado tanto as alas tradicionais da Igreja que um conflito clássico dentro da instituição desde o início do século XX volta a ter papel central. Qual deve ser o olhar da Igreja? Deve se preocupar mais com a vida material ou com a vida espiritual dos seus fiéis?
Diante desse embate, as vozes reacionárias não se intimidaram. Steve Bannon que foi estrategista chefe da Casa Branca no governo Trump e mantem relações próximas com a família Bolsonaro chegou a dizer que o Papa Francisco seria o maior inimigo do projeto da extrema-direita global. Alguns cardeais também se manifestaram por meio de uma carta em que era pedido o impeachment do Papa, acusando-o de heresia. Matteo Salvini, um dos representantes da extrema-direita italiana, chegou a reunir seus seguidores na Piazza del Duomo, em Milão, para protestar contra o pontífice. As críticas se davam em torno do discurso pró-migração. Salvini, durante seu discurso, projetava em um telão imagens de João Paulo II, Bento XVI e o preferido da ultra-direita para suceder Francisco, o cardeal Robert Sarah.
No Brasil, a eleição de um extremista também colocou os setores atrasados da Igreja em evidência. Bolsonaro durante sua campanha visitou templos católicos e protestantes e viralizou junto com os fiéis o gesto que o fez ser conhecido na política, a arminha com a mão. Em uma das visitas, o candidato e agora presidente, assinou uma carta-compromisso com o Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani Tempesta, assegurando governar mantendo os valores morais da família. Bolsonaro também visitou a sede da Canção Nova em São Paulo, onde conversou com o líder do Renovação Carismática Católica, Monsenhor Jonas Abib.
O Sínodo para a Amazônia vem para acirrar ainda mais as fileiras do catolicismo. Após o evento ser anunciado, o grupo também ultra conservador católico denominado TFP (Tradição, Família e Propriedade) criou um site chamado Pan Amazon Synod Watch com a intenção de boicotar o congresso dos bispos. A organização acusa o Sínodo de promover práticas “neopagãs” por preservar a liberdade religiosa das tribos indígenas nativas da Amazônia. Em contrapartida, o Papa Francisco realizou uma intervenção no grupo Arautos do Evangelho, uma dissidência da TFP que também é oposição ao Sínodo, devido acusações que a organização possui relacionadas a práticas de exorcismo e desvios financeiros.
A batalha ideológica se mostra efervescente. A Amazônia oscilou entre trevas e luz nas mãos da Igreja Católica, digo trevas quando estudamos as práticas de grande parte dos jesuítas perante os nativos na colonização; e digo luz quando podemos lembrar de missionários que pagaram com a vida pela luta por reforma agrária e o fim da desigualdade. Hoje, ela sendo o centro das discussões do clero, pode ser que a ideia de solidariedade, libertação e combate as injustiças saia fortalecida e majoritária na instituição. Os próximos capítulos, assim como o período em que vivemos, promete ser carregado de disputas e tensões em todos os campos.
Um espectro ronda a América do Sul!
(*) PEDRO AUGUSTO DOMINGOS é militante petista de Santo André (SP).