Orientação Militante N°373 (24 de junho de 2023)

Boletim interno da Direção Nacional da

tendência petista Articulação de Esquerda

1/reunião da direção nacional da AE

No dia 25 de junho haverá reunião da direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda.

2/pauta da reunião da Dnae

Na reunião de 25/6 a Dnae tratará dos seguintes assuntos: i/debate e resolução sobre conjuntura; 2/preparação da reunião do Diretório Nacional do PT; 3/informes diversos; 4/resoluções organizativas; 5/congresso da UNE; 6/8º Congresso Nacional da AE;

3/debate e resolução sobre conjuntura

Pontos que serão objeto de debate: i/situação internacional, com destaque para a guerra, eleição nos EUA e situação latino-americana e caribenha; ii/situação nacional, com destaque para perspectivas da economia, impactos da política de juros e do novo marco fiscal, situação social, resultado das pesquisas, julgamento cavernícola, situação no congresso nacional e no STF, CPMI do 8 de janeiro, CPI do MST e das Americanas; iii/eleições 2024 e movimentações sobre 2026; iv/situação do PT e da esquerda partidária e social, incluindo aí conferência de Saúde, Congresso da UNE, movimento sindical e movimentos populares.

4/reunião DN

No dia 8 de julho acontecerá uma reunião do Diretório Nacional do PT. No dia 4 de julho devem ser inscritos documentos com propostas de resolução. A Dnae deve decidir sobre estas propostas.

5/informes e resoluções

-viagem à China

-situação da FPA

-encontro do Foro de SP

-Congresso da CUT.

-Congresso UNE

-encontro Tocantins.

-pauta do Página 13 de julho, conferência da JAE.

Lembramos que ao longo das edições estamos buscando incluir textos sobre: ministérios um-a-um; governos estaduais um-a-um; “novo” congresso nacional; “novas” assembleias legislativas; CUT 40 anos; congresso da CMP; UNE e Ubes; aniversário MST; atitude dos movimentos sociais em geral e do movimento sindical em particular frente ao governo Lula, destacando temas como o da reforma da previdência e trabalhista.

-proposta de contribuição militante

-apresentação da ouvidoria

-apresentação do curso de formação sobre violência de gênero

-projeto 30 anos

-AEP13

-congressos da CUT, MNLM e CMP

-questões de comunicação

-viabilidade financeira de produzir o P13 quinzenalmente e a capacidade de voltar a fazer impresso;

-três temporadas especiais em formato podcast, um sobre o Foro, um curso de formação e um sobre a história da AE;

-relatório resgatando nossas formulações a respeito do tema comunicação (em geral, do governo federal, do PT, do campo democrático-popular, da AE). Tarefa a cargo da Alana (RS);

-relatório sobre o estado da arte dos meios de comunicação do campo democrático-popular, incluindo movimentos, partidos, tendências, mandatos, iniciativas mais ou menos empresariais etc. Tarefa a cargo do Silvio Queiroz (DF);

-relatório com balanço de conteúdo e público dos instrumentos de comunicação da AE: o jornal Página 13; o boletim Orientação Militante; a revista Esquerda Petista; o Antivírus; o Contramola; o Podcast; o site; e nossa presença em listas e nas redes sociais. Tarefa a cargo do Walter (MS);

-formulação, com base nos três relatórios supracitados, de uma proposta de conjunto para a comunicação da tendência no período 2023-2026, incluindo: a) identidade visual; b) agência de publicidade; c) política para as redes sociais; d) vídeos e youtubers; d) política para as listas; e) jornal impresso; f) política de impulsionamento; g) contratação de pessoal e profissionalização. Até o 8º Congresso da AE, portanto, manteremos as mídias atuais, sem prejuízo de ajustes.

-resolvido o item anterior, buscaremos organizar oficinas virtuais de comunicação;

-idem, será criado um grupo de zap dos comunicadores da AE;

-no congresso será informada a ampliação do Conselho Editorial da revista e da editora, convidando de imediato: Daniel Valença, Patrick Araújo, Bruno Elias, Adriele Manjabosco, Laurem Aguiar, Adriano Bueno, Rayane Andrade.

-prossegue a venda dos livros Socialismo ou Barbárie e logo começará a venda da segunda edição do livro Novos rumos para o governo Lula

-informe sobre Elahp

-informe sobre cursos nos estados: as prioridades são: Santa Maria, São Luís do Maranhão. Está sendo negociada a data de um curso em Caxias do Sul. Há demandas para fazer cursos em Santos, em Juiz de Fora, em Florianópolis, em Patos de Minas, em Esteio, em Cachoeira Paulista, no MS e no PI. No caso do Maranhão, Jandyra buscará contribuir. No caso de Santa Maria, Patrick buscará contribuir.

-censo

-informe dos estados

-informe dos setoriais

6/8º Congresso Nacional da AE;

O 8º Congresso Nacional da AE será nos dias 28, 29 e 30 de julho. O Congresso será presencial, em Brasília. O regimento do congresso e o texto base estão disponíveis aqui: https://pagina13.org.br/category/documentos-da-ae/8-congresso-da-ae-2023/

7/logística do congresso

O 8º Congresso vai ser realizado no auditório da sede nacional do PT em Brasília, que fica no Setor Comercial Sul Quadra 2, Bloco C, Nº 256. O transporte, a hospedagem e a alimentação das delegações é de responsabilidade de cada delegação.

8/Programação do 8º Congresso

28 de julho, sexta, 19h00

Ato político de abertura, sob coordenação de Daniela Matos e Patrick Araújo, cabendo a Múcio Magalhães e Natália Sena falarem dos 30 anos da tendência petista Articulação de Esquerda. A palavra será aberta aos convidados e a quem deseje falar. O ato será transmitido pelas redes sociais. No encerramento, cantaremos A Internacional.

29 de julho, sábado, das 9h00 às 20h00

Leitura e aprovação do regimento; eleição da mesa (proposta Daniela Matos e Patrick Araújo); eleição da comissão de emendas (proposta: Valter Pomar e Damarci Olivi); eleição da comissão eleitoral (proposta: Múcio Magalhães, Júlio Quadros, Natália Sena e Jandyra Uehara); apresentação do texto base (proposta: Valter Pomar). Em seguida, debate em plenário do texto base e apresentação de emendas.

29 de julho, sábado, a partir das 20h00

Reunião da comissão de emendas e reunião da comissão eleitoral. Noite livre para quem não fizer parte dessas comissões.

30 de julho, domingo, a partir das 9h00

Leitura do relatório da comissão de emendas. Debate e votação das emendas e moções. Apresentação da proposta da comissão eleitoral, eleição da nova Direção nacional e da nova comissão de ética nacional.

30 de julho, domingo, 13h00

Encerramento e regresso das delegações. Reunião da nova direção nacional e da nova comissão de ética nacional.

9/pessoas convidadas

Além dos delegados e delegadas com direito a voto, poderão participar do congresso: militantes da AE em dia com suas obrigações e, também, pessoas convidadas pela direção nacional. Convidamos para participar da abertura do Congresso, dia 28 de junho, inclusive fazendo uso da palavra: i/integrantes do Diretório Nacional do PT; ii/integrantes da bancada federal do PT (parlamentares e assessorias da Câmara e Senado); iii/petistas que integram o governo federal; iv/integrantes do Diretório Distrital do PT DF; v/o presidente Lula e a presidenta Dilma; vi/todas as tendências do PT que possuem representação junto no atual Diretório Nacional do PT; vii/os militantes petistas que fazem parte da direção nacional da CUT, do MST, do MNLM, da CMP, da UNE e da Ubes. Convidamos para assistir a todo o nosso Congresso e a falar quando quiserem: i/os integrantes da nossa chapa (EPS, Novos Rumos, Eloi Pietá, Breno Altman, Rui Falcão, José Genoíno); ii/os integrantes do blog Manifesto Petista; iii/Guilherme Estrela, Raimundo Júnior; iv/militantes com papel destacado em nossa história.

10/congressos de base

Reiteramos que as delegações são eleitas nos congressos de base; sendo que os congressos de base são municipais ou intermunicipais; e que os congressos de base devem ser presenciais. Informamos que a direção nacional da AE vai convocar um congresso nacional virtual de “repescagem”, no dia 23 de julho, para que militantes que não tenham podido participar de seus congressos de base possam participar do debate e eleger delegação.

11/nova direção e comissão de ética

A atual direção nacional vai apresentar, ao Congresso, um balanço de sua atuação, uma proposta de critérios para a eleição da nova direção e uma proposta de nominata para a nova direção. A direção nacional, reunida no dia 25 de junho, vai aprovar a versão preliminar do balanço e das duas propostas citadas.

Como já foi informado no OM 371, na reunião da Dnae, dia 25 de junho, discutiremos uma proposta, a ser submetida ao 8º Congresso, acerca da composição da nova direção nacional da AE, bem como da comissão de ética nacional. Esta proposta incluirá: i/um balanço da atuação da direção nacional da AE está findando seu mandato; ii/uma proposta de critérios de funcionamento e composição da nova direção; iii/uma nominata. Nossa proposta tem como pressupostos óbvios: i/acordo com a linha política aprovada no Congresso; ii/capacidade dirigente; iii/disposição de assumir tarefas, a começar pela participação nas reuniões periódicas; iv/paridade. Lembramos que a direção nacional não é um parlamento representativo das regiões, estados, setores etc. Tendo em vista a ampliação das tarefas, num cenário de governo, eleições municipais 2024 e Ped 2025, estamos considerando a seguinte possibilidade: i/manter uma direção executiva com uma composição de 8 integrantes; ii/eleger uma direção ampliada maior.  Nesta possibilidade, a direção executiva manteria reuniões mensais e a direção ampliada faria reuniões trimestrais. Destacamos, dentre as tarefas a cargo dos/das dirigentes nacionais: secretaria geral e de organização; comunicação; finanças; formação política; acompanhamento da direção partidária; acompanhamento dos setoriais; acompanhamento do Congresso nacional; acompanhamento dos movimentos sociais e de nossa atuação neles; acompanhamento da atuação da AE nos estados. A proposta é que, ao elegermos a direção, o façamos já estabelecendo as respectivas tarefas. Reiteramos, finalmente, que a direção eleita em 2023 terá mandato até 2025, portanto “cuidará” das eleições 2024 e do PED 2025.

12/texto-base do 8° Congresso da AE

Já está disponível, no site Página 13, a primeira versão do texto base. Quem quiser pode encontrar aqui: https://pagina13.org.br/category/documentos-da-ae/8-congresso-da-ae-2023/

A reunião da Dnae no dia 25 de junho vai debater uma nova versão do texto base, acrescentando um capítulo sobre a estratégia e outro sobre o funcionamento da AE.

Salientamos que o texto será emendado e atualizado de forma contínua, desde agora até o dia de abertura do 8º Congresso da AE, quando será apresentada à plenária a versão final.

13/Proposta de nova versão em debate na Dnae

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À militância petista

À militância da tendência petista Articulação de Esquerda

O Partido dos Trabalhadores aprovou, no V Encontro Nacional (1987) e no I Congresso (1991), o direito de tendência. E determinou que as tendências devem dar publicidade, ao Partido, acerca de suas posições e atividades.

Cumprindo esta determinação, informamos ao conjunto do Partido que nos dias 28, 29 e 30 de julho de 2023, acontecerá na sede nacional do PT em Brasília, o Oitavo Congresso nacional da tendência petista Articulação de Esquerda.

Destacamos o fato de que neste ano de 2023 a tendência petista Articulação de Esquerda completará 30 anos, fato que será lembrado na abertura do Oitavo Congresso.

Fica desde já convidada a participar, da abertura do 8º Congresso, o conjunto da militância petista, em particular a direção nacional do PT, bem como as direções de todas as tendências existentes no Partido, a começar pelas 14 tendências que fazem parte das 8 chapas representadas no Diretório Nacional do Partido eleito em 2019.

Este convite -dirigido a todas as tendências do Partido – é extensiva a abertura dos congressos de base da tendência, que elegerão as delegadas e os delegados que terão direito a voto no Oitavo Congresso nacional da AE.

Nestes congressos de base, terão direito a voto os/as militantes da tendência que estiverem em dia com sua contribuição militante (conforme disposto no regulamento do congresso, disponível em https://pagina13.org.br/category/documentos-da-ae/8-congresso-da-ae-2023/).

Como subsídio aos congressos de base, a direção nacional da AE aprovou no dia 30 de abril um projeto de resolução. No dia 26 de maio, este projeto de resolução recebeu várias emendas. No dia 25 de junho, a Direção nacional debateu a seguinte nova versão, que será submetida ao debate nos congressos de base na plenária final do Oitavo Congresso nacional.

Imensos desafios, enormes perigos

A situação mundial, continental e nacional pode ser sintetizada por duas palavras: crise sistêmica. Esta crise possui múltiplas dimensões (militar, política, social, econômica, ambiental, cultural), tem duração indeterminada e seu desfecho dependerá dos conflitos que estão em curso, entre Estados e entre classes sociais.

No âmbito mundial, o conflito fundamental se dá entre Estados Unidos e República Popular da China. No âmbito continental, o conflito fundamental se dá entre imperialismo e integração regional latino-americana e caribenha. No âmbito nacional, o conflito fundamental se dá entre defensores e opositores do modelo primário-exportador.

Nenhum destes conflitos é recente. Mas todos ganharam maior dimensão e velocidade nos últimos anos, como se viu na crise de 2008, na pandemia, na segunda onda de governos progressistas e de esquerda, na guerra travada na Ucrânia entre Ucrânia e Rússia – na verdade uma guerra travada entre Otan e Rússia e, em certo sentido, a primeira “guerra por procuração” entre EUA e China.

Em 2015, a tendência petista Articulação de Esquerda alertou que vivíamos “tempos de guerra” e que precisávamos estar à altura disto. Oito anos passados, depois de um golpe, de um governo cavernícola, de uma pandemia e em meio a uma guerra que inclui ameaças nucleares, repetimos: precisamos de um partido que esteja à altura dos tempos de guerra. E estar à altura inclui perceber que momentos de crise profunda – como a que vivemos atualmente – são terríveis, são perigosos, podem ser fatais, mas também são aqueles momentos históricos mais propícios à dar os passos decisivos para a construção de um novo mundo, um mundo socialista.

É desta perspectiva que abordamos a conjuntura mundial, continental e brasileira. Na qual destacamos o fato de que voltamos ao governo federal e, portanto, dispomos de uma situação melhor do que antes, não apenas para melhorar a vida do povo, mas também para mudar as estruturas de poder e de riqueza em nosso país, dando assim uma contribuição inestimável para a mudança na região e em todo o mundo.

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Lula tomou posse na Presidência da República do Brasil em 1 de janeiro de 2023. Esta vitória só foi possível porque as forças democráticas e populares resistiram e derrotaram os golpistas e os neofascistas, derrota consagrada no dia 30 de outubro de 2022, tendo sido decisivo o voto da classe trabalhadora com consciência de classe, das mulheres, das negras e negros, da juventude e dos eleitores de coração nordestino, moradores ou não daquela região do país.

A partir de então e mesmo antes de ser diplomado, Lula começou de imediato a tomar decisões e atitudes tipicamente presidenciais. É o caso de sua participação na 27ª Conferência do Clima das Nações Unidas e, também, da participação de Lula nas negociações junto ao Congresso Nacional, buscando alterar o orçamento 2023 de forma a incluir recursos para pagar a chamada Bolsa Família para milhões de famílias.

O governo cavernícola não havia incluído tais recursos na previsão orçamentária e, caso a negociação não fosse feita, Lula iria iniciar seu governo administrando uma crise humanitária de proporções ainda mais graves.

Também no período de 31 de outubro a 1 de janeiro, Lula dedicou grande atenção ao balanço do governo findante, balanço realizado pelo chamado “governo de transição”, figura prevista na legislação brasileira desde 2002. O resultado do trabalho da equipe de transição está consolidado num relatório que foi tornado público no dia 22 de dezembro de 2022 e cuja leitura é essencial para dar conta da herança maldita recebida pelo governo Lula, que dificulta imensamente nossa atuação.

No mesmo período, Lula se dedicou à composição de seu governo e à definição de suas relações com o judiciário e com o legislativo. Nos três casos, aplicou-se a chamada “política de frente ampla”, ou seja, a política de alianças entre o Partido dos Trabalhadores e um amplo leque de forças, incluindo aí outros partidos de esquerda, partidos de centro, partidos de centro-direita e partidos de direita, bem como setores de partidos.

Somos favoráveis a que o PT faça alianças. E consideramos que – dada a correlação de forças – é necessário fazer alianças inclusive com inimigos. Mas a chamada “política de frente ampla” não é uma política de alianças, é uma política de capitulação prolongada frente a inimigos. Outra política de alianças é possível, outro tipo de frente se faz necessária.

No que diz respeito ao judiciário, Lula e seu governo adotaram relações institucionais e respeitosas para com o colegiado de 11 ministros que integram a cúpula do poder judiciário brasileiro, a começar pelo Supremo Tribunal Federal. Isso ocorre não obstante parte do judiciário, inclusive da suprema corte, ter dado respaldo à ilegal condenação, prisão e interdição eleitoral de Lula.

Reafirmamos que o protagonismo político do STF e do judiciário em geral, problema apontado por nós há tempos, segue sendo um tema a ser enfrentado e superado. E isso não será feito, se continuar prevalecendo a política atual, que vem empoderando o judiciário, sob o pretexto de que no momento prevalece no Supremo uma postura contrária à extrema direita, esquecendo que há pouco tempo prevaleceu uma postura contrária à esquerda. Não é possível admitir que um poder não eleito tenha tamanho poder.

Esta mesma conduta, de empoderar inimigos, foi adotada no que diz respeito ao legislativo. Atendendo orientação do governo, a bancada do PT no Congresso Nacional votou a favor da reeleição do presidente da Câmara dos Deputados e do presidente do Senado federal. Isto apesar de ambos terem contribuído para dar sustentação legislativa à administração da extrema-direita, além de terem introduzido métodos – como o popularmente designado “orçamento secreto” – duramente criticados pelo PT.

A atitude adotada pelo Partido e pelo governo na prática contribui para que a maioria de direita e extrema-direita no Congresso nacional tente impor um semiparlamentarismo ou, o que é equivalente, um semi-presidencialismo.

Reafirmamos que um dos nossos desafios segue sendo derrotar a hegemonia da direita e da extrema-direita no Congresso Nacional. E isto não se fará dentro das atuais regras do jogo político-eleitoral. Também por isso reiteramos a posição – aprovado por Congressos do PT – de lutarmos pela convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

No caso da composição do ministério, Lula contemplou a ampla coligação que o elegeu, mas também contemplou outras forças, supostamente necessárias para compor uma maioria congressual, maioria que como sabemos só se materializa naqueles assuntos onde fazemos concessões à direita, como é o caso do chamado marco fiscal.

Dos 37 ministros, 17 são petistas ou simpatizantes do Partido; 3 são filiados ao PSB; 3 são filiados ao MDB; 3 são filiados ao PSD; 2 são filiados ao União Brasil (partido que, entretanto, não se considera parte da base do governo no Congresso Nacional); 2 são vinculados ao PDT (embora um destes dois seja na verdade vinculado ao União Brasil, que portanto ocupa de fato três cadeiras no ministério); 1 é integrante do PCdoB, 1 da Rede e 1 do PSOL (embora não tenha se oposto a participação de uma filiada como ministra, o PSOL enquanto partido não se considera parte do governo).

Ademais da composição partidária estrito senso, é importante ressaltar que o ministério é composto por uma maioria de homens e brancos, realidade que precisa ser alterada. Assim como se faz necessário corrigir distorções regionais e contemplar a diversidade partidária, que não se espelha no ministério, onde uma única tendência controla a maior parte dos principais cargos. Aliás, não há como não concordar com quem disse que o grupo atualmente majoritário no PT é amplo da porta para fora e sectário da porta para dentro.

O atual ministério tomou posse no início de janeiro. Desde então e até hoje, está em curso uma intensa atividade, tanto por parte do presidente Lula quanto por parte dos ministros e ministras, como fica evidente nos relatórios que o governo divulgou acerca de seus 100 primeiros dias, cuja leitura e estudo atento recomendamos a toda militância.

Destacamos, entre as ações realizadas, as medidas tomadas em defesa dos povos indígenas, em particular as ações para deter o genocídio contra o povo Yanomami; a retomada de várias obras paradas; as iniciativas relativas ao programa Minha Casa, Minha Vida e ao programa Mais Médicos; e a interrupção de privatizações; as decisões sobre o mínimo, sobre a recomposição do salário do funcionalismo público, sobre a política de preços da Petrobras.

O desempenho do governo Lula nesses primeiros meses teria sido melhor, se vários ministérios não tivessem sido saqueados, desmontados ou até mesmo extintos pelo governo cavernícola, o que agora exige uma engenharia administrativa, legal e orçamentária que torna muito difícil este início de governo. Além disso, o orçamento deixado pelo cavernícola é absolutamente inferior ao necessário.

A ação de muitos ministérios precisa enfrentar o peso da herança maldita deixado pelo governo da extrema direita: desmonte e recursos à míngua, contrastando com a realidade, que exige grande e imediata intervenção.

Outro fator que dificulta a ação de vários ministérios é o fato de – pelo menos até abril de 2023 – as equipes ainda não estarem completamente recompostas, entre outros motivos porque o governo busca calibrar as nomeações com a busca – até o momento infrutífera – de ter uma efetiva maioria no Congresso Nacional. Como já foi dito, esta busca tem produzido, em vários casos, situações inaceitáveis, com a presença de bolsonaristas em postos chave do governo. Sem que isso mude o comportamento efetivo da maioria do Congresso, que apoia o governo naquilo que é de interesse do governo.

As ações positivas do governo – especialmente quando postas em contraste com anos de gestão cavernícola – não podem nos levar a fechar os olhos para o fato de que, em algumas áreas e temas, muito pouco ou quase nada mudou. E isto se deve, essencialmente, ao fato de que vários ministérios são encabeçados por titulares vinculados a direita, inclusive a setores que participaram do golpe, do lavajatismo, além de terem apoiado o governo cavernícola.

Evidente que enquanto prosseguir esta situação, nesses ministérios – com destaque para os da Comunicação e da Defesa – não haverá avanços efetivos, no sentido do cumprimento do programa de reconstrução e transformação.

Julgar, condenar e prender os criminosos de 8 de janeiro

As dificuldades citadas anteriormente eram previsíveis, especialmente para quem acompanhou o trabalho da chamada transição.

Apesar disso, muitos eleitores de Lula externaram publicamente — no dia 1 de janeiro de 2023 — a certeza de que o “pesadelo havia chegado ao fim”. A verdade era outra, como ficou patente no dia 8 de janeiro.

Naquele dia, milhares de criminosos atacaram os prédios do governo federal, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. Depois de algumas horas de depredação, foram reprimidos pela polícia.

Para fazer a polícia da capital do país agir adequadamente contra os criminosos, o presidente Lula foi obrigado a decretar intervenção na segurança do Distrito Federal. Posteriormente, o presidente do Supremo Tribunal Federal decretou o afastamento temporário do governador do Distrito Federal. E, dias depois, foi a vez do comandante do Exército ser demitido e substituído, comprovando que ele nunca deveria ter sido nomeado.

O ataque da extrema-direita não foi um ato espontâneo, nem totalmente inesperado. Já no dia 12 de dezembro de 2022, após a diplomação de Lula, a extrema-direita havia promovido um quebra-quebra na cidade de Brasília, contando com a cumplicidade do ainda presidente da República, do governo do Distrito Federal, de setores das Forças Armadas e das polícias. E no final de dezembro de 2022 e início de janeiro de 2023, as redes (anti)sociais da extrema-direita foram tomadas por mensagens arregimentando pessoas para vir a Brasília.

Tratou-se, portanto, de uma operação de guerra, financiada por empresários, coordenada por uma aliança cívico-militar e perpetrada por alguns milhares de neofascistas, que usaram o acampamento defronte ao Quartel General do Exército como base de operações. Apesar disso, o então e ainda ministro da Defesa disse que nos acampamentos havia democratas, inclusive amigos e familiares seus, prevendo que eles se desmobilizariam aos poucos e pacificamente. Posteriormente o ministro da Defesa tentou explicar estas declarações, mas suas explicações apenas confirmam os motivos pelos quais ele foi escolhido pelos militares para ocupar o posto. Aliás, o ministro da Defesa segue – contra todas as evidências – tentando encobrir a participação criminosa de altos mandos nos atos de 8 de janeiro.

Desde então, está evidente a necessidade de processar, julgar e punir quem financiou as caravanas e os acampamentos da extrema-direita; quem, por ação ou omissão, facilitou o acesso da extrema-direita à Esplanada dos Ministérios, onde ficam os três prédios atacados; assim como processar, julgar e punir quem invadiu e depredou os três palácios. Ficou patente, também, a necessidade de uma revisão completa dos protocolos de segurança e inteligência do governo federal. Parte disto vem sendo feito. Mas muito resta por ser feito, como ficou fartamente demonstrado pelos fatos que levaram à demissão do General encarregado do chamado GSI; e, mais recentemente, pela descoberta de diálogos mantidos pelo então ajudante de ordem do cavernícola.

Por tudo isso e por muito mais, enfrentar a “questão militar” segue na ordem do dia

Até agora, oficiais-generais e outros militares de alta patente envolvidos com o golpe não foram punidos, nem mesmo administrativamente. O ex-comandante do Exército, por exemplo, general Júlio César Arruda, precisa ser compulsoriamente reformado, uma vez que resistiu às ordens para desalojar o acampamento bolsonarista montado diante do Quartel General do Exército em Brasília, desacatou ministros e o interventor federal no Distrito Federal (DF) e chegou a ameaçar um coronel da Polícia Militar que tentava remover os acampados.

Outro general de quatro estrelas, Gustavo Dutra de Menezes, foi responsável por impedir ações contra os bolsonaristas acampados no QG. Portanto, é outro caso de militar da mais alta patente que não pode permanecer na ativa, independentemente das ações que vierem a ser ajuizadas contra ele por participação nos eventos golpistas.

Caso os generais Arruda e Dutra não sejam objeto de reforma, passando à reserva, eles continuarão participando do Alto Comando do Exército, o que é uma situação inaceitável, tais as evidências de seu envolvimento com os golpistas.

Reformá-los imediatamente é uma prerrogativa do governo federal e deve ser levada a cabo, sob pena de premiar quem conspirou contra a vontade popular. Dutra, por exemplo, vem até o momento exercendo uma subchefia do Estado-Maior do Exército.

Destaque-se como ação extremamente positiva a transferência da Agência Brasileira de Informações (ABIN) para a Casa Civil, deixando assim de fazer parte do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Mas o próprio GSI deve ser extinto e o controle da Inteligência deve ficar sob controle de órgãos civis e não do Exército. Ademais, precisamos ter um Ministério da Defesa que seja legítimo representante do poder civil. Além de seguir pendente a necessidade de criar um Ministério da Segurança Pública.

Segue necessária, também, uma reforma das Forças Armadas e das PMs, que seja capaz de democratizar tanto os processos de recrutamento e de formação de oficiais como suas estruturas internas (organização, regulamentos, hierarquia). Os currículos atuais das escolas militares são fortemente enviesados pelo conservadorismo mais reacionário, calcado nas antigas doutrinas de “Segurança Nacional” e nas agendas expansionistas dos EUA, a ponto de as Forças Armadas considerarem seriamente a possibilidade de uma invasão da Amazônia pela França e de colocarem um oficial-general a serviço da 5ª Frota estadounidense.

As escolas militares não podem se furtar às orientações do Ministério da Educação, nem escamotear uma vasta bibliografia de autores e escolas de pensamento que os generais ainda hoje enxergam como “subversivos”. A resistência dos militares a qualquer alteração no seu sistema escolar indica precisamente quão crucial é esse sistema na reprodução da ideologia profundamente antidemocrática, visceralmente oligárquica, que historicamente vem enquadrando a visão de mundo de gerações e gerações de oficiais. Lembrando que esta visão de mundo inclui a subordinação das forças armadas brasileiras a uma potência estrangeira: os Estados Unidos.

A gestão das escolas militares é profundamente autoritária, desrespeitando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e a Constituição Federal, que preveem a gestão democrática do ensino, com a participação de professores, funcionários e estudantes nos colegiados e nas decisões das instituições escolares. No ensino superior, um exemplo é o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), cujo reitor é escolhido em processo de seleção decidido exclusivamente pelo Alto Comando da Aeronáutica, sem consulta à comunidade.

A extinção da diretoria responsável pelas escolas cívico-militares, no âmbito da Secretaria de Educação Básica do MEC, foi um passo importante para sepultar a política do governo anterior. Contudo, não é suficiente para avançarmos na desmilitarização da gestão educacional e escolar das redes públicas. É preciso induzir a descontinuidade e a reversão do processo de militarização de escolas em estados e municípios, para que as estruturas civis responsáveis por essas unidades escolares reassumam plenamente sua gestão, em todos os aspectos, livrando-as da interferência de militares e de suas respectivas corporações.

Outra alteração que devemos priorizar, não apesar mas exatamente por causa das pesadas adversidades conjunturais, é a desmilitarização das PMs e sua desvinculação do Exército. É preciso pôr fim à falida “guerra às drogas”. As PMs seguem comportando-se como “tropa de ocupação” nas periferias e comunidades faveladas dos grandes centros urbanos. São as forças policiais que mais matam no mundo inteiro! O texto atual da Constituição Federal as define como “forças auxiliares do Exército” e dificulta aos governadores e governadoras exercer comando sobre elas. O que vale para os governos estaduais encabeçados por petistas, sendo o caso da Bahia particularmente preocupante. Neste sentido, a mudança precisa “começar em casa”: qualquer conivência de governantes petistas com o modus operandi tradicional das polícias deve ser criticado e condenado publicamente.

Vale lembrar, também, da necessidade de alterar o artigo 142 da Constituição Federal, que prevê, atualmente, a figura da “garantia da lei e da ordem” (GLO). É preciso acabar com as chamadas operações de GLO e transferir automaticamente para a reserva o militar que assumir cargo público, encerrando as especulações sobre o suposto “poder moderador” das Forças Armadas, pondo fim a um certo discurso praticado por setores neofascistas com a finalidade de justificar a tutela militar sobre a sociedade civil.

É central a reformulação do artigo 1º da Lei da Anistia (lei 6.683/1979) e do seu parágrafo 1º, que preveem anistia para os autores de “crimes conexos”, uma espécie de código para anistiar agentes militares e civis que praticaram torturas, assassinatos e toda sorte de atrocidades contra aqueles e aquelas que se opuseram à Ditadura Militar, bem como contra diferentes grupos populacionais, inclusive camponeses e povos indígenas.

Ao “interpretar” essa lei, em 2010, o Supremo Tribunal Federal considerou válidos os dispositivos de “crimes conexos”, legitimou a anistia que os militares se autoconcederam (e a seus cúmplices civis), e interditou todo e qualquer processo criminal contra torturadores e assassinos a serviço do regime ditatorial e de seu terrorismo de Estado: centros de tortura, execuções sumárias, “casas da morte”, desaparecimento forçado de corpos, falsificação de laudos etc.

Não haverá sequer liberdades democráticas no Brasil, muito menos uma “democracia”, enquanto persistir a tutela militar sobre a sociedade civil, enquanto a tortura não for definitivamente banida, enquanto as Polícias Militares tiverem licença para matar. Razão pela qual devemos incluir a questão militar entre os itens prioritários do programa do PT e exortar o governo do companheiro Lula a prosseguir avançando.

Vale dizer que buscamos fazer isso no debate sobre o programa de reconstrução e transformação; no debate sobre o programa da federação; e no debate sobre o programa da coligação. Em todas estas oportunidades, o grupo majoritário no Diretório Nacional e também setores de outras tendências, inclusive das que se consideram parte da “esquerda petista”, preferiram silenciar a respeito. O mesmo silêncio ocorreu no governo de transição. O resultado foi sermos surpreendidos pelo 8 de janeiro. Não esperamos dos indivíduos responsáveis pelos erros citados que façam autocrítica, mas que mudem de conduta, sob pena de sermos novamente surpreendidos.

As armadilhas da herança maldita

O governo Lula, se quiser triunfar na batalha principal do momento histórico que vivemos – a batalha sobre se continuaremos a ser uma subpotência primário-exportadora ou se nos converteremos numa “potência neoindustrializada” – precisará implementar uma “guerra de movimentos”. Se não formos muito velozes nas mudanças, seremos atropelados pelos acontecimentos.

Mas ao mesmo tempo em que precisa travar uma guerra de movimentos, o governo Lula precisa combinar isso com uma guerra de posições, parecida com aquela que se precisa fazer quando se reocupa uma cidade que fora tomada por um exército invasor: é preciso ir de casa em casa, desalojando franco-atiradores, desmontando minas e armadilhas de todo tipo.

Uma dessas armadilhas está no campo da educação. É necessário retomar a pauta do financiamento, que de acordo com a Meta 20 do Plano Nacional de Educação deveria chegar até 10% do PIB, objetivo que sofreu um profundo retrocesso com a Emenda Constitucional que instituiu o chamado “teto dos gastos”. É preciso enfrentar, também, os retrocessos ocorridos, desde 2016, na Educação Básica e no Ensino Médio. Nos somamos a luta dos trabalhadores da educação e dos estudantes que pedem a revogação da chamada reforma do ensino médio. E criticamos o governo, em particular o ministro da Educação, por adotar uma política de cogestão com privatistas neste tema do ensino médio.

A principal das armadilhas deixadas pelo governo anterior ficou no Banco Central.  Legislação aprovada durante o golpe concedeu uma suposta “independência” ao Banco Central, suposta porque na prática o tornou dependente e extensão dos interesses da especulação financeira.

Nomeado pelo cavernícola, o atual presidente do Banco Central mantém uma política de juros absolutamente alucinada, cujo único propósito é transferir recursos para o setor financeiro.

É preciso tomar todas as medidas legais e institucionais para, no mais rápido prazo possível, alterar a diretoria do Banco Central, a começar pela sua presidência, sob pena de não conseguirmos adotar uma política de desenvolvimento com ampliação do bem-estar social.

Apoiamos as críticas feitas pelo presidente Lula contra a política de juros e conclamamos o Partido a apoiar uma campanha nacional contra os juros altos e, também, a favor de que os ricos paguem impostos. Ao contrário do que disse o ministro da Fazenda, companheiro Fernando Haddad, não se trata apenas de combater a sonegação e as isenções; é preciso criar impostos que gravem o patrimônio dos muito ricos.

Destacamos a importância da revogação das contrarreformas trabalhista e da previdência, bem como destacamos a política de valorização do salário-mínimo que, como defendeu a CUT, deveria ser de, no mínimo, R$ 1.382,71 e deveria valer já a partir do início do ano, como forma de compensar o confisco salarial resultante da inflação. Reafirmamos que é preciso achar maneiras de recuperar o que foi confiscado desde o golpe.

Destacamos, também, a necessidade de a Petrobrás adotar medidas que rompam com a política adotada no governo anterior e a façam adotar papel central (junto com a Eletrobrás) no processo de retomada do crescimento, do desenvolvimento e da reindustrialização de novo tipo. A mudança da política de preços é um importante passo neste sentido, mas muito mais precisa ser feito.

Por todos estes motivos, divergimos da opção feita pelo governo, de apresentar um “novo arcabouço fiscal”. No fundo, o que o governo buscou fazer foi “redução de danos”, de certa maneira afrouxando a armadilha deixada pelo governo Temer, quando o certo era destruir a armadilha. E, como não podia deixar de ser, a maioria conservadora do Congresso tornou pior o que já era ruim.

O chamado “teto de gastos”, implementado desde 2017, buscava limitar por 20 anos a expansão do gasto público à variação inflacionária, excetuando os gastos financeiros, cuja evolução seguiu descontrolada.

O resultado foi a evolução descontrolada da dívida pública, a desestruturação das políticas públicas e a estagnação da economia nacional. O preço quem pagou foi a maioria do povo.

O PT sempre se opôs ao “teto de gastos” e o presidente Lula, na campanha, informou que iria trabalhar por sua revogação. Mas o “Novo Arcabouço Fiscal” (NAF) elaborado pelo Ministério da Fazenda não consistia numa efetiva revogação.

O que a Fazenda propôs foi substituir o “teto de gastos” por um conjunto de metas de evolução para o saldo primário e regras de variação das despesas.

O NAF originalmente proposto estabeleceu metas de superávit primário, com o objetivo de chegar ao superávit primário em 2026. Foram previstas bandas (variações em torno da meta) e, também, punições, para o caso da meta não ser atingida.

Para atingir este objetivo, o NAF propôs limitar a expansão dos gastos públicos a um percentual (70%) do crescimento das receitas, estabelecendo exceções a esta regra (na saúde, na educação, na previdência).

Ao mesmo tempo, o NAF estabelecia um piso (0,6%) e um teto (2,5%) de expansão real (acima da inflação), percentuais que poderiam ser reajustados periodicamente. E estabelecia um piso (valor mínimo, a ser reajustado pela inflação) de investimentos, de R$ 70 bilhões.

Resumidamente: enquanto o teto de gastos impedia a expansão real do gasto público, o NAF permite que isso ocorra. Mas o NAF permitiria isso apenas sob determinadas condições, entre as quais a obtenção de superavit, o crescimento das receitas e – como pressuposto geral – o crescimento da economia.

Portanto, em um cenário em que não se conseguir aumentar os impostos, em que não se conseguir avanços significativos no combate às desonerações e à sonegação, a proposta de Novo Arcabouço Fiscal deixa o crescimento fundamentalmente na dependência do crescimento do investimento privado.

Mais do que isso: ao estabelecer um crescimento das “despesas” sempre menor do que as receitas, o NAF projeta um futuro em que o Estado será mais mínimo do que é hoje.

Estas opções são, em si mesmas, erradas, contraditórias com as posições históricas do Partido e medíocres, quando contrastadas com o que o Brasil necessita para sair das atuais condições de desigualdade social e primário-exportação.

Além disso, no atual cenário nacional e mundial, as opções sintetizadas no NAF não ajudam – pelo contrário – em nosso desempenho nas eleições de 2024 e 2026.

Argumentou-se que tais opções decorriam da correlação de forças. De fato, a correlação de forças é um problema. Mas a questão não está em constatar a correlação de forças, mas sim em alterar a correlação de forças. Se nos limitamos a constatar, é óbvio que o passo seguinte será retroceder ainda mais.

Por isso defendemos que o Partido, através de nossa bancada na Câmara, apresentasse emendas no sentido  de: 1/estabelecer metas de crescimento e geração de empregos, como parâmetros para a política fiscal; 2/ estabelecer metas fiscais opostas à política monetária, sem o que correríamos o risco de viver um duplo efeito contracionista; 3/estabelecer metas de evolução do superávit que estejam subordinadas às necessidades de investimento, em nenhum caso aceitando déficit zero ou superávit enquanto a economia brasileira não crescer de forma sustentada; 4/diluir ao longo de vários anos as “punições” previstas para o caso de não cumprimento das metas de superávit primário; 5/incluir propostas tributárias que, além de rever desonerações e combater a sonegação, aumentem os impostos sobre os ricos; 6/alterar os números de variação da receita, crescimento mínimo dos gastos e crescimento médio dos gastos, no sentido de garantir que não haja restrição permanente ao papel do setor público na economia brasileira: o peso do setor público frente ao PIB deve crescer; 7/retirar a educação, a saúde, a previdência, o salário-mínimo e os investimentos da conta dos gastos, para evitar arrocho sobre os demais gastos públicos; 8/permitir que o Tesouro transfira recursos aos bancos públicos.

Ou seja: o que propúnhamos é que o NAF não fosse um teto de gastos, mas sim um estímulo para o crescimento e o desenvolvimento.

Como sabemos, tais emendas não foram apresentadas. O Diretório do Partido não debateu o tema. E prevaleceu na bancada do PT uma postura recuada. O efeito foi que a maioria de direita do Congresso nacional, principalmente através do relator Cajado (PP da Bahia), pode agir sem nenhum contraponto.

Submetido ao debate na Câmara dos Deputados, o NAF original foi alterado para pior, com a introdução de contingenciamento obrigatório, criminalização, eliminação de exceções, proibição de concursos e reajustes etc. A bem da verdade, no essencial se piorou o que já era ruim.

No Senado, a proposta aprovada pela Câmara sofreu duas alterações importantes – preservando o Fundeb e os investimentos em ciência e tecnologia. Agora o tema volta ao debate na Câmara. E novamente se coloca o dilema: qual será a posição do governo e da bancada do PT? Manter os termos do Cajado ou alterar?

Se for mantida a proposta do relator Cajado (PP Bahia), passaremos a ter dois problemas: uma política monetária e uma política fiscal que não contribuem para o desenvolvimento. Vale dizer que até o momento o Banco Central mantém sua política de juros. Ou seja: não ocorreu o que se disse, a saber, que com o marco fiscal, o BC iria “afrouxar”. Pelo visto, o BC – diferente da postura de setores do governo e do PT – só “entrega” depois de “receber”.

Reiteramos: é preciso fazer de tudo para substituir já o presidente do BC. E é preciso que nas reuniões do Copom, a postura dos representantes do governo seja oposta a postura do BC. Além disso, alterando ou não a política de juros, é preciso travar uma batalha imensa por uma reforma tributária progressiva, que faça os ricos pagarem a conta. Neste sentido, a proposta de reforma tributária que está tramitando é simplesmente ridícula.

Atuando sob condições mais difíceis

O ocorrido no dia 8 de janeiro, o ocorrido com o NAF e os acontecimentos internacionais confirmam que o terceiro governo Lula atua em condições muito mais complexas e difíceis do que os governos encabeçados pelo PT entre 2003 e 2016.

Além das dificuldades resultantes da situação mundial e da herança maldita do golpismo e do bolsonarismo, temos as dificuldades ligadas à situação do governo Lula, da classe trabalhadora, da esquerda e do PT.

Fica evidente, a cada dia que passa, que enfrentamos uma dupla oposição: da direita tradicional e da direita neofascista, ambas neoliberais. As duas direitas estão presentes no governo e na máquina de Estado. São majoritárias no Congresso nacional, entre os governadores de Estado, nos aparatos de segurança e na grande mídia. As duas oposições, embora se dividam no que toca a “reconstrução”, unificam-se para impedir a “transformação” nacional. Ambas operam para vencer as eleições de 2024 e tirar o PT da presidência, em 2026.

Frente a este quadro, a linha política hegemônica na esquerda brasileira e em nosso Partido está demonstrando ser ineficiente e insuficiente, tanto do ponto de vista tático quanto do ponto de vista estratégico. É preciso mudar de orientação estratégica e tática. E, para fazer isto, é preciso abandonar a atitude baluartista, cabotina, autocongratulatória e debater abertamente os problemas existentes, debate que deve ser feito nas instâncias partidárias.

Hoje, ainda tem prevalecido a opção de não travar o debate nas instâncias. Antes mesmo da campanha começar, a maioria dos integrantes do atual Diretório Nacional escolheu não aprovar nenhuma resolução sobre como enfrentar o bolsonarismo nas forças armadas, assim como não aprovou uma resolução que propunha enfrentar já na campanha eleitoral a mal denominada “independência” do Banco Central. Tampouco debatemos previamente na direção do Partido a proposta de Novo Arcabouço Fiscal. Como resultado, o Partido tem mais dificuldade de enfrentar os problemas, uma vez que estes não desaparecem pelo fato de não terem sido debatidos.

A respeito desses e de outros temas, como por exemplo a necessidade de revogar as contrarreformas da previdência, trabalhista, sindical e do ensino médio, a mudança de rumo da Petrobrás e a recuperação da Eletrobrás, a luta por outra política de segurança pública e de Defesa, a Articulação de Esquerda tem apresentado diversas propostas ao Diretório Nacional do PT.

Com base nelas, e também com base nas propostas que surjam dos congressos de base, o Oitavo Congresso da AE aprovará um conjunto de resoluções e orientações, tendo como objetivos principais apontar medidas concretas no sentido de retomar o crescimento, implementar uma industrialização de novo tipo, mudar o curso do desenvolvimento nacional, realizar a reforma agrária, defender o meio ambiente, ampliar as políticas públicas de saúde (ver o anexo desta resolução) e educação, concretizar o bem-estar social e as liberdades democráticas do povo brasileiro, recuperar a soberania nacional, promover a integração latino-americana e caribenha, mudar o lugar do Brasil no mundo.

Entretanto, não bastam propostas, se não conquistarmos maioria organizada junto a classe trabalhadora.

As eleições presidenciais de 2022 demonstraram que a esquerda é majoritária entre os eleitores ativos, por uma diferença de 2 milhões de votos. Aliás, ganhamos 5 das últimas 9 eleições presidenciais. Entretanto, se considerarmos os mais de 30 milhões que votaram branco, nulo e se abstiveram; e somarmos a estes os trabalhadores que votaram na candidatura presidencial da extrema-direita, a conclusão inescapável é que, neste momento, a esquerda não tem maioria numérica na classe trabalhadora.

Ademais, décadas de neoliberalismo, somadas a décadas de institucionalização e burocratização, enfraqueceram brutalmente a presença, a força e a representatividade das organizações da classe trabalhadora: movimentos, associações, sindicatos, partidos. E, de outro lado, nas últimas décadas constituiu-se uma extrema-direita com base de massas.

Portanto, nossa tarefa estratégica, de cujo sucesso dependem todas as outras tarefas, é fazer com que a esquerda conquiste e organize a maioria da classe trabalhadora. Conquistar e organizar a maioria exige um conjunto de ações práticas, entre as quais trabalho de base, funcionamento regular das instâncias, política de comunicação. Mas exige, acima de tudo, linha política correta. Neste sentido, reafirmamos a necessidade de recuperar o “fio vermelho” das elaborações do V Encontro Nacional (1987) e do 6º Congresso Nacional do PT (1917).

Esta tem sido a preocupação fundamental da tendência petista Articulação de Esquerda, desde 1993. Isso pode ser constatado na leitura das resoluções de seus seis seminários (1993-1997), onze conferências (1998-2009) e sete congressos (2011-2020).

Diretrizes estratégicas

A construção do socialismo supõe que a classe trabalhadora tenha poder para reorganizar a sociedade. O tema do poder, no que consiste, como construí-lo, como conquistá-lo, é portanto uma questão chave em toda reflexão política.

Durante o século XIX, os socialistas enxergavam o tema do poder através do prisma oferecido pela revolução francesa: 1789, 1848, 1871 eram os paradigmas clássicos ao redor dos quais girava o imaginário de anarquistas, sindicalistas revolucionários, socialistas, social-democratas, narodniks, comunistas etc.

As revoluções russas de 1905, fevereiro de 1917 e outubro de 1917 ofereceram um novo paradigma, ao redor do qual girou, durante décadas, a reflexão política, tática e estratégica dos diferentes setores da esquerda mundial.

Os paradigmas “francês” e “russo” tinham semelhanças: o protagonismo da plebe urbana, o papel contraditório das massas camponesas, a insurreição seguida de guerra civil e contra inimigos externos, o caráter “permanente” da revolução, o fantasma do “Termidor”.

O isolamento da Rússia soviética e a derrota das tentativas revolucionárias na Alemanha, na Romênia e na Itália, entre outras, resultarão – nos anos 1920 e 1930 – numa reflexão acerca da estratégia a adotar, seja nos países capitalistas desenvolvidos, seja nos países que não faziam parte do núcleo metropolitano central.

Tal reflexão correu simultânea a outros debates, igualmente complexos, acerca da construção do socialismo na URSS, acerca de qual devia ser a política internacional de um Estado socialista, acerca da evolução do capitalismo e do imperialismo pós-Primeira Guerra Mundial, acerca de como se posicionar frente a cada vez mais provável (segunda) guerra mundial.

Os escritos de Antonio Gramsci datam deste período, embora sua influência (em variadas versões e contraditórias releituras) vá se estabelecer após a Segunda Guerra, em uma situação mundial distinta daquela que serviu de base para as reflexões do comunista italiano.

De toda forma, até o final da Segunda Guerra, quando se debatia os temas do poder, predominava em grande parte da esquerda o paradigma da revolução russa: o papel de vanguarda da direção partidária, o protagonismo das plebes urbanas, o acúmulo de forças via lutas sindicais, políticas e ideológicas, o duplo poder, a insurreição como parte da guerra civil, a construção do socialismo. Tal “modelo” estava presente inclusive nos que defendiam as Frentes Populares, inclusive nas suas versões mais moderadas, de alianças estratégicas com setores da burguesia, nas políticas conhecidas como “etapistas”.

Um novo paradigma se afirmará com a vitória da revolução chinesa de 1949. Neste paradigma, o papel do Partido continua destacado, mas trata-se de um partido-exército. O protagonismo principal é das massas camponesas. As cidades, antes palco da insurreição decisiva, passam agora a ser “cercadas pelo campo”. O acúmulo de forças prévio passa a incluir experiências precoces de duplo poder, com libertação de territórios, formação de governos e do exército popular. A insurreição urbana está à serviço da guerra popular prolongada.

A estes dois paradigmas (“russo” e “chinês”) soma-se um terceiro, que foi o da guerra de libertação nacional. Este terceiro paradigma vai se materializar sob duas formas principais. A primeira delas é anti-nazista, em países como Albânia e Iugoslávia (onde a derrota dos nazistas é seguida pela instauração de governos de orientação socialista); Grécia (neste caso, a guerrilha comunista é derrotada pela intervenção britânica); Itália e França (nestes dois casos, a política dos partidos comunistas não foi a de transformar a guerra em revolução). A segunda forma pela qual vai se materializar o paradigma da guerra de libertação nacional é o da guerra anticolonial, como no caso do Vietnã, Laos, Camboja, Angola, Moçambique e Guiné Bissau. Cabendo citar duas situações contemporâneas: Sahara Ocidental e Palestina. Valendo lembrar que o que talvez seja primeiro caso de uma revolução anticolonial vitoriosa foi o das chamadas 13 colônias contra o Império Britânico.

Estes três paradigmas (“russo”, “chinês” e de “libertação nacional”) influenciaram o debate político e estratégico da esquerda latino-americana, dos anos 1920 aos anos 1950. Há toda uma literatura a respeito, que vale a pena revisitar sempre, especialmente aquela que leva em conta o impacto da revolta de Túpac Amaru, da revolução haitiana e da grande revolução mexicana, episódios que apavoraram a elite continental muito antes que acontecesse a revolução socialista russa.

Outra grande influência, obviamente, foi da revolução cubana vitoriosa em 1959: uma revolução democrática anti ditatorial, baseada na combinação entre diferentes formas de luta e organização, com ênfase na combinação entre guerrilha no campo e insurreição urbana; revolução que, uma vez vitoriosa, se revelou cada vez mais democrática popular e antiimperialista; e que acaba convertendo-se em uma revolução socialista.

A revolução cubana, especialmente suas interpretações de tipo “foquista”, infuencia fortemente a esquerda latinoamericana nos anos 1960 e 1970. Mas, com a parcial exceção da revolução nicaraguense, as estratégias inspiradas no exemplo cubano não foram vitoriosas em nenhuma parte de nosso subcontinente.

O mesmo, entretanto, deve ser dito das demais estratégias adotadas pela esquerda revolucionária, até o final dos anos 60. Aliás, devemos reconhecer que se as revoluções são fenômenos raros, as revoluções vitoriosas são fenômenos ainda mais raros e profundamente singulares: há mais constância nos motivos de derrota do que nas razões de vitória.

Foi neste contexto que surgiu a experiência do governo da Unidade Popular chilena, entre 1970 e 1973.

A história da Unidade Popular, os antecedentes da vitória eleitoral de 1970, as vicissitudes do governo Allende, o golpe de 1973, a ditadura que veio em seguida (com semelhanças e diferenças frente a outras ditaduras contemporâneas), as políticas neoliberais e os governos de centro-esquerda posteriores, são processos cujo estudo é essencial para quem hoje faz ou busca fazer parte dos governos “progressistas e de esquerda” na América Latina.

Reformista demais para os revolucionários, revolucionária demais para os reformistas, a estratégia experimentada pela Unidade Popular ficou numa espécie de limbo até 1998. Desde então, diversos governos da região passaram a tentar construir o socialismo, não a partir de revoluções, mas sim a partir de vitórias eleitorais.

Ao mesmo tempo, outros partidos socialistas passaram a ter que lidar – em seus esquemas estratégicos – com governos que buscavam implementar reformas mais ou menos profundas no capitalismo.

Portanto, pelo menos para alguns setores da esquerda regional, a experiência pós 1998 de governos como o de Chavez exigia revisitar o debate sobre a orientação estratégica que se buscou materializar no governo da Unidade Popular, evidentemente que à busca de construir um “caminho chileno com final feliz”.

Este revisitar não fazia sentido, é óbvio, para quem a revolução (e, em alguns casos, o socialismo) não faziam mais parte do horizonte estratégico. Para gente assim, não cabe diferenciar luta pelo governo e luta pelo poder. São os que achavam que ganhar uma eleição é ganhar o poder; e que, por outro lado, golpes seriam coisa do passado, pois a classe dominante também teria feito “as pazes com a democracia”.

O revisitar tampouco fazia sentido para quem acreditava que os governos progressistas e de esquerda eram uma aclimatação da experiência socialdemocrata europeia ou customização da experiência populista latinoamericana. Nos dois casos, tratar-se-ia de experiências mais ou menos funcionais ao esquema de dominação imperialista e capitalista, governos mais ou menos reformistas que logo seriam ultrapassados pelos acontecimentos, após o que a luta de classe voltaria a condições que exigiriam – da parte da esquerda – a adoção de algum dos paradigmas revolucionários clássicos.

Portanto, seja para o esquerdismo, seja para o melhorismo, a experiência da Unidade Popular chilena não era vista como tendo muito o que nos ensinar, do ponto de vista estratégico, salvo do ponto de vista negativo. Aliás, é curioso constatar essas e outras semelhanças entre melhoristas e esquerdistas.

Já para aqueles setores que continuam tendo o socialismo como objetivo estratégico, e que portanto querem que a classe trabalhadora tenha o poder necessário para construir o socialismo, o “case” da Unidade Popular entre 1970 e 1973 é estrategicamente atual. E a pergunta chave é: como converter a parcela de poder obtida num processo eleitoral, não apenas em melhorias concretas para a vida do povo, não apenas em reformas estruturais, mas também numa parcela de poder que permita iniciar a transição socialista?

Em linhas muito gerais, em primeiro lugar é preciso construir um sólido apoio nas classes trabalhadoras, o que inclui articular sob um comando estratégico único a maior parte das organizações políticas e sociais. A combinação entre luta institucional e eleitoral, ação parlamentar e de governos, luta social e construção partidária, só é virtuosa quando articulada politicamente.

Em segundo lugar, é preciso ganhar o apoio dos setores médios, dividir as classes dominantes e isolar o inimigo principal. Impedindo que ocorra o contrário: que a classe dominante isole a esquerda, ganhe o apoio dos setores médios e divida as classes trabalhadoras.

Em terceiro lugar, é preciso combinar disputa política com disputa cultural. A construção do poder necessário para iniciar uma transição socialista é indissociável da construção de outra hegemonia ideológica, cultural.

O que remete, em quarto lugar, para a necessidade de ganhar apoio nos organismos para estatais, ou seja, organismos aparentemente privados, mas que executam funções públicas, como é o caso das igrejas, das escolas, da indústria cultural e dos meios de comunicação.

Em quinto lugar, é preciso conquistar uma maioria eleitoral que seja suficiente para ter hegemonia de esquerda nos organismos executivos e legislativos fundamentais. É insuficiente ter a presidência da República, mas sem maioria no Congresso, nem nos governos subnacionais fundamentais.

Em sexto lugar, é preciso impedir a sabotagem e a subversão provenientes dos organismos de Estado não eletivos, principalmente a alta burocracia, o judiciário e as forças armadas. Trata-se de democratizar o acesso, estabelecer controle social, mudar as doutrinas vigentes e, fundamentalmente, garantir o respeito a legalidade que advém da soberania popular. Motivo pelo qual é tão decisiva a realização de processos constituintes.

Em sétimo lugar, é preciso construir uma rede de solidariedade e proteção internacional, que reduza a ingerência externa que as metrópoles capitalistas centrais fazem sobre processos socialistas nacionais. Daí a centralidade da integração regional latinoamericana e caribenha.

Em oitavo lugar, é preciso construir um programa de transformações que não seja artificial, ou seja, que parta dos problemas reais enfrentados pela sociedade e que construa soluções que atendam às necessidades das camadas populares, respeitando os níveis de consciência e a correlação de forças em cada momento, mas sempre tendo em perspectiva que cada passo gera novas necessidades, novos conflitos e novas reações, cabendo à direção política do processo se antecipar.

No caso chileno, o programa de transformação seguiu por dois eixos fundamentais: o poder popular e a área de propriedade social. O que nos remete para um nono tema, que é como fazer a conversão de uma economia dominada pelo capitalismo privado, em uma economia capitalista hegemonizada pelo capitalismo estatal, sob condução de um governo de esquerda.

Finalmente, é preciso manter a iniciativa tática, especialmente nos momentos de impasse estratégico. O ano de 1973, no Chile, foi um desses momentos. A classe dominante havia decidido ir para o golpe. E o governo Allende perdeu progressivamente a iniciativa, passando a uma postura cada vez mais defensiva, confundindo a defesa estratégica da legalidade, com a passividade legalista frente à subversão de direita.

O legalismo corresponde a visão estática da consciência popular. A legalidade é sempre uma mediação entre a lei (que expressa a correlação de forças passada) e a legitimidade (que expressa a correlação de forças presente). A burguesia sabe disto muito bem e não deixa de invocar o suposto apoio popular, quando lhe interessa desrespeitar a legalidade, sempre que esta está do lado da esquerda.

A história poderia ter sido diferente se, por exemplo frente ao Tancazo, o presidente Allende tivesse acatado as propostas do General Prats de afastar os comandantes golpistas. Também por isso, é um erro dizer que o golpe teria sido, inevitavelmente, vitorioso.

O Partido dos Trabalhadores, entre 1985 e 1989, implementou uma estratégia política que fazia referência explícita à experiência chilena de 1970-1973. Entre 1990 e 2002, a experiência da Unidade Popular perdeu influência, mas seguiu presente. Entre 2003 e 2016, os governos petistas enfrentaram várias situações que teriam sido melhor equacionadas, se algumas lições do Chile tivessem sido levadas em consideração. E, em 2016, um golpe de Estado derrubou o governo brasileiro, então encabeçado por Dilma Rousseff, do PT.

Veio então um governo golpista, sob o qual foram realizadas as eleições presidenciais de 2018, nas quais se impediu a participação do então ex-presidente Lula. Lula assistiu da cadeia a vitória e a posse de um cavernícola. Mas, pouco tempo depois, Lula foi libertado, reconquistou o direito de disputar as eleições e venceu – por dois milhões de votos de diferença – as eleições presidenciais de 2022.

O novo governo Lula (2023-2026) experimenta dilemas estratégicos semelhantes aos de seus dois primeiros governos (2003-2006, 2007-2010), mas em condições piores do que no passado. Algo parecido ocorre com os demais governos encabeçados por partidos nacional-populares, de esquerda e progressistas na América Latina e Caribe.

Guardadas as devidas proporções, a mudança de cenário e a mudança de ânimo dos protagonistas as vezes faz lembrar o que ocorreu quando o Partido Socialista voltou à presidência do Chile, com Ricardo Lagos (2000-2006): o mundo era outro, o Chile era outro, o Partido Socialista era outro, os problemas eram maiores e menores os meios para resolvê-los. Mas, acima de tudo, era diferente a estratégia predominante na esquerda chilena. E diferente num sentido muito profundo: para amplos setores, o “horizonte” deixara de ser o socialismo e passara a ser, não a socialdemocracia europeia ou o desenvolvimentismo latino-americano dos anos 1950-1970, mas sim o social-liberalismo, ou seja, a tentativa de fazer coexistir certos compromissos democráticos e sociais, com políticas econômicas neoliberais e a submissão à hegemonia estadounidense.

Na época, talvez muitos não tenham se dado conta disso. Assim como, hoje, muitos setores da esquerda latino-americana e caribenha pensam sinceramente que não mudaram de lado, que estão apenas fazendo concessões devido à correlação de forças etc. Tal metamorfose atinge, como é demonstrado pelo governo Boric, inclusive setores que há tão pouco tempo eram vistos como alternativas idôneas à velha esquerda.

Tudo isto ocorre, paradoxalmente, mas não surpreendentemente, num ambiente em que o cenário mundial é de crises e guerras, o que noutros tempos desembocou em rupturas e revoluções. E depois de 40 anos de neoliberalismo, que provocou mudanças profundas nas classes trabalhadoras, mudanças que colocam novos desafios teóricos e práticos para as forças políticas e sociais que seguem comprometidas com a derrota do capitalismo e do imperialismo.

Levando em conta o conjunto da situação, cabe concluir que, assim como nossa poesia deve ser extraída do futuro, a estratégia da esquerda brasileira também está por ser construída. E, se quisermos construir vitórias no tempo de nossas vidas, esta construção passa pelo por nosso Partido, pelo Partido dos Trabalhadores.

Defender, construir e disputar os rumos do PT

A maioria da classe trabalhadora com consciência de classe, especialmente mulheres, jovens, negros e negras, se identifica com o PT. Desde os anos 1980 até hoje, a vitória da classe trabalhadora brasileira depende, em grande medida, das opções feitas pelo PT. Mas a verdade é que nosso Partido – ao mesmo tempo que tem imensos méritos – vem apresentando imensas debilidades. A principal destas debilidades não é organizativa, nem de comunicação; a principal debilidade é política: nosso Partido não construiu uma linha política e uma maneira de funcionar adequadas aos tempos de guerra em que vivemos.

Guerra travada, contra a maioria do povo brasileiro, pelos defensores do imperialismo, do capitalismo, do modelo primário exportador, do neofascismo, do patriarcado, do racismo, do fundamentalismo, pelos defensores de todo tipo de preconceito, opressão e exploração. Guerra que custou a vida de centenas de milhares de pessoas, como é o caso dos indígenas vítimas de genocídio; e, também dos brasileiros e brasileiras que poderiam estar entre nós, se o governo de extrema direita não tivesse sido aliado da Covid.

Neste contexto, qual é o papel da tendência petista Articulação de Esquerda? Em resumo, contribuir, no limite de nossas forças, para que nosso Partido – assim como a CUT, o MST, a CMP, o MNLM, a UNE, a Ubes, as Frentes e todas as demais organizações do nosso povo – estejamos à altura dos imensos desafios postos pela atual situação nacional, continental e mundial.

Para tornar isso possível, será necessário um intenso trabalho organizativo, com destaque para nosso enraizamento na classe trabalhadora e para a mudança de métodos de funcionamento. A retificação que exigimos no PT, também deve ser feita entre nós. As minorias e as maiorias de nosso Partido padecem de deformações gravíssimas e não somos alheios a isto.

Destacamos, como parte desta retificação, em primeiro lugar, contribuir na organização da classe, nos locais de trabalho, de moradia, de estudo, nos espaços de cultura e lazer. Para este esforço convocamos cada militante de nossa tendência. Não basta criticar o que os outros não fazem, é preciso fazer aquilo que achamos que precisa ser feito.

Em segundo lugar, contribuir para construir o Partido dos Trabalhadores e das trabalhadoras, como partido de massas e radicalmente democrático. Novamente, reafirmamos: não basta criticar os que têm maioria nesta ou naquela instância, é preciso fazer por nossa própria conta o que pode e deve ser feito.

Em terceiro lugar, lutar contra as políticas equivocadas que existem no interior do chamado campo democrático-popular, com destaque para os setores social liberais infiltrados na esquerda, defensores das privatizações, das terceirizações, do capital financeiro e do agronegócio. Neste terreno, é preciso lembrar que as concessões feitas ao neoliberalismo só produzem mais neoliberalismo.

Em quarto e fundamental lugar, trabalhar para que o PT continue lutando, aqui e agora, em favor de soluções efetivamente socialistas e revolucionárias para os grandes problemas do nosso país, de nosso continente e do mundo. Nos tempos perigosos e desafiantes em que vivemos, não cabe dúvida: o futuro depende da classe trabalhadora lutar com todas as suas forças pela soberania, pela democracia, pelo desenvolvimento e pelo socialismo.

Anexo

A Saúde como política pública estratégica e de Estado, democrática, classista, anticapitalista e rumo ao socialismo

  1. Militantes, filiados, simpatizantes, membros do quadro diretivo e parlamentares do PT integraram o Movimento pela Reforma Sanitária, nas décadas de 1970 e 1980, assim como lutaram pelo acesso universal à saúde na 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986.
  2. No Congresso Constituinte de 1987-1988, nossa bancada de deputados federais defendeu o Sistema Único de Saúde universal, público, gratuito e estatal.
  3. A “Saúde como direito de todos e dever do Estado” é uma conquista consagrada pela Constituição de 1988, que começou a ser efetivamente executada em 1990, com a Lei Orgânica da Saúde, expressa nas leis 8.080 e 8.142/1990, que deram início à implantação do SUS, embasado nos pilares da descentralização, da integralidade e do controle social.
  4. De lá para cá, mesmo com todas as interdições e descaminhos impostos pelas forças neoliberais e de extrema direita que hegemonizam o sistema político brasileiro, seja nos diferentes níveis do executivo, legislativo ou judiciário, assim como no setor privado da saúde e na mídia empresarial, a militância de esquerda e do Partido dos Trabalhadores segue lutando em diferentes espaços, junto aos movimentos sociais, governos e conselhos de saúde, pela consolidação de um sistema de atenção à saúde para todes, comprometido com a intersetorialidade, a equidade e a integralidade de ações, uma vez que o direito à saúde não se esgota no tratamento de doenças.
  5. Para uma vida digna e saudável, a população precisa ter acesso à alimentação, moradia, saneamento básico, meio ambiente, trabalho, renda, educação, comunicação, transporte, cultura, lazer e outros bens e serviços essenciais.
  6. Como projeto, o SUS se contrapõe ao modelo de desenvolvimento capitalista, porque é uma política pública inclusiva e nacional, que demanda ação integrada e capilarizada das diversas políticas sociais de um Estado forte, que ao ser implementado fere e busca superar interesses de quem defende e atua para que a Saúde seja mercadoria.
  7. Na década de 1990, a onda neoliberal dificultou, distorceu, mas não impediu o processo de inclusão social estimulado pelo SUS, que adquiriu capilaridade em todo território nacional.
  8. Desde então até hoje, é evidente o impacto positivo nos indicadores de saúde, tais como: redução da mortalidade infantil, da mortalidade materna, da mortalidade por doenças infecciosas e parasitárias, bem como o aumento da esperança de vida ao nascer da população.
  9. Esses avanços convivem, entretanto, com uma precária estabilização do financiamento do SUS, sabidamente insuficiente para sistemas universais como o nosso e bem menor que o desejável. Além disso, parte importante do financiamento do sistema é desviado em direção ao setor privado, bem como a um insustentável modelo de atenção que prioriza a atenção especializada e de alto custo em detrimento da atenção básica e das ações de prevenção das doenças e promoção da saúde. Além de existir evidente desequilíbrio entre as instâncias federal e estadual frente a sobrecarga dos municípios.
  10. Também não foram consolidados e integrados sistemas transparentes que possibilitassem um gerenciamento adequado, marcado pela disseminação generalizada da entrega e terceirização da gestão dos serviços à iniciativa privada; nem conseguimos por fim aos desmandos e à lucratividade desenfreada dos planos e seguros saúde, que impactam nos gastos de trabalhadores com bens e serviços privados de saúde, especialmente de idosos.
  11. Na pandemia, em que prevaleceu no nível federal o obscurantismo militarizado e grotesco, violento e agressivo, configurado no genocídio e no negacionismo da necropolítica, o SUS salvou milhões de vidas. Na contramão do discurso imposto pelos neoliberais, que tanto influencia a cultura política do nosso povo, grande parte da população pode enxergar no SUS uma estrutura estatal de confiança; inclusive os monopólios de mídia foram obrigados a retratar o sistema como uma solução, ainda que isto tenha sido facilitado pelo fato de que o elogio dizia respeito a vacinação e ao combate a uma pandemia.

Governo Lula

  1. No contexto do governo de coalizão encabeçado por Lula, o Ministério da Saúde nestes primeiros meses, com Nísia Trindade e equipe, vem acertando em suas prioridades, embora haja um longo caminho para reverter as muitas perdas dos últimos anos.
  2. A nova ministra, pela experiência gestora como autoridade sanitária e reconhecido compromisso com a saúde pública, com a ciência e com a democracia, veio para coordenar e repactuar com as demais instâncias a retomada das capacidades de governo, retirando os militares que colonizavam a estrutura ministerial, concentrando esforços na reconstrução de políticas que estavam enfraquecidas para responder às necessidades da população.
  3. Sua gestão vem priorizando a emergência na saúde dos povos Yanomani para, junto com outras instâncias governamentais, focar na reversão do genocídio em curso daquele povo; a recuperação das coberturas vacinais em queda, atuando para retomar a credibilidade e a confiança nas vacinas com a reorganização do Programa Nacional de Imunização; a realização de investimentos contínuos em ciência, tecnologia e inovação, com a descentralização da produção de bens de saúde como vacinas, medicamentos e equipamentos médicos para reduzir a dependência em relação a importações; a criação de condições financeiras para pagamento do piso da Enfermagem com a sanção da lei que liberou aos estados e municípios o valor de R$ 7,3 bilhões para garantia de fontes pagadoras para efetivação do piso; a reorganização e recriação do Programa Mais Médicos, com o preenchimento total das 6 mil vagas na primeira chamada, podendo alcançar mais 10 mil vagas até o final deste ano, para as populações acessarem ações e serviços de saúde em zonas remotas como as terras indígenas e as periferias das grandes cidades, provendo profissionais com progressão de carreira, capacitação, acesso a telemedicina e abertura de novas vagas para cursos de Medicina voltados às necessidades da população e formação generalista; a liberação de recursos para reduzir filas de cirurgias no SUS, com alcance de pelo menos 18 estados desde fevereiro, através do Programa Nacional de Redução das Filas, prevendo chegar a R$600 milhões em repasses até o final de 2023, conforme planejamento e demanda dos estados e municípios para garantir equipes cirúrgicas completas e melhorar o fluxo de atendimento prioritários, de acordo com as realidades locais; a reaproximação do Ministério com o Conselho Nacional de Saúde (CNS), que é a principal instância de controle social das políticas públicas de saúde no país, cujo presidente integrou o grupo de trabalho temático sobre saúde na transição de governo, como também o primeiro escalão do ministério voltando a participar de suas reuniões e a retomada dos apoios à organização da 17ª Conferência Nacional de Saúde, a ser realizada em julho, e à 5ª Conferência Nacional de Saúde Mental, que finalmente ocorrerá em outubro deste ano, após vários adiamentos ocasionados pela falta de vontade política de que ocorresse durante o governo anterior.
  4. Mas a Saúde, nessa quadra histórica, na correlação de forças sociais em disputa, acumula desafios muito espinhosos, que envolvem iniciativas que transcendem a ação do Ministério da Saúde, a começar por se manter a esquerda no comando do Ministério, alvo central dos embates do governo Lula com o “Centrão” de Artur Lira, na mais recente chantagem para se impor como real governante do país.
  5. Para além desses gravíssimos enfrentamentos, estão colocados desafios relevantes para nossas lutas em defesa do SUS 100% público, integral, equânime e democrático que dizem respeito ao desfinanciamento do SUS nos marcos da implementação do novo marco fiscal, à avassaladora privatização da gestão dos serviços e das ações assistências através da contratação maciça de serviços privados de forma substitutiva aos serviços públicos estatais, desregulamentação dos planos e seguros privados e insatisfatória ação gestora do Estado brasileiro combinada com a precarização da força de trabalho da saúde e as ameaças renitentes ao cuidado em liberdade e antimanicomial para viabilizar a reforma psiquiátrica no Brasil.

Novo Marco Fiscal (NMF) e a Saúde com um financiamento 100% público, ampliado e sustentado

  1. Uma advertência: este texto está sendo escrito quando a Câmara Federal aprovou o (NMF) –também conhecido como Novo Arcabouço Fiscal– proposto pelo deputado Cláudio Cajado (PP-BA), que agora tramita no Senado. Para compreender o proposto por Cajado, é necessário compreender o que foi encaminhado pelo Ministério da Fazenda ao Congresso. E para isso é preciso começar nosso debate em 2022.
  2. Em sua campanha à presidência e mesmo já no governo, durante os repetidos embates com o presidente do Banco Central atacando a taxa de juros no Brasil como uma das mais altas do mundo, o presidente Lula tem sempre reafirmado que “saúde não pode ser considerado gasto, é investimento”, ressaltando a proteção da saúde e da vida. Uma das diretrizes urgentes, portanto, é a recomposição do orçamento da saúde. Tendo por referência o investimento em saúde nos países desenvolvidos, nosso plano de governo apresentado ao povo brasileiro nas eleições de 2022, definiu a necessidade da “revogação da EC 95/2016, instituição de uma política fiscal que considere as necessidades de saúde, adotando regras estáveis e menos dependentes das flutuações cíclicas da economia, na perspectiva de elevar o gasto público em saúde (união, estados e municípios) para que possa atingir 6% do PIB.” Atualmente encontra-se em torno de 3,6%, sendo destes, 3% de transferências do governo federal e os outros 3% de governos estaduais e municipais.
  3. Neste sentido, a proposta do NMF para os anos de 2024 a 2027, apresentado ao Congresso Nacional através do Projeto de Lei 093/2023, apesar de superar o teto de gastos, está muito longe de uma política fiscal amiga do desenvolvimento e do bem-estar social, algo oposto ao que fizemos o povo acreditar que implantaríamos quando eleitos.
  4. Lembramos que o chamado “teto de gastos”, implementado desde 2017, buscava limitar por 20 anos a expansão do gasto público à variação inflacionária, excetuando os gastos financeiros, cuja evolução seguiu descontrolada. O resultado foi a evolução descontrolada da dívida pública, a desestruturação das políticas públicas e a estagnação da economia nacional. O preço quem pagou foi a maioria do povo. Entretanto, o que o Ministério da Fazenda sob o comando de Fernando Haddad propôs foi substituir o “teto de gastos” por um conjunto de metas de evolução para o saldo primário e regras de variação das despesas.
  5. O NMF originalmente proposto estabeleceu metas de superávit primário, com o objetivo de chegar ao superávit primário em 2026. Foram previstas bandas (variações em torno da meta) e, também, punições, para o caso da meta não ser atingida. Para atingir este objetivo, o NMF propôs limitar a expansão dos gastos públicos a um percentual (70%) do crescimento das receitas, estabelecendo exceções a esta regra (na saúde, na educação, na previdência). Ao mesmo tempo, o NMF estabelecia um piso (0,6%) e um teto (2,5%) de expansão real (acima da inflação), percentuais que poderiam ser reajustados periodicamente. E estabelecia um piso (valor mínimo, a ser reajustado pela inflação) de investimentos, de R$ 70 bilhões.
  6. A regra básica, que limita o investimento público a 70% da variação real da receita do ano anterior, limitado a 2,5% como crescimento máximo das despesas, é restritiva ao investimento público, e como tal, um fator que dificulta a recomposição do orçamento da saúde, que ficará limitado a 15% da RCL (Receita Corrente Líquida) em 2024.
  7. É neste ponto que se faz necessário perceber uma das consequências do NMF. Como nos próximos anos vão aumentar as despesas, e como estas despesas não podem crescer mais do que 70% das receitas, o que vai acontecer é que haverá uma disputa para saber quais despesas serão mantidas ou serão cortadas. Por isso é que vai crescer a pressão para revogar os atuais pisos constitucionais da saúde e da educação, conforme aliás já anunciado pelo Secretário do Tesouro. Ou seja, um efeito colateral do NMF é jogar uns contra os outros, jogar os defensores de uma política pública conta os defensores de outra política pública. Isso é inadmissível em geral. E é inadmissível querer tocar no piso constitucional da educação e da saúde. No específico da Saúde, é preciso ampliar os recursos, para dar conta de todos os compromissos que a Saúde tem para recuperar e superar as dificuldades dos anos sombrios de genocídio bolsonarista e desmantelo pós-golpe, sendo também necessário incorporar ao seu orçamento as perdas advindas dos anos em vigor da EC 95/2016, calculadas em R$ 70,4 bilhões, os recursos das emendas impositivas e do piso da enfermagem (extra-teto).
  8. Há que se considerar nova fonte de custeio do SUS por meio do fundo social do petróleo e, no caso de emergência sanitária (calamidade pública) como ocorreu com a escassez de insulina, abrir créditos extraordinários (extra-teto).
  9. Denunciamos, portanto, que o NMF – dados os parâmetros propostos – impõe, como consequência lógica, matemática, a necessidade de uma PEC com a alteração dos atuais pisos da saúde e educação, visando reduzir o crescimento dessas despesas para próximo da velocidade máxima do teto. Isso porque o teto cresce na velocidade de 70% da receita (ainda limitado a 2,5% de ganho real) e saúde e educação crescem com base em 100% da receita. A saúde e educação passarão a ocupar crescentemente o espaço das áreas que não têm piso. Como compatibilizar isso com tantas necessidades de crescimento orçamentário?
  10. Resumidamente: enquanto o teto de gastos impedia a expansão real do gasto público, o NMF permite que isso ocorra. Mas o NMF permite isso apenas sob determinadas condições, entre as quais a obtenção de superávit, o crescimento das receitas e – como pressuposto geral – o crescimento da economia.
  11. Portanto, em um cenário muito provável, no qual não haja grandes investimentos internacionais nem grandes investimentos privados nacionais, em que não se consiga aumentar os impostos, em que não se consiga avanços significativos no combate às desonerações e à sonegação, o NMF imporá reduzir o piso constitucional. Por isso repetimos: o NMF não é adequado e precisa ser substituído por outro. E, ao mesmo tempo, dizemos: já que é assim, é preciso então cobrar mais impostos dos ricos.
  12. Repetimos também: ao estabelecer um crescimento das “despesas” sempre menor do que as receitas, o NMF projeta um futuro em que o Estado será mais mínimo do que é hoje. O único jeito de evitar isso, mantidas as demais variáveis, é criando impostos sobre as grandes riquezas, sobre os grandes patrimônios.
  13. Pelas razões expostas anteriormente, reafirmamos que as opções do NMF (na versão Haddad e na versão Cajado) são, em si mesmas, erradas, contraditórias com as posições históricas do Partido, quando contrastadas com o que o Brasil necessita para sair das atuais condições de desigualdade social, da condição de país primário-exportador, de uma saúde efetivamente universal, equânime, integral, 100 % pública e de qualidade.
  14. Argumentou-se que tais opções decorriam da correlação de forças. De fato, a correlação de forças é um problema. Mas a questão não está em constatar a correlação de forças, mas sim em alterar a correlação de forças. Se nos limitamos a constatar, é óbvio que o passo seguinte será retroceder ainda mais.
  15. O esperado era que o Partido, que não foi ouvido previamente, tivesse podido debater a proposta antes de ser encaminhada à Câmara. E, uma vez na Câmara, apresentasse emendas no sentido de: 1) estabelecer metas de crescimento e geração de empregos, como parâmetros para a política fiscal; 2) estabelecer metas fiscais compatíveis com a política monetária, para evitar um duplo efeito contracionista; 3) estabelecer metas de evolução do superávit que estejam subordinadas às necessidades de investimento, em nenhum caso aceitando déficit zero ou superávit enquanto a economia brasileira não crescer de forma sustentada; 4) diluir ao longo de vários anos as “punições” previstas para o caso de não cumprimento das metas de superávit primário; 5) incluir propostas tributárias que, além de rever desonerações e combater a sonegação, aumentem os impostos sobre os ricos; 6) alterar os números de variação da receita, crescimento mínimo dos gastos e crescimento médio dos gastos, no sentido de garantir que não haja restrição permanente ao papel do setor público na economia brasileira: o peso do setor público frente ao PIB deve crescer; 7) retirar a educação, a saúde, a previdência, o salário-mínimo e os investimentos da conta dos gastos, para evitar arrocho sobre os demais gastos públicos; 8) permitir que o Tesouro transfira recursos aos bancos públicos.
  16. Tais emendas não foram apresentadas. Prevaleceu na bancada uma postura recuada. E o efeito foi que a direita, através do relator, pode agir sem nenhum contraponto.
  17. Submetido ao debate no Congresso, o NMF original foi alterado para pior, com a introdução de contingenciamento obrigatório, criminalização, eliminação de exceções, proibição de concursos e reajustes etc. A bem da verdade, no essencial se piorou o que já era ruim.
  18. Supondo que o Senado faça como a Câmara e aprove a proposta do relator Cajado, não haverá como negar que passamos a ter dois problemas: uma política monetária e uma política fiscal que não contribuem para o desenvolvimento. O que nos obrigará a travar uma batalha imensa por uma reforma tributária progressiva, que faça os ricos pagarem a conta.

Saúde como elemento estratégico na política de desenvolvimento nacional do programa de governo de reconstrução e transformação do Brasil – Em defesa do SUS 100% público e gradativamente estatal.

  1. Mantido o cenário atual ‒ onde convivem privatização e terceirização na saúde, ausência de Carreira Única nacional, multiprofissional e pactuada do SUS, com compartilhamento interfederativo, incipiente integração sanitária no Sistema entre os entes federados, desfinanciamento a partir do Golpe de Estado de 2016, imensa renúncia fiscal e desonerações diversas em favor de entes privados ‒, serão imensos os obstáculos para a saúde se converter em um elemento estratégico de uma política de desenvolvimento nacional.
  2. Será preciso ampla discussão e mobilização social para que a saúde seja umas das prioridades contínuas no Programa de Reconstrução e Transformação do Brasil, que vem que sendo implementado pelo governo Lula.
  3. Ou seja, manter a saúde como componente fundamental na estratégia de desenvolvimento nacional perpassa as questões econômica, social, sanitária, humanitária e política, pois visa conferir concretude aos pontos que se seguem.
  4. Garantir a implantação e manutenção de uma política global em defesa da vida de todas as pessoas.
  5. Garantir a adequada reprodução da força de trabalho nacional.
  6. Garantir a incidência direta da área da saúde no crescimento econômico geral.
  7. Garantir a área da saúde como suficiente e permanente produtor de bens e de serviços necessários à consecução das finalidades do SUS, tanto as clínicas – com foco individual – quanto as coletivas – com foco na população.
  8. Garantir ao SUS o papel de orientador do desenvolvimento do Complexo Médico e Industrial da Saúde do País, o que é fundamental para a soberania nacional.
  9. Garantir ao aparato sanitário do SUS sua ampliação no território nacional, o que significará ampliar sobremaneira a força de trabalho em saúde – intensiva no emprego de mão-de-obra –; prover assistência à saúde da população de regiões do País que convivem com vazios assistenciais; prover equipamentos de saúde especializados – hospitais, centros especializados e unidades de urgência e emergência – e equipes de vigilância em saúde em regiões do País nas quais são insuficientes ou ausentes.
  10. Estancar e iniciar a reversão de toda sorte de privatização direta ou indireta do SUS, adotada pelo Ministério da Saúde e pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, ao lado da criação de Carreira Única nacional, multiprofissional e pactuada do SUS, com compartilhamento interfederativo, contemplando todas as profissões e ocupações existentes no Sistema.
  11. Estabelecer uma política de estruturação e ampliação da rede própria de forma a paulatinamente substituir a rede privada contratada em todos os níveis de atenção.
  12. Ampliar o Programa “Mais Médicos” para o “Mais Saúde” com a inclusão de outras categorias profissionais fundamentais na estruturação da atenção básica nos municípios.
  13. Instituir a contratualização direta entre os serviços da Rede SUS e as respectivas gestões nos correspondentes níveis administrativos, garantindo autonomia administrativa e financeira bem como a profissionalização da gerência e gestão desses serviços.
  14. Entendemos que combater a privatização no SUS significa também eliminar todas as formas de gerência, gestão e ações assistenciais – como fundações de direito privado, serviços sociais autônomos, EBSERH e congêneres -, que de forma direta ou indireta retroalimentam o clientelismo e patrimonialismo no Estado e atentam contra direitos básicos dos servidores públicos como a estabilidade, que é a forma de garantir imunidade dos trabalhadores contra ações fisiologistas de governos.

Pela ampliação do financiamento público do cuidado em liberdade laico no SUS

  1. O governo Lula incorporou importantes lutadores da reforma psiquiátrica e sanitária para os quadros do Ministério da Saúde, que adotam as premissas da Reforma Psiquiátrica, defendendo o cuidado em liberdade social, territorial e comunitária e a redução de danos como diretrizes do atendimento a usuários de substâncias psicoativas, destacados representantes dos movimentos sociais da luta antimanicomial no último período, que se somam às ruas e ao controle social no SUS. Estes sujeitos trazem para disputa institucional a agenda de ampliação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) em consonância com a lei 10.216/2001, cuja implantação incompleta e conturbada em nossos governos, frontalmente atacada pós-golpe, é retomada pela priorização dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Centros de Convivência e Cultura, Residências Terapêuticas, Oficinas de Geração de Renda, ou seja, a implementação de diversos serviços substitutivos, a qual se agregou mais recentemente, a interdição parcial e completa dos Hospitais Custódias no Brasil, instituída pela resolução 487 do Conselho Nacional de Justiça apoiada pelo Ministério da Saúde e entidades/movimentos sociais progressistas.
  2. É neste cenário de avanços, que se apresentam também contradições. Se em 2011, durante o governo Dilma, as Comunidades Terapêuticas (CT) foram inseridas na RAPS, através da portaria 3.088/2011, agora em janeiro de 2023 foi anunciado um departamento das CT no Ministério do Desenvolvimento Social, que consolidou recentemente sua nomenclatura em “departamento de entidades de apoio e acolhimento atuantes em álcool e outras drogas”. Ação de governo essa que favorece o setor privatista da saúde, a ala conservadora da igreja e seus partidos, e os tratamentos para usuários em abuso/dependência em substâncias psicoativas fora dos preceitos de direitos humanos. Prevaleceu o financiamento de 214 milhões em 2023 para práticas asilares não laicas focadas na abstinência. É importante destacar que as CT não se enquadram na Resolução de Tipificação dos Serviços Socioassistenciais aprovadas no Conselho Nacional de Assistência Social (n. 13/2014) e possuem diversas denúncias de irregularidades em todo o Brasil, apontadas no Relatório da inspeção nacional em CTs, elaborado pelo Conselho Federal de Psicologia, pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura e pelo Ministério Público Federal (2018).
  3. Nesse sentido, defendemos que o governo Lula revogue o decreto federal que cria tal departamento, como recomendou o Conselho Nacional de Saúde, e simultaneamente desenvolva ações, sob a coordenação do Ministério da Saúde, voltadas ao controle e vigilância de modo a gradativamente extinguir tais instituições, suspendendo a transferência de verbas públicas e definindo-as como asilos religiosos ou assemelhados, agenciando seu fechamento com a retomada e fortalecimento dos serviços substitutivos na RAPS.

A reconstrução do pacto federativo na Saúde com efetiva regionalização e uma carreira interfederativa, única e nacional do SUS

  1. Sem a vigorosa restauração democrática, sem pujante incremento do número de empregos e restauração e aprofundamento dos direitos sociais, o Brasil não superará o caos provocado pelos neofascistas, ultraliberais e neoliberais. Na verdade, além de melhorar os indicadores epidemiológicos e promover o bem-estar social, a política de saúde, a um só tempo, deve almejar combater o desemprego e a desigualdade, contribuindo para o crescimento econômico e a desconcentração de renda, em um novo ciclo de desenvolvimento inclusivo com sustentabilidade ambiental.
  2. O entrelaçamento entre política de saúde, crescimento econômico e desenvolvimento ficou evidenciado em plena pandemia de coronavírus, quando, por exemplo, o mercado produtor nacional não fabricou luvas, nem seringas, tampouco agulhas e conjunto de testes diagnósticos em quantidade suficiente para que pudéssemos combater a pandemia. Isso demonstrou que, em nome da soberania sanitária, é estratégico o papel do SUS como instância de dinamização dos complexos econômico-industriais produtivos em saúde.
  3. A sustentabilidade e o futuro do SUS, estão umbilicalmente ligados ao compromisso de luta contra a privatização do sistema de saúde e contra as diversas formas de mercantilização no seu interior, mediante a reversão gradual, organizada e acelerada da privatização até agora existente, criando as bases econômicas e institucionais para a reconstrução do Estado na área da saúde. Boa parte dos problemas de gestão do SUS decorrem do seu sucateamento e o Estado, sob controle social, deve privilegiar a progressiva e definitiva alocação de recursos financeiros para a administração pública direta e indireta, como reza a Lei Orgânica da Saúde, até efetivamente os recursos públicos serem investidos de forma planejada apenas nas instituições públicas estatais, ficando a compra de serviço privado complementar destinada para as necessidades imprevistas e emergenciais.
  4. Destacamos as questões nacionais de fundo que devem ser enfrentadas para a sustentabilidade e o futuro do SUS por um governo de reconstrução e transformação nacional, conforme enfatizaremos nos pontos que se seguem.
  5. Estancar e reverter toda sorte de privatização direta ou indireta do Sistema adotada pelo Ministério da Saúde e pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, porque:

A.1. os processos de privatização direta ou indireta, inclusive da gestão, que foram se amiudando no SUS nos últimos 20 anos, tornaram-no mais custoso ao Erário Público do que se fosse operado exclusivamente pelo Poder Público;

A.2. do ponto de vista da gestão do cuidado fornecido às pessoas e da multiplicidade de serviços prestados aos cidadãos e às cidadãs que envolvem o cuidado às pessoas, tornaram-no incontrolável;

A.3. existem evidências sólidas, extraídas da experiência internacional, sobre o modo mais efetivo para organizar a saúde, ou melhor, Sistemas públicos e nacionais têm melhor desempenho que modelos privados.

  1. Impõe-se que a União e todos os Estados da Federação (re) assumam protagonismo maior e de novo tipo no Sistema, dando um basta ao sacrifício que se impôs historicamente às municipalidades e, assim, garantindo a efetiva integração sanitária sistêmica entre os entes federados e a natureza nacional do SUS.
  2. Múltiplos fatores na evolução histórica do SUS determinaram a fragmentação do Sistema em redes de unidades de saúde dos entes federados – Municípios, Estados, Distrito Federal e União – em função do Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais de Saúde não terem conseguido integrar o aparato sanitário nacional ao longo do tempo. Tal fragmentação é aprofundada pela existência de:

C.1. múltiplas lógicas organizativas no Sistema (administração direta e indireta, contratos e convênios, organizações sociais – OS e outros);

C.2. relação existente entre hospitais e ambulatórios privados e filantrópicos e o SUS, há décadas, sobre os quais os gestores públicos têm baixa capacidade de controle e governabilidade;

C.3. crescente – e destrutiva! – privatização da gestão de serviços e de redes de unidades de saúde municipais e estaduais, criando-se nos territórios de entes federados gestores privados com poder e autonomia para definir política de pessoal, estratégias de cuidado de usuários, entre outros.

  1. Urge conferir uma nova institucionalidade para o SUS, o que pressupõe lutar pela organização e a operacionalização do SUS a partir das 438 Regiões de Saúde existentes no país – processo denominado regionalização previsto na Constituição Federal de 1988 –, buscando superar a fragmentação e garantir a integração sanitária do Sistema.
  2. O processo de regionalização demanda o forte protagonismo das Secretarias Municipais de Saúde, das Secretarias Estaduais de Saúde dos Estados e do Distrito Federal, compartilhado necessariamente com o Ministério da Saúde, tratando-se de gestão compartilhada pelos entes federados cuja institucionalização requer aprovação de lei federal específica.

E.1. Lei federal específica com tal finalidade – organização e a operacionalização do SUS a partir das Regiões de Saúde existentes no país – pode ensejar a criação de uma estrutura administrativa estatal nacional, gerida pela Comissão Intergestores Tripartite – Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) e Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) –, sob o acompanhamento do Conselho Nacional de Saúde, no plano federal.

Manter-se-iam, com a ampliação da complexidade de suas funções, o papel institucional das Comissões Intergestores Bipartite estaduais – Secretarias Estaduais de Saúde e Conselhos de Secretários Municipais de Saúde de cada Estado da Federação (COSEMS) – e Conselhos Estaduais de Saúde, no plano estadual; das Comissões Intergestores Regionais – representantes regionais de Secretarias Estaduais de Saúde e os Secretários Municipais de Saúde de municípios localizados em cada Região de Saúde de cada Estado da Federação, no plano regional; e das Secretarias Municipais de Saúde e Conselhos Municipais de Saúde, no plano municipal.

E.2. Lei federal específica com tal finalidade – organização e a operacionalização do SUS a partir das Regiões de Saúde existentes no país – pode decorrer, eventualmente, em outro arranjo jurídico.

  1. Criação de Carreira Única nacional e multiprofissional e pactuada do SUS, com compartilhamento interfederativo, contemplando todas as profissões e ocupações existentes no Sistema, na qual seja implantado Plano de Carreira, Cargos e Salários do SUS, que contemple cargos de comando e assessoria técnica na carreira do SUS, cujo concurso de ingresso tome como referência territorial o Estado da Federação e que, na sua estruturação, possibilite a adesão de funcionários municipais, estaduais e federais. Enfim, faz-se tarde a criação de tal instrumento potente para conferir prioridade e nobreza à profissionalização do trabalho no setor público de saúde no Brasil.
  2. Ressaltamos que, ainda que um processo de transformação do Brasil pressuponha mudar a essência da chamada lei de responsabilidade fiscal – LRF no sentido de substituí-la por legislação de responsabilidade social, em caráter emergencial, é necessário lutar para que sejam retirados os funcionários da área da saúde – Municípios, Estados, Distrito Federal e União – da base de cálculo da chamada LRF, porque a área da saúde é intensiva no emprego de mão-de-obra, além de também ter atribuições de fiscalização e controle que lhes são próprias e são destinadas a preservar a saúde e a vida das pessoas.
  3. É preciso, igualmente, conhecer e eliminar os fatores que causam as doenças, sendo hoje os principais determinantes a superexploração do trabalho, a desigualdade, a pobreza, a fome, o desemprego, a violência, o analfabetismo e a destruição do meio ambiente. É preciso água de qualidade, saneamento básico em cada moradia, alimento sem agrotóxico em toda mesa e transporte público adequado para todas e todos.
  4. Esse conjunto de medidas representa um desafio gigantesco, mas com o apoio das frentes políticas e movimentos populares e democráticos estariam reunidas condições mais favoráveis para a luta pela realização dessas reformas estruturais. É uma tarefa extraordinária, mas, neste momento, é vital valorizarmos a solidariedade entre as nações, bem como a função social da propriedade, o planejamento e o mercado interno, desprivatizando, assim, o fundo público e incorporando a sociedade civil autenticamente representativa, consciente e organizada no processo decisório governamental.
  5. Por fim, na 17ª Conferência Nacional de Saúde, devemos cerrar fileiras e organizar a luta em torno da defesa, da ampliação e do aprofundamento do SUS, conforme foi inscrito na Constituição Federal de 1988 – CF de 1988, a saber:
  6. um SUS de fato nacional – urge que a União e os Estados da Federação (re) assumam protagonismo maior e de novo tipo no Sistema dando um basta no sacrifício que se impôs historicamente às municipalidades;
  7. um SUS de fato único – urge superar a fragmentação do Sistema em redes de entes federados que podem fazer – e fazem – o que querem, porém guardam entre si insuficiente interação sistêmica, fragmentação essa agudizada pela avassaladora privatização de redes públicas de saúde por meio de Organizações Sociais;
  8. um SUS de fato público – urge estancar e reverter toda sorte de privatização direta ou indireta do Sistema, a começar por aquela realizada por meio de Organizações Sociais;
  9. um SUS de fato universal – para todos os brasileiros e todas as brasileiras;
  10. um SUS de fato com carreira de âmbito nacional – urge criar uma Carreira Única nacional, multiprofissional e pactuada do SUS, com compartilhamento interfederativo, contemplando todas as profissões e ocupações existentes no Sistema, que na sua estruturação possibilite a adesão de funcionários municipais, estaduais e federais, cujo concurso de ingresso tome como referência territorial o Estado da Federação;
  11. um SUS de fato com renovada e deliberativa participação da comunidade; e,
  12. um SUS de fato com financiamento adequado – bloqueado desde o seu nascedouro pela classe dominante brasileira que agiu politicamente para obstaculizar o suficiente financiamento federal e, desse modo, dificultar sobremaneira a implantação plena do Sistema.

13/Agenda dos próximos dias

28 de junho: reunião da frente institucional

29 de junho: abertura do XXVI encontro do Foro de São Paulo, em Brasília

2 de julho: encerramento do XXVI encontro do Foro de São Paulo

2 a 8 de julho, 17ª Conferência Nacional de Saúde, em Brasília

12 a 15 de julho: congresso da UNE

22 de julho, 14h, virtual, conferência setorial de saúde da AE

23 de julho: data final congressos de base

26 de julho: reunião da frente institucional

27 a 29 de julho: Elahp promove seminário sobre estrutura sindical em Brasília (As inscrições são feitas através do site da Elahp Seminário sobre reforma da estrutura sindical – ELAHP).

28 de julho, das 15h às 18h, apresentação e debate da proposta de curso sobre violência de gênero

28 de julho: reunião da Dnae em Brasília e abertura do 8º Congresso

29 e 30 de julho: 8º congresso da AE

30 de julho: reunião da nova Dnae

14/Expediente

Orientação Militante é um boletim interno da Direção Nacional da tendência petista Articulação de Esquerda. Responsável: Valter Pomar. A direção da tendência é composta por: Mucio Magalhães (PE) acompanhamento do PI, PE, PB e SE; Valter Pomar (SP), coordenação geral, comunicação e acompanhamento das regiões Sudeste e Norte e do Maranhão; Damarci Olivi (MS), finanças; Daniela Matos (DF), formação, cultura, LGBT e acompanhamento do MT e GO; Natalia Sena (RN), acompanhamento da bancada parlamentar e dos Estados do RN, CE, BA e AL; Jandyra Uehara, sindical e acompanhamento dos setoriais de mulheres; Patrick (PE), acompanhamento da juventude, do setorial de combate ao racismo, do MS e DF; Júlio Quadros (RS), acompanhamento dos setoriais de moradia, rurais e da região Sul. Comissão de Ética: Jonatas Moreth(DF), titular; Sophia Mata (RN), titular; Izabel Costa (RJ), suplente; Pere Petit (PA), suplente

 

 

 

 

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